Aumentar os impostos dos super-ricos é uma proposta liberal (Joel Pinheiro da Fonseca)
Ninguém gosta de impostos. Até o tema é desagradável. Num país como o Brasil, que paga mais impostos do que a média de países com renda e indicadores sociais similares aos nossos, aprendemos a ser automaticamente contra qualquer imposto ou taxa e a celebrar sempre que se anuncia uma redução. Essa reação automática, no entanto, nem sempre acerta. Na semana passada, despertei a ira de alguns libertários da internet ao defender que os super-ricos —pessoas cujo patrimônio está nas dezenas de milhões de dólares— sejam mais taxados. Ou seja, que contribuam com uma parte maior de sua riqueza para o bem coletivo. E isso não foi à toa. Os chamados super-ricos, em qualquer país do mundo, contribuem muito pouco. Foi isso que levou Warren Buffett —um dos homens mais ricos do mundo— a afirmar, em 2011, que ele pagava menos imposto de renda que qualquer funcionário de seu escritório. No Brasil, sabemos como a carga tributária é excessivamente pesada para os mais pobres e leve para os mais ricos. Tributamos muito o consumo, que é para onde vai a maior parte da renda dos mais pobres. Por outro lado, indivíduos ricos pagam pouco. Há muitos jeitos de começar a reverter isso: taxar lucros e dividendos, criar novas alíquotas do imposto de renda para rendas mais altas, imposto sobre herança. Globalmente, impostos sobre o patrimônio dos super-ricos —talvez implementados simultaneamente por várias nações, para reduzir a fuga de patrimônio— pode dar conta de captar aquilo que não foi tributado como renda. Propor taxar alguém não significa ser contra sua existência. Nossas vidas são melhores graças à Amazon, à Tesla, à Microsoft e ao Google, empresas cujos donos hoje figuram entre os mais ricos do mundo. O mesmo vale para Magazine Luiza, Ambev, Havan e outras empresas brasileiras. Sem dúvida, um mundo em que as riquezas fossem simplesmente confiscadas e empresários de sucesso mantidos no mesmo nível econômico que um trabalhador comum teria muito menos empreendedorismo e inovação. A ambição individual é motor de crescimento. Mas é improvável que alguns milhões de dólares a menos mudassem os incentivos de um multibilionário. Aliás, já sabemos que ricaços não deixam de viver e declarar impostos em países que os taxam muito mais do que nós. A escolha do tamanho do Estado é diferente da escolha de como ele será financiado. O Estado ser pequeno (menos de 30% do PIB em impostos, como a Austrália) ou grande (cerca de 45% na Dinamarca) não implica diretamente em saber se essa carga tributária será distribuída de forma justa e eficiente pela população. A reforma tributária em discussão no Congresso toca no objetivo importante de simplificar nossa carga, sem o que o Brasil não terá muita esperança de crescer e competir globalmente. Restará ainda reformular a distribuição dessa carga. Nesse momento, qualquer dogmatismo está fora de lugar. Assim como medos de que qualquer imposto sobre os ricos terá efeitos cataclísmicos. A pandemia, além da perda trágica de vidas, causou também a perda de emprego e renda para milhões de pessoas. Muitas das pessoas mais ricas do mundo, contudo, ficaram ainda mais ricas. Só Elon Musk aumentou seu patrimônio em mais de US$ 150 bilhões. Fora da utopia anarquista, impostos sempre vão existir. A questão é quanto cada um vai pagar. Você é favorável a aumentar os impostos dos mais pobres para que pessoas como ele continuem pagando menos? É isso que está em jogo. Joel Pinheiro da FonsecaEconomista, mestre em filosofia pela USP. FOLHA DE S. PAULO
Presidente de comissão de reforma tributária fala em volta da CPMF para bancar auxílio
O senador Roberto Rocha (PSDB-MA), presidente da comissão mista de reforma tributária do Congresso, avalia que a necessidade de retomada do auxílio emergencial pode acabar favorecendo a discussão de uma nova CPMF com “finalidade específica e duração limitada”. Em entrevista ao Estadão, Rocha admite, no entanto, que é contrário à discussão da CPMF na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma tributária porque o entendimento sobre a volta do novo tributo ainda está muito longe, e pode contaminar o que já foi construído como consenso. O sr. disse que a CPMF não tem que ser tratada na reforma tributária. Por quê?Porque já temos um consenso em relação à unificação dos impostos sobre a base de consumo. Temos que fazer uma reforma possível e que gere os resultados esperados. O entendimento sobre o retorno da CPMF ainda está muito longe, no âmbito da reforma tributária, e por isso pode contaminar o que já foi construído como consenso. O sr. acha que tem ambiente político para a CPMF?O prolongamento da pandemia preocupa a todos. É evidente a necessidade de continuar fornecendo algum tipo de suporte aos mais diretamente impactados. Há meses observamos tentativas de se encontrar fontes para viabilizar esse auxílio emergencial, porém, até o momento, nenhuma logrou êxito. Talvez esse contexto favoreça uma nova discussão sobre CPMF, com finalidade específica e duração limitada. O sr. aposta na reforma tributária ainda este ano? Mesmo com a administrativa tomando a dianteira?Acredito que há espaço para as duas matérias tramitarem em paralelo, pois uma trata da forma que o governo arrecada seus tributos e a outra pretende melhorar a forma que ele gasta os recursos arrecadados. Ou seja, não são matérias conflitantes, mas complementares. Ambas são importantes. Agora, se você me perguntar qual é a mais importante e urgente para o País, eu te afirmo, com toda convicção, que é a tributária. Qual o futuro da comissão mista da reforma tributária?Já está pactuado com os presidentes do Senado e da Câmara que a comissão mista concluirá seus trabalhos dentro do prazo previsto. Os próximos passos são a apresentação do relatório pelo relator, deputado