Covid dá direito a estabilidade no trabalho? Justiça vai decidir

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Folha de S.Paulo Diagnosticado com Covid-19 em maio de 2020 e depois em junho de 2021, João Carlos, 48, ainda vive sequelas da contaminação pela doença, como fraqueza nas pernas e cansaço. Motorista dos Correios, ele calcula atender uma média de 130 pessoas por dia, entregando encomendas de um lado a outro da cidade. Para ele, não há dúvida de que sua contaminação pelo vírus ocorreu como consequência de seu trabalho, ou seja, foi uma doença ocupacional. Não foi como a empresa entendeu. Quando encaminhou o atestado médico, João Carlos, que pede para não ser identificado pelo nome verdadeiro, solicitou que os Correios emitissem um documento chamado CAT (comunicado de acidente de trabalho). Esse documento é tido como o primeiro passo para que o benefício concedido pelo INSS seja classificado como acidentário, termo que identifica a origem do adoecimento no trabalho. A diferença mais importante entre uma benefício por incapacidade comum e um acidentário é que esse último garante estabilidade de 12 meses no emprego após o retorno. Os depósitos do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) também são mantidos. Na época, ele foi informado pela empresa de que o CAT não seria emitido, pois não era possível determinar o local da contaminação. Ele poderia, por exemplo, ter pego no transporte coletivo. “Comprei meu desinfetante e minha máscara. Naquela época, as máscaras estavam muito caras. Comprei duas N95 [tipo de máscara que promete proteção maior] e revezava com as que eles deram, mas é uma máscara de pano ridícula”, diz. Os Correios dizem que as máscaras fornecidas aos funcionários seguem descrição técnica e orientações de órgãos reguladores. Segundo a empresa, elas podem ser confeccionadas em três tipos de tecido e seguem especificações mínimas de tamanho. “Desde o início da pandemia, os Correios têm atuado para proteger seus empregados, acompanhando a situação de saúde de todos e prestando o apoio necessário ao seu quadro no combate à covid-19”, diz a empresa, em nota. A briga de João Carlos com os Correios não é única no Brasil. Levantamento da Datalawyer para a Folha aponta para 12,9 mil processos trabalhistas discutindo Covid-19 e doença ocupacional já nas petições iniciais. Juntas, essas ações somam R$ 3,13 bilhões. Setores como bancos, estabelecimentos de saúde, administração pública, abate de aves, transporte rodoviário e limpeza em prédios e em domicílios aparecem como os principais demandados. Na Justiça do Trabalho, há decisões dos dois tipos: das que reconhecem o enquadramento como doença do trabalho e das que concluem pela falta de nexo causal, termo técnico para o conjunto de indícios de que a atividade exercida e a doença estão ligados. No caso dos Correios, levantamento feito pelo Sintect-SP (sindicato dos trabalhadores) mostra um “placar” apertado. De 14 ações –os processos são iniciados por unidade, como centros de entrega ou de distribuição, por exemplo– com pedido de emissão do comunicado de acidente de trabalho por Covid-19, houve decisão contrária em 8. Outras 6 tiveram sentença pela comunicação de acidente de trabalho. Em junho, a primeira dessas ações em que os trabalhadores conseguiram o enquadramento como doença ocupacional chegou ao TST (Tribunal Superior do Trabalho). Desde o dia 3 de agosto, o caso aguarda voto do ministro José Roberto Freire Pimenta, da 2ª turma, que será o relator. Entre os advogados trabalhistas, há grande expectativa quanto ao entendimento do TST em relação a esse caso. A decisão não criará uma vinculação a outros processos do tipo, mas poderá ser a primeira decisão de um tribunal superior, criando jurisprudência contra ou a favor do entendimento. Em 2020, o governo Jair Bolsonaro (sem partido) chegou a tentar dificultar o enquadramento. Um artigo em uma medida provisória dizia que casos de “contaminação pelo coronavírus (Covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.” Na prática, o artigo não impedia a classificação como doença do trabalho, mas tornava-o mais difícil. Levado ao STF (Supremo Tribunal Federal), o dispositivo foi considerado inconstitucional. Depois, a MP caducou, ou seja, não foi votada por Câmara e Senado em 120 dias e perdeu a validade. No Supremo, o ministro Alexandre de Moraes considerou que prever que casos de contaminação pelo coronavírus não seriam considerados ocupacionais ofenderia os trabalhadores de atividades essenciais que continuam expostos ao risco. Na avaliação do advogado Fabrício Máximo Ramalho, que representa o Sintect-SP, em casos de contaminação de trabalhadores de setores essenciais deve haver a presunção de que o adoecimento está ligado ao trabalho. Para ele, um dos fatores que contribui para essa conclusão é a duração das jornadas de trabalho. “O trabalhador passa mais tempo fora de casa, na atividade laboral, do que em qualquer outro lugar”, afirma. Além disso, devem ser considerados os esforços –ou a ausência deles– para conter o risco de contaminação. Em uma das sentenças favoráveis aos trabalhadores dos Correios, o juiz Willian Alessandro da Rocha, da Vara do Trabalho de Poá, escreveu que “é impossível provar o momento e o local onde os empregados contraíram a doença.” Porém, ele considerou que a contaminação de seis trabalhadores do mesmo centro de distribuição, registradas todas na mesma época, somada à falta de medidas preventivas, permitia estabelecer o nexo causal do adoecimento com o trabalho. Por outro lado, no TRT-18 (Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região), em Goiás, um técnico de enfermagem que não atuava em ambiente hospitalar não conseguiu o enquadramento. Pesaram para a decisão o fato dele atuar em cuidados domiciliares e de sua esposa ser enfermeira. Ela trabalhava em dois hospitais e foi diagnosticada antes dele. A advogada Letícia Ribeiro, do Trench Rossi Watanabe, diz que a recomendação para as empresas é para que elas redobrem os protocolos de saúde e segurança, de modo que seja possível provar que todos os cuidados disponíveis foram adotados. “O que as empresas podem fazer é ter como provar que foram diligentes ao tratar do assunto.”

