Negócios se unem sob a ótica feminina
Criada no fim de 2019, uma “confraria feminina” se transformou em porto seguro para suas idealizadoras – cinco empresárias, donas de negócios em setores distintos – neste momento de forte impacto na economia provocado pela pandemia do novo coronavírus. O que as aproximou foi o desejo de criar um ambiente próprio em que pudessem compartilhar experiências sobre a administração de suas empresas e falar também sobre o desafio de ser uma mulher empreendedora no Brasil. “O lugar da empresária mulher é um lugar solitário com certa frequência. Temos de tomar decisões difíceis, equilibrar muitos conflitos. Nossas empresas são pequenas: não temos consultores e conselhos robustos”, afirma Fabiana Caporal Sonder, cofundadora da FabFoods Alimentos, dona da marca de pipocas gourmet Pipó. As reuniões do grupo são, em geral, mensais. Além de discutirem as “dores” de estar à frente de um negócio no Brasil, elas trocam dicas de fornecedores e, periodicamente, trazem especialistas de fora para exposições sobre assuntos que consideram cruciais para a condução do dia a dia do negócio. Ano passado, por exemplo, perceberam a necessidade de entenderem melhor as mudanças trazidas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e trouxeram para a mesa (ainda que virtual, em tempos de pandemia) o advogado Ricardo Weberman. Para falar sobre saúde financeira e governança corporativa, a convidada foi a empresária e consultora Denise Damiani. Para tratar de inovação, o “palco” foi de Andrea Janer, cofundadora da Oxygen, plataforma de experiências em inovação. “No grupo, trocamos experiências sobre as melhores práticas de gestão do negócio e também sobre nossas frustrações”, conta Renata Merquior , cofundadora do DryClub, rede de “salões express”, com serviços como uma escova e maquiagem. Com sua operação afetada pela pandemia, Renata foi buscar o apoio e orientação das colegas para colocar de pé um novo projeto. Ela decidiu ampliar o segmento de produtos de marca própria, mais uma fonte de receita. O investimento em comércio online tem se mostrado promissor para muitos empresários, diante da obrigatoriedade de fechar suas portas por conta das medidas de isolamento social. O propósito de Renata é atrair um investidor para injetar novos recursos no projeto. Para isso, ela preparou uma apresentação, enumerando o que considera como pontos fortes de seu negócio e as vantagens da nova linha de produtos a ser criada. Antes de se sentar com os potenciais interessados – o que está fazendo agora –, ela simulou uma apresentação para as demais integrantes da confraria, que acabou funcionando como um conselho de administração informal. Com o DryClub, criado em 2017 e com duas lojas, Renata levou mais recentemente para a mesa a discussão se um dos caminhos seria fechar uma de suas lojas, no Itaim Bibi, região da cidade de São Paulo que concentra grandes escritórios de empresas e de bancos – e que, em grande parte, continua a adotar o trabalho remoto. Assim como Renata, Flávia Terpins, dona de uma empresa de aluguel de móveis para eventos, também teve seu negócio afetado pela pandemia. A 100% Eventos, que possui três galpões em São Paulo, viu seu quadro de funcionários recuar em 80% na crise e ainda não há uma expectativa de quando os eventos voltarão a ocorrer como antes, ainda mais neste momento de aumento do número de casos de covid no País. E também foi do grupo que Flávia recebeu a ideia de explorar um novo nicho na pandemia: o de aluguel de móveis para temporadas, o que poderia render uma receita extra para a empresa. A ideia surgiu diante da avaliação de que muitas famílias decidiram passar a quarentena em espaços maiores e precisariam, com isso, de um mobiliário por apenas um período definido. Efeitos diferentesO caráter de um “conselho de administração informal” da confraria ganhou ainda maior peso quando se olha o efeito da crise nos pequenos negócios. Logo nos primeiros meses de pandemia da covid-19, o Brasil perdeu 716 mil empresas, segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Quase a totalidade (99,2%) destes negócios era de pequeno porte. A atual crise afetou de maneira distinta diversos setores da economia e isso também se refletiu no microcosmo da confraria. Enquanto as demais companheiras tiveram de lidar com queda de receita e corte de funcionários, Augusta Mafuz, que conduz a Touch Baby, loja de enxovais para bebês aberta há mais de três décadas por sua mãe, viu seu faturamento saltar 50% no ano passado em relação a 2019. Com a dificuldade de viajar ao exterior por conta da pandemia, as famílias que antes compravam todo o enxoval para os filhos lá fora passaram a adquirir esses itens no mercado doméstico, o que impulsionou os fabricantes nacionais. Aos 32 anos (é a mais nova do grupo) e formada em economia e direito pela FGV, Augusta assumiu o leme do negócio da mãe em 2015. Pensando em crescer, ela foi conhecer um dos galpões de Flávia para ter uma visão de um espaço organizado, atrás de inspiração e aconselhamento para uma futura expansão. Agora, depois de completar seu primeiro aniversário e atravessando um ano inteiro de pandemia, a própria confraria se prepara para crescer. A ideia é trazer mais mulheres empreendedoras para a roda de discussão, de forma a ampliar o escopo dos temas. A meta é ter mais diversidade no grupo de setores de atuação, por exemplo. “Temos negócios muito diferentes e temos muita troca de experiências. Cada uma tem um perfil, mas as dores são parecidas. É muito rico ter o olhar de quem está de fora”, conta a fundadora da Cau Chocolates, Renata Feffer, que também está tendo de lidar com o fechamento de lojas. No começo da pandemia, ela criou uma operação de drive thru e delivery, além de turbinar sua venda online, o que vem rendendo frutos. Apesar dos movimentos, conta, os números da companhia voltaram para os observados em 2015. O ESTADO DE S. PAULO
