Reformas administrativa e tributária e BR do Mar: veja situação de projetos travados

Propostas consideradas prioritárias pelo governo no início do ano ainda não foram destravadas apesar da ampliação da base governista no Congresso, que está sob comando de aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Em fevereiro, foram eleitos, com apoio de Bolsonaro, os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Logo depois, o governo enviou a eles uma lista com as pautas consideradas mais importantes. De 17 projetos econômicos, 8 seguem travados. Não foram votados pelo plenário de nenhuma das Casas até o momento. Entre eles, estão as medidas estruturantes colocadas como pilares da gestão do ministro Paulo Guedes (Economia). Ainda não há previsão para votação da reforma administrativa (que muda regras no funcionalismo público). A reforma tributária, por sua vez, não avançou e aguarda o envio de propostas pelo governo. Também está travada a criação da BR do Mar, iniciativa que busca reduzir a dependência do transporte rodoviário no país e ampliar a navegação entre portos nacionais (cabotagem). Quatro propostas ainda dependem do aval de uma das Casas, sendo que uma delas é a MP (medida provisória) que abre caminho para a privatização da Eletrobras, a ser votada nesta segunda-feira (21) pela Câmara. Cinco itens da lista já foram aprovados, como a nova lei do gás e a que concede autonomia ao Banco Central. Procurado, o Ministério da Economia não quis comentar o desempenho da agenda econômica no Congresso. Reservadamente, auxiliares de Guedes afirmam que certas pautas prioritárias enfrentam dificuldades mesmo com a presença de aliados do governo no comando do Congresso. É o caso das novas regras para ferrovias. Interlocutores do ministro dizem que o projeto é alvo de forte lobby, que está travando as negociações. Um membro da pasta inclui as mudanças de normas ambientais na lista de projetos considerados de difícil aprovação. O texto, que flexibiliza as regras de licenciamento ambiental, foi aprovado pela Câmara em maio, mas enfrenta resistência de senadores. Líderes governistas afirmam que a pauta de votações no Senado ficou emperrada desde que foi instalada a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid, no fim de abril. Por isso, as votações têm focado em medidas provisórias, que perdem validade se não forem aprovadas dentro do prazo. A reforma tributária, que estava em estágio avançado na Câmara, empacou. Por articulação do governo, a proposta encabeçada por líderes partidários ligados ao ex-presidente da Casa Rodrigo Maia (DEM-RJ) foi praticamente enterrada. Há quase um ano e meio, o ministro Paulo Guedes (Economia) prometeu enviar a proposta dele ao Congresso em uma ou duas semanas. Até hoje, porém, só um projeto —de um total de cinco ou seis— foi apresentado. A proposta que já está na Câmara unifica PIS e Cofins num novo tributo, a CBS. O texto, no entanto, sequer tem indicação de quem será o relator. Lira aguarda o envio dos demais projetos da reforma tributária de Guedes para destravar essa agenda. Aliados de Guedes no Congresso chegaram a sondar o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) para relatar a criação da CBS. Ribeiro recusou. Ele foi relator da PEC (proposta de emenda à Constituição) do grupo de Maia e que desagradava a equipe econômica. A expectativa agora é que a segunda fase da proposta de reforma tributária chegue ao Congresso até quarta-feira (23). O texto deve tratar das mudanças no Imposto de Renda para pessoa física, jurídica e nos dividendos de empresas. Nessa área, Guedes já reconhece que não será possível fazer uma reforma ampla. O time do ministro deve deixar de lado uma ampla desoneração de encargos trabalhistas e outras mudanças mais radicais no sistema tributário para focar em medidas de simplificação e ajustes mais tímidos de alíquotas. Na reforma administrativa, o governo enfrentou dificuldade logo na primeira sessão da comissão especial da Câmara que vai analisar o projeto. Membros de partidos aliados a Bolsonaro são ligados a corporações do funcionalismo público, como o líder da bancada da segurança pública, deputado Capitão Augusto (PL-SP). Em 22 de fevereiro, Lira estimou que a reforma administrativa seria votada no plenário da Casa antes do fim do primeiro trimestre. No dia 10 de maio, afirmou que sua intenção era enviar o texto para o Senado até julho. O relator da PEC, deputado Arthur Maia (DEM-BA), quer concluir o parecer até o fim de agosto. Mas a pressão da base bolsonarista ameaça empurrar a reforma administrativa só para 2023. Em relação à criação da BR do Mar, o projeto foi aprovado pela Câmara no fim do ano passado. O plano é flexibilizar as regras para a navegação entre portos nacionais e aumentar a frota de embarcações no país. Mas falta passar pelo Senado, onde a proposta deverá ser modificada pelo relator, Nelsinho Trad (PSD-MS). Com isso, o texto ainda deverá voltar para a Câmara depois que o governo conseguir reduzir as resistência a ele no Senado. Em evento promovido pela Abras (Associação Brasileira de Supermercados), Guedes voltou a defender na quinta (17) a aprovação de marcos regulatórios, como o de ferrovias e de cabotagem, para melhorar a logística e o escoamento da produção brasileira. Ainda não há previsão de votação dessas propostas. Outro projeto do ministro é a mudança no regime de exploração de petróleo. Desde o fim de 2019, após um megaleilão frustrado, o ministro defende a licitação com concessão nos blocos em que esse regime for mais vantajoso para o Brasil e instituir a disputa em igualdade de condições nas licitações de partilha da produção. Mas a proposta, de autoria do senador José Serra (PSDB-SP), está parada, apesar de no ano passado o Ministério da Economia ter enviado um ofício ao Senado pedindo celeridade. Guedes também tem dificuldade para destravar a proposta de cortar salário acima do teto do funcionalismo (R$ 39,3 mil). O projeto está pronto para votação no plenário da Câmara, mas enfrenta forte lobby de servidores, especialmente do Judiciário. No Congresso, líderes governistas admitem que a janela para aprovar medidas de grande impacto na economia fica aberta até o início de 2022, ano eleitoral. Por isso, consideram o segundo

