A possibilidade de elevar o depósito compulsório — o montante que os bancos são obrigados a deixar no Banco Central — para obter recursos a fim de criar um programa de microcrédito para os trabalhadores informais, depois que terminar o auxílio emergencial, não foi bem recebida pelos bancos, devido ao custo que isso representaria.
Na prática, diz um executivo de um grande banco, quanto maior o compulsório, maior o custo de captação das instituições. A possibilidade de elevar o valor dos depósitos compulsórios para bancar um programa de microcrédito, que teria recursos de até R$ 25 bilhões, foi noticiada na quinta-feira pelo jornal O Estado de S.Paulo.
Segundo esse executivo, isso vai se refletir em maiores taxas de juros cobradas dos clientes. Ele avalia que são os bancos públicos (Caixa e Banco do Brasil) que trabalham mais com microcrédito. Os bancos privados são mais cautelosos quanto a esse tipo de empréstimo, exatamente por falta de garantias.
— O aumento do compulsório pode resultar em redução do volume de crédito e possível aumento de spreads bancários, o que é ruim tanto para os bancos como para quem busca acesso a crédito — ressalta Leo Monteiro, analista de investimentos da Ativa Investimentos.
O analista de bancos da consultoria Eleven Financial, Carlos Daltozo, observa que o caminho lógico para aumentar a oferta de empréstimos seria reduzir compulsório e liberar recursos para o sistema. Não o contrário.
— Não faz sentido reduzir o dinheiro em circulação e “carimbar” a parcela a ser recolhida no BC para empréstimos de microcrédito. Os bancos podem preferir deixar esse dinheiro parado no BC, que é remunerado a 2% ao ano, do que correr um risco elevado nas operações de microcrédito — diz Daltozo.
Cenário desfavorável
Embora a ideia seja não onerar o governo, que já está com a situação fiscal difícil e não tem recursos para prolongar auxílios sociais, trata-se de uma medida ruim, avalia Daltozo. O auxílio emergencial foi dado a fundo perdido, numa situação de emergência, e destinado ao consumo. O microcrédito precisa de garantias, observa.
Um especialista em setor financeiro também afirma que o fluxo normal para aumentar a oferta de crédito seria reduzir ainda mais a parcela de compulsório dos bancos para ampliar o bolo de recursos destinado ao crédito, não o inverso. Além disso, mesmo liberando mais recursos para o crédito, não há garantia de que os bancos privados vão realmente destinar esse dinheiro ao microcrédito.
De acordo com esse especialista, os bancos olham sobretudo para as garantias, e o cenário atual, com desemprego elevado, é desfavorável. Ele disse ainda que será preciso ver que taxa de juros será cobrada.Procurada, a Febraban disse que não tem conhecimento e não comenta futuros programas oficiais de assistência.
Mas a notícia sobre o aumento de compulsórios afetou os papéis dos bancos na quinta-feira. As ações ordinárias (ON, com direito a voto) do Banco do Brasil recuaram 4,19%. Já os papéis preferenciais (PN, sem voto) de Bradesco e Itaú Unibanco caíram, respectivamente, 3,95% e 2,44%.
O GLOBO