Aguinaldo Ribeiro; a concessão de vistas coletivas e de alguns dias para apresentação de sugestões pelos membros; a análise das sugestões recebidas pelo relator, e sua eventual inclusão no relatório; e, por fim, a votação do relatório na comissão. Há dúvidas se Câmara e Senado vão votar separadamente o projeto. Como será a tramitação depois da apresentação do relatório já que a comissão mista não tem caráter regimental?Há três caminhos possíveis para o relatório após sua aprovação na comissão mista: dar origem a uma nova PEC; ser apresentado pelo Aguinaldo como relatório da PEC 45 (a proposta da Câmara), uma vez que ele é o relator na comissão especial, na Câmara; ou ser apresentado por mim como relatório da PEC 110, uma vez que sou o relator dessa PEC na CCJ do Senado. O sr. trabalhou nos bastidores para a comissão ser mantida e o relator também. Mas na Câmara ainda há resistências. Isso pode mudar?Trabalhei porque acredito que o conhecimento acumulado ao longo da tramitação das PECs 110 e 45, assim como na comissão mista, não pode ser perdido. Sei do empenho do deputado Aguinaldo e de sua equipe no sentido de ouvir todos os segmentos da sociedade para chegar a um texto equilibrado e que realmente resulte num sistema tributário mais simples, transparente e eficiente. Mudar a relatoria da comissão mista seria andar para trás. A proposta do Senado virou um pouco o patinho feio da reforma no ano passado. Mas isso pode mudar?O momento não é mais de comparar PEC 110 e PEC 45. Ambas as propostas têm o mesmo chassi: a unificação dos impostos sobre o consumo no IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e um imposto seletivo sobre atividades que se deseja desestimular o consumo. O momento, portanto, é de conciliar o que há de diferente para gerar uma carroceria compatível com as necessidades do país. Uma das principais diferenças entre as propostas da Câmara e do Senado é a questão da alíquota. Enquanto a do Senado já prevê uma série de alíquotas diferenciadas, a da Câmara prevê apenas uma. Por que o sistema proposto na reforma do Senado seria melhor?Eu, particularmente, penso que não podemos onerar da mesma maneira bens e serviços que são essenciais, como os itens da cesta básica, o gás de cozinha, e serviços como saúde e educação. Penso também que, via alíquota diferenciada, podemos estimular a sustentabilidade ambiental. A bem da verdade, a PEC não prevê uma série de alíquotas diferenciadas, apenas remete a discussão para uma melhor calibragem por meio de lei complementar. É possível, inclusive, que na regulamentação as alíquotas sejam as mesmas ou muito próximas daquela de caráter mais geral. A nova sistemática precisa entrar em funcionamento para tirarmos algumas conclusões, mas de antemão informa que o objetivo a ser perseguido é a neutralidade tributária, ou seja, que a tributação respeite as leis de mercado. Espero que o deputado Aguinaldo também seja sensível a essas questões, mas ainda não sei qual solução proporá em seu relatório. O ESTADO DE S. PAULO
(Falta de) qualidade do serviço público deveria ser prioridade (Ana Carla Abrão)
Qualidade do serviço público é o principal instrumento de geração de oportunidades e de mobilidade social. Afinal, são educação pública de qualidade, atendimento de saúde universal decente e segurança pública eficaz que permitem ao cidadão que nasce pobre – e não tem senão no Estado as condições de acesso a esses serviços – reduzir o abismo que o distingue daqueles que podem pagar por eles. No Brasil, apesar do aumento contínuo dos gastos públicos, a qualidade do serviço público é ruim, quando não péssima. É isso que mostram os resultados da pesquisa que o movimento Livres encomendou ao instituto Ideia Big Data. Alguns dos resultados já foram publicados em reportagem do Estadão do último fim de semana. Mas, considerando a importância (e quiçá ressurreição) da reforma administrativa, vale destacar um outro conjunto de resultados, esses voltados à qualidade dos serviços públicos básicos. Nada que surpreenda, mas que deveria nos motivar a abraçar a reforma. O Ideia ouviu mais de 1.600 pessoas visando a capturar aspectos relacionados ao regime jurídico e de contratação e promoção de servidores públicos, avaliação de desempenho, qualidade dos serviços, comparação entre os mercados público e privado de trabalho e – foco desta coluna – a avaliação dos serviços públicos de segurança, educação e saúde. Os números da Livres/Ideia gritam. Em relação à qualidade da educação nas escolas públicas de ensino médio e fundamental, 29% dos entrevistados avaliam como péssima ou ruim e outros 39% a consideram apenas regular. Na saúde, o porcentual de péssimo e ruim atinge 34% quando se avaliam prontos-socorros e UPAs e 35% no caso de Unidades Básicas de Saúde. Quando o foco são os hospitais públicos a insatisfação chega a 45%. Na segurança, apenas 18% avaliam como ótima ou boa a qualidade do serviço. No caso de creches e centros de educação infantil, tipicamente ofertados por municípios, a satisfação chega a 34%, patamar que, embora baixo, é superior ao observado nos demais serviços. Os números variam por região, em alguns casos, para muito pior. É o caso dos hospitais públicos na Região Norte do País, que são avaliados como péssimos ou ruins por 52% dos entrevistados. Há também discrepâncias entre regiões como no caso da avaliação da educação. No Sul, a avaliação satisfatória atinge 36% (frente ao número geral de 28%), enquanto no Centro-Oeste os mesmos 36% refletem insatisfação (29% da avaliação geral). Para creches e educação infantil o destaque positivo fica por conta da Região Sul, onde ótimo e bom atingem 47%. Mas vale notar que isso equivale a dizer que mais da metade da população não está satisfeita com a qualidade do serviço. Os resultados apresentados corroboram outras avaliações já feitas e que sempre apontaram