Justiça nega pedidos para classificar covid-19 como acidente de trabalho
A Justiça tem negado pedidos para classificar a covid-19 como doença ocupacional. Nas primeiras decisões sobre o tema, os juízes destacam a falta de provas do contágio no ambiente de trabalho e de determinação legal para o enquadramento. Em geral, só têm concedido o pedido para funcionários da saúde que atuam na linha de frente de combate ao coronavírus. A discussão é importante porque a classificação da covid-19 como doença do trabalho gera estabilidade de um ano para o trabalhador. Além disso, ele pode obter na Justiça o direito a indenizações por danos materiais e morais. Em pelo menos 9,4 mil ações trabalhistas, segundo levantamento do escritório Lee, Brock e Camargo Advogados, a covid-19 é citada. E em parte delas, cerca de 2,1 mil, verificou-se também, além da doença, o termo “acidente de trabalho”. O setor industrial foi o mais demandado nesses processos, segundo Ricardo Freitas Silveira, responsável pela área de inteligência artificial do escritório. “Isso é explicado porque a indústria foi o segmento que menos teve atividade interrompida. Os escritórios, por exemplo, conseguem manter o isolamento”, afirma. O segundo setor que mais aparece nas ações é o de transporte e armazenagem. “Quanto mais a atividade envolve contato entre trabalhadores, maior a ocorrência de covid-19 como acidente de trabalho”, diz o advogado. A maioria das ações ainda não foi analisada. Mas entre os julgados, as empresas perderam em 73% dos casos em que a covid-19 é citada. Não é possível detalhar se a doença estava no pedido principal ou no contexto dos fatos, de acordo com Silveira. Em um dos casos analisados, o juiz Thomaz Moreira Werneck, da 36ª Vara do Trabalho de São Paulo, negou pedido de liminar a um funcionário que trabalhava na limpeza do Metrô, por meio de uma empresa terceirizada. O trabalhador, que foi demitido, pedia suspensão do aviso prévio e estabilidade provisória por supostamente ter contraído a doença no ambiente de trabalho (processo nº 1000960-48.2020.5.02.0036). Na decisão, o juiz destaca que a Portaria nº 2309, de 2020, do Ministério da Saúde, que incluiu a covid-19 na lista de doenças relacionadas ao trabalho, foi posteriormente revogada por outra portaria, a de nº 2345. Ele acrescenta que poderia ser aplicado ao caso o artigo 20, parágrafo 1º, da Lei nº 8213, de 1991, que lista o que não pode ser considerado como acidente de trabalho, entre elas doenças endêmicas. “O contágio por covid-19 foi definido pela OMS como pandemia, ou seja, de alcance mundial e de efeitos muito mais gravosos do que aquelas doenças endêmicas desenvolvidas em uma determinada região”, diz o juiz. De acordo com ele, “o enquadramento do contágio por covid-19 como doença ocupacional não decorre de nexo causal presumido”. E acrescenta: “O seu reconhecimento como acidente de trabalho demanda a análise ampla das medidas tomadas pelo empregador para preservar a saúde de seus empregados.” Para o magistrado, a contaminação pode ocorrer em vários outros locais, “na residência, estabelecimentos comerciais, eventuais atividades de lazer, deslocamentos para outros lugares quaisquer”. Uma funcionária de uma clínica médica também teve seu pedido negado para que fosse emitido um Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT) para especificar que contraiu covid-19. O pedido foi analisado pelo juiz Rodrigo Acuio, da 2ª Vara do Trabalho de Diadema (SP). Na sentença, o magistrado diz que, apesar de a trabalhadora alegar no processo que contraiu a covid-19 no ambiente de trabalho, ficou comprovado nos autos que ela teve contato direto com seu sogro, que morreu em decorrência da doença. Ele afirma também que o contágio ocorreu após o afastamento, por 14 dias, do ambiente de trabalho – devido à morte do sogro e estado gripal (processo nº 1000372-42.2020.5.02.0262). Uma auxiliar administrativa de um hospital também não conseguiu o reconhecimento de covid-19 como acidente de trabalho ou doença ocupacional. Ela alega ter sido infectada por estar na linha de frente do atendimento de pessoas contaminadas pelo vírus (processo nº 1000899-41.2020.5.02.0311). Na decisão, o juiz da 1ª Vara do Trabalho de Guarulhos (SP), Elmar Troti Jr, destaca que o contágio vem atingindo a população em escala mundial de forma vertiginosa e, apesar de a empregada trabalhar em um hospital, atuava no setor administrativo e não apresentou nenhuma incapacidade no retorno. “Não há como responsabilizar civilmente a reclamada por contaminação desta doença pandêmica”, afirma na sentença. Já duas filhas de uma enfermeira que trabalhou na linha de frente em Belém e acabou morrendo em decorrência da doença conseguiram indenização por danos morais no valor de R$ 75 mil para cada uma. No caso, a juíza Erika Moreira Bechara, da 16ª Vara do Trabalho de Belém, entendeu que a doença foi contraída no ambiente de trabalho. A juíza afirma, na decisão, que ficou comprovado que a enfermeira era do grupo de risco, por ser hipertensa e diabética, e continuou trabalhando normalmente na emergência do hospital (processo nº 0000462- 79.2020.5.08.0010). “A probabilidade de ter a falecida contraído o vírus fora do ambiente de trabalho é mínima se comparado com o risco a que se expunha diariamente, ao cuidar de pacientes portadores da covid-19”, diz. O advogado Marcelo Bessa, sócio do Ávila de Bessa Advocacia e ex-juiz do trabalho, considera que o Supremo Tribunal Federal (STF) já sinalizou que a covid-19 pode ser considerada doença ocupacional. Em abril, julgou pontos da Medida Provisória nº 927, de 2020, e anulou o artigo que descartava o enquadramento. A decisão, acrescenta, sinaliza que seria encargo do empregador comprovar que a covid-19 não foi adquirida no trabalho, invertendo o ônus da prova. Para ele, a doença pode ser considerada ocupacional porque o empregado passa a maior parte do tempo no trabalho. “Só a vacina resolve isso. Do ponto de vista econômico e trabalhista, é importante. A vacina é o principal EPI [Equipamento de Proteção Individual].” VALOR ECONÔMICO
