PGFN restringe decisão do STF contra tributação do salário maternidade

O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) contra a cobrança da contribuição previdenciária sobre o saláriomaternidade não acabou totalmente com a discussão. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) entende que a decisão dos ministros, tomada em agosto deste ano, não vale para a parcela paga pela empregada, apenas para a do empregador.

O posicionamento da PGFN está no Parecer nº 18361, publicado recentemente. Advogados, porém, afirmam que, com base no voto do relator do caso (RE 576967), ministro Luís Roberto Barroso, não deveria haver cobrança. Caso prevaleça o entendimento da Fazenda Nacional, acrescentam, dificilmente haverá ações por parte de empregadas. A PGFN alega no parecer que essa parcela não foi questionada no Supremo. Para o órgão, só uma leitura “totalmente isolada e destoada do julgamento” pode levar a pensar que os ministros declararam nulo para todos os efeitos os parágrafos 2º e 9º do artigo 28 da Lei nº 8.212, de 1991, que tratam da tributação do salário-maternidade.

O órgão afirma que os dispositivos devem ser considerados inválidos só para compreender que o salário-maternidade não é remuneração, logo não integra a base de cálculo da contribuição previdenciária a cargo do empregador. “O mesmo dispositivo continua válido para fins de incidência da contribuição da empregada”, diz a PGFN no parecer. A decisão do Supremo foi dada em recurso do Hospital Vita Batel (Tema 72 da repercussão geral), de Curitiba. No documento, a Fazenda Nacional avalia, porém, que o entendimento valeria para as contribuições de terceiros (Incra, Senac, Sesc e Sebrae, por exemplo). O pedido sobre os terceiros foi feito nos embargos de declaração apresentados pela instituição, que ainda não foram julgados.

No parecer, a PGFN ainda afirma que a argumentação utilizada pelos ministros para reconhecer a invalidade material da incidência da contribuição previdenciária do empregador sobre o salário-maternidade não pode ser estendida à parte que cabe à empregada. O relator entendeu, no julgamento, que admitir uma incidência tributária que recaia somente sobre a contratação de mulheres e mães é tornar sua condição biológica, por si só, um fator de desequiparação de tratamento em relação aos homens, desestimulando a maternidade.

“Não faz sentido levantar a bandeira em prol da isonomia, para desonerar a funcionária de arcar com a sua contribuição previdenciária, porque essa medida é indiferente para o bolso do empregador e em nada colaborará para a sua maior inserção no mercado de trabalho”, diz a PGFN no parecer. Ações com esse pedido devem ser “duramente combatidas”, segundo a procuradoria, com a apresentação das distinções aplicáveis, para evitar a consolidação de uma jurisprudência defensiva em torno da matéria. O órgão ainda acrescenta que a contribuição de empregada está em dispositivo diferente da Constituição – inciso II do artigo 195, enquanto a do empregador está no inciso I.

No entendimento da PGFN, o recolhimento da contribuição da segurada durante a licença maternidade lhe garante o reconhecimento de seus direitos previdenciários, já que o tempo de afastamento será computado como tempo de contribuição e carência. Para advogados da área previdenciária, no entanto, esse argumento não justificaria a cobrança da parcela das empregadas, já que no caso do auxílio-doença não incide a contribuição, mas o período é computado para fins de aposentadoria.

“É uma grande polêmica”, diz o advogado Paulo Roberto Gomes Carvalho, do escritório Trench Rossi Watanabe sobre a interpretação da PGFN. Ele afirma que o entendimento do órgão afeta empresas que obtiveram liminares para não pagar a contribuição previdenciária e consideram que abrangeriam as duas parcelas – do empregador e da trabalhadora. “A procuradoria se apegou a formalidades e vai exigir a aplicação de forma restrita.” Ainda segundo o advogado, as empresas normalmente só discutem na Justiça a parte do empregador, e não vão brigar sobre o que o relator quis dizer. “Não é o que se esperava da decisão do STF. Não é comum a pessoa física entrar”, afirma Carvalho. De acordo com Breno Vasconcelos, sócio do escritório Mannrich e Vasconcelos Advogados, os valores envolvidos devem fazer com que trabalhadoras não entrem na Justiça, já que a parcela da empregada da contribuição varia de 7,5% a 14% sobre o salário, com teto de R$ 6 mil.

Para Marcello Pedroso, advogado da área previdenciária do Demarest, o acórdão do relator no STF não fala da parte da segurada e o julgamento não entrou nesse tema. ”Ainda é uma questão discutível porque não foi realmente abordada no acórdão”, diz ele, acrescentando, porém, que “se uma coisa não é base, presume-se que não é base para ninguém”. A discussão pode tomar um rumo semelhante ao do aviso prévio indenizado, afirma o advogado. No caso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não incidia a contribuição previdenciária sobre os valores e a Receita Federal, por meio de soluções de consulta, restringiu a decisão. No ano passado, a Corte esclareceu que a decisão alcança as contribuições destinadas a terceiros (REsp 1823187).

“Não sabemos se é a mesma situação e o ministro Barroso levou tudo em consideração quando julgou, mas o acordão não dá amparo expresso para que o questionamento não aconteça”, diz Pedroso. Ainda segundo ele, a empregada que não quiser ter o desconto teria que entrar com ação judicial em seu próprio nome, pois a empresa não pode fazer esse pedido. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional foi procurada, mas não retornou até o fechamento da edição. A Receita Federal já fez alterações no sistema do e-Social que possibilita recolher apenas a contribuição da empregada.

VALOR ECONÔMICO

Compartilhe