na direção da baixa qualidade dos serviços públicos. Estudos e pesquisas publicados nos últimos anos pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), vêm medindo a percepção da população em relação à qualidade dos serviços do Judiciário e da saúde, segurança e educação públicas. Os números da CNI nunca foram animadores. Na segurança, em pesquisa divulgada em 2016, metade dos brasileiros considerava péssima a situação da segurança pública no País e seis em cada dez consideravam que ela havia piorado em relação a anos anteriores. Na saúde, a melhoria no atendimento público se mantinha no topo das três principais prioridades pelo quinto ano consecutivo em pesquisa divulgada em 2018. Em relação à educação básica, a avaliação de preparo dos alunos que concluem o ensino fundamental e médio nas escolas públicas piorou ao longo das três avaliações feitas. Nelas, o porcentual de entrevistados que avaliou os alunos como pouco preparados ou não preparados subiu de 39% em 2010 para 55% em 2017. Numa avaliação mais geral, feita em 2016, 90% disseram que a qualidade dos serviços públicos deveria ser melhor considerando o valor dos impostos. Segurança pública eficaz reduz as chances de ser o crime a melhor (senão única) alternativa de renda; saúde, além de humanidade e dignidade, tem impacto na produtividade. Educação, dentre todos os instrumentos, é o mais poderoso para garantir tudo isso junto e muito mais, além de cidadania. Daí porque a melhoria dos serviços públicos básicos deveria ser a prioridade de um País que vê a desigualdade de renda piorar, a pobreza avançar sobre a população e a injustiça social corroer nossa sociedade. A pesquisa Livres/Ideia joga nova luz sobre a insatisfação da população com os serviços públicos e reforça a necessidade de reformar um modelo de funcionamento da máquina pública que, além de injusto e disfuncional, concentra renda, desperdiça recursos e não entrega resultados. Buscar qualidade no serviço público exige romper com feudos e privilégios há décadas forjados por um modelo que só uma ampla e corajosa reforma administrativa poderá alterar. *ECONOMISTA E SÓCIA DA CONSULTORIA OLIVER WYMAN. O ARTIGO REFLETE A OPINIÃO DA COLUNISTA O ESTADO DE S. PAULO
Relator mantém defesa do pleno emprego em projeto de autonomia do Banco Central
O parecer prévio do deputado federal Sílvio Costa Filho (Republicanos-PE) sobre a proposta de autonomia do Banco Central, protocolado na Câmara dos Deputados, mantém como meta secundária do órgão fomentar o pleno emprego. O objetivo principal continua sendo o controle da inflação. O texto já foi chancelado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e pelo próprio presidente do BC, Roberto Campos Neto. Segundo o deputado, a versão final do texto será apresentada em uma reunião de líderes hoje e, se o acordo se mantiver, o tema vai à votação em plenário já na terça-feira, 9. A autonomia do Banco Central já foi aprovada no Senado. Em pronunciamento após reunião com Costa Filho, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), o presidente do BC e o ministro Paulo Guedes elogiaram o relatório e defenderam a aprovação do projeto. Segundo eles, a autonomia do BC é decisiva para garantir a estabilidade no controle dos preços no País. “É a garantia de que aumentos setoriais e temporários de preço, como que ocorreu com materiais de construção e alimentos, não devem se transformar em aumentos permanentes e generalizados de preços, que é a espiral inflacionária”, afirmou o ministro. “Ele é decisivo para garantir a estabilidade monetária do País, poder de compra da moeda, poder de compra dos salários, das aposentadorias e a própria execução orçamentária pode ser estável se tivermos essa garantia.” No parecer, Costa Filho lembrou a crise econômica gerada pela pandemia do novo coronavírus e se declarou favorável à aprovação da autonomia do BC. Segundo ele, a autonomia vai favorecer o combate à inflação no Brasil, a busca do pleno emprego, a queda de juros e adequar o País a padrões internacionais. “O Banco Central do Brasil defenderá a estabilidade de preços de maneira autônoma”, citou Sílvio Costa Filho em seu parecer, ao listar os benefícios da autonomia. “É precisamente em defesa dos cidadãos mais pobres e desfavorecidos que uma política severa de combate à inflação se faz necessária. Nesse sentido, um banco central autônomo é seguramente mais eficiente na busca de baixa inflação”, registrou. MetasOutro benefício da proposta, conforme o deputado, é que o BC buscará o pleno emprego. “Esta é, sem dúvida, mais uma grande conquista para as trabalhadoras e os trabalhadores brasileiros, que se verão protegidos por um órgão governamental autônomo e que, doravante, terá por objetivo zelar pela adequada oferta de empregos na economia”, disse o deputado. Hoje, o Banco Central tem como única meta o controle da inflação. Para isso, ele calibra a taxa básica de juros, a Selic. No parecer, Costa Filho também defende que a autonomia do BC permitirá a redução dos juros no Brasil. Além disso, conforme o deputado, será possível adequar o País a padrões internacionais. “Somos um dos poucos países do mundo desenvolvido a não termos um banco central autônomo, o que distorce a nossa imagem de economia madura e preparada para receber investimentos que possam gerar mais emprego e mais renda à população.” O texto aprovado no começo de novembro pelo Senado mantinha a estabilidade de preços como objetivo central do Banco Central. A proposta incluiu ainda duas novas metas acessórias, sem prejuízo à principal: suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego no País. Na época, o governo concordou com a redação da proposta, apesar de o BC ser historicamente contrário a ampliar o escopo da atuação. O projeto ainda prevê mandato de quatro anos para os dirigentes da instituição, quarentena para ex-diretores e novas metas acessórias à autoridade monetária. O texto estabelece mandato de quatro anos para o presidente e oito diretores do Banco Central, incorporando o modelo adotado em outros países, como nos Estados Unidos. Se a proposta for aprovada também pela Câmara e sancionada por Bolsonaro, cada mandato começará em um determinado momento, sendo permitida uma recondução. A intenção é que os dirigentes da autoridade monetária não estejam suscetíveis às políticas do governo da ocasião. O ESTADO DE S. PAULO