Legislativo, MP e Judiciário ‘escapam’ do ajuste promovido pela PEC Emergencial
As medidas de ajuste fiscal para Estados e municípios lidarem com o elevado comprometimento de suas finanças serão adotadas de forma individual pelos Poderes, segundo o texto da PEC emergencial. Na prática, enquanto um governador ou prefeito congela salários de servidores do Executivo, juízes, desembargadores, parlamentares, procuradores e membros dos tribunais de contas poderão propor aumentos em suas remunerações ou continuar contratando, mesmo durante a “emergência fiscal”. A PEC garante a possibilidade de acionar os gatilhos quando as despesas correntes do Estado ou município chegam a 95% de sua receita corrente. Mas, além de as medidas serem facultativas, exercer a opção será uma escolha do chefe de cada Poder. O dispositivo difere do congelamento atual, aprovado como contrapartida ao socorro financeiro a Estados e municípios, que alcança de forma obrigatória todos os Poderes, mas vale apenas até o fim de 2021. “Todos seguirão vida normal, o ajuste será só no Executivo”, afirma o consultor de Orçamento do Senado Vinicius Amaral. Há incentivo à adesão aos gatilhos: o risco de ficar sem ter o Tesouro como fiador em financiamentos, o que costuma garantir acesso a condições mais baratas. Mas mesmo esse dispositivo tem problemas, segundo os técnicos ouvidos pelo Estadão/Broadcast, pois a manutenção da garantia da União depende de todos os Poderes adotarem os gatilhos, embora o aval para o empréstimo seja concedido apenas ao Executivo. Há risco de judicialização. Amaral alerta que um governador não tem nada além do “apelo político” para convencer os demais Poderes a dividirem a conta do ajuste. Hoje, outra fatura do tipo já recai apenas sobre o Executivo. Quando há frustração de receitas e é preciso bloquear despesas, Judiciário e Legislativo têm blindados os seus “duodécimos”, como são chamadas as fatias da receita prevista no Orçamento que são repassadas mensalmente, sem qualquer prejuízo. No Rio de Janeiro, por exemplo, já foi comum ver salários atrasados de professores, mas juízes pagos em dia. A PEC até tentou coibir esse tipo de distorção, mas o trecho foi excluído. GatilhosSobre os gatilhos, o consultor diz que o governador ou prefeito pode eventualmente vetar propostas de aumento de outros Poderes. “Ele poderá sustentar que a adoção das medidas (de ajuste), mesmo que somente no Executivo, o obriga a vetar as propostas dos outros Poderes. Mas aí a Assembleia pode derrubar o veto. Além disso, há despesas que não precisam ir a sanção”, afirma Amaral. Outro risco, segundo ele, é que os demais Poderes se antecipem ao acionamento dos gatilhos e usem a barganha para conseguir vantajosos aumentos antes de um período de “ajuste” mais à frente. Para a procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, Élida Graziane, a falta de um parâmetro constitucional que obrigue poderes e órgãos autônomos a dividir a conta da frustração de receitas provoca uma separação abusiva. “A desigualdade no dever de ajuste fiscal entre os poderes e órgãos autônomos explica parcialmente o motivo por que os órgãos de controle não conseguiram resguardar o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal”, diz. O economista Leonardo Ribeiro, consultor do Senado, engrossa o coro dos que veem risco de desigualdade na aplicação dos gatilhos, mas ele vê ainda outras fragilidades, como o risco de manipulação de indicadores por meio de contabilidade criativa, judicialização e possibilidade de gastança em ano eleitoral. Como a apuração do limite de 95% se dá num período acumulado em 12 meses, o governante pode pisar no acelerador no fim do terceiro ano de gestão sem qualquer sanção, enquanto as medidas mais amargas viriam apenas na virada para o novo mandato. No caso da contabilidade criativa, Ribeiro critica o fato de a PEC não definir o que é considerado despesa e receita corrente, abrindo margem para considerar o valor bruto ou líquido após descontos de deduções como repasses de ICMS a municípios. Procurado sobre essas questões, o Ministério da Economia não respondeu até a publicação desta reportagem. O ESTADO DE S. PAULO
Governo barra novo cadastro para receber auxílio emergencial
A nova rodada do auxílio emergencial a vulneráveis deve contemplar apenas brasileiros que já estavam recebendo o benefício em dezembro de 2020, sem possibilidade de novo cadastro para alcançar quem também perdeu a fonte de renda no período mais recente. A estratégia do governo já desperta críticas de organizações da sociedade civil, que consideram urgente a abertura de um novo prazo para pedidos de auxílio. As entidades também dispararam um movimento para ampliar o limite de R$ 44 bilhões aprovado pelo Senado para o pagamento do benefício. As críticas surgem antes mesmo da aprovação final da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que abre caminho para nova rodada do auxílio. O texto ainda precisa do aval da Câmara dos Deputados, em dois turnos de votação. A previsão é que as discussões na Casa tenham início nesta terça-feira. A Rede Brasileira de Renda Básica alerta para a urgência de o Ministério da Cidadania abrir um novo cadastramento para incluir pessoas que perderam o emprego ou renda e ficaram em situação de vulnerabilidade a partir do segundo semestre de 2020. A primeira rodada do auxílio considerou quem estava registrado no Cadastro Único de programas sociais até 20 de março. Para os “invisíveis”, também foram aceitos pedidos por site ou aplicativo até 2 de julho do ano passado – prazo que nunca foi reaberto. Segundo apurou o Estadão/Broadcast, o governo não vê espaço para abrir um novo cadastramento e quer “aproveitar o que já existe”. A avaliação