No período recente foram publicados alguns artigos com críticas à PEC 45, que propõe uma reforma da tributação indireta centrada na substituição de cinco tributos atuais (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um único Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Uma característica comum a essas críticas é sua inconsistência técnica, o que sugere que o principal objetivo dos autores é impedir o avanço da reforma tributária, apelando a qualquer argumento, por mais frágil que seja. A análise feita a seguir deixa claro esse ponto.
Um primeiro argumento contra a PEC 45 é de que a adoção de um imposto sobre o consumo com alíquota uniforme estimularia a pejotização, ou seja, a substituição de empregados pela contratação de pequenas empresas prestadoras de serviços – pois nesse modelo a empresa que contratou o PJ teria direito a recuperar o crédito de IBS, o que reduziria seu custo. Tal argumento é totalmente equivocado, pois no IBS só é possível haver crédito (para o contratante) se houver recolhimento do imposto na etapa anterior (pelo PJ), o que significa que é impossível reduzir o montante de imposto devido via pejotização. Ao contrário, o que estimula a pejotização é o sistema atual, no qual um PJ pode recolher PIS-Cofins à alíquota de 3,65% e gerar um crédito de 9,25% para o contratante.
Um segundo argumento é de que a cobrança no destino nas operações interestaduais prevista na PEC 45 estimularia a “fraude carrossel” e levaria ao acúmulo de créditos do imposto no Estado de origem. Tal crítica revela completo desconhecimento da PEC 45, pois tais problemas só poderiam ocorrer se o IBS fosse cobrado individualmente por cada Estado e as operações interestaduais estivessem sujeitas à alíquota zero. O modelo proposto da PEC 45, no entanto, prevê arrecadação centralizada e a incidência cheia do imposto nas transações interestaduais, o que inviabiliza a “fraude carrossel” e evita o acúmulo de créditos.
Outro argumento que revela total desconhecimento da PEC 45 é o de que a transição proposta para a distribuição da receita do IBS para os Estados e os municípios levaria a um aumento da carga tributária. O texto é absolutamente claro ao definir que o financiamento da transição se dá entre os próprios entes da Federação, ou seja, aqueles cuja participação no total da receita cresce financiam – temporariamente – aqueles cuja participação diminui. Vale lembrar que, por causa do impacto muito positivo sobre o crescimento da reforma, todos os entes da Federação tendem a ser beneficiados no longo prazo.
Em quarto lugar, argumenta-se que a rápida aprovação da reforma tributária seria injustificável no atual contexto, pois o setor de serviços, já prejudicado pela covid, seria ainda mais afetado pela reforma tributária. Mesmo desconsiderando os estudos que mostram que o setor de serviços tende a ser beneficiado pela reforma, o argumento está incorreto. A principal razão é que a aprovação da PEC 45 não teria qualquer impacto setorial antes de três ou quatro anos (considerando o tempo de implantação e o período de teste). Ou seja, não só não há sobreposição entre os efeitos da pandemia e os da reforma tributária, como o impacto da aprovação da PEC 45 sobre as expectativas e os juros de longo prazo poderia ajudar muito na saída da crise atual.
Por fim, há alguns argumentos contra a PEC 45 que beiram o esdrúxulo. É o caso da afirmação de que a regulamentação do IBS por lei complementar não contemplaria os municípios, pois estes não estão representados no Congresso Nacional por um “Senado municipal”. É o caso, também, do argumento de que não existem estudos sobre o impacto da aprovação da PEC 45, quando o Centro de Cidadania Fiscal colocou à disposição dois estudos estimando esses impactos. O mais estranho é que as pessoas que fazem essa crítica já propuseram mudanças no sistema tributário sem apresentar qualquer estudo sobre o seu impacto.
*SÃO DIRETORES DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL
O ESTADO DE S. PAULO