Projeto exige que empresa pague dívida com a União antes de aumentar tarifa

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Um projeto de lei apresentado na Câmara dos Deputados quer obrigar concessionárias e prestadoras de serviços públicos a comprovar que não têm dívidas com a União para poder reajustar tarifas. A proposta do deputado Elias Vaz (PSB-GO) foi protocolada na quinta-feira (17). Ele decidiu redigir o texto após levantamento de dívidas ativas de concessionárias de serviços públicos com a União. Os dados foram obtidos na PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional). No projeto, o deputado propõe incluir na lei que trata do regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos o dispositivo obrigando as empresas a comprovarem a regularidade fiscal antes de terem os reajustes homologados. A medida poderá ser aplicada a companhias aéreas, de telefonia, energia elétrica, gás e rodovias, entre outras. Hoje, a exigência de situação fiscal regularizada já existe para empresas que participam de licitações que envolvam concessão ou permissão. Com a proposta, seria criada a exigência também no momento do reajuste tarifário. No projeto, Vaz citou especificamente a situação tributária das quatro maiores operadoras de telefonia e internet do país: Claro, Vivo, Tim e Oi. Juntas, as companhias têm cerca de R$ 6 bilhões em débitos inscritos na dívida ativa da União. O maior passivo é o da Claro, segundo o levantamento obtido pelo deputado: R$ 2,1 bilhões. Vivo vem a seguir, com R$ 1,7 bilhão, enquanto a Tim tem R$ 1,1 bilhão e a Oi, R$ 1 bilhão. “Isso fere o interesse do país. Só essas quatro empresas devem R$ 6 bilhões”, criticou Vaz. “O estado brasileiro precisando de dinheiro, porque nós temos problema sério fiscal, e quatro empresas dando desfalque de R$ 6 bilhões no Orçamento da União.” “A gente paga. Quando a gente paga a nossa conta telefônica, a gente paga impostos. O que eles não estão é recolhendo os impostos, é imposto que a população já pagou. Até porque se não pagar, eles cortam o telefone.” A ideia, disse Vaz, é obrigar as empresas a andarem em dia. “Uma das formas é doer no bolso. Se a gente trava essa possibilidade de reajuste da tarifa, a gente entende que vai obrigá-las a não ficarem inadimplentes.” A dívida ativa reúne débitos de pessoas e empresas com o governo. Os passivos são inscritos no banco depois que o processo regular de cobrança se esgotou na Receita Federal e em outros órgãos. Mesmo dentro das inscrições da dívida ativa, há débitos considerados regulares. Isso porque estão em algum tipo de programa de parcelamento ou dependem de decisão judicial. No caso das empresas de telecomunicações, a maior parte das dívidas é considerada regular porque há questionamento judicial. Até que a Justiça dê o veredito, essas companhias oferecem como garantia bens em valor equivalente ao da dívida. Dos R$ 6 bilhões devidos, quase R$ 5,7 bilhões aguardam decisão em processo judicial e estão regularizados por meio de garantias dadas pelas empresas. O último dado computado é de maio deste ano. Há ainda débitos suspensos na Justiça ou inscritos em parcelamentos do governo. Apenas R$ 127 milhões são considerados irregulares pela PGFN e estão em processo de cobrança. Portanto, no caso de aprovação do projeto, a limitação dos reajustes de tarifas incidiria apenas sobre a parcela efetivamente considerada irregular pelo governo. Membros do governo afirmam que os questionamentos na Justiça e o uso de garantias são mecanismos usuais nesse processo. O advogado Eduardo Telles, sócio do Tauil & Chequer Advogados, também afirmou ser comum que essas garantias sejam oferecidas enquanto a discussão se alonga. Segundo ele, existe a possibilidade de se tratar de imposto não recolhido. No entanto, em muitos casos a tributação é contestada. “Às vezes a empresa não deixou de recolher, ela só acha que não é devido, discorda da cobrança. Certamente no caso das telefônicas não é ‘não quero pagar’, é muito mais não concordo com essa dívida.” Na justificativa do projeto, Vaz afirmou que “a maioria esmagadora dos credores opta em firmar contratos de seguro e, assim, oferecem as apólices ao poder público”. “Essa operação é um grande negócio para as empresas, pois é mais barata quando comparada ao débito”, disse. “Hodiernamente, no planejamento tributário profissional, as empresas optam em não pagar os impostos, desembolsam uma parcela pequena para as seguradoras, conduzem os processos judiciais até a última instância e ficam com o crédito tributário investido na própria empresa ou em algum ativo financeiro, por exemplo.” Telles também disse ser possível que a empresa possa vislumbrar um programa de refinanciamento tributário para conseguir desconto na dívida. Embora algumas empresas usem esses instrumentos para adiar pagamentos e aguardar a liberação de algum Refis (programa de parcelamento com desconto), técnicos do governo afirmam que companhias de grande porte de telecomunicações costumam ter programas de governança arrojados e não costumam usar esses subterfúgios. Procuradas, as quatro teles encaminharam a demanda da reportagem para a Conexis. A Conexis Brasil Digital, que representa as principais operadoras de telecomunicações do país, afirmou que o setor tomou conhecimento do projeto de lei e está analisando o texto. AS DÍVIDAS DAS TELESClaro Tem R$ 2,2 bilhões inscritos na dívida ativa da UniãoApenas R$ 300 mil são considerados irregulares e estão em cobrança. O restante está em programa de parcelamento ou pendente de decisão judicial, sendo considerado regularVivo Tem R$ 1,8 bilhão inscrito na dívida ativa da UniãoDo total, R$ 17 milhões são considerados irregularesTim Tem R$ 1,1 bilhão na dívida ativa da UniãoR$ 10 milhões estão em cobrançaOi Tem R$ 1 bilhão na dívida ativa da UniãoR$ 100 mil estão em cobrança FOLHA DE S. PAULO