é que a base de dados pré-existente já contemplaria um número robusto – 56 milhões de brasileiros recebiam o auxílio em dezembro – e foi preciso desenhar novos critérios para conseguir focalizar o benefício nos cerca de 45 milhões que devem ser alcançados agora com a nova rodada. Além disso, mesmo quem não estava no CadÚnico em março do ano passado tem boa chance de ter conseguido o auxílio por meio do site ou aplicativo da Caixa, argumentam técnicos ouvidos pela reportagem. Por outro lado, trabalhadores que tenham eventualmente perdido o emprego no segundo semestre de 2020, sem conseguir recolocação, podem ficar sem proteção. Outro obstáculo citado pelos técnicos é a demora para operacionalizar novos cruzamentos de dados, o que é rebatido pelas entidades, uma vez que o número de pedidos desta vez seria menor do que na primeira rodada. Procurado, o Ministério da Cidadania não se manifestou. Medida provisóriaO risco de brasileiros ficarem sem renda mesmo com a nova rodada do auxílio emergencial levará as organizações da sociedade civil a pressionar no Congresso pela alteração da medida provisória que será editada pelo governo para detalhar o funcionamento da nova rodada do benefício. O objetivo dessas entidades é mudar as regras de acesso e determinar novos cruzamentos de dados e registros de vulneráveis, para garantir que ninguém fique de fora. Uma MP tem vigência imediata, mas precisa ser votada em até 120 dias para não perder a validade. Como o auxílio só dura quatro meses (exatamente, 120 dias), a estratégia do governo é impedir a votação da MP e deixar que o texto expire, justamente para evitar mudanças no texto. O mesmo caminho teve a MP 1.000, que em setembro do ano passado criou o auxílio residual com quatro parcelas de R$ 300 e apertou as regras de acesso. Ela perdeu validade sem ter sido votada, tirando as chances do Congresso de impor qualquer alteração ou acréscimo ao texto. Para a diretora de relações institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica, Paola Carvalho, é preciso vencer nos próximos dias a etapa de cruzamento de dados, principalmente a de atualização de sistema. Para isso, o Ministério da Cidadania teria de abrir um novo recadastramento, para inclusão das famílias. “Dá tempo. O auxílio emergencial já foi implementado por um aplicativo”, afirma ela, que ao longo de 2020 trabalhou como um “elo” de comunicação entre pessoas com dificuldades para terem o auxílio aprovado, Defensoria Pública da União (que ajudou cidadãos na busca do direito ao benefício) e o próprio Ministério da Cidadania. Para Paola, o auxilio é segunda arma mais importante para o combate da pandemia, depois da vacinação. E que o auxilio tem de ser dado até que aja a imunização em massa. “Não existe retomada econômica, empurrar as pessoas para arrumar emprego se a vacina não chegar e não tiver um imunização em massa.” O ESTADO DE S. PAULO
Guedes diz que Bolsonaro não deixou claro problema da saúde e vacinação
Ao defender a vacinação em massa, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o presidente da República Jair Bolsonaro por “infelicidade” não deixou claro sua preocupação com “o problema da saúde e vacinação”. “Nós não podemos deixar a economia se desorganizar, é muito importante isso. Essa mensagem que o tempo inteiro o presidente tem tentado passar também que, talvez, por infelicidade, não deixou claro o problema da saúde, da vacinação em massa”, disse Guedes ao dar entrevista sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) emergencial, que autoriza uma nova rodada do auxílio. O texto foi aprovado pelo Senado esta semana e deve ser analisado na semana que vem pela Câmara. “Mas a agonia dele com a economia é a seguinte: se você der o auxílio, chegar lá, a prateleira estiver vazia, todo mundo com dinheiro na mão, a inflação, falta de alimentos… Então temos que manter os sinais vitais da economia funcionando, como fizemos no passado”, disse. Guedes defendeu a imunização contra a covid-19 para evitar nova queda economia, diante da “tragédia que voltou a nos atingir” ao falar sobre o agravamento da pandemia. Na quinta-feira, 4, Bolsonaro demonstrou irritação com aqueles que cobram em redes sociais que o governo federal compre vacinas contra a covid-19, chamando-os de idiotas e dizendo que só poderia comprar imunizantes “na casa da tua mãe”. “Isso é a coisa mais importante que nós temos agora. O presidente sempre falou, a economia e a saúde andam juntas. Então, é a vacinação em massa, se não a economia não sustenta, ela volta a cair ali na frente”, disse Guedes, após se reunir com o relator da PEC, deputado Daniel Freitas (PSL-SC). Sobre a PEC, Guedes afirmou que é o Congresso quem dá o direito do governo gastar. “O programa já estava pronto, já sabemos como tínhamos que agir, mas ao mesmo tempo precisávamos dessa licença”, disse. “Como disse o deputado Daniel Freitas, a coisa está relativamente bem encaminhada”, disse. Ele não quis entrar em detalhes sobre quais seriam outros próximos passos, mas disse que a PEC restabelece um protocolo de enfrentamento da crise. “Nós enfrentamos a primeira vez, estamos sendo relativamente bem sucedidos”, afirmou citando que a economia brasileira foi uma das que menos caiu durante a pandemia em comparação a outros países. Para ele, é preciso manter os sinais vitais da economia funcionando. Guedes fez elogios ao Congresso e citou a aprovação do projeto de autonomia do Banco Central. “Foi aprovado o Banco Central independente para impedir que aumento setoriais e transitórios de preço se transformem em alta generalizada e permanente de preços, que é o que a gente chama de inflação”, disse. “Eu acho que nós precisamos de um espírito construtivo, nós temos que construir juntos, é um compromisso construir o Brasil, eu tenho dito que essa briga política, essa guerra sem fim, não vai nos ajudar a chegar no melhor lugar”, afirmou. O ESTADO DE S. PAULO