Projeto que regulamenta lobby no Brasil é escanteado por Bolsonaro

Plano anticorrupção previa prazo até março para projeto de lei; Arthur Lira defende regulamentação Folha de S.Paulo Uma das prioridades dentro do plano anticorrupção lançado pelo governo federal no fim de 2020, o projeto que regulamenta o lobby no Brasil foi deixado em segundo plano pela gestão Jair Bolsonaro (sem partido). Desde março, o governo vem adiando o envio de um texto sobre o tema ao Congresso. No bastidor, há relatos de um embate entre a CGU (Controladoria-Geral da União) e o Ministério da Economia para definir quem teria controle das informações envolvendo as atividades de lobby, consideradas de interesse para ajudar a desenhar políticas, por exemplo. O plano anticorrupção estabeleceu prazo até 15 de março deste ano para a apresentação de um projeto de lei para regulamentar a representação privada de interesses, atividade também conhecida como relações institucionais e governamentais ou lobby. Na apresentação do plano, o governo afirma que é necessária a atuação de indivíduos e grupos de interesse com o objetivo de influenciar decisões do setor público. Nesse contexto, argumenta que é preciso haver transparência e ética para existir uma separação entre a representação legítima e atividades obscuras e corruptas. Com o descumprimento do prazo, o governo prometeu a representantes do setor que acompanham a discussão enviar o texto até 31 de maio. Depois, o envio foi previsto para o fim de setembro. “A gente está na expectativa de que até o fim do mês, se houver o cumprimento desse segundo adiamento, saia alguma coisa”, afirma Carolina Venuto, presidente da Abrig (Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais).