Inflação desacelera para 0,25% em janeiro com queda na conta de luz
Após alta de 1,35% em dezembro, a inflação desacelerou em janeiro, ficando em 0,25%, o menor índice desde agosto de 2020 (0,24%). Os dados são do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgado nesta terça-feira, 9, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 12 meses, o indicador acumula alta de 4,56%. O resultado ficou perto do piso das expectativas dos analistas ouvidos pelo Projeções Broadcast, que estimavam uma inflação entre 0,24% e 0,54% em janeiro, com projeção média de 0,30%. Alimentos e bebidas continuam a puxar os preços para cima, mas com menos força. Além disso, a mudança de bandeira nas contas de energia elétrica e as quedas nos preços de passagens aéreas ajudaram a segurar a inflação em janeiro. “Houve uma queda de 5,60% no item energia elétrica, que foi, individualmente, o maior impacto negativo no índice do mês. Após a vigência da bandeira tarifária vermelha patamar 2 em dezembro, passou a vigorar em janeiro a bandeira amarela. Assim, em vez do acréscimo de R$ 6,243 a cada 100 quilowatts-hora, o consumidor passou a pagar um adicional bem menor, de R$ 1,343. O que resultou em uma deflação (-1,07%) no grupo habitação, do qual esse item faz parte, mesmo com a alta em outros componentes, como o gás encanado (0,22%) e a taxa de água e esgoto (0,19%)”, explica o gerente da pesquisa, Pedro Kislanov. Outro grupo que registrou deflação em janeiro foi o de vestuário (-0,07%), após alta de 0,59% em dezembro, quando as vendas do setor se aquecem para as festas de fim de ano. Os demais sete grupos, no entanto, registraram elevação de preços, com destaque para alimentação e bebidas (1,02%), que apresentou a maior variação e o maior impacto positivo (0,22 ponto percentual) no índice do mês. Mas a alta foi menos intensa que a de dezembro (1,74%). “Os alimentos para consumo no domicílio, que haviam subido 2,12% no mês anterior, variaram 1,06% em janeiro. As frutas subiram menos (2,67% contra 6,73% em dezembro) e as carnes caíram de preço (-0,08% contra alta anterior de 3,58%), assim como o leite longa vida (-1,35%) e o óleo de soja (-1,08%). Por outro lado, os preços da cebola (17,58%) e do tomate (4,89%), que haviam recuado no mês anterior, aumentaram”, destaca Kislanov. A alimentação fora do domicílio seguiu movimento inverso, passando de 0,77% em dezembro para 0,91% em janeiro, particularmente por conta da alta do lanche (1,83%). O custo dos transportes (0,41%), grupo com o segundo maior peso no IPCA, também desacelerou em relação ao mês anterior (1,36%), principalmente devido à queda no preço das passagens aéreas (-19,93%), cujos preços haviam subido 28,05% em dezembro. No entanto, os combustíveis (2,13%) apresentaram variação superior à do mês passado (1,56%), com destaque para a gasolina (2,17%) e o óleo diesel (2,60%). Os planos de saúde (0,66%), que estavam com reajuste suspenso em 2020, terão em 2021 aumentos retroativos, o que tem impacto no grupo saúde e cuidados pessoais (0,32%). Em janeiro, foi incorporada a primeira parcela da fração mensal do reajuste. O ESTADO DE S. PAULO
Em meio a megavazamento, caminho da Autoridade de Dados preocupa especialistas
Na esteira do principal caso de vazamento de dados do Brasil, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão responsável por fiscalizar a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), tornou públicos os primeiros passos de seu funcionamento – a agência teve os diretores nomeados em outubro de 2020. Apesar de as publicações darem sinais positivos de que os motores do novo órgão estão aquecendo, especialistas ouvidos pelo Estadão demonstram preocupações com o projeto. Foram duas publicações feitas nas últimas semanas: a agenda regulatória para 2021 e 2022 e o planejamento estratégico mirando os próximos três anos. O principal ponto de preocupação em relação à agenda é o fato de ela não ter sido construída em conjunto com o Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade (CNPD). A entidade multissetorial, com integrantes da sociedade civil, tem como papel definir diretrizes para a atuação da agência. “O artigo 58 da LGPD diz que compete ao CNPD propor diretrizes para a atuação da ANPD”, afirma Flavia Lefevre, advogada do coletivo Intervozes. “Certamente a definição da agenda deveria ter passado antes pelo Conselho”. A entidade, porém, ainda está em processo de formação – o edital de convocação foi publicado pela ANPD apenas na última quinta-feira, 4. Sobre a agenda, a ANPD disse, em nota ao Estadão, que trata-se de “uma medida adotada voluntariamente com o objetivo de organizar e priorizar as atividades, assim como de dar transparência e previsibilidade à sociedade quanto aos temas que serão endereçados nos próximos dois anos”. A agência afirmou também que “a portaria que aprova a Agenda Regulatória da ANPD explicitamente estabelece que as metas nela previstas poderão ser alteradas por deliberação do CNPD. Assim, após a constituição e funcionamento do conselho, este poderá, naturalmente, opinar quanto a eventuais ajustes à Agenda Regulatória”. Há também considerações sobre a hierarquização de prioridades da agenda. Na visão de Danilo Doneda, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público, o calendário deixou para mais tarde questões que são urgentes, como