Brasil tem maior alta de óbitos entre os 10 países com mais mortes por covid
No momento em que vive a pior fase da pandemia, com recorde de vítimas e hospitais colapsando, o Brasil se vê na contramão do mundo. O País tem hoje a maior alta no número de mortes por covid entre as dez nações com mais óbitos pela doença, segundo análise feita pelo Estadão com base em dados do site Our World in Data, projeto da Universidade de Oxford. Dos dez países líderes em mortes no mundo, oito registraram queda na média móvel de novos óbitos na última sexta-feira em comparação com o dado de 14 dias atrás. No mesmo período, essa média subiu 30,5% no Brasil, passando de 1.037 mortes diárias em 18 de fevereiro para 1.353 na sexta. O único outro país da lista que também registrou alta foi a Índia, mas em patamar muito inferior ao brasileiro (8,9%). Enquanto isso, o Reino Unido, que também viveu o drama do surgimento de uma variante mais transmissível e da explosão de mortes em janeiro, acumula queda de 49,4%. Os Estados Unidos também registram algum alívio. No intervalo analisado, a média móvel de mortes baixou 8,7%. Também tiveram diminuição Espanha (-32,1%), Alemanha (-26,8%), México (-24,7%), França (-13%), Rússia (-9%) e Itália (-7,3%). A média de mortes em todo o mundo recuou 9,7% no período. Entre os dez países, o Brasil tornou-se o primeiro em novas mortes por milhão de habitantes na quinta, superando os EUA. Na última sexta, o País era responsável por 15% de todos os casos e mortes do mundo (considerando a média móvel). A falta de coordenação nacional para a resposta à pandemia, o negacionismo do presidente Jair Bolsonaro, medidas restritivas frouxas, baixa adesão da população e o surgimento de uma variante criaram uma “tempestade perfeita”, nas palavras de especialistas. “Temos alta mobilidade da população, resistência ao cumprimento de medidas de distanciamento, variantes mais transmissíveis, sistema hospitalar perto do limite e má gestão e comunicação por parte do governo. Aí se formou a tempestade perfeita”, diz o médico brasileiro Ricardo Parolin Schnekenberg, doutorando em Oxford e colaborador do Imperial College London. Ele relata as diferenças na postura do governo britânico quando identificou uma nova cepa mais contagiosa. “Fecharam tudo em janeiro: lojas, restaurantes, igrejas, escolas. E tem punições pesadas para quem descumpre. Mas o que faz a maioria da população aderir não é a punição, mas o entendimento de que a situação é grave, e isso vem com mensagens consistentes do governo, coisa que o Brasil nunca teve”, diz. Outra diferença é a velocidade da vacinação. O Reino Unido já tem 30,9% da população imunizada com ao menos uma dose – quase dez vezes mais do que o Brasil, com 3,5%. “Os Estados Unidos estão vacinando 2 milhões por dia e acabaram de contratar mais uma vacina, a da Janssen”, diz Marcia Castro, chefe do departamento de Saúde Global e População da Escola de Saúde Pública da Universidade Harvard. “O Brasil poderia vacinar rápido também. Tem experiência e conhecimento, só faltaram as doses”, completa. A gestão Bolsonaro também falhou ao ignorar alertas de especialistas sobre o risco da nova onda avassaladora. “A taxa de queda dos casos começou a desacelerar e virou estabilização em outubro, o que já indicava reversão de tendência. Em novembro começamos a ver o aumento”, diz o cientista de dados Isaac Schrarstzhaupt, da rede Análise Covid-19. Ele monitora diariamente os principais indicadores da pandemia no País e, em 17 de dezembro, publicou nas redes sociais análise que mostrava que um “tsunami” se aproximava. Ele e outros especialistas refutam o argumento de que o surgimento inesperado da variante levou ao cenário atual. “A própria existência da variante se deu por causa do desrespeito das medidas de distanciamento. Fica parecendo que estávamos fazendo tudo certo e demos o azar de ter uma variante que acabou com nossos esforços. Provavelmente, não haveria variante se estivéssemos fazendo um bom controle”, diz Schrarstzhaupt. Ministério diz que repassou dinheiro para EstadosQuestionado, o Ministério da Saúde disse manter esforço constante para garantir atendimento em saúde, tendo repassado aos Estados R$ 33,2 bilhões para ações contra a covid-19. A pasta ressaltou que Estados e municípios têm autonomia para definir medidas locais. O ministério informou ainda que, como prevenção e controle, preconiza o “uso de máscaras, bem como evitar aglomeração, distância de pelo menos 1 metro entre as pessoas, etiqueta respiratória e higienização das mãos”. O órgão afirmou que está trabalhando para atender a todos no plano de vacinação. Até agora, informa a pasta, mais de 17 milhões de doses já foram distribuídas e a previsão é de que outras 29 milhões sejam entregues ainda em março. Queda de mortes pode demorar 5 semanasO abismo entre o Brasil e os demais países no controle da pandemia deve aumentar nas próximas semanas, principalmente se o País seguir com uma campanha de vacinação lenta e se os governos estaduais recuarem rapidamente das quarentenas mais rígidas que ganharam espaço nos últimos dias. Isso porque, com um patamar ainda alto de casos, o País deve levar muito tempo para reverter a tendência de aumento, enquanto outras nações mantêm as infecções em baixa com reaberturas cautelosas e vacinação em massa. “Mesmo se tivermos um lockdown nacional rigoroso no Brasil, ainda demoraríamos de três a quatro semanas para ver uma queda nas hospitalizações e cinco a seis semanas para ter uma diminuição das mortes”, opina Ricardo Parolin Schnekenberg, doutorando da Universidade de Oxford e colaborador do Imperial College London nos estudos sobre covid-19 no Brasil. Ele conta que, no Reino Unido, mesmo com o número de novos óbitos em queda há mais de um mês, o lockdown começará a ser flexibilizado somente nesta semana, com a reabertura das escolas a partir de amanhã. Comércios não essenciais serão permitidos apenas em abril. Já restaurantes e pubs poderão reabrir em maio. “É um processo lento e cauteloso para que o número de casos tenha uma redução grande e qualquer surto seja mais facilmente controlado, e também para que dê tempo de mais gente ser imunizada”, afirma o médico brasileiro sobre a