Reforma do Imposto de Renda terá texto alterado pelo Senado, indica Pacheco

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Ao contrário da Câmara, que votou o texto ‘na raça’, presidente do Senado quer uma reforma mais amadurecida e discutida entre os senadores; sinalização trouxe alívio a vários setores, entre eles o empresarial O Estado de S.Paulo Se a polêmica reforma do Imposto de Renda avançar no Senado Federal, o texto será bastante modificado. Essa é a percepção de interlocutores do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que encaminhou o projeto para a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Ele quer uma reforma mais amadurecida e discutida entre os senadores. O projeto também deverá passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Pacheco já avisou que temas densos vão tramitar na Casa e não seguirão direto para o plenário para permitir o debate amplo, diferentemente do que ocorreu na Câmara, onde a reforma já foi votada direto pelos deputados. O senador quer retirar todo o “excesso” ruim do projeto para que chegue no plenário “amortecido” com o consenso. Essa indicação de Pacheco deu alívio ao setor empresarial, tributaristas e representantes dos Estados e municípios de que a votação não será no atropelo, de forma açodada, como ocorreu na Câmara, em que o presidente Arthur Lira (PP-AL) pautou “na raça” o projeto. Lira tem um trunfo que é a tramitação do Refis (parcelamento de débitos), cujo projeto é de interesse de Pacheco e já foi aprovado pelo Senado, faltando a votação na Câmara. Os Estados também já se mobilizam junto aos senadores para mudar o texto. O secretário de Fazenda de Pernambuco, Décio Padilha, disparou nesta segunda-feira mensagem aos colegas afirmando que “a luta agora será no Senado”. A mensagem ressalta estudo da Instituição Fiscal Independente (IFI) apontando que o texto aprovado na Câmara traz perdas bilionárias para os cofres regionais. Um dos pontos reforçados por Pacheco para que a pautas econômicas avancem no Senado é que tenham bom conteúdo, sejam de interesse do País e não apenas do ministro da Economia, Paulo Guedes, como a versão do projeto aprovada pelos deputados. Para reforçar a interlocução, Guedes nomeou o atual secretário da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação, Jorge Lima, para o cargo de assessor especial da pasta. Com a mudança, o Ministério da Economia disse que Lima reforçará o diálogo com o setor produtivo e apoiará a condução das reformas estruturantes no Congresso.

Falta de neutralidade na tributação da renda do trabalho tem muitas consequências

O bom sistema tributário é aquele em que a organização do trabalho é a mesma sem e com tributação O Estado de S.Paulo – Opinião Bernard Appy Em artigo publicado recentemente no Valor Econômico (Guerra santa contra o lucro presumido), o professor Marcos Cintra defende que não faz sentido comparar a tributação da atividade unipessoal dentro do regime de lucro presumido (LP) com a tributação de um trabalhador assalariado. Segundo o artigo, a relação de trabalho possui várias características que a distinguem da atividade autônoma e sem subordinação do sócio da empresa do LP. Do meu ponto de vista, a posição de Cintra está completamente equivocada. O argumento mais importante é que a tributação não deveria distorcer a forma de organização do trabalho. Para entender esse ponto, é útil pensar num cenário hipotético em que não há tributação. Neste cenário, as empresas vão decidir se, para a realização de um serviço, vão utilizar seus próprios empregados ou se contratarão o serviço autônomo e sem vínculo do sócio de uma empresa – já consideradas todas as diferenças resultantes da legislação trabalhista. Em um sistema tributário bem desenhado, a tributação da renda deveria reduzir proporcionalmente a renda disponível do empregado e do sócio da empresa, mas não deveria alterar a forma de contratação observada no cenário sem tributação. Não é isso que ocorre no Brasil. No Brasil, o trabalho do empregado formal de alta renda é muito mais tributado que o trabalho do sócio de uma empresa do LP que opera com alta margem de lucro. A diferença pode ser monumental, com a alíquota marginal da tributação da renda variando de cerca de 40% para um empregado formal com salário superior a R$ 6,5 mil a 13,6% para um sócio de empresa do LP que opera com margem de lucro de 80% e tem renda mensal de R$ 200 mil. Tal desequilíbrio decorre, em parte, de diferenças na incidência de tributos sobre a renda, mas também do recolhimento, pelo empregador, de contribuição sobre a folha, que – quando a remuneração do empregado excede o teto do salário de contribuição (R$ 6,4 mil) – é equivalente a um tributo sobre a renda, pois não gera benefício para o trabalhador. Vale notar que a menor tributação do sócio da empresa do LP não se verifica apenas em relação ao trabalhador assalariado, mas também em relação ao profissional autônomo que opera como pessoa física, cuja tributação é muito semelhante à do assalariado (inclusive no recolhimento de contribuição para a previdência pela empresa contratante). Neste caso, não há sequer como argumentar que a diferença se deve às características de subordinação e habitualidade do trabalho assalariado. Essa falta de neutralidade na tributação da renda do trabalho tem muitas consequências. A mais aparente é a absoluta iniquidade, com a alíquota média efetiva incidente sobre a renda de um sócio de empresa do LP com renda de R$ 200 mil/mês sendo cerca de 40% da alíquota incidente sobre a renda de um trabalhador assalariado com renda de R$ 20 mil/mês. Mas a falta de neutralidade também tem consequências relevantes para a eficiência e o crescimento econômico. Ao impor uma tributação muito menor sobre a renda do sócio da empresa do LP relativamente à renda do empregado formal e do autônomo PF, o sistema brasileiro leva a que uma parcela maior do trabalho seja prestada por sócios de empresas do LP, ainda que isso seja menos produtivo. A empresa com vários empregados pode ser mais eficiente na obtenção de clientes, no compartilhamento de custos (p. ex., com secretária e aluguel), na distribuição de tarefas e na qualificação de seus trabalhadores. Ainda assim, o sistema tributário brasileiro induz a prestação do mesmo serviço, de forma autônoma e menos eficiente, pelo sócio de uma empresa do LP. O bom sistema tributário, como mencionado anteriormente, é aquele em que a organização do trabalho é a mesma sem e com tributação. É por conta da falta de compreensão de questões simples como essa que, no Brasil, se defendem políticas que fazem com que o País seja injusto e cresça menos do que poderia. *DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL

Após fechar fábricas no Brasil, Ford adota produção terceirizada de veículos

Empresas brasileiras fornecem peças para a produção O Estado de S.Paulo Após decidir fechar suas três fábricas no Brasil e passar a ser importadora, a Ford resolveu adotar na América do Sul a mesma estratégia que o grupo americano tem em outras regiões na produção de veículos comerciais – segmento que vem crescendo no mundo todo –, que é a terceirização da produção. Assim como faz na China, na Turquia e na Rússia, a Ford fez parceria com a empresa Nordex, do Uruguai, para produzir a Transit em versões furgão e van. Há empresas brasileiras fornecendo peças para a produção, mas o número não foi revelado ontem, quando a montadora apresentou o veículo à imprensa local. O grupo criou no País uma divisão específica para a venda de comerciais leves. A Transit estará à venda no País ainda neste ano, primeiro na versão minibus para transporte escolar e turismo. No próximo ano, chega a versão furgão, para transporte de cargas. A Transit será vendida nos cerca de 110 pontos de venda de concessionárias da marca que foram mantidos após a reestruturação que se seguiu ao anúncio do fim das operações locais. É menos da metade do que a marca tinha quando vendia automóveis, ou 287 revendas. O vice-presidente da Ford América do Sul, Rogelio Golfarb, explica que um dos motivos para a alta procura de furgões em todos os mercados é o crescimento das vendas online, principalmente após o início da pandemia de coronavírus. A empresa estima um mercado de 66,6 mil minibus e furgões na América do Sul neste ano (alta de 15% em relação a 2020), e de 33,1 mil para o Brasil (alta de 7% ante o ano passado). A decisão pela parceria com a Nordex, segundo Golfarb, é o padrão da qualidade na produção em volumes mais baixos de veículos, a equação de custos e a experiência no ramo. O grupo já produz o Peugeot Expert, o Citroën Jumpy e o Kia Bongo. Com fábrica na região, a Ford também continua se beneficiando do acordo de redução de tarifas do Mercosul, assim como o livre comércio no futuro. As duas empresas compartilharam investimento de US$ 50 milhões em uma linha exclusiva para a produção da Transit, veículo que é líder em vendas no segmento nos EUA e na Europa. A Ford afirma que a vantagem da Transit em relação aos concorrentes será um inédito serviço de conectividade que permitirá acesso rápido a atendimentos para manutenção, resolução remota de problemas, envio de reboque, entre outros. Entre os concorrentes, estão o Renault Master, a Mercedes-Benz Sprinter, o Hyundai HR, o Iveco Daily e o BYD T-3, o único na versão elétrica. Pelos dados da Fenabrave (representa as concessionárias), foram vendidos até agosto 22.122 furgões, 15,8% a mais em relação ao mesmo período de 2020. A Ford negocia a venda das três fábricas em São Paulo e na Bahia, mas não recebeu nenhuma proposta efetiva de compra.

