Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) deram início ao julgamento em que vão definir um ponto importante das negociações coletivas na seara trabalhista, a validade da chamada ultratividade – manutenção do acordo coletivo anterior até a fixação de um novo. O julgamento começou ontem, mas nem o relator, ministro Gilmar Mendes, votou, por causa do horário. Ao suspender a sessão, o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, afirmou que irá marcar uma data para a continuação, o que deve ocorrer no dia 30. O tema pode impactar centenas de pessoas. Hoje, cerca de 3,760 milhões processos tramitam com as palavras chaves ‘norma coletiva’, ‘acordo coletivo’, ‘convenção coletiva’ e ‘supressão’ ou ‘prevalência’ ou ‘limites de direitos trabalhistas’ na petição inicial, segundo o Data Lawyer Insights, plataforma de jurimetria. O banco de dados abrange processos desde 2014.
O assunto é julgado em ação proposta pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen) contra a interpretação judicial do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelos Tribunais Regionais do Trabalho da 1ª (RJ) e da 2ª Regiões (SP) sobre a ultratividade das normas coletivas. Em novembro de 2012, o TST revisou a Súmula nº 277, de 1988. A partir daí, a Corte passou a entender que os benefícios concedidos aos trabalhadores serão automaticamente renovados e somente revogados se houver nova negociação. Até então, o entendimento do TST era de que as vantagens negociadas entre empresas e trabalhadores valeriam enquanto vigorasse o acordo. Esse prazo, segundo a CLT, poderia ser de um a dois anos. Para mantê-los na próxima convenção seria necessária nova rodada de negociação.
A Confenen alega na ação que o TST mudou entendimento consolidado de maneira abrupta. Com a edição da reforma trabalhista, em 2017, foi introduzido na CLT, o parágrafo 3º, do artigo 614, que vedou a ultratividade. Quando não há ultratividade em cada data base, as categorias precisam retomar a negociação do patamar zero, explicou na sustentação oral o advogado José Eymard Loguércio, representando a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria Química (CNTQ), amicus curiae (interessada) na ação. Se de um lado a ultratividade induz a manutenção das relações de trabalho para que se retome a negociação, ela não impede que em situação excepcional ou de dificuldade econômica o empregador possa reformar o acordo coletivo, segundo Loguércio.
O advogado exemplifica o caso de um auxílio-alimentação acordado em negociação. “Ao final do acordo coletivo, sem ultratividade, cessaria a obrigação de pagar auxílio alimentação? O que faz o empregador? Para espontaneamente? Não paga? Aguarda? A regra da ultratividade é de segurança para as negociações coletivas”, afirma. O tema é central para o direito do trabalho e para o atual momento de mudanças nas relações de trabalho, segundo Loguércio. De acordo com Zilmara David de Alencar, que representa um conjunto de amicus curiae, também de sindicatos de trabalhadores do comércio e educação, entre outros, a ultratividade é necessária para a harmonia sistêmica das relações de trabalho.
VALOR ECONÔMICO