a transferência internacional de dados pessoais. Segundo a ANPD, essa discussão está prevista para o primeiro semestre de 2022. Esse, porém, é um assunto que aparece em pautas discutidas atualmente – entre elas estão as novas regras de privacidade do WhatsApp e o repasse de informações do app para o Facebook. “A transferência internacional de dados tem sido discutida no mundo todo e depende da ANPD para começar. Uma empresa que faz comércio internacional precisa de segurança para isso”, diz Doneda. “Além disso, os prazos colocados no documento são para o início dos trabalhos sobre os temas e não para a entrega de resultados”. Dentro das prioridades, também salta aos olhos de especialistas o prazo para o início do processo regulatório de direitos dos titulares de dados pessoais – apesar de a LGPD estabelecer esses direitos, diversos pontos ainda precisam de regulamentação. Na agenda, essa discussão ficou para o segundo semestre de 2022. “Uma definição mais objetiva dos direitos dos titulares deveria ser feita já nesse primeiro ano”, destaca Diogo Moyses coordenador do programa de Telecomunicações e Direitos Digitais do Idec. Para Doneda, o atraso nesses temas está em conflito com outros que aparecem com mais urgência na agenda. Entre eles está o debate sobre regulamentação diferenciada para microempresas e empresas de pequeno porte. “A regulamentação começou não pelo direito do cidadão, mas pelas exceções em relação às empresas. Isso pode sinalizar que, talvez, haja muitas empresas pressionando a ANPD e poucos cidadãos fazendo o mesmo. Se a agenda regulatória considerar só a questão de demanda, ela corre o risco de ser sequestrada por empresas”, afirma. Sobre as priorizações, a ANPD disse em comunicado enviado ao Estadão que “a Agenda Regulatória consiste no estabelecimento de um cronograma de trabalho e não na priorização de temas em razão de sua importância.” A respeito dos direitos dos titulares de dados pessoais, a agência afirmou que a LGPD já traz clareza quanto aos direitos dos titulares, situação que, segundo ela, “não se verifica quanto a outros itens incluídos na agenda regulatória”. Sobre a transferência internacional de dados, disse: “Embora não estejam previstas ações de regulamentação no ano de 2021 quanto ao tema da transferência internacional de dados, o assunto já se encontra em fase de estudos e a ANPD já está em contato com autoridades de outros países com vistas a explorar as possibilidades de cooperação com relação à facilitação dos fluxos transnacionais de dados pessoais”. Por outro lado, há também quem aponte que a agenda é “realista” – ou seja, ela estaria de acordo com as limitações estruturais do órgão. “A ANPD é vinculada à Presidência da República – há uma limitação e o órgão ainda está sendo constituído. Acredito que os atrasos não sejam falta de interesse, mas sim devido à própria máquina pública e pela demora para instalação para um órgão”, diz Bruna Martins do Santos, da associação Data Privacy Brasil. Estruturação lenta na criseO tempo, porém, joga contra a ANPD. A estruturação lenta acontece em meio a uma crise grave: o megavazamento de dados que expôs 223 milhões de CPFs, 40 milhões de CNPJs e 104 milhões de registros de veículos. Antes disso, outro caso já demandava atenção do órgão: uma falha de segurança no sistema de notificações de covid-19 do Ministério da Saúde deixou expostos na internet, por pelo menos seis meses, dados pessoais de mais de 200 milhões de brasileiros, como mostrou o Estadão. Sobre o caso do vazamento, a ANPD se pronunciou sobre o assunto só oito dias depois da divulgação do caso e, pelo menos, 16 dias após o início da comercialização dos dados. Em nota ao Estadão em janeiro, a ANPD disse que “está apurando tecnicamente informações sobre o caso e atuará de maneira cooperativa com os órgãos de investigação competentes e oficiará para apurar a origem, a forma em que se deu o possível vazamento, as medidas de contenção e de mitigação adotadas em um plano de contingência, as possíveis consequências e os danos causados pela violação”. O
Grupo Caoa planeja criar 500 empregos em 2021
O grupo Caoa planeja abrir 500 postos de trabalho neste ano. Isso representa incremento de 25% no quadro efetivo em suas duas fábricas no Brasil. Desse total, 300 serão em Anápolis (GO) e 200 em Jacareí (SP). Uma parte dos novos contratados – 150 operários – já começou a trabalhar em Anápolis. Somente essa primeira etapa já eleva em 10% o quadro efetivo da operação goiana. A abertura dos 200 postos na fábrica em Jacareí depende, ainda, de a atividade econômica não sofrer nenhum solavanco mais forte. Mas, se tudo seguir como está, o aumento do emprego nessa unidade será ainda mais representativo. Elevará o quadro efetivo atual em 40%. Em Anápolis, as contratações seguem o plano de expansão da Caoa, anunciado há menos de três meses, e que prevê investimento de R$ 1,5 bilhão na operação em Goiás até 2025. A ideia, agora, de ampliar o número de empregos também em Jacareí, revela que ganha ainda mais força a estratégia do grupo brasileiro, que, a partir de uma parceria com a Chery, há três anos, deu início a um audacioso plano de fazer dos modelos chineses carros desejados pelo consumidor brasileiro. A necessidade de elevar o número de empregados vem da expansão do grupo, sustentada, principalmente pelo aumento de vendas da Chery. Embora a participação da marca chinesa no mercado brasileiro seja ainda pequena, de pouco mais de 1%, equivale a quase o dobro de um ano atrás. Quando a Caoa adquiriu o controle da operação chinesa, em 2017, a Chery era a 24ª no ranking nacional. Hoje é a 11ª. Esse crescimento tem sido amparado por uma contínua renovação da linha e uma constante e agressiva campanha de marketing. Como consequência, o grupo decidiu, na contramão do que acontece com outras marcas, investir na expansão