Equipe econômica quer isenção para dividendos de até R$ 20 mil por mês

O Ministério da Economia definiu uma proposta de tributação de dividendos em 20%, com faixa de isenção de R$ 240 mil por ano (R$ 20 mil por mês). Conforme o Valor antecipou, a pedido do Palácio do Planalto o time do ministro Paulo Guedes estava revisando a proposta de tributação de dividendos de modo a incluir uma faixa de isenção no desenho. O site Poder 360 noticiou a definição do valor de R$ 20 mil por mês, informação confirmada pela reportagem do Valor. Hoje, essa forma de distribuição de lucros é totalmente livre de tributação. Originalmente, trabalhava-se na equipe econômica com uma alíquota de 15% sem isenção, mas já havia considerações sobre a possibilidade de ela subir para 20%. Com a ideia de uma faixa de isenção, a alíquota maior ganhou força. A cobrança sobre dividendos visa financiar a redução do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) em cinco pontos percentuais, de 25% para 20%. Também deve ajudar a bancar o reajuste das faixas de tributação do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), cujo limite de isenção caminhava para ser fixado em R$ 2,4 mil. A proposta para reforma do IR agora será analisada pelo Palácio do Planalto, que deve decidir também o momento do envio. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse na semana passada esperar que o texto seja remetido aos deputados ainda nesta semana, mais precisamente amanhã. O governo, porém, ainda não se comprometeu publicamente com esse prazo. Na tarde de ontem, o presidente Jair Bolsonaro recebeu Guedes para discutir com seu núcleo de ministros palacianos a proposta que estava pronta na área econômica. O Valor apurou que o acertado foi buscar cumprir o prazo de envio na quarta. Ex-assessora do ministro da Economia para a reforma tributária, a coordenadora do núcleo de estudos tributários do Insper, Vanessa Canado, demonstra preocupação com a possibilidade de o desenho da tributação de dividendos com uma faixa de isenção de R$ 240 mil por ano (R$ 20 mil mensais) aumentar a complexidade do sistema. De acordo com ela, o limite de isenção reduzirá a alíquota efetiva de tributação, que na versão mais recente da proposta é de 20% sobre a distribuição de lucros. Para Vanessa, em vez de uma isenção para renda mensal de até R$ 20 mil com dividendos, faria mais sentido que o limite de isenção siga a tabela progressiva do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF). “O que estou propondo é evitar mais uma tabela, mais uma regra. Já que querem dar algum tipo de isenção, adota a que já existe. Não é questão de ser alta ou baixa, mas sim de não criar mais uma regra”, afirmou ao Valor. Como ainda não há muitos detalhes da proposta, Vanessa disse temer que o governo faça essa isenção apenas para distribuição de lucros de empresas em regimes especiais, como o Simples. “Nesse caso, vai-se tratar de forma diferente quem é acionista de empresa maior de quem é de empresa menor, o que é uma diferença econômica injustificável”, disse, acrescentando que isso acabaria por reforçar a complexidade do sistema e ampliar “distorções alocativas” e incentivos para que as empresas se mantenham menores. VALOR ECONÔMICO

Baixo desempenho do mercado de trabalho levanta dúvidas sobre recuperação da economia

