Projeto de reforma do Imposto de Renda precisa de mais ajustes, dizem especialistas

A forte desoneração do Imposto de Renda (IR) das empresas prevista no parecer do relator do projeto de reforma tributária, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), pode acabar levando ao aumento da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), proposta do novo tributo para a fusão do PIS e Cofins.

Esse é um dos riscos apontados por especialistas com a redução agressiva da alíquota de 25% para 12,5% da alíquota do IRPJ proposta pelo relator com apoio do ministro da Economia, Paulo Guedes.

A votação da CBS, prevista no projeto da primeira fase da reforma tributária que foi fatiada pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco, perdeu a prioridade na votação com as discussões do projeto de lei que reforma o IR das empresas e das pessoas físicas, enviado ao Congresso há menos de 15 dias e que foi completamente repaginado pelo relator.

O Estadão procurou especialistas para avaliarem os pontos do parecer que ainda precisam ser ajustados e os riscos de mudanças feitas com a decisão do relator de garantir uma redução agressiva da carga tributária do IR (leia as análises nesta página). Uma das preocupações é de que a reforma fatiada não permite avaliar o impacto das mudanças por completo, o que pode trazer riscos mais à frente.

A decisão do relator de retirar do projeto as medidas de combate à sonegação e elisão fiscal (formas que as empresas usam para pagar menos impostos ou dilatar o pagamento ao longo do tempo de maneira que se torne, na prática, inexistente) também são vistas com grande preocupação.

“Depois que reduzir o IRPJ, ele não sobe mais, mas sobe a CBS”, alerta a tributarista Elisabeth Libertuci, sócia do escritório Lewandowski Libertuci.

A pesquisadora Grazielle David, da Tax Justice Network, organização internacional de pesquisa e defesa da justiça fiscal, baseada na Inglaterra, diz que a proposta de redução excessiva do imposto às empresas altera elementos fundamentais da tributação no País. “Fica cada vez mais distante a possibilidade de reduzir a regressividade do sistema tributário”, diz. A regressividade ocorre quando quem ganha menos paga proporcionalmente mais do que os mais ricos com mais elevado.

Para Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), da forma como ficou, o texto incentiva a pejotização, quando um trabalhador se torna um prestador de serviço, atuando como pessoa jurídica.

Leia, logo abaixo, a opinião de cada um dos especialistas consultados pelo ‘Estadão’ sobre a reforma do Imposto de Renda

Texto vai na ‘contramão do mundo’, diz Grazielle David
“A carga tributária no País é extremamente regressiva (prejudica os mais pobres), e a única forma de mudar isso é fazer uma redistribuição dessa carga – sair dos tributos sobre consumo e migrar para o Imposto de Renda, riqueza, propriedade e patrimônio. A proposta vai muito na contramão do cenário internacional. Ainda que a atual alíquota da PJ seja muito alta, em torno de 34%, estamos falando de alíquota nominal. Quando a gente olha para uma alíquota efetiva, que permite uma comparação no cenário internacional, a nossa alíquota mais alta estava em torno de 22%. Com a reforma, a alíquota efetiva será possivelmente inferior aos 15% discutidos no cenário internacional. Então, o Brasil vai ficar com uma alíquota parecida com paraíso fiscal para empresas? As grandes corporações vão sair lucrando muito com isso.”

Risco de aumento de impostos, aponta Elisabeth Libertuci
“O que está sendo feito é sair na frente para resolver o Imposto de Renda por conta da ideia fixa de tributar dividendos para depois aprovar a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Vão deixar a mão mais pesada ainda na CBS, que já tem uma série de problemas. Tenho seriíssimas dúvidas se isso tem o aval da Receita. Quando falam que quem vai pagar a conta são 20 mil empresas (sobre as quais a proposta retira incentivos fiscais), está tudo em ordem com a parte jurídica? Pode tirar o benefício do dia para a noite? É um tiro no escuro. Espero que os cálculos estejam bem feitos. Depois de reduzir, o IRPJ não sobe, mas sobe com a CBS.”

Incentivo para a pejotização, analisa Bernard Appy
“Do ponto de vista das empresas, o relatório ficou bem melhor. A carga sobre o lucro distribuído na versão anterior estava bastante salgada, mas tem problemas seriíssimos. Algumas das distorções do relatório inicial foram mantidas. Uma delas foi ampliada: o estímulo à pejotização. A empresa de um profissional liberal com lucro de R$ 20 mil hoje paga 9,6% de IR e CSLL, o que é baixo, na comparação com um empregado formal com a mesma renda (27,5% de IRPF). Com a proposta do governo, já tinha caído para 7,6% e, com o parecer do relator, caiu para 4,6%. Ampliou a distorção, na contramão do que tem de ser feito. Vai ter empresa se fragmentando para ficar no limite de R$ 4,8 milhões anuais. Na prática, está desonerando a renda para aumentar a tributação do consumo, o oposto do que o Brasil precisa fazer.”

O ESTADO DE S. PAULO

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