Guedes quer elevar teto de isenção de cobrança de dividendos para não mexer com dentista e médico
O ministro da Economia, Paulo Guedes, sinalizou nesta quinta-feira, 22, que está disposto a aceitar elevar o teto de isenção na tributação de lucros e dividendos para não penalizar profissionais liberais e a classe média. O texto da reforma tributária do Imposto de Renda enviada pelo governo prevê uma alíquota de 20% na tributação de lucros e dividendos e um teto de isenção de R$ 20 mil para acionistas de pequenas e médias empresas. “Se precisar subir mais um pouquinho, sobe mais um pouco. Não quero mexer com dentista, médico, profissional liberal, não queremos atingir a classe média, nada disso. Queremos tributar os mais afluentes e desonerar as empresas e assalariados”, afirmou Guedes, em evento promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), junto com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Essa não deve ser a única mudança na tributação de lucros e dividendos – que hoje são isentos de imposto. Além do aumento do teto, o relator na Câmara, Celso Sabino (PSDB-PA), disse em entrevista ao Estadão que estuda mudanças e até uma tabela progressiva (ou seja, alíquotas diferentes a depender do valor recebido), com alíquota até maior do que os 20% originalmente propostos. Guedes voltou a reconhecer que a primeira versão da reforma do Imposto de Renda, que recebeu fortes críticas do empresariado, tinha erros na calibragem de alíquotas. “Não temos compromisso com o erro”, disse ele, sugerindo que a culpa seria da equipe da Receita Federal pela proposta – segundo ele, uma “máquina treinada para arrecadar”. Ele manifestou confiança no avanço da agenda econômica no Congresso e previu a aprovação, até o fim do ano, da privatização dos Correios e da reforma administrativa (que reformula o RH do Estado, com novas regras para contratar, promover e demitir os servidores públicos), além da reforma tributária. Ele voltou a defender o fatiamento da proposta em etapas. “Teria sido grande equívoco entrar na tal reforma tributária ampla. Não seria aceita por 5 mil prefeitos”, disse Guedes. Segundo ele, o apoio de governadores só teria sido conquistado ao custo da criação de um fundo de R$ 500 bilhões para compensar Estados por eventuais perdas – um “abuso”, em sua avaliação. Guedes afirmou que foi necessário “reduzir a ambição”, deixando temas como a desoneração da folha de pagamentos (redução dos encargos cobrados sobre os salarios dos funcionários) para depois. “Vamos dar primeiro passo, aprovar CBS, IVA federal, e convidar governadores a aderirem à PEC no Senado”, disse o ministro. Citando o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), ele disse que “um boi se come aos bifes”. O ministro voltou a insistir hoje na ideia de criação de um imposto sobre transações como forma de desonerar as empresas de encargos sobre a folha de pagamentos que representam, na avaliação dele, uma “arma de destruição em massa de empregos”. “A hipocrisia de se esconder atrás do pobre é prática no Brasil. Foi o que aconteceu com o imposto sobre transações. Se todo mundo pagasse imposto de transação, desoneraríamos a folha”, disse. Para ele, os encargos trabalhistas, em conjunto com o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), são um dos motivos da desindustrialização do Brasil. “Sou democrata, não só um liberal, entendo o recado e o Congresso é soberano”, comentou o ministro. A proposta de desonerar a folha salarial por meio de um imposto que tem ampla resistência no Congresso por ser visto como uma reedição da antiga CPMF, o imposto do cheque, que vigorou por dez anos, entre 1997 e 2007. “Seria fácil desistir, mas não temos compromisso com popularidade, e, sim, com fazer o certo.” Guedes comemorou o aumento da arrecadação e usou esse argumento para defender o corte de 12,5 pontos percentuais no Imposto de Renda cobrado das empresas, o que pode abrir um rombo de R$ 30 bilhões nas contas públicas. Guedes reafirmou que esse impacto será absorvido pela recuperação mais rápida da economia, que deve levar a uma arrecadação R$ 200 bilhões maior do que o previsto neste ano. “Com arrecadação de R$ 200 bilhões acima, será que não posso arriscar R$ 30 bilhões”, questionou. O ESTADO DE S. PAULO
Se o Centrão consentir, governo deveria votar a reforma do IR em um momento mais oportuno
Rogério L. F. Werneck* Salta aos olhos a escalada de dificuldades que vêm sendo enfrentadas pela condução da política econômica nos últimos meses, em decorrência da perda de ascendência do governo sobre o Congresso. Basta ter em conta episódios recentes mais marcantes para discernir os contornos de um processo, cada vez mais claro, de avanço do Centrão sobre a condução da política econômica. Não é que o governo tenha perdido o controle do Congresso para a oposição. Longe disso. O que se observa é algo bem distinto. Fragilizado como está, o governo perdeu ascendência sobre o bloco parlamentar que supostamente lhe dá apoio. Matérias de seu interesse acabam, sim, sendo aprovadas pelo Congresso. Mas sempre à moda do Centrão. O governo já não tem como impedir que sejam brutalmente desfiguradas. É o que fica claro quando se tem em conta os episódios do orçamento secreto, da pilhagem da privatização da Eletrobrás e, agora, da aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) com amplo espaço para reedição do orçamento secreto, em 2022, e triplicação do financiamento público de partidos políticos nas eleições do ano que vem. Já era tempo de o Ministério da Economia ter-se dado conta da extensão dessa vulnerabilidade tão séria a que está claramente exposta a condução da política