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Na coluna passada argumentei que o panorama externo favorável trouxe folga para o cenário fiscal já que as coisas que produzimos e exportamos —commodities em sua maioria— tornaram-se mais demandadas, especialmente agora que várias economias avançam na vacinação, reabrem suas economias e estabelecem planos de investimentos em infraestrutura para uma retomada sustentável, além de mais verde e tecnológica. Mas ainda que o país possa ter ficado mais rico, os ganhos não foram distribuídos para a população. Há, sem dúvidas, ganhadores e perdedores, e um dos principais sinais de uma frágil recuperação vem do mercado de trabalho, que apesar de dar sinais de melhora, o faz de forma lenta e desigual. A taxa de desocupação, métrica tradicional de desempenho do mercado de trabalho, está em 14,7%. Apesar de ser um recorde histórico desde o início da série, em 2012, o número representa um aumento de apenas 2,5 pontos percentuais em comparação a igual trimestre do ano anterior. Em números absolutos são em torno de 2 milhões de pessoas desocupadas a mais (14,8 milhões no total). Entretanto, durante a pandemia a taxa de desocupação passou a ser estatística pouco informativa sobre os efeitos devastadores da crise econômica na vida das pessoas, já que muitos trabalhadores ficaram fora da força de trabalho da economia, apesar de serem força de trabalho em potencial. São pessoas que gostariam de trabalhar, mas que ficaram impedidas de procurar ou de assumir postos de trabalho, seja porque não existe emprego, porque o retorno ainda não é seguro, ou porque as escolas ainda não estão totalmente abertas. Nesta crise, a força de trabalho em potencial aumentou muito mais que a população desempregada, passando de 8,3 para 11,3 milhões. Assim, somando os desempregados à força de trabalho em potencial, temos 26 milhões de trabalhadores subutilizados. Considerando, alternativamente, a população ocupada, passamos de 92,2 para 85,6 milhões de empregos entre os primeiros trimestres de 2020 e 2021, uma perda de 7 milhões de empregos. O baixo desempenho do mercado de trabalho é evidente, e levanta muitas dúvidas sobre uma recuperação mais robusta da economia. Pela massa de rendimentos reais, houve queda de quase 7% em termos reais entre os primeiros trimestres de 2020 e 2021, apesar do PIB real ter crescido 1% em igual período. E a relativa estabilidade do rendimento real do trabalho, em torno de R$ 2.500, diz pouco sobre a escassez de mão-de-obra, já que mudanças na composição da força de trabalho favorecem, justamente, os trabalhadores de maiores salários. Os setores que mais cresceram no período —indústria e agricultura— não são os mais intensivos em mão de obra, e o setor de serviços continua sem muitas perspectivas enquanto a vacinação não avançar. Na abertura do emprego por setor, os ganhadores e perdedores se revelam: enquanto a ocupação em agricultura e pecuária aumentou em 329 mil postos, o comércio perdeu 1,6 milhão de trabalhadores, as atividades de alojamento e alimentação mais 1,4 milhão, e população de trabalhadores domésticos encolheu outro 1 milhão. A recuperação econômica sem empregos (jobless recovery) —quando a economia cresce, mas o mercado de trabalho não responde— acontece quando realocações setoriais geram descasamentos entre quem busca e quem oferece trabalho. Em alguns setores, a demanda pode não voltar aos níveis pré-pandemia, resultado direto das mudanças nos padrões de consumo que permanecem mesmo depois da vacinação e reabertura. E reestruturações organizacionais eliminam permanentemente trabalho desnecessário, especialmente em firmas pequenas, criando mudanças estruturais nas oportunidades de emprego. Pode até ser que o avanço da vacinação traga alguma esperança para a recuperação do mercado de trabalho. Os próximos meses dirão. Mas também não há nenhuma garantia de que tudo voltará a ser como antes. Se de um lado a trajetória fiscal se tornou mais sustentável, de outro, a sociedade ficou mais desigual e com piores perspectivas de emprego. O PIB é certamente um dos indicadores da retomada, mas ele sozinho não será suficiente para garantir um crescimento estável e duradouro da nossa economia, especialmente quando os ganhos deixam tanta gente para trás.​ FOLHA DE S. PAULO

