O tom mais duro contra a inflação adotado pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) no seu comunicado de 16 de junho, no qual elevou a Selic – a taxa básica de juros do País – de 3,50% para 4,25%, aumentou a incerteza e deslocou para cima as apostas do mercado para a trajetória dos juros. Após a decisão, a mediana das estimativas para a Selic no fim de 2021 subiu a 6,50%, segundo a pesquisa Projeções Broadcast. No último levantamento, antes da reunião do Copom, a previsão era de 6,25%.
A estimativa mínima do mercado para a Selic avançou de 5% para 5,75%, enquanto o teto das projeções subiu de 7% para 7,25%. Agora, cinco de 37 instituições pesquisadas estimam que a taxa básica de juros deve ser, ao fim do ano, igual ou maior que 7%. Na pesquisa anterior, apenas uma das 52 instituições financeiras ouvidas previam esse nível de juros.
No seu comunicado, o Copom agiu em linha com as expectativas do mercado ao substituir a menção a uma “normalização parcial” da Selic pela sinalização de “normalização para patamar considerado neutro” – isto é, em um nível que permita manter a inflação estável e mais próxima à meta de 3,5% no fim de 2022. Mas o colegiado ainda foi além e sinalizou a possibilidade de acelerar o ciclo de alta de juros caso haja deterioração das expectativas de inflação para o ano que vem.
Diante da sinalização do BC de que deve elevar novamente a Selic em 0,75 ponto porcentual, 35 de 37 casas preveem aumento dos juros a 5% na próxima decisão de política monetária em agosto. No entanto, duas instituições já esperam alta de juros de 1,0 ponto porcentual diante da afirmação do Copom de que uma deterioração das expectativas de inflação poderia levar a uma “redução mais tempestiva dos estímulos monetários”.
Riscos de inflação
Para o economista-chefe do banco de investimentos Haitong, Marcos Ross, o comunicado do BC sinalizou um equilíbrio de riscos assimétrico, por causa das chances de aceleração da inflação. O analista manteve o cenário de aumento de 0,75 ponto porcentual da Selic em agosto, a 5,0%, e de juros em 6,75% no fim de 2021, mas reconhece que o texto indicou um risco de normalização mais rápida da política monetária.
“Acho que a chance de o Copom reduzir o ritmo não existe mais”, diz Ross, que prevê alta de 6,10% para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2021 e inflação entre 3,50% e 3,60%, próxima ao centro da meta, para 2022. “Existe um risco de aceleração [do ciclo de alta de juros] com base na evolução das expectativas para 2022 e existe uma chance não desprezível de o BC, no meio do caminho, aumentar esse ritmo de alta para 1,0 ponto porcentual.”
Ross avalia que o BC parece ter ficado desconfortável com a expectativa do mercado para a inflação de 2022 em torno de 3,80% e afirma que um aumento dessa previsão a 3,90% ou 3,95% já pode ser suficiente para desencadear a aceleração do ciclo. Por outro lado, o movimento de apreciação do real em relação ao dólar, somada à alta de juros, pode ser suficiente para conter as expectativas de inflação e dar espaço para uma normalização mais lenta da política monetária. Das 37 instituições consultadas, 28 preveem fim do ciclo de alta ainda em 2021.
O ASA Investments já incorporou ao seu cenário-base um aumento de juros de 1,0 ponto porcentual na reunião de agosto. Segundo o economista-chefe da instituição, Gustavo Ribeiro, a sinalização do BC de que uma deterioração das expectativas pode exigir aceleração da normalização praticamente contrata um aumento dessa magnitude em agosto, quando o cenário de inflação e atividade deve estar mais pressionado.
Ribeiro lembra que a inflação acumulada em 12 meses deve atingir o pico em agosto e afirma que essa medida tem forte correlação com as expectativas de inflação.
Já o Banco Inter aposta em um fim do ciclo de alta em outubro, com Selic a 5,75%. A economista-chefe, Rafaela Vitória, explica que essa é a taxa considerada neutra pela instituição, suficiente para manter uma inflação próxima da meta em 2022, para a qual estima 3,60%.
“A inflação corrente contamina as expectativas. Em junho do ano passado, a mediana no Focus (para o IPCA) chegou a ser de 1,5%. Hoje é o contrário, mas a inflação é de oferta, e, não, de demanda”, ressalta Vitória. “O choque está se dissipando, com commodities em queda, câmbio mais favorável e o próprio ajuste da política monetária.”
A economista acrescenta que o ambiente externo, com juros muito baixos em países como os Estados Unidos, é outro elemento que sustenta a Selic em nível menor. Como riscos, a economista-chefe cita a possibilidade de um superaquecimento americano e uma mudança da política de gastos por parte do governo brasileiro. “Se (o governo) fizer um Bolsa Família fora do teto e eleva despesas para 2022, vai ter impacto na demanda, pode ter no câmbio e isso pode ser repassado para a inflação”, afirma.
O ESTADO DE S. PAULO