Cordeiro em pele de cordeiro

Neste ambiente, não há a menor possibilidade de o País avançar na agenda de reformas O Estado de S.Paulo – Opinião Winston Churchill costumava referir-se a Clement Attlee, líder trabalhista, por meio dessa versão modificada da conhecida expressão “lobo em pele de cordeiro”. A alcunha ajeita-se perfeitamente ao perfil do presidente Jair Bolsonaro. Ele não governa a partir de um ideário e de um plano construído com o Congresso Nacional, como se espera no modelo presidencialista vigente. Planta o caos, cria canais diretos com seus seguidores mais radicais, ignora a importância do equilíbrio institucional e, quando julga ter passado do tom, volta atrás. Neste ambiente, não há a menor possibilidade de o País avançar na agenda de reformas. A direção simetricamente oposta é a mais provável: retroceder nas áreas tributária, social, econômica e fiscal. A famigerada carta veiculada após as manifestações do 7 de setembro não é senão um recuo, mas com prazo de validade. Enquanto isso, o País padece em meio à inflação de 10%, ao desemprego e à ausência de rumo em todas as áreas. Perde-se tempo e vidas continuam sendo ceifadas pela pandemia e pela crise econômica e social. Entretanto, o que importa ao chefe do Poder Executivo e a seus auxiliares é plantar tempestades para, então, acenar com uma aparente diástole. Ocorre que essa instabilidade não passa incólume. A economia vai crescer abaixo de 2% no ano que vem. No segundo semestre de 2021, deve ficar estacionada, no melhor dos cenários – isto é, se não houver uma crise energética e hídrica, como muitos já preveem. O argumento de que o Supremo Tribunal Federal (STF) ou mesmo o Congresso impediriam o presidente de executar seus projetos para o País não tem fundamentação lógica ou empírica. As instituições trabalham dentro das suas atribuições, de modo que o fracasso retumbante na economia, na área social, na saúde, nas contas públicas, na política ambiental e na política externa é do governo. O centrão apoia Bolsonaro, mas a agenda é tão mal-ajambrada que nenhum tema relevante proposto pelo Executivo avançou. Quando conseguiu aprovar uma PEC, como no caso da Emenda 109, foi para piorar o regramento do teto de gastos. Para ter claro, a regra a acionar medidas de ajuste fiscal simplesmente não tem como ser ativada. Gastou-se capital político, é claro, e agora restou apresentar um Orçamento fake para 2022. No lugar de preocupar-se com entregar resultados à população, a preferência é por conduzir o País em toada beligerante, alimentando o ódio à corrupção (dos outros) como combustível para segurar-se na corda bamba da baixa popularidade. Não adianta. No fim do dia, o que importa para as pessoas é se conseguirão voltar ao mercado de trabalho, botar comida na mesa, enfim, ter o mínimo para viver com dignidade. A súcia de destemperados que foi às ruas no feriado da Independência, em sua maioria, nem sabia o que estava fazendo lá. Bradava palavras de ordem para um Bolsonaro que já não existe ou, melhor dizendo, que nunca existiu. Mas o Brasil real – expressão de Machado de Assis que também Darcy Ribeiro e Ariano Suassuna utilizavam – sofre e imagina, um dia, poder melhorar sua situação econômica. As pessoas, no fundo, querem ser felizes. Os arroubos de autoritarismo do presidente da República já não encontram o mesmo eco no mercado. Os donos do poder financeiro perceberam que não haverá progresso com alguém que, cotidianamente, deixa em aberto o futuro. Sobe ao palanque para atacar o ministro Alexandre de Moraes num dia, para, então, elogiá-lo logo depois. Em qual Bolsonaro depositar confiança? A ameaça golpista é real, mas até o momento não encontrou respaldo na sociedade civil e no seio das instituições, sobretudo das Forças Armadas. Bolsonaro tenta o improvável e, sim, há uma chance de conseguir. Esbarra, contudo, na realidade de um governo anódino, que não prospera e não faz prosperar. O resultado é muito direto: o vaivém do discurso e a paralisação decisória, incluída aí a incompetência para lidar com o Congresso, a política e os diversos setores representativos da sociedade. É possível arguir tratar-se de um lobo, mesmo, em pele de ovelha. Mas isso requereria certa sofisticação do mandatário ou, ao menos, de seus assessores próximos, além de algum tipo de planejamento, de visão de país e de mundo. Bolsonaro não os tem. Continua a ser o deputado apagado que ganhou adeptos pendurando fotografias de ex-presidentes militares no gabinete e exaltando Brilhante Ustra. Aquele mesmo que passou quase três décadas no Congresso e nada aprendeu. Pior, nada de bom produziu. Chegou ao posto máximo da República na esteira de uma insatisfação geral com “tudo isto que aí estava”. O presidente é um lobo solitário perigoso, potencialmente, mas, até agora, um cordeiro em pele de cordeiro. Cabe às forças democráticas, de lado a lado, espantar os abutres do meio de campo e garantir uma arena possível para o pleito do ano que vem. DIRETOR-EXECUTIVO DA IFI, VENCEDOR DO PRÊMIO JABUTI, EM 2017, COM O LIVRO ‘FINANÇAS PÚBLICAS: DA CONTABILIDADE CRIATIVA AO RESGATE DA CREDIBILIDADE’ (RECORD, 2016).