Mudança na correção das contas do FGTS pode ter impacto R$ 401 bilhões

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mudança na correção do saldo nas contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF), pode ter impacto de pelo menos R$ 401 bilhões nas contas do fundo, segundo cálculos da Secretaria de Política Econômica (SPE), do Ministério da Economia, antecipados ao Estadão/Broadcast. Enquanto entidades que representam os trabalhadores pressionam a Corte para colocar o processo na pauta, o governo vê o tema com preocupação e alerta para o risco de a medida significar financiamento imobiliário mais caro para os próprios trabalhadores. A lei hoje diz que o saldo das contas vinculadas do FGTS precisa ser corrigido pela Taxa Referencial (TR), atualmente zerada, mais um juro de 3% ao ano. Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) questiona a correção monetária e pede a aplicação de um dos índices de inflação ao consumidor medidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais o juro de 3%. O impacto de R$ 401 bilhões é estimado para o caso de o STF decidir que a correção das contas vinculadas desde 1999 deve ser feita pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do País. Com o emprego do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), o efeito seria de cerca de R$ 408 bilhões sobre o passivo do fundo, segundo a SPE. “Do ponto de vista do fundo, é bastante ameaçadora a decisão”, afirma ao Estadão/Broadcast o diretor do Departamento do FGTS no Ministério da Economia, Gustavo Tillmann. Segundo ele, a remuneração atual das contas vinculadas do FGTS permite que o fundo também empreste recursos com a cobrança de TR (hoje zerada) mais 3% e um adicional para remunerar os trabalhadores e o próprio fundo. Ao mudar o índice de correção monetária dos saldos, haverá em primeiro lugar um “descasamento”, uma vez que os recursos passados já foram emprestados a uma taxa menor. Isso pode desequilibrar o fundo. Para frente, uma decisão nesse sentido do STF levaria o fundo a ajustar sua cobrança nas operações. “O dinheiro que empresta a TR vai ter que ser emprestado a IPCA, e isso vai limitar muito o público que vai querer pegar crédito no FGTS”, alerta Tilmmann. Segundo ele, ficará mais caro tanto construir empreendimentos, no caso das empresas, quanto adquirir a casa própria, no caso dos consumidores. O diretor lembra ainda que a última medida adotada para recompor perdas inflacionárias impostas ao FGTS pelos planos econômicos Verão (1989) e Collor 1 (1990) resultou na Lei Complementar 110, de 2001. Ela instituiu uma cobrança adicional de 10% sobre os depósitos devidos em caso de demissão sem justa causa, para além da multa de 40%. Embora a Caixa tenha declarado que a cobrança atingiu sua finalidade em 2007, seu fim só ocorreu no início de 2020. Tillmann ressalta que não necessariamente o mesmo modelo de compensação seria repetido agora. Mas reforçou que alguém precisará arcar com a fatura. “Quem é que vai pagar isso aí e por quanto tempo? É um custo a mais que vai se introduzir nas operações, seja para as empresas, seja para o tomador de crédito final. Vai ter que ter um acordo”, diz. O presidente do Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador (IFGT), Mario Avelino, entregou ao STF na semana passada um ofício com mais de 10 mil assinaturas pedindo a reinclusão do processo na pauta da Corte. O julgamento estava previsto para 13 de maio, mas foi adiado. A entidade afirma que o governo deixou de creditar R$ 554 bilhões nas contas de 1999 até hoje, prejudicando mais de 60 milhões de trabalhadores. Distribuição de resultadosO governo entende que a principal queixa dos trabalhadores, de que a correção dos saldos do FGTS não supera a inflação, foi mitigada com a política de distribuição de resultados do fundo a seus cotistas. Essa medida é adotada desde 2017 e contribuiu, nos últimos anos, para que os trabalhadores passassem a ter ganhos reais, ou seja, acima da inflação. No ano passado, foram distribuídos R$ 7,5 bilhões do lucro total de R$ 11,3 bilhões observado em 2019. O valor assegurou um retorno próximo de 4,9%, acima da inflação registrada no ano de referência (4,31%). “Não sei qual é a aplicação com o mesmo nível de risco que daria esse retorno. O esforço é sempre dar um ganho real”, afirma Tillmann, lembrando que os recursos do FGTS são isentos de Imposto de Renda e têm garantia de liquidez da União, o que significa risco menor do investimento. Ele reconhece, porém, que a aceleração da inflação em 2021 pode representar um desafio para a rentabilidade do fundo. A distribuição do lucro de 2020 deve ser decidida nas próximas semanas. Segundo o balancete provisório do ano passado, o resultado foi positivo em R$ 8,2 bilhões. Os números ainda precisam ser chancelados antes da decisão final. O ESTADO DE S. PAULO

Para isentar IR até R$ 2,4 mil, equipe econômica vai propor taxar em 20% lucros e dividendos