Com auxílio, consumo de alimentos por mais pobres cresce 8% em 2020
No ano de pandemia, os brasileiros no geral aumentaram o consumo de alimentos dentro de casa, mas os mais pobres conseguiram colocar uma quantidade maior de comida no prato. Em 2020, o volume de itens consumidos dentro dos domicílios de todas as faixas de renda cresceu 4% em relação a 2019. No entanto, entre as camadas de menor renda, as classes D e E, o avanço foi o dobro, de 8%, mostra pesquisa exclusiva da consultoria Kantar. O aumento do consumo de alimentos pelos mais pobres foi embalado pelo auxílio emergencial, que injetou cerca de R$ 300 bilhões na economia em 2020. Cerca de 70% das classes D e E, com renda familiar de até R$ 2,6 mil, segundo o IBGE, receberam o benefício. Isso provocou um salto na receita dessa faixa da população, que gasta quase 25% do que ganha com comida. Com mais dinheiro no bolso, os mais pobres incluíram itens que não faziam parte do cardápio. Presunto e apresuntados passaram a ser consumidos por 8,5 milhões de famílias das classes D e E no ano passado; 6,2 milhões de domicílios experimentaram empanados, do tipo nuggets, de frango, carne bovina e vegetais; 4,5 milhões foram às compras de hambúrguer, linguiça, maionese; 5,1 milhões passaram a usar manteiga e requeijão; e 7,1 milhões, azeite, mesmo do tipo misto, por causa da disparada de preço do óleo de soja. O acesso a novas categorias de produtos por conta do auxílio emergencial lembra o movimento que ocorreu no início do Plano Real, em meados dos anos 1990. Na época, a queda abrupta da inflação permitiu a compra de frango e iogurte pelos mais pobres. Agora, porém, esse movimento de consumo é tido como transitório. E um primeiro sinal disso já começou a aparecer nos supermercados paulistas, que tiveram queda real de vendas este ano (mais informações nesta página). “O brasileiro comeu melhor no ano passado, porque o auxílio emergencial criou um mundo fantasioso, um poder de compra temporário”, afirmou David Fiss, diretor de serviços ao cliente da Kantar e responsável pela pesquisa. Semanalmente, a consultoria audita 11,3 mil domicílios para radiografar o consumo a partir do tíquete de compra. O estudo da Kantar mostra que o auxílio turbinou o consumo de itens básicos – não sós alimentos – nas regiões mais pobres do País. No Norte e Nordeste, o gasto médio das famílias que receberam o auxílio cresceu 9,1% ante 2019, enquanto aquelas que não receberam desembolsaram 2,1% a mais na mesma região. Também a cesta de produtos perecíveis, que inclui carnes, verduras e frutas, foi a mais beneficiada pelo aumento da renda em 2020. O gasto médio de todos os brasileiros que receberam auxílio aumentou 16% com esses itens. Já os que não receberam destinaram 13% a mais. Moradora da comunidade de Paraisópolis, na zona sul da capital paulista, Jaqueline Santos da Silva, de 25 anos e mãe de três filhos, com sete e três anos de idade e um bebê de cinco meses, contou que conseguia comer melhor na época que recebia o auxílio emergencial de R$ 600. “Comprava bolacha que as crianças pediam, fruta, linguiça, frango, salsicha”, disse ela. Agora, voltou para o Bolsa Família, cujo benefício não chega R$ 300, e busca doações de cesta básica, mas até as doações ficaram mais difíceis. “Pego a marmita de doação no almoço e me viro na janta com o que tem.” Na semana passada, Jaqueline tinha dois quilos de arroz, uma garrafa de óleo fechada, sal e feijão. “Acho que a semana que vem não tem mais nada.” FomeAinda não há dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) disponíveis sobre como andou a fome no Brasil em 2020, disse na semana passada ao Estadão Alícia Bárcena, secretária executiva da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal), órgão das Nações Unidas. Mas, considerando as informações sobre a redução da pobreza extrema, que é medida também pelo acesso a uma cesta básica de alimentos, Alícia calcula que 8,6 milhões de brasileiros deixaram a pobreza extrema no ano passado por causa do Bolsa Família, do Benefício de Prestação Continuada e do auxílio emergencial. “O desafio é sustentar essas medidas para que, no futuro, essa contenção possa se manter”, afirmou. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que autoriza a volta do auxílio foi aprovada no Senado na última quinta-feira e agora segue para Câmara do Deputados – a previsão é que a votação aconteça entre terça e quarta-feira. O valor do benefício deve variar entre R$ 150 e R$ 375. É uma cifra inferior aos R$ 600 pagos inicialmente em 2020. O governo ainda pretende restringir o auxílio a uma pessoa por família, ao contrário da rodada de 2020. O ESTADO DE S. PAULO
Múltis planejam modelo de trabalho flexível no pós-crise
