Valor Econômico –
Lidar com negócios exige que todo empresário enfrente problemas diários que envolvem a própria sobrevivência e, em busca desse objetivo, o planejamento tributário surge como um forte aliado, capaz de pormenorizar esses riscos. Ninguém mais do que o empreendedor precisa ter consciência da importância desse recurso, sobretudo no período pós-pandemia. Para entender o tamanho dessa importância, bastaria estudar os faturamentos das empresas brasileiras antes e depois de março de 2020.
A partir desse período, houve uma queda acentuada de receita e um aumento elevado do desemprego, modificando negativamente o cenário de muitas companhias, principalmente das micro e pequenas empresas. No entanto, não houve grandes mudanças nas tributações das três esferas (federal, estadual e municipal), exceto por decisões tomadas no âmbito jurídico.
Esse desequilíbrio da balança comprometeu bastante a performance de diversos setores, mas foi bem menor para quem se preveniu com um planejamento tributário. Ao contrário do que muitos pensam, esse tipo de ação não significa elaborar estratagemas complexos para reduzir o peso dos tributos, mas amparar-se na própria lei para fazer valer os direitos da empresa de pagar rigorosamente aquilo que lhe compete.
Se alguém deparar com uma proposta indecorosa de quem promete uma carteira de isenções fiscais, a recomendação é: caia fora! Planejamento tributário não é recorrer a medidas escusas, até porque o resultado não vale a pena. A Receita Federal possui um dos maiores e mais complexos bancos de dados do país, e alguns comparativos seriam mais do que suficientes para enquadrar a empresa na condição de sonegadora. Além do nome sujo, as multas comprometeriam ainda mais o orçamento do que seria se mantivesse o pagamento em dia.
Antes, contudo, o planejamento tributário exige o acompanhamento rigoroso de projetos de lei em tramitação e ações em curso, e que podem ter efeitos positivos para o caixa. Uma delas aconteceu no primeiro semestre, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedentes os embargos de declaração contra a exclusão do ICMS da base de cálculos do PIS/Cofins. E melhor: a decisão manteve seu caráter retroativo, de maneira que o cômputo passou a valer desde março de 2017. Resultado: as empresas mais antenadas com o julgamento hoje têm uma boa gordura no pagamento do PIS/Cofins, e algumas vão ter o privilégio de se manter por alguns anos sem pagar a contribuição.
A possibilidade de expansão dos prazos de empréstimos contraídos junto ao governo federal também vem alimentando boas expectativas de quem está a par do tema. São circunstâncias que exigem planejamento e acompanhamento constantes, com vistas a, permanentemente, buscar meios de reduzir os impactos fiscais na folha das empresas.
O direito tributário possui inúmeras armas de combate aos excessos do Estado. Antever e gerenciar os riscos são medidas cruciais para manter a saúde da empresa em dia.
Há alguns recursos legais que são de conhecimento dos escritórios de contabilidade mais sérios. Não é possível, por exemplo, falar de planejamento tributário sem compreender e pôr em prática o conceito de elisão fiscal. Muitos confundem a estratégia com sonegação, embora uma coisa não tenha absolutamente nada a ver com a outra. Sonegação é o ato criminoso de ocultar o recolhimento de tributos, e a empresa que promove esse tipo de ação está sujeita a diversas sanções, inclusive a prisão dos proprietários.
Em muitos momentos, o contexto político-econômico deve ser levado a termo ainda mais que a própria lei. Isso porque há situações em que o benefício é concedido provisoriamente, por força de decreto, pelo Poder Executivo, a fim de contornar um momento econômico delicado ou puramente para estimular determinado setor a investir. São os casos em que ocorrem as isenções fiscais e os incentivos. Podem ocorrer até perdões parciais de dívidas ou alguma compensação de créditos fiscais vantajosos e, claro, legais.
Mas não são apenas essas práticas que estão à mão. Há outras que exigem obediência rígida por parte do empresário. Vale observar que planejamento tributário remete a organização, zelo, estudo minucioso. Esse arranjo não começa e termina no escritório de contabilidade, mas passa por todos os setores da empresa e até pelos proprietários. Misturar pessoas física e jurídica, por exemplo, é algo bastante comum na cultura empreendedora do país, mas que leva a uma desorganização que pode matar a própria companhia.
É o caso de quem utiliza a entrada de recursos na empresa para pagar o cartão de crédito pessoal, os presentes de Natal para as crianças, a viagem de férias ou as compras de supermercado. Já existe uma regulamentação, a Lei nº 13.874/19, feita exatamente para inibir esse tipo de postura, conhecida por “confusão patrimonial”. Além de colocar em risco o patrimônio pessoal do proprietário, ela também distancia a empresa de um planejamento tributário coerente, uma vez que torna mais difícil a tarefa de identificar o que é entrada e o que é saída tributável.
Há inúmeras outras iniciativas disponíveis ao empresário, mas fica claro que dependem tão somente dele os primeiros passos rumo a esse planejamento. Manter a contas (e as práticas) da empresa dentro da legalidade; recorrer a profissionais com expertise para buscar seus direitos; ser criterioso nas operações de entrada e saída. Tudo aponta para o que já sabemos: planejamento é um trabalho que pode e deve ser feito a várias mãos. No fim, ganha – e muito – o caixa da empresa.
Diogo Montalvão é advogado e sócio do escritório BLJ Direito e Negócio