Novo texto da reforma alivia IR para empresas e deixa rombo de R$ 30 bi nas contas públicas

Após pressão de empresários, a nova versão da proposta de reforma do IR (Imposto de Renda) prevê um corte de 12,5 pontos percentuais no tributo sobre empresas, afirmou o relator do texto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA).

Com forte alívio na tributação das pessoas jurídicas, o parecer inverte a tendência da proposta original do governo, que geraria ganhos de arrecadação, e passa a prever uma perda final de quase R$ 30 bilhões nas receitas federais por ano.

A proposta apresentada em 25 de junho pela equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) propunha uma redução da alíquota do IR de empresas dos atuais 15% para 10%, com um escalonamento de 2,5 pontos percentuais no primeiro ano e mais 2,5 pontos no segundo ano. A tributação adicional de 10% sobre lucros acima de R$ 20 mil continuaria valendo.

Agora, o relator cortou a alíquota base de forma mais radical —de 15% para 2,5%. Pela nova proposta, haverá uma redução de 10 pontos percentuais no primeiro ano de vigência e mais 2,5 pontos no segundo ano.

Para a pessoa física, não houve ampliação dos benefícios propostos. O parecer preliminar, apresentado a líderes partidários nesta terça-feira (13), mantém a elevação da faixa de isenção dos atuais R$ 1.900 para R$ 2.500. Também fica inalterada a proposta de permitir o desconto padrão da declaração simplificada apenas a pessoas com renda anual de até R$ 40 mil.

O corte na alíquota de Imposto de Renda para empresas retira, sozinho, R$ 74 bilhões da arrecadação federal em 2022 e R$ 98 bilhões a partir de 2023 (na versão original do governo, a previsão era de aproximadamente R$ 20 bilhões e R$ 40 bilhões, respectivamente).

Para compensar a perda nessa e em outras medidas, Sabino disse que buscou diferentes fontes. Será proposto um corte de incentivos tributários para empresas das áreas de cosméticos, perfumaria, medicamentos e produtos químicos.

Além disso, ele diz que haverá tributação sobre aeronaves e embarcações. “Se você for comprar um iate, ou um jato, você não paga boa parte dos tributos. Estamos tirando esses benefícios”, disse.

O projeto também retira benefícios tributários de empresas de geração de termelétricas no PIS e Cofins, usados na aquisição de carvão e gás. Segundo ele, o setor já foi amplamente beneficiado com o projeto de capitalização da Eletrobras.

“Vamos cortar alguns subsídios de quatro setores que atingem 20 mil empresas ativas. E, em contrapartida, essa redução no imposto das pessoas jurídicas vai beneficiar 1,1 milhão de empresas”, disse.

Em outra frente, o relator informou que também está propondo tributar o recebimento de auxílio-moradia e auxílio-transporte por agentes públicos, como políticos e juízes. Além disso, ele afirmou que está usando a previsão de economia com o corte de supersalários de servidores públicos (aprovado na Câmara nesta terça e que seguirá em tramitação no Senado).

Ainda assim, o relator afirmou que o resultado da proposta será negativo para as contas do governo.

Para 2023, o custo total das novas regras será de R$ 115 bilhões, enquanto os ganhos com as medidas compensatórias é estimado em R$ 85 bilhões. Com isso, a previsão é de uma perda total de praticamente R$ 30 bilhões.

Sabino afirmou que essa perda será compensada por meio do ganho de arrecadação de impostos estimado pelo Ministério da Economia com a recuperação da atividade. Segundo ele, a ideia recebeu o aval de Guedes.

“A nossa aposta é no incremento da arrecadação prevista pelo ministério no segundo semestre. E estamos apostando no Brasil, a gente acredita que essa medida fomenta a economia e traz mais arrecadação”, disse o relator. “Estamos reduzindo a carga de quem produz, gera emprego e empreende no Brasil”.

Sem fazer uma compensação orçamentária, no entanto, o projeto deixa um buraco nos dados da arrecadação que contribui para o desequilíbrio nas contas do Tesouro Nacional —que estão em déficit desde 2014. A dívida pública decorrente do desequilíbrio é paga pelo país como um todo.

Nelson Marconi, coordenador do Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da FGV EAESP, afirma que a proposta vai na direção contrária ao discurso da equipe econômica de necessidade de equilíbrio fiscal.

“É contrário ao ajuste fiscal e [à tarefa de] equilibrar as contas, num momento em que o governo ainda tem que gastar com políticas sociais e precisa gastar mais com investimento público”, afirma. “Está na cara que vai piorar a situação fiscal. É uma loucura”, disse.

Nas últimas semanas, Guedes vinha dizendo a interlocutores que concordaria com eventual perda de receita na reforma do IR, com o argumento de que o expressivo aumento de arrecadação nos últimos meses permite ao governo fazer experimentos na reforma.

Sobre a insuficiência de medidas para neutralizar o efeito fiscal do projeto, técnicos da pasta argumentam que a Lei de Responsabilidade Fiscal permite que reduções de tributação sejam feitas sem compensação, desde que sejam lineares e amplas. A legislação exige que essa renúncia de receita seja prevista no Orçamento e não comprometa o cumprimento da meta fiscal.

De acordo com o deputado, será mantida a proposta do governo de extinguir a isenção de dividendos, com instituição de alíquota de 20% sobre a distribuição desses recursos. Também fica inalterada a faixa de isenção de R$ 20 mil mensais para esses ganhos.

Nesse ponto, apenas será retirado o trecho que prevê a taxação sobre a distribuição de dividendos entre empresas do mesmo grupo.

O relator também afirmou ter eliminado do texto o que chamou de “pacote de medidas acessórias” que vinham sendo criticadas, como o fim da isenção para fundos imobiliários, e ainda aumentou a possibilidade de empresas usarem o chamado lucro presumido (mecanismo de apuração mais simples).

Segundo ele, também foi retirada a previsão de come-cotas (cobrança antecipada do IR) para aplicações em fundos de investimento em infraestrutura, agronegócios e logística e de fundos exclusivos para estrangeiros.

As alterações no texto foram negociadas com o Ministério da Economia e são uma resposta à onda de críticas feitas por empresários à versão inicial enviada pelo governo ao Congresso no fim de junho. O projeto original promovia um aumento agregado da carga sobre as companhias e previa um leve aumento de R$ 6 bilhões na arrecadação no agregado dos próximos três anos.

O governo planeja que o projeto seja aprovado ainda neste ano, para valer em 2022 e gerar respaldo orçamentário para o Bolsa Família em ano eleitoral (graças às medidas de aumento de arrecadação dentro da proposta). Tanto o relator como o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), evitaram prever quando o projeto será votado.

FOLHA DE S. PAULO

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