O brasileiro Roberto Azevêdo assumiu a vice-presidência global de assuntos corporativos da PepsiCo, nos Estados Unidos, em 1º de setembro do ano passado, um dia depois de ter deixado a direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). Seis meses depois, ele não ocupou uma só vez até agora sua mesa na grande sala dos principais executivos da multinacional americana em Purchase (Nova York). A sede da empresa continua fechada, a exemplo de milhares de grandes companhias globalmente, para evitar mais propagação do coronavírus. A PepsiCo, com mais de 300 mil funcionários globalmente, a líder mundial do setor de alimentos Nestlé, com 291 mil empregados, e o laboratório farmacêutico Novartis, com 110 mil funcionários, têm em comum a constatação de que a pandemia acelerou a necessidade de reorganizar o modelo de trabalho. Quando a crise sanitária global passar, muitas multinacionais estudam não voltar a ter mais a presença física nos seus escritórios – pelo menos não como antes. Boa parte dos empregados poderá escolher onde e como vai trabalhar. Em alguns casos, sem ter necessidade de perguntar a seus gerentes. Mais flexibilidade na realização das tarefas poderá resultar em redução de despesas e aumento da produtividade. “O trabalho nas empresas, seguramente nos EUA e imagino na maior parte do mundo ocidental, não voltará ao que era antes, porque a crise sanitária e as novas https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpgs demonstraram que há formas mais eficientes para trabalhar, que aumentam a produtividade e que dispensam da presença do contato físico nos escritórios’’, diz Roberto Azevêdo, sem mencionar especificamente planos da PepsiCo. No seu dia a dia, até agora, Azevêdo trabalha num apartamento que alugou em Whiteplains, cidade a oito minutos de carro da sede da companhia em Purchase (NY). Em seis meses na Pepsi, ele só esteve na sede para poucas reuniões em tendas armadas ao ar livre, com distanciamento social, uso de máscara e outras precauções. E até agora não conheceu pessoalmente sua assistente direta. O contato só tem sido por telefone ou vídeo. “O que sabemos é que os empregadores estão surpreendentemente satisfeitos com o ‘home office’’, diz Sergei Suarez Dillon Soares, economista do trabalho na Organização Internacional do Trabalho (OIT). ‘’Antes, eles tinham muita resistência ao teletrabalho, achando que não iam controlar os empregados. Mas agora constatam que pelo menos no curto prazo há ganhos se trabalhando a partir de casa numa grande gama de setores. O grosso do tempo economizado no trânsito, por exemplo, está sendo utilizado para mais trabalho.’’ Segundo diferentes fontes, mais e mais empresas sinalizam reduzir já os espaços físicos dos seus escritórios e obter com isso uma economias expressiva. Em vez de ir a semana inteira à empresa, o funcionário passará a ir uma ou duas vezes. Em algumas áreas, nem isso, como é o caso da contabilidade, que pode ser feita de qualquer lugar. Empresas mencionam aumento de produtividade. O funcionário não vai perder um bom tempo se deslocando para o escritório. As companhias notaram que a pessoa em casa tem preocupação de mostrar que está trabalhando, bem mais do que no escritório. Viagens de negócios vão diminuir fortemente. A participação física em conferências será reduzida. As empresas vão ter menos despesas com viagens de trabalho, com material de escritório e outros itens. Além disso, com boa parte dos empregados trabalhando em casa, empresas vão aproveitar para reduzir sua “pegada carbono’’ e cumprir compromissos de redução de emissões de gases de efeito estufa. Na suíça Novartis, funcionários manifestaram forte desejo por mais flexibilidade sobre como, onde e quando trabalham, e líderes antes céticos aprenderam que modelos de trabalho flexíveis bem direcionados funcionam. “Acreditamos que podemos criar um modelo de trabalho futuro que otimize o desempenho pessoal e empresarial’’, informou a companhia. Cerca de dois terços dos funcionários da empresa confirmaram em pesquisas que querem flexibilidade no futuro, cerca de 14% gostariam de trabalhar em casa na maior parte do tempo (10% antes da pandemia) e pouco menos de um quarto precisa ou prefere trabalhar no escritório a maior parte do tempo. A Novartis delineou um modelo que chama de “Escolha com Responsabilidade”. Por ele, o empregado pode decidir, em consulta com a equipe, como, onde e quando trabalha de forma mais eficaz em suas funções (dentro das fronteiras nacionais), assumindo a responsabilidade pessoal de informar seus gerentes e cumprir os requisitos necessários, como proteção de dados, regras de tempo de trabalho e descanso, saúde e segurança. É o que a empresa chama de ‘’unbossed environment’’, que é mais do que ambiente sem chefe, e sim sobre “empoderamento” que “ajudará nosso pessoal a ser mais criativo e produtivo quando tiver o poder de moldar seu próprio ambiente de trabalho’’, removendo obstáculos para “atingir seu potencial máximo’’, segundo a companhia. Na Nestlé, a constatação é de que o fim da pandemia não está à vista neste momento, mas a empresa quer “aprender com a experiência e adotar práticas de trabalho que nos permitam colaborar melhor e tomar decisões com mais agilidade”. Isso inclui maior uso de videoconferência e serviços em nuvem, permitindo mais flexibilidade nos modelos de trabalho. Segundo estudo da OIT, o aumento enorme do trabalho em casa, por causa da pandemia, deverá persistir nos próximos anos. A organização recomenda aos governos a adoção de medidas específicas para atenuar riscos psicossociais e introduzir um “direito à desconexão’’ para assegurar o respeito das fronteiras entre vida profissional e vida privada. Antes da pandemia, a OIT calculava que 260 milhões de pessoas trabalhavam em casa no mundo, o que representa 7,9% da força de trabalho mundial. No início da pandemia e lockdowns, a estimativa era de que entre 15% e 18% dos trabalhadores globalmente tinham passado a fazer o “home office”, variando de um entre três empregados na América do Norte e Europa e um entre seis na África. Para Sergei Soares, da OIT, um dos problemas grandes na pandemia é que os teletrabalhadores estão 24h plugados. “É preciso não só ter o direito à desconexão, e sim ter o hábito da desconexão.” França, Bélgica, Itália e Equador já
Guedes espera Orçamento para antecipar 13º do INSS e permitir a empresas reduzir salários