Setor de logística cresce durante a pandemia e tem milhares de vagas de emprego abertas em SP

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G1 Link para a reportagem O setor de logística foi um dos que mais cresceu durante a pandemia. Só na cidade de Jundiaí, que concentra um dos maiores polos de logística do estado, há quase duas mil vagas abertas no setor. Ainda assim é pouco diante dos quase 3,6 milhões desempregados no estado de São Paulo, de acordo com o IBGE. É o maior número desde o primeiro trimestre de 2020. Entre as explicações para o crescimento no setor estão o aumento das vendas online e a necessidade de criar uma cadeia de distribuição de insumos de saúde. De acordo com o economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Renan Gomes de Pieri, o crescimento do setor de Logística ainda deve se manter. “Tecnologia, logística, saúde são provavelmente e os setores que nos próximos meses e até anos devem ter um desempenho melhor, em termos de geração de empregos”. O bom desempenho deve se manter por conta da chegada de datas importantes para o comércio e para a indústria de maneira geral, como o Dia das Crianças em outubro, a Black Friday em novembro e o Natal, em dezembro. As dez regiões do estado que mais concentram empresas de logística são Cajamar, Jundiaí, Guarulhos, Campinas, Embu das Artes, Barueri, Sorocaba, Atibaia, São Paulo e ABC. Cajamar, na Grande São Paulo, e Jundiaí são vizinhas. A explicação para a concentração de empresas de logística é que elas ficam próximas de duas grandes rodovias, a Anhanguera e a Bandeirantes, além do Rodoanel. Estão perto da capital paulista, com fácil acesso tanto ao interior, quanto à capital e até ao porto de Santos. Além disso, são locais com terrenos ainda com um preço acessível. Já a região do ABC, que está em décimo lugar, tem potencial para crescer. Uma empresa de logística, inclusive, deve se instalar no terreno da montadora Ford, que deixou São Bernardo do Campo em outubro de 2019.