O ministro da Economia, Paulo Guedes, decidiu propor a volta da tributação do Imposto de Renda sobre a distribuição de lucro e dividendos com uma alíquota de 20%. Isenta da cobrança do imposto desde 1996, essa distribuição representa a forma como as empresas remuneram seus acionistas em contrapartida ao capital investido. A arrecadação com o retorno da tributação – um tema econômico que ganhou o debate eleitoral em 2018 – vai financiar um aumento em torno de 26% da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), que deve subir dos atuais R$ 1,9 mil para R$ 2,4 mil, conforme antecipou no sábado a coluna do Estadão. A correção da faixa de isenção – “congelada” desde 2015 – é uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro e é vista, neste momento, como uma medida para aumentar o apoio da classe média, às vésperas das eleições de 2022. As medidas precisam ser aprovadas este ano para entrarem em vigor no ano que vem. No Congresso, o limite poderia subir para R$ 3 mil, adiantam aliados do governo, devido ao apelo popular da medida. Cálculos feitos pelo tributarista Eduardo Fleury, do escritório FCR Law Advogados, mostram que o reajuste do limite de isenção para R$ 2,4 mil, se aplicado a todas as faixas do IRPF (beneficiando todos os contribuintes), resultaria numa perda de arrecadação de aproximadamente R$ 26 bilhões. A conta foi feita com dados mais recentes da Receita Federal, de 2018. Especialista em tributação, o economista Sergio Gobetti prevê uma perda de pelo menos R$ 25 bilhões, podendo chegar a R$ 30 bilhões. Os cálculos são difíceis de serem feitos porque não se tem detalhes se haverá outros arranjos no IRPF que podem ter impacto na conta. “É uma estimativa prévia sem os microdados, apenas com dados por faixa de salário mínimo”, explica Gobetti. A proposta inicial da equipe econômica era taxar a conta de lucros e dividendos no IR paga pelas pessoas físicas com uma alíquota de 15%, mas Guedes considera melhor subir a alíquota para 20%, com uma faixa de isenção para essa tributação de R$ 20 mil por mês. Para Fleury, o ideal para que o sistema seja eficiente e gere novos negócios é permitir que a distribuição de lucros para outras empresas seja também isenta. “A distribuição de lucros entre as empresas tem de manter a isenção, como também para o exterior”, recomenda ele. “Se for cobrar a alíquota de 20% para o exterior, a medida será absolutamente ineficaz”, acrescenta. O consultor do Congresso Pedro Fernando Nery chama a atenção para uma consequência da correção da faixa de isenção: “Como aumenta a isenção até R$ 2,4 mil, vai beneficiar servidores que ganham mais (porque não são pessoas jurídicas e não são afetados por lucros e dividendos). A parte isenta do salário aumenta”, diz Nery, que calcula que um servidor com salário no teto remuneratório (R$ 39,2 mil por mês) teria um ganho na remuneração líquida de R$ 1,5 mil por ano. EmpresasO governo também vai reduzir de 25% para 20% a alíquota de Imposto de Renda das empresas. A ideia é fazer essa redução em dois anos (2,5 pontos a cada ano), mas setores empresariais já pressionam para que a queda da alíquota ocorra de uma única vez. Bolsonaro ainda precisa bater o martelo. A minuta do projeto está sob o exame do Palácio do Planalto, que costuma fazer mudanças de última hora. O presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), que quer tocar a reforma tributária (o projeto do IR é uma etapa da proposta que ficou com os deputados) “agendou” para quarta-feira o envio do projeto. Fonte da equipe econômica informou que a equação também prevê a necessidade do fim do chamado Juros sobre Capital Próprio, outro instrumento que as empresas têm para remunerar os seus investidores. A medida também é vista como necessária para cobrir o “rombo” na arrecadação com o aumento da faixa de isenção do IRPF. “Bastante inoportuno. Não é hora de dificultar ainda mais a atração de investimentos, o que certamente ocorrerá com o fim de JCP”, criticou o tributarista Luiz Bichara. Segundo ele, independentemente da necessidade de se repensar de forma inteligente a reforma da tributação sobre a renda (e não somente sobre o consumo ), o momento seria ruim para essa discussão. “Os contribuintes precisam de estímulo, não de obstáculos.” O que muda no Imposto de RendaPessoa físicaO governo deve aumentar a faixa de isenção de R$ 1,9 mil para cerca de R$ 2,4 mil. Todos os contribuintes, até quem ganha mais de R$ 2,4 mil, são beneficiados. As alíquotas não são cobradas integralmente sobre os rendimentos. Quem ganha R$ 4 mil por mês, por exemplo, não paga 22,5% sobre toda a parte tributável do salário. Hoje, os ‘primeiros’ R$ 1.903,98 são isentos. É esse valor que deve subir para R$ 2,4 mil. EmpresasA alíquota do IRPJ vai cair de 25% para 20%. Haverá um escalonamento de dois anos: 2,5 pontos no primeiro e a outra metade no segundo ano. A alíquota da CSLL, que também incide sobre o lucro, de 9%, não será alterada. Lucros e dividendosA distribuição de lucros e dividendos, remuneração que os acionistas recebem pelo capital investido na empresa, não é tributada desde 1995. A proposta fixa uma alíquota de 20% e define uma faixa de isenção de R$ 20 mil por mês (ou seja, até esse valor, o investidor não pagará imposto). Hoje, as companhias de capital aberto (com ações na Bolsa), são obrigadas a distribuir pelo menos 25% do seu lucro líquido. Juros sobre Capital PróprioÉ uma forma de as empresas remunerarem seus investidores que pode ser abatida como despesa fazendo a empresa pagar menos IR. A ideia é acabar com esse mecanismo. Assim como os dividendos, os juros sobre capital próprio nada mais são que a distribuição dos lucros de uma empresa de capital aberto (que tem ações na Bolsa) aos seus acionistas. No entanto, neste caso existe a cobrança de 15% de Imposto de Renda sobre esse

Indústria não quer protecionismo, mas reequilíbrio de carga, diz presidente da Abit