O ministro da Economia, Paulo Guedes, confirmou que aguarda a aprovação do Orçamento de 2021 para poder antecipar o 13º dos segurados do INSS e que o governo relançará o programa que permite redução de jornada e salário ou suspensão de contrato de trabalhadores da iniciativa privada, mas “em novas bases”. O Orçamento deve ser votado até o dia 24 de março. Como mostrou o Estadão/Broadcast, o governo quer permitir um novo período de até quatro meses de redução de jornada e salário ou suspensão de contrato de trabalhadores para evitar alta no desemprego em meio às medidas restritivas contra a covid-19, mas o pagamento do benefício que compensa a perda salarial deve ter um desenho distinto. A intenção é garantir dois meses do BEm, pago pelo governo, e outros dois meses seriam de antecipação do seguro-desemprego a que teria direito se demitido. O novo modelo ainda está sendo fechado pelos técnicos, que também buscam uma fonte de financiamento para a parte do BEm que será bancada pelo governo. Há discussões internas no sentido de empregar recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que hoje já banca o abono salarial e o próprio seguro-desemprego. O principal desafio, porém, é que esse fundo já gasta mais do que arrecada e precisa de aportes do Tesouro Nacional para operar. O novo desenho do Programa Emergencial de Manutenção de Emprego e Renda deve manter os mesmos porcentuais de redução de jornada e salário (25%, 50% e 70%), além da suspensão de contrato. A mudança mais substancial deve ser mesmo a forma de pagamento do benefício. Há ainda um impasse envolvendo a antecipação do 13º dos aposentados do INSS, medida que a equipe econômica quer implementar para injetar R$ 50 bilhões na economia ainda no primeiro semestre do ano e ajudar a dar fôlego à atividade enquanto a nova rodada do auxílio emergencial não sai do papel. Economistas têm feito coro em torno do risco de uma recessão no primeiro semestre, dado que o aumento no número de casos e óbitos por covid-19 tende a retrair o consumo dos brasileiros. Em relação à antecipação do 13º, o impasse se dá porque a medida não pode ser adotada antes da aprovação do Orçamento de 2021. Os gastos obrigatórios estão sendo feitos de forma provisória na proporção de 1/12 ao mês em relação ao estimado na proposta, como autoriza a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Pagar o 13º mais cedo que o habitual elevaria essa proporção. O ministro da Economia defendeu a ação do Congresso nas medidas de combate à covid-19 e disse que “não há substituto para a boa política, com classe política atuante e que não se omita”. Guedes ressaltou ainda que sua equipe trabalha para adotar as medidas “com responsabilidade”. Ele destacou o fato de a dívida pública brasileira ter chegado “só” a 89% do PIB em 2020, enquanto, no auge das incertezas, previsões chegaram apontar para patamares acima de 100% do PIB. O ESTADO DE S. PAULO
FGTS está entre os principais motivos de ações na Justiça do Trabalho
Problemas envolvendo o pagamento do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) estão entre os assuntos mais recorrentes nas ações apresentadas por trabalhadores na Justiça do Trabalho. No pódio dos motivos para processos contra empregadores, o topo é ocupado pelo aviso prévio, que apareceu em 394,3 mil casos. A multa de 40% do FGTS vem em seguida, com menção em 332,8 mil ações trabalhistas apresentadas em 2020, segundo estatística do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Os trabalhadores têm direito à multa quando são demitidos sem justa causa. Ela deve ser calculada sobre o saldo de depósitos feitos pelo empregador no decorrer do contrato. Discussões sobre o pagamento do Fundo de Garantia aparecem outras duas vezes no ranking dos 20 principais assuntos destacados pelo TST. Falhas em depósitos ou a existência de diferença a ser recolhida apareceram em 162,7 mil processos trabalhistas no ano passado. Outras 130 ações mil citam apenas o Fundo de Garantia. É comum que as ações apresentadas por trabalhadores contra empregadores tenham diversos pedidos consecutivos. O terceiro motivo mais comum no ranking do TST é a multa prevista no artigo 477 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), devida quando o empregador não paga as verbas rescisórias até dez dias depois de o contrato ser encerrado. O Termômetro Covid-19 na Justiça do Trabalho, ferramenta de jurimetria da Datalawyer, mostra que, entre os quase 200 mil processos trabalhistas que citam a pandemia de coronavírus, a multa do FGTS também aparece em segundo lugar no volume de demandas. Até esta quinta-feira (04), 38,8 mil ações tratavam do assunto. Diferenças de recolhimento ou falta de depósito aparecem em 16,4 mil ações trabalhistas. O FGTS, diferentemente da contribuição previdenciária, é recolhido integralmente pelo empregador. Ele corresponde a 8% do valor do salário, e é depositado em conta vinculada ao CPF do trabalhador. Cada emprego gera uma nova conta. Trabalhadores com contrato de jovem aprendiz têm recolhimento de 2%. Nos últimos anos, os governos Jair Bolsonaro e Michel Temer mexeram em regras de remuneração e saque, aumentando as possibilidades de movimentação do dinheiro. Originalmente, o trabalhador podia sacar os valores quando era demitido sem justa causa, ao fim de contrato de trabalho, na aposentadoria ou se ficasse três anos sem emprego formal. Também era permitido usar o saldo na compra da casa própria. No ano passado, o governo liberou uma retirada emergencial de até um salário mínimo. Antes disso, já tinha permitido o saque aniversário, no qual o trabalhador recebe parte do saldo, todos anos, no mês em que nasceu. Quem adere a esse modelo não recebe os valores do Fundo de Garantia se for demitido –esse tipo é chamado de saque rescisão. Os trabalhadores com carteira assinada conseguem acompanhar os depósitos de valores feitos pelos empregadores. Esse monitoramento pode ser uma boa solução para evitar problemas no futuro, como a descoberta de que o dinheiro não foi recolhido. No site do FGTS (fgts.gov.br), é possível acessar os extratos completos e cadastrar o telefone para receber, por mensagem de texto, informações da movimentação da conta do fundo. Há também o aplicativo FGTS, disponível para Android e IOS. FOLHA DE S. PAULO