A pandemia agravou o problema crônico da desocupação e do trabalho precário no Brasil. Os dados atuais da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) indicam que menos da metade (47%) dos brasileiros em idade de trabalhar está trabalhando. Trata-se da menor proporção dos últimos 30 anos. Só não é pior devido às bem-sucedidas medidas do governo para preservar empregos – redução de jornada e suspensão do contrato de trabalho.
Mas, essas medidas assim como o auxílio emergencial vão terminar em breve. Será que o mercado de trabalho do início de 2021 terá fôlego para oferecer as oportunidades de emprego para que boa parte das 65 milhões de pessoas que até hoje recebem aquele auxílio passe a viver da renda derivada do trabalho?
Nos últimos dias, tivemos a boa notícia do início da aplicação da vacina contra o coronavírus na Europa. Em poucos meses, chegará ao Brasil. Isso reanimou a economia. Ainda assim, é pouco provável que, no início de 2021, os brasileiros encontrem trabalho suficiente para manter o seu sustento, o que, no meu entender, torna inevitável a manutenção do auxílio emergencial por, pelo menos, mais três meses. E, sobre isso, não há decisão. Fala-se na expansão do Bolsa Família sem se saber até momento de onde virão os recursos: fim do abono salarial e do seguro defeso, redução de jornada e salários de servidores públicos, suspensão da correção dos benefícios de quem ganha acima de três salários mínimos?
O tempo está correndo muito mais depressa do que as decisões do governo. A situação é aflitiva. A simples redução do auxílio emergencial de R$ 600 para R$ 300 jogou milhões de famílias na pobreza e na extrema pobreza. A interrupção abrupta desse benefício a partir de 31 de dezembro é uma tragédia anunciada – um grave desastre social.
Sei que o problema fiscal é gravíssimo. Mas, o Brasil não pode deixar sua gente morrer de fome. Espera-se uma definição do governo para os próximos dias.
Mas, as incertezas reinam, também, no Poder Judiciário. Num tempo de pandemia que exige ações rápidas, é incompreensível que, até o momento, discute-se no Supremo Tribunal Federal a validade da prevalência do negociado sobre o legislado tão claramente estabelecida na reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017). Centenas de milhares de acordos e convenções coletivas já foram acertadas com base nesse critério ao mesmo tempo que se arrasta no STF o julgamento do Tema 1.046 de repercussão geral (Recurso Extraordinário com Agravo 1.121.633) que pode trazer consequências dramáticas para o cenário trabalhista do Brasil.
Outra fonte de incerteza decorre das Ações Diretas de Constitucionalidade 58 e 59 e das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 5.867 e 6.021 que abordam a correção dos débitos trabalhistas – assunto igualmente tratado pela lei da reforma trabalhista que estabeleceu a TR como parâmetro de reajuste daqueles débitos.
Apesar disso, a Justiça do Trabalho vinha adotando o IPCA-E + 12% ao ano, que dava uma correção em torno de 16%. Era um rendimento tão estratosférico que, para muitos advogados, as ações trabalhistas transformaram-se em valiosos investimentos: quanto mais tempo demoravam, mais ganhavam, o que forçava as empresas a fazer provisões gigantescas que comprometiam os seus investimentos produtivos e a geração de empregos.
Num tempo de tantas dificuldades, é essencial garantir a liberdade de negociações expeditas e a geração de caixa para as empresas honrarem o pagamento de salários e criarem novos empregos. Nesse sentido, a inação do STF acrescenta enorme intranquilidade ao mercado de trabalho.
Quem sou eu para querer pautar o governo e os magistrados? Mas, é visível a necessidade de ações imediatas para eliminar as incertezas criadas pela postergação de decisões que são cruciais para a economia, para as famílias e para os trabalhadores brasileiros.
*Professor da Universidade de São Paulo e presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio-SP. É membro da Academia Paulista de Letras