econômica. E, dessa perspectiva, é fácil perceber quão temerária foi a decisão do governo de enviar ao Congresso, justo agora, um projeto tão complexo de reforma da tributação direta no País. Mesmo que se tratasse de projeto cuidadosamente concebido e bem articulado, sobre o qual o governo tivesse inabalável convicção, ainda teria sido decisão imprudente, tendo em conta o alto risco de que, nas atuais circunstâncias, as medidas propostas acabassem desfiguradas no Congresso. Tendo em vista, contudo, que não se trata em absoluto de um projeto bem concebido e que, sobre ele, nem mesmo o Ministério da Economia se mostra convicto, a decisão já não pode ser considerada meramente imprudente. Só pode ser percebida como deplorável temeridade. Constatados os furos, as inconsistências e as desarticulações do projeto, o que agora se vê é o complexo sistema de tributação de renda pessoal, lucros e aplicações financeiras no País sendo drasticamente reconcebido pelo Centrão, ao sabor de uma pororoca de lobbies de todo tipo. No Congresso, brinca-se com dispositivos e parâmetros tributários com a mesma leveza com que uma criança encaixa peças de um jogo de armar, ao acaso, sem maiores preocupações com o que está sendo montado. Não é excesso de pessimismo temer que disso dificilmente sairá um sistema de tributação direta melhor do que o que hoje se tem. Vendo-se agora relegado a mero coadjuvante na tramitação da reforma no Congresso, o ministro da Economia tem razões de sobra para estar alarmado com o desfecho que poderão ter as negociações no Legislativo quando, afinal, o projeto for votado em plenário, na Câmara e no Senado. Tudo indica que o presidente, devidamente alertado, já compartilha dessa apreensão. Há poucos dias, Bolsonaro achou oportuno esclarecer que, a seu ver: “Houve um exagero por parte da Economia na reforma tributária, já está sendo acertado com o relator. Realmente, a Receita, no meu entender, como é muito conservadora, foi com muita sede ao pote”. E acrescentou: “Mesmo sendo projeto meu, se passar no Congresso e chegar para mim aumentando a carga tributária, eu veto” (O Globo e Estadão, 21/7). A ameaça de veto é uma solução descabida. Mas ainda há tempo de evitar o pior. Não é a primeira vez que o governo constata que submeteu ao Congresso um projeto equivocado e impensado. Quando isso ocorre, a solução natural é a simples retirada do projeto. É inegável que há muito o que aprimorar na legislação de Imposto de Renda das pessoas físicas e jurídicas. Mas, nas atuais circunstâncias, o que de melhor o governo poderia fazer é retirar o projeto do Congresso e deixar a reforma que faria sentido para momento mais oportuno. Se o Centrão consentir, é claro. *ECONOMISTA, DOUTOR PELA UNIVERSIDADE HARVARD, É PROFESSOR TITULAR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC-RIO O ESTADO DE S. PAULO
Carga tributária cairia para alguns setores, diz estudo
Estudo da Universidade Presbiteriana Mackenzie com base no parecer preliminar do deputado Celso Sabino (PSDB-BA), relator da proposta de Reforma Tributária, estima que as premissas adotadas pelo parlamentar podem acarretar uma redução de 19,28% na carga de impostos das empresas nos ramos de indústria, finanças e energia a partir de 2023. A análise está fundamentada em dados financeiros dos últimos cinco anos de 14 empresas listadas na B3. “Em princípio, a proposta do deputado Celso Sabino tem impacto menor do que as anteriores”, sustenta um dos autores do estudo, Henrique Formigoni, professor do Programa de Pós-Graduação em Controladoria e Finanças Empresariais (PPGCFE), da Mackenzie. A carga tributária nominal de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) é atualmente de 34% sobre o lucro das empresas, havendo a isenção na distribuição de dividendos aos sócios. Essa carga é resultado de uma alíquota de 25% de IRPJ somada a outra de 9%, da CSLL. Embora essa seja a regra geral de tributação, Formigoni ressalta que a alíquota da CSLL do setor financeiro, por exemplo, é mais elevada: 20% para bancos e 15% para as demais instituições financeiras. Em seu parecer, Sabino propõe que a Contribuição Social sobre Lucro Líquido seja mantida em 9%, mas a alíquota do IRPJ caia para 15% em 2022 e para 12,5% em 2023. Isso faria com que o patamar atual de tributação (34%) passasse para 24% no próximo ano e para 21,5% em 2023. Dentro dessa lógica, levando em consideração as alíquotas efetivas de cada setor e o lucro médio nos últimos cinco anos das empresas pesquisadas, Formigoni e os doutorandos Rodrigo Romanato Leite e Márcia Rossi calcularam que a carga tributária das companhias energia cairia 25,03% em 2022. No ano seguinte esse percentual de redução avançaria para 32,52% – os valores não são cumulativos. A desoneração seria menor para bancos e demais instituições financeiras, devido à carga mais alta. Se aprovada a reforma nos moldes propostos por Sabino, a tributação do setor diminuiria em 9,43% no primeiro ano, porcentagem que evoluiria para 15,57% em 2023. Já para o setor industrial a carga tributária encolheria num primeiro momento em 11,57%. Posteriormente, em 2023, o corte chegaria a 18,95%. Na média, considerando os três setores pesquisados, a carga cairia 12,69% em 2022. E, no ano seguinte, essa redução chegaria ao valor médio de 19,28%. Foram colhidos dados relativos ao lucro antes do Imposto de Renda, bem como, as despesas de IR e CSLL. E, também, informações relativas ao pagamento de Juros sobre Capital Próprio (JSCP) e dividendos. “Sabino manteve a tributação sobre dividendos e Juros sobre Capital Próprio”, lembra Formigoni. A amostra final analisada por Formigoni, Romanato e Rossicontemplou Cemig, Copel