dos pontos de venda. Hoje, o Brasil tem 115 concessionárias Chery. Até o fim de 2021, serão 150. Do total de hoje, 63 pertencem ao grupo Caoa. A linha Chery é produzida tanto em Anápolis como em Jacareí. A unidade goiana produz também veículos da coreana Hyundai. E nos planos de expansão do grupo já está decidido, também, trazer para o Brasil, este ano, a Exeed, linha de alto luxo da Chery. Há pouco tempo, a Caoa criou também uma locadora e uma seguradora. O grupo, que não revela receita, pertence ao empresário Carlos Alberto Oliveira Andrade, cujas iniciais dão nome à empresa. Dr. Carlos, como é conhecido na companhia, está hoje no comando do conselho. A presidência executiva está, desde dezembro de 2016, nas mãos do engenheiro Mauro Correia, contratado no início de 2014 para o cargo de vice-presidente. Correia sabe bem como organizar a estrutura industrial de uma montadora. Ele foi um dos responsáveis pela instalação da fábrica da Ford em Camaçari (BA), que acaba de ser fechada pela montadora americana. Além dos 19 anos de trabalho na Ford, esse engenheiro mecânico com especialização em negócios, também trabalhou na Volkswagen, além de empresas de outros setores, como Nokia, Semp Toshiba, Metalfrio e a têxtil Scalina. O executivo sorri e desconversa quando a questão envolve saber se o grupo estaria ainda interessado em alguma das fábricas fechadas agora pela Ford, como se cogitou quando a primeira delas, em São Bernardo do Campo (SP), foi fechada há mais de um ano. Dr. Carlos já disse estar interessado em trazer mais carros de marcas chinesas para o Brasil. Correia terá, de qualquer forma, que negociar com a Ford. O grupo Caoa é o maior concessionário da marca americana no Brasil, com dez lojas. Ter de fechar alguma delas não faria muito estrago para um grupo que, ao todo, é dono de 158 concessionárias no país. Para o executivo, depois de um ano mais complicado, por conta da pandemia, em 2020, a expansão da Caoa tem “demonstrado consistência”. Ele acredita, ainda, que agora o Brasil vive clima mais propício para fazer as reforças tributária e administrativa. “O governo tem que ficar mais leve”, diz. “É preciso haver motivação para as empresas investirem e criarem mais empregos”, diz. Correia gostaria de ver avançar planos de privatização de portos e de incentivos ao transporte ferroviário e de cabotagem. A fábrica de Anápolis desfrutará da prorrogação, até 2025, dos incentivos fiscais para montadoras instaladas no Nordeste e Centro-Oeste. Até lá, o melhor a fazer, segundo o executivo, é trabalhar no aumento da produtividade. “Temos muito chão pela frente, mas junto com os avanços na infraestrutura do país, é possível melhorar a competitividade”, destaca. Nos planos de expansão de seu grupo, Dr. Carlos pretende ser, cada vez mais, um concorrente de peso das multinacionais com décadas de história no país. Faz parte de seus sonhos, também, acabar com o preconceito que ainda cerca o automóvel chinês. Para Correia, o conceito de fidelidade em relação aos carros mudou no país. “O Brasil é um dos países com o maior número de marcas produzindo, o que garante uma oferta grande de produtos para consumidores apaixonados por carros”, destaca. Assim como as marcas tradicionais, a Chery também já conta com clubes de fãs, que, com frequência, enviam para a companhia fotos ao lado dos carros. A concorrência é forte. “Mas nós também temos nosso lugar ao sol”, diz. VALOR ECONÕMICO
B2W entra com frete grátis e reduz taxa para lojista
A B2W, dona de Americanas.com e Submarino, decidiu rever pilares centrais de sua estratégia com os lojistas do “marketplace” – braço de shopping virtual responsável por 60% da receita da empresa. As mudanças foram comunicadas aos varejistas na metade de janeiro e começam a valer neste mês, disse ao Valor o comando da companhia. Alguns analistas, que também souberam da decisão nos últimos dias, entendem que o movimento serve para “ajustar a proposta de valor” aos lojistas, e pode ser uma reação ao crescimento menos acelerado em 2020 frente aos rivais, Mercado Livre e Magazine Luiza. Novidades incluem o fim da cobrança de comissão em venda cancelada e alteração na comissão de frete Há três ações centrais, na relação comercial e de comunicação com os varejistas. A empresa passará a oferecer frete grátis em compras acima de R$ 100, também deixará de cobrar dos lojistas a taxa de comissão sobre venda cancelada e ainda aboliu a taxa de comissão sobre o valor do frete (isso passa a ter um preço fixo). No fim do dia, o efeito é uma redução nas cobranças sobre os vendedores. Quanto a um eventual reflexo negativo sobre a receita da empresa, a direção entende que isso deve gerar um aumento de escala, com mais varejistas e clientes optando por negócios pela B2W. Isso implica em um consequente avanço na frequência de consumidores e no valor do tíquete. “É um conjunto de ações, de alavancas que funcionam juntas. Não é o frete grátis isolado, por exemplo, que isso só não funciona”, disse Raoni Lapagesse, diretor de relações com investidores. “Com as mudanças, eu vou ganhar escala no 3P [sigla para ‘third-party seller’, o responsável operação de marketplace], que são as categorias de maior engajamento de cliente. Devo acelerar meu volume e reduzir custo da operação”, disse o executivo. A respeito do frete grátis, a empresa avisará neste mês os clientes que fizerem as compras acima de R$ 100 que serão incluídos do programa de benefícios “Americanas Mais”, que dá frete grátis pelo período de 12 meses. Há um sortimento que dá direito a essa opção, e ele será móvel. Atualmente, o Mercado Livre oferece frete grátis acima de R$ 99. Magazine e Via Varejo não usam essa estratégia. A B2W vai subsidiar parte dessa conta para que a isenção funcione, e isso estará atrelado ao uso do pacote de serviços da B2W (que determina a eficiência da entrega), algo que ele paga para ter acesso. A empresa coleta, armazena e distribui produtos de clientes, a depender da necessidade do lojista. Por exemplo, varejistas no nível 1 a 3 na escala da empresa, que não usam serviços do grupo, não terão subsídio, então o frete grátis existirá, mas o lojista terá que decidir se repassa ao preço ou se absorve o valor no seu cálculo do produto. Cerca de 90% dos vendedores da empresa usam os serviços da empresa B2W Entrega. São em torno de 80 mil lojistas no marketplace. No caso dos lojistas do nível 4, que utilizam mais ferramentas, a B2W vai pagar 40% do frete e no nível 5, pagará 50%. Já no nível 6, o último da escala, são varejistas que usam toda a cadeia de serviços da companhia (o chamado “fulfillment”). Nesse caso, o subsídio é de 60% e os prazos de entrega serão os menores na companhia (envios no mesmo dia). Hoje, são 3 mil lojistas nesse patamar mais alto, ainda uma minoria dentro da base do grupo, e a empresa tem tentado elevar esse número. Para Roberto Wajnsztok. CEO da Origin Consultoria, se B2W financia os lojistas, e a receita cresce, o custo logístico cai. “Se a estratégia funcionar, é algo que não demora a dar resultados, em alguns meses, pode ver retorno”, diz ele. Esse movimento se adiciona a outros dois. Em um deles, a empresa aboliu a taxa de comissão sobre o frete, o que beneficia envios a longa distância, e pode atrair lojistas regionais, e de médio ou pequeno porte, para a sua base. Esse, inclusive, é um dos objetivos dessas mudanças. No mercado, desde o início da crise em 2020, cresceu a disputa dos marketplaces pelo pequeno e médio varejista – o Magazine Luiza criou um braço de venda focado no segmento. Na operação de marketplace, há taxas cobradas sobre o valor da venda e sobre o valor da entrega do produto. Supondo que em um item o frete calculado seja R$ 15 e a comissão 10% (varia de 10% a 20% no mercado em geral), será cobrado 10% sobre R$ 15. Agora, não há mais essa variação. A empresa definiu um valor fixo de R$ 5 para qualquer envio. Lojistas de pequeno porte, que fazem parte de grupos de mensagens, celebraram a mudança, apurou o Valor. No caso de entregas com frete muito baixo, o preço fixo pode ser desvantagem. “O volume de lojistas beneficiados é muito maior [do que aquele que vê perda]. Isso gera previsibilidade. Em certos casos, essa cobrança dos 10% podia trazer prejuízo na venda ao lojista”, diz o diretor. A empresa ainda eliminou a cobrança da comissão sobre venda cancelada. Há muitos casos no marketplace em que a transação não é concluída, ou há devoluções. Na pandemia, analistas acreditam que isso cresceu, e era uma demanda antiga dos lojistas eliminar esse valor. “Vamos abolir desde que o pedido seja cancelado até a expedição do produto. Mas majoritariamente, o cancelamento é antes da expedição”, diz o executivo. Também tem sido preparada uma mudança na comunicação da empresa com o varejista pequeno e médio, por meio dos canais de contato das partes (o “B2W Marketplace”). A intenção é simplificar a interação e explorar melhor as ferramentas da B2W (treinamentos, produtos de crédito) para trazer e manter esse cliente na sua base. As ações podem ser vistas como uma sinalização mais clara ao mercado de medidas práticas que a B2W vem tomando para voltar a uma expansão mais forte. Em dezembro, em encontro anual com analistas e investidores, o mercado sentiu falta
Isolamento na pandemia mudou perfil do emprego formal no ano passado
O isolamento social imposto pela pandemia mudou o perfil do mercado de trabalho formal no ano passado. As ocupações ligadas ao serviço de entregas e ao atendimento remoto ficaram no topo do ranking das que mais ampliaram as contratações com carteira assinada em 2020. Em contrapartida, aquelas ligadas à educação, turismo, cultura e transportes, atividades que envolvem aglomerações, encerraram o ano com saldo negativo de vagas em comparação com 2019. Auxiliar de logística, por exemplo, foi a ocupação que mais aumentou o número de vagas: encerrou o ano com 19.276 trabalhadores com carteira assinada. O crescimento foi de 28,1% no estoque de emprego sobre o ano anterior. Também os estoquistas (19,1%) e embaladores de produtos (12,7%) apresentaram taxas de crescimento de dois dígitos no saldo de postos de trabalho no ano. O resultado dessas categorias está bem acima da variação média do avanço do emprego formal, que foi de apenas 0,4% em 2020. Os dados são de um levantamento feito pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) a partir das 2,5 mil ocupações codificadas no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho. “Das profissões tradicionais que mais geram ocupação, praticamente nenhuma figura entre as que se destacaram no ano passado em termos de saldo positivo de vagas”, afirma Fábio Bentes, economista-chefe da CNC e responsável pelo estudo. A única exceção é a ocupação de alimentador de linha de produção, cujo saldo de vagas em 2020 foi de 182.267, com avanço de 18,3%. ReversãoO abalo no comércio presencial foi tão forte que a ocupação de vendedor, uma das que mais empregam formalmente no País, teve queda 4% no estoque de empregados no ano passado sobre o de 2019. Foram fechadas liquidamente 76 mil vagas. “É o retrato da transformação do varejo: menos consumo presencial e mais e-commerce.” No entanto, observa Bentes, a recuperação que houve no comércio a partir do segundo semestre abriu oportunidade de colocação para atendentes de lojas e mercados, com crescimento de 13% nas contratações; armazenistas (11,9%), repositores de mercadorias (8%) e até vendedores em domicílio (7,9%). Entre as vinte ocupações que mais ampliaram vagas em 2020 estão também as ligadas à agricultura e à construção civil, dois setores que tiveram bom desempenho, mesmo com a pandemia. O outro lado da moeda apontado pelo levantamento é que ocupações ligadas à educação, transportes e turismo foram muito mal na geração de emprego formal. Cobrador de transportes coletivos (exceto trem) registrou queda de 11,3% na ocupação, seguido por motorista de ônibus urbano. “Metade das ocupações entre as 20 que mais fecharam postos de trabalho no ano passado é da área de educação”, destaca Bentes, lembrando que o tema do momento é o retorno às aulas presenciais. O ponto crucial hoje, segundo economista, é saber se haverá um retorno ao modelo de educação presencial que existia antes da pandemia. “Caso isso não ocorra, esses profissionais poderão ter sérias dificuldades de se recolocar em outras ocupações porque têm conhecimentos muito específicos.” No ano passado, o mercado formal de trabalho como um todo teve um saldo positivo de 142,7 mil vagas de emprego. Apesar de ser o menor resultado desde 2017, o desempenho surpreendeu, segundo economista, diante do estrago que a pandemia provocou na atividade. O ESTADO DE S. PAULO
Governo quer que patrão ofereça curso ao contratar beneficiário do BIP, novo auxílio
No modelo em estudo para a criação do BIP (Bônus de Inclusão Produtiva), que substituiria o auxílio emergencial, o governo avalia exigir que as empresas forneçam um curso de qualificação ao contratarem beneficiários do programa. A medida seria uma forma de compensação dada pela companhia pelo fato de estar incluindo em seus quadros um funcionário com encargos trabalhistas reduzidos, dentro do sistema da Carteira Verde e Amarela. Como mostrou a Folha, o governo está preparando uma proposta que libera três parcelas de R$ 200, com foco nos trabalhadores informais não atendidos pelo Bolsa Família. A ideia é que o recebimento do auxílio possa ser associado ao fornecimento de um curso aos beneficiários, que, em sua maioria, têm baixo nível de qualificação. Um dos modelos desenhados pelo Ministério da Economia previa parcerias com órgãos do sistema S, que seriam responsáveis por oferecer os treinamentos. No entanto, seria necessário uma rede bem mais ampla para atender às 30 milhões de pessoas que devem ser beneficiadas pelo BIP. Um exemplo foi a medida adotada pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) que buscou exigir curso de qualificação profissional a quem pedir seguro desemprego pela segunda vez em dez anos. Mas, sem uma ampla oferta de vagas, por exemplo, no Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), a ideia gerou pouco efeito na liberação de seguro desemprego desde 2013. Isso porque sem oferta por entidade pública, o benefício é concedido sem a obrigatoriedade de curso técnico. O Pronatec recuou de quase R$ 4,7 bilhões em 2015 para uma previsão de R$ 100 milhões neste ano. Membros da equipe econômica estudam, portanto, um modelo que não dependa de ampliação dos recursos públicos para a oferta de cursos profissionalizantes. Por isso, afirmam que pode ser adotado um novo caminho, com treinamento oferecido pelas próprias empresas. Nessa possibilidade em avaliação, os beneficiados pelo BIP receberiam as três parcelas de R$ 200 enquanto procuram um emprego. Eles seriam autorizados a assinar contratos sob o modelo flexível da Carteira Verde e Amarela, que permitiria o trabalho por hora e teria encargos reduzidos. Ao encontrar a vaga, essa pessoa teria de passar por um curso na empresa. O ônus do treinamento ficaria a cargo do empregador, sem custo ao funcionário. De acordo com uma fonte que participa da elaboração da medida, existe a possibilidade de que o curso seja focalizado em pessoas mais jovens, assim como a redução dos encargos na Carteira Verde e Amarela. O desenho do BIP, no entanto, prevê o pagamento das parcelas de R$ 200 para informais de todas as idades. A movimentação da equipe econômica para criar um programa vinculado a contrapartidas é uma tentativa de evitar que o Congresso aprove uma liberação direta de recursos para o auxílio emergencial. Parlamentares já sinalizaram que podem criar a assistência mesmo que não haja corte de gastos em outras áreas. A proposta do ministro Paulo Guedes (Economia) busca condicionar esse gasto extra com o benefício ao corte de despesas do governo. Para isso, vai propor a inclusão de uma cláusula de calamidade pública na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do pacto federativo, que retira amarras do Orçamento e traz gatilhos de ajuste fiscal. O modelo de treinamento feito pela empresa também existe, por exemplo, nos casos de lay off, quando companhias fecham acordo coletivo para suspender o contrato de trabalho de funcionários por até cinco meses em momentos de crise. Nesses casos, os empregados participam de curso ou programa de qualificação profissional oferecido pela própria empresa. No ano passado, por conta da pandemia, esses treinamentos foram oferecidos na modalidade não presencial, pela internet. O mecanismo do lay off dá ao trabalhador o direito a uma bolsa de qualificação profissional, calculada de forma semelhante ao seguro-desemprego. O valor mensal tem por base os três últimos salários recebidos, não podendo ser inferior a um salário mínimo. Para o beneficiário do BIP, não haveria o pagamento dessa bolsa. Ele receberia do governo as parcelas de R$ 200. Segundo técnicos da equipe econômica, o objetivo do modelo desenhado para o BIP é estimular a qualificação profissional sem que isso represente um peso às contas públicas. Desde o início do governo, a qualificação bancada com recursos públicos vem sendo substituída por iniciativas mais baratas ao Orçamento e com ampliação da parceria com o setor privado. Com o discurso de que o formato atual do Pronatec não tem o efeito devido no mercado de trabalho, o governo começou a selecionar empresas de qualificação profissional para serem remuneradas de acordo com a efetiva empregabilidade dos alunos formados. Mas a medida ainda precisará ser expandida. FOLHA DE S. PAULO