Por meio de uma espécie de perversidade seletiva, o impacto da pandemia sobre o mercado de trabalho, ruim para milhões de trabalhadores e suas famílias, tem sido mais intenso e agressivo para determinados grupos. São os jovens e os trabalhadores com ensino médio incompleto.
Os números mostram clara deterioração generalizada do mercado de trabalho. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua do IBGE, em janeiro havia 86,1 milhões de pessoas ocupadas. É bem mais que o total ocupado em julho do ano passado (80,3 milhões). Mesmo assim, como mostrou estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), “o mercado de trabalho brasileiro segue deteriorado”.
O fato de o total de pessoas ocupadas continuar bem abaixo do registrado antes da pandemia (94 milhões em janeiro de 2020) bastaria para comprovar isso.
A taxa de desocupação de 14,1% já é alta, mas teria sido ainda mais alta se não tivesse ocorrido forte contração da força de trabalho, que recuou 5,4% no último trimestre móvel mostrado pela Pnad. A redução se deveu ao fato de que pessoas que, por algum motivo, não procuraram emprego em determinado período foram retiradas da força de trabalho. Se não tivesse havido essa exclusão, a taxa de desocupação estaria perto de 20%.
Mas há alguns aspectos que mostram também uma deterioração seletiva. Para determinados grupos, o desemprego tem sido mais intenso do que para outros. Não é um fato surpreendente para estatísticos e analistas do mercado de trabalho, mas nem por isso é menos grave.
“O impacto da pandemia tem sido mais prejudicial para os indivíduos mais jovens e os menos escolarizados”, diz a técnica do Ipea Maria Andréia Parente Lameiras, autora do estudo. No último trimestre de 2020, a taxa de desocupação dos trabalhadores com idade de 18 a 24 anos alcançou 29,8%, com 4,1 milhões de jovens sem emprego. Entre os trabalhadores com ensino médio incompleto, passou de 18,5% para 23,7% entre os últimos trimestres de 2019 e 2020.
As vagas abertas pela recuperação da economia não deverão ser suficientes para abrigar todos os desempregados e aqueles que, diante das perspectivas, sairão da inatividade e voltarão à força de trabalho. E, mais uma vez, os trabalhadores jovens e com menor escolaridade ficarão para trás.
O ESTADO DE S. PAULO