Folha de S.Paulo
Supremo definiu que voto de ministro aposentado vale em novo julgamento; empresas poderão ter de pagar R$ 80 bi
Cristiane Gercina
SÃO PAULO
A decisão tomada pelo plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) na última quinta-feira (9), de que votos de ministros aposentados são válidos em novos julgamentos sobre um mesmo tema, reabre um debate que pode fazer com que empresas desembolsem cerca de R$ 80 bilhões para pagar contribuição previdenciária sobre o terço de férias de seus funcionários.
O plenário da corte definiu que quando houver pedido de destaque em julgamento virtual com voto de ministro que já se aposentou, o posicionamento é válido e não deve ser descartado em novo julgamento no plenário físico.
A decisão terá impacto sobre o julgamento da revisão da vida toda, que tem voto favorável do ministro Marco Aurélio de Mello, já aposentado, e com a modulação do tema 985, que trata da incidência de contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) sobre o terço constitucional de férias. Há outros 19 processos com relatoria de Marco Aurélio, cujos votos serão considerados nos novos julgamentos.
O cálculo de gastos que vão de R$ 60 bilhões a R$ 80 bilhões a serem desembolsados pelas empresas é da Abat (Associação Brasileira de Advocacia Tributária). A associação busca no Supremo a suspensão da cobrança enquanto o julgamento não chega totalmente ao final. O impasse começou em 2020, quando o STF decidiu que o terço constitucional de férias tem natureza trabalhista e, portanto, incide contribuição previdenciária de 20% sobre ele.
A decisão foi de encontro ao que já havia sido definido pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), em 2014, de que não há natureza trabalhista na verba e, portanto, não há pagamento de INSS. “O número que trazemos é baseado na remuneração do terço de férias, levando em consideração a folha de pagamento de todas as empresas, incluindo a parte de terceiros, e um percentual de 28,5%”, explica Halley Henares Neto, presidente Abat e sócio do Henares advogados.
Segundo ele, a associação pediu ao STF que suspenda todos os processos em andamento na Justiça até que haja modulação sobre o tema. A modulação teve início em 2021, no plenário virtual do Supremo, mas o debate foi interrrompido após pedido de destaque do ministro Luiz Fux, que levará o julgamento a recomeçar no plenário virutal, agora com um voto contrário de Marco Aurélio.
A dívida bilionária calculada pela Abat se refere ao período entre 2014 e 2021, data de publicação do julgamento, quando as empresas deixaram de pagar a contribuição com base na decisão judicial do STJ e voltaram a ser obrigadas após decisão do Supremo.
“A partir daquele momento, as empresas acabaram voltando a recolher. Se não modular, baseado na segurança jurídica, haverá uma quebra do princípio da proteção da confiança do contribuinte no poder Judiciário”, diz Henares Neto.
Para o advogado Rodrigo Prado Gonçalves, sócio nas áreas de reestruturação e insolvência e tributário do Felsberg Advogados, a modulação é necessária para garantir segurança jurídica.
“Se não houver essa modulação após uma decisão que reverte outra, aqueles contribuintes que deixaram de contribuir aquilo que era um crédito, ficam com uma dívida muito alta, especialmente neste momento de crise, inflação e guerra da Ucrânia.”
Ele defende o julgamento presencial. “É de extrema importância para se chegar a um consenso. É louvável e salutar que esse tema seja discutido de forma ampla”, afirma.