O ministro da Economia acenou com duas alíquotas para a CBS, uma para indústria e outra mais baixa para serviços. Como o setor vê isso?Pessimamente. Manifestamos contrários. É legítimo que o setor faça as suas demandas. Agora, temos cálculos mostrando que no passado era assim a indústria tinha que continuar a pagar mais. Perpetuar o erro e depois dizer que a indústria é chorona, protecionista. Não é nada disso. Faz parte da disputa democrática e temos que ter a capacidade de mostrar com contas e números. Estamos mostrando. Você quer pagar mais por uma geladeira ou uma academia de ginástica? Eu estou falando isso sem preconceito, até porque eu faço ginástica. Só quero dizer que precisa de um reequilíbrio nesse peso da taxação. A indústria paga mais. Isso é latente, é claro. Por que ela tem que pagar mais do que os outros setores? Qual é a razão? Por que existe Imposto sobre Produtos Industrializados, o IPI? Isso é kafkiano. Paga imposto porque agregou valor. Isso é uma excrescência. Uma Federação tão desigual, tão cheia de interesses, não é fácil. Se puxa uma pena, não vem uma galinha, não. Vem uma granja em cima de você. O setor já levou para o presidente da Câmara, Arthur Lira, essa posição?Estamos defendendo no que acreditamos e vamos trabalhar para que saia. O que vocês estão defendendo?Não queremos que a indústria pague mais. Se é 12%, é 12%. Certo. Se começar a abrir a caixa de discricionariedade, o que vai acabar tendo, todo mundo vai querer ficar na exceção. Vai faltar bote para tanto náufrago. Um modelo de imposto que seja o mais equitativo possível. Está claro na mandala do custo Brasil que um dos entraves maiores que carregam o ônus é a parte tributária. Olha o tamanho do contencioso tributário e julgamento recente do ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins. Vem, aí, o ISS. Vai por aí. É um sistema que não sabe se o que está pagando está certo ou se vai ser contestado. Do jeito que está não está bom. A reforma sai ainda este ano?Se as pessoas acharem que mais uma vez não é possível conciliar. O Brasil também tem uma procrastinação exacerbada de temas que geram muitos conflitos. Então, vamos continuar nos arrastando com taxas de crescimento ridículas. Não vamos continuar conseguindo viver por muito tempo com esse sistema alucinado que ninguém sabe muito bem quanto está pagando. O senhor é representante de um segmento da indústria antigo que muitas vezes os críticos, inclusive do setor de serviços, apontam que só querem mais protecionismo.A democracia é bonita por causa disso, mas eu queria fazer um registro. Nossa indústria é tradicional, multimilenar, moderna, inovadora. Atendeu e está atendendo as necessidades médico-hospitalares do País. É a quinta maior do mundo e enfrenta um planeta. Desde os Estados Unidos que é o terceiro maior produtor de têxteis do mundo, até países de países de baixíssimo nível de compliance, que nós não aceitaríamos o regramento que lá prevalece seja aceito aqui dentro. Quem enfrenta a concorrência internacional há mais tempo, desde a abertura do Collor, câmbio a R$ 0,85 foi a indústria. Não foi o serviço. Agora, mais recentemente, o serviço está mais exposto. Até porque a pandemia acelerou uma série de processos de “servitização” internacional. A indústria paga os melhores salários médios, a maior quantidade de investimentos, o maior efeito multiplicador da economia. Esse é um debate que não vai levar a lugar nenhum porque a indústria está cada vez mais “servitizada” São setores hoje muito mais conectados?Na agricultura, mesmo que os caras estão lá na enxada, tem uma indústria. É trator, fertilizante, os EPIs (equipamentos de proteção individual) para quem trabalha na lavoura. Agora, quando a gente vê o quanto paga de imposto a agricultura e a indústria, independente dos méritos que foram alcançados pela agricultura tropical brasileira. Estamos integrados. Ninguém vai sair dessa encrenca sozinha. A pandemia mostrou com clareza e alguns países estão se dando conta disso o quão relevante é a indústria. Agora, é um produto tradable (negociado no mercado externo), quanto exportamos o tecido ou a roupa brasileiro, estamos exportando junto 7% do preço que é imposto que ficou acumulado. E esse é um dos pontos da discussão. A verdade é que o Brasil ficou anacrônico. Nós não queremos protecionismo. Queremos reequilíbrio de carga. A vaca leiteira no passado foi muito mais a indústria. O ESTADO DE S. PAULO

Indústria e serviços travam disputa para reduzir cobrança de impostos na reforma tributária

A fala do ministro da Economia, Paulo Guedes, acenando com a possibilidade de a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) – o tributo proposto pelo governo para substituir PIS e Cofins – ter uma alíquota mais alta para a indústria do que para serviços e comércio jogou lenha na fogueira da disputa para ver quem vai pagar menos imposto na proposta de reforma tributária em negociação no Congresso. Os ânimos estão mais acirrados porque o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), sinalizou na semana passada que quer tocar a votação do texto mais rapidamente e em conjunto com o projeto que trata de uma reformulação do Imposto de Renda – que deverá será enviado ao Congresso nos próximos dias. A CBS é um tributo proposto por Guedes nos moldes do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). O projeto foi enviado pelo governo no final do ano passado com uma alíquota única de 12%. Tanto indústria como serviços acham que o valor está alto e que pagam mais do que outro, alimentando uma disputa histórica. Ninguém quer ser surpreendido na Câmara. Resultado: a articulação política com os deputados se intensificou nos últimos dias. Guedes também tem se reunido, nas últimas semanas, com empresários para sentir o termômetro da reforma e ainda para buscar apoio ao programa que cria o Bônus de Inclusão Produtiva (BIP) e o Bônus de Incentivo à Qualificação (BIQ), com pagamento de R$ 600 por mês a jovens e trabalhadores informais. Metade desse valor seria financiada pelas empresas, enquanto a outra metade o ministro quer pagar em conjunto com o Sistema S para treinar 2 milhões de trabalhadores. O presidente da Central Brasileira de Serviços (Cebrasse), João Diniz, disse que a CBS, com a unificação do PIS e Cofins, é um tributo que pega em cheio o setor e a alíquota de 12% significaria um aumento muito grande de carga tributária. “Vai significar quebradeira. O setor de serviços não aguenta mais esse tipo de jogo que vem sendo jogado, com a conta estourando no nosso colo”. Para o presidente da Confederação Nacional de Serviços (CNS), Luigi Nese, a tramitação da CBS não pode andar sem uma definição sobre a desoneração da folha de pagamentos, ou seja, redução dos encargos que as empresas pagam sobre os salários dos funcionários – proposta que perdeu força nos debates recentes. Segundo Nese, o setor defende a desoneração da folha de pagamentos com a recriação da CPMF e também o programa de treinamento. No encontro com Guedes, o ministro explicou os planos de chamar o Sistema S para colaborar com a proposta. “O sistema S tem de trabalhar para treinar pessoas, e não para fazer prédios”, criticou Nese. Já o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, rebateu o setor de serviços e disse que a indústria é quem mais paga, segundo ele, na contramão do que acontece nos Estados Unidos, Europa e Ásia. A CNI não concorda com a alíquota maior para indústria da CBS. “A CNI é a favor de uma reforma ampla, que dê mais segurança jurídica e crie mais equilíbrio na economia”, disse. Segundo ele, a indústria paga 32% dos impostos federais e 41% dos estaduais. “É um absurdo”, afirmou, acrescentando que é mais fácil cobrar os tributos da indústria. E que esse quadro beneficia mais a camada mais rica que consome mais serviços. O ESTADO DE S. PAULO

Justiça nega pedidos de empresas em crise e mantém cota de aprendizes

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A crise desencadeada pela pandemia de covid-19 tem sido usada como argumento por empresas que respondem a ações civis públicas milionárias movidas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) por não cumprir a cota de aprendizes, estabelecida em lei. A argumentação, contudo, só tem sido aceita no Judiciário em poucos casos. Na maioria, os juízes afirmam que não há previsão legal para flexibilizar as regras. Na pandemia, houve uma queda no número de aprendizes. Em abril do ano passado, 468.347 pessoas estavam contratadas. Neste ano, no mesmo mês, eram 394.906, segundo os dados mais recentes do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), ligado à Secretaria Especial de Previdência e Trabalho. Os estabelecimentos com mais de sete empregados estão obrigados a contratar um mínimo de 5% e um máximo de 15% do total de empregados para o cargo de aprendiz. A admissão de jovens entre 14 e 24 anos está prevista na Lei nº 10.097, de dezembro de 2000, que alterou o artigo 429 na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Esses contratos preveem seis horas diárias de jornada e não podem exceder dois anos. Recentemente, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo manteve condenação por danos morais coletivos e multa de R$ 10 mil por dia, que pode chegar no máximo a R$ 1 milhão, contra uma empreiteira. Para a relatora do caso, desembargadora Lizete Belido Barreto Rocha, “a situação atual de pandemia não isentou as empresas do cumprimento da cota de aprendizes” (processo nº 1001113-35.2016.5.02.0032). A 2ª Turma do TRT do Paraná também adotou entendimento semelhante, reformando decisão que beneficiava empresas do setor industrial da região de Colombo. A relatora, Claudia Cristina Pereira, destaca em seu voto que “não houve a edição de qualquer medida provisória, decreto ou qualquer outra modalidade legislativa que autorizasse a suspensão do cumprimento de cotas para a contratação de aprendizes, mesmo durante o estado de calamidade pública decretado” (processo nº 0000275- 43.2020.5.09.0657). No Pará, uma empresa de navegação também foi condenada em ação por danos morais coletivos. A decisão é da juíza Larissa de Souza Carril, da Vara do Trabalho de Altamira. A companhia vinha sendo investigada pelo descumprimento desde 2016 e alegou dificuldades para cumprimento da cota nesse período de pandemia. “Mesmo as medidas provisórias que trouxeram medidas flexibilizadoras em razão da pandemia de covid-19 optaram por manter e proteger a aprendizagem, dada a sua importância para a sociedade e considerando os valores fundamentais que alicerçam o instituto da aprendizagem”, diz na decisão (processo nº 0000341-63.2020.5.08.010). No Tribunal Superior do Trabalho (TST), porém, há liminar favorável às empresas. O caso é de uma transportadora de valores que foi condenada a cumprir a cota sob pena de multa diária de R$ 1 mil por aprendiz não contratado. Os ministros da 4ª Turma foram unânimes ao entender que não daria para fazer essa exigência no momento de pandemia (processo nº 1001559-52.2020.5.00.0000). Nesse mesmo sentido, a juíza Alessandra de Cássia Fonseca Tourinho, da 4ª Vara do Trabalho de Diadema (SP) negou indenização de R$ 100 mil por danos morais coletivos, em ação movida pelo MPT de São Paulo contra uma empresa de autopeças que dispensou quase dois terços de seus funcionários na pandemia e está sem nenhum aprendiz. O advogado da empresa, Ricardo Serafim, do Ilário, Serafim Advogados, afirma que o não preenchimento da cota de aprendizes foi amplamente justificado e comprovado ao MPT. De acordo com ele, mesmo antes da pandemia, a empresa já tinha perdido clientes e teve uma redução de 60% do faturamento, o que culminou nas dispensas de funcionários. “Após a pandemia, o que era ruim, piorou”, diz. “Nesse contexto, não seria plausível dispensar trabalhadores efetivos, pai e mães responsáveis por famílias inteiras, para dar lugar à contratação de aprendizes.” A argumentação foi aceita pela juíza. Ela considerou “legítima a excepcional relativização da norma que impõe a obrigatoriedade de contratação de aprendizes”. Para ela, “o prejuízo social pode ser bem maior do que se pretende evitar com a determinação de contratar aprendizes, se isso acarretar a dispensa de empregados” (processo nº 1000199- 75.2021.5.02.0264). Autor da ação, o procurador Renan Bernardi Kalil entende, porém, que a pandemia não autoriza o descumprimento da lei. “Não foi editada norma que autorize essa medida. Além disso, cria-se uma situação desigual em relação às demais empresas que corretamente permanecem observando o artigo 429 da CLT”, diz. O órgão já recorreu da decisão. Segundo o procurador, o programa jovem aprendiz é importante não só pela formação profissional, mas também pela função social, com a inserção de jovens em situação de vulnerabilidade econômica e social no mercado de trabalho. VALOR ECONÔMICO