Câmara aprova mudança na lei da improbidade

A Câmara dos Deputados aprovou ontem por 408 votos a 67 projeto de lei que muda a Lei de Improbidade Administrativa, texto que estabelece regras para punir gestores públicos por irregularidades na administração pública, como dano ao erário. O projeto segue para o Senado. O texto foi criticado por entidades representativas de órgãos de fiscalização, como integrantes do Ministério Público e dos advogados públicos, que disseram que as mudanças vão permitir a impunidade. Um dos pontos mais criticados é a necessidade de comprovar o dolo (intenção) do gestor em cometer a irregularidade, o que argumentam ser mais difícil de provar. Hoje falhas e erros de gestão podem ensejar punições por esta lei.

Já os defensores do projeto dizem que a lei atual tem uma interpretação muito aberta para penas muito duras e que quase todos os gestores públicos do país acabam por responder a processos com base nela, o que levaria pessoas com boas intenções a desistirem de entrar na vida pública. Prefeitos e ex-prefeitos de todo o país estavam mobilizados para aprovação. Mudanças na lei para “afrouxar” as punições terão efeito retroativos. Entre as mudanças aprovadas está restringir o alcance da punição de perda da função pública por atos de improbidade. O gestor só poderá perder o cargo se ainda estiver nele no momento da condenação – se o prefeito foi eleito para outra função, como deputado, não perderá o mandato. A exceção são casos que envolvem enriquecimento ilícito. Outras alterações são extinguir a ação de improbidade quando houver a absolvição criminal pelo mesmo ato, impedir que os entes lesados possam ingressar com ações por improbidade administrativa (será prerrogativa apenas do Ministério Público) e limitar os inquéritos para investigar atos de improbidade a no máximo 360 dias.

Por outro lado, até os críticos reconheceram que o projeto avança ao classificar o nepotismo (contratação de parentes) e publicidade com “inequívoco enaltecimento do agente público” como improbidade e modificar as penas para punir enriquecimento ilícito, de oito a dez anos para até 14 anos de prisão, e o prazo de suspensão dos direitos políticos de oito para 12 anos. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que já foi condenado por improbidade administrativa e pode se beneficiar da nova lei, fez um discurso em plenário defendendo a proposta e criticou o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Sarrubbo, que chamou a proposta de “PL da impunidade” nas redes sociais. Lira disse que se reuniu com Sarrubbo em fevereiro e que este pediu para que não fosse votado o projeto que restringe os “supersalários”. “Esse é o papel do procurador-geral?”, questionou, indicando que pautará a proposta que corta os “penduricalhos” do Ministério Público. Foi aplaudido.

O deputado Tadeu Alencar (PSB-PE), presidente da comissão especial que discutia o projeto, criticou a decisão de remeter proposta direto para o plenário. “Discordamos veementemente porque achamos que seria possível convencer a sociedade e que, apesar de avanços no relatório, há pontos que deveriam ser profundamente debatidos”, disse Para o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), o texto erra ao excluir as hipóteses de culpa grave, o que impedirá punir um prefeito pela “negligência” de comprar remédios sem eficácia comprovada para distribuir para a população. “É inacreditável que, no meio de uma crise econômica e sanitária, aja uma aliança entre petistas e bolsonaristas para flexibilizar a lei da improbidade”, disse. O parecer do deputado Carlos Zarattini (PT-SP) recebeu apoio de quase todos os partidos, com exceção do Novo, Podemos e Psol, e todas as emendas votadas acabaram rejeitadas. O governo também apoiou a iniciativa e o próprio presidente Jair Bolsonaro afirmou publicamente que apoiava o projeto para “não engessar os prefeitos”, mas seus aliados mais ideológicos evitaram discursos no plenário.

Zarattini defendeu que as modificações evitarão que os gestores públicos se sintam ameaçados a todo tempo pelos órgãos de fiscalização. “Queremos uma lei que de fato puna quem tem que ser punido, aqueles que causam dano ao patrimônio público e os corruptos, e queremos ao mesmo tempo permitir que os gestores, os administradores, tenham liberdade para exercer, dentro da lei, suas atribuições”, afirmou. O deputado Vitor Lippi (PSDB-SP) afirmou que a lei coloca no mesmo balaio os honestos e os desonestos e que 80% dos prefeitos da sua região foram acusados de improbidade e 64% foram condenados – inclusive ele. O tucano citou estudo do Instituto de Direito Público (IDP) nos acórdãos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) mostrou que menos de 10% dos recursos estavam relacionados a enriquecimento ilícito. “90% daqueles que foram chamados de desonestos não enriqueceram, não atuaram como corruptos”, disse.

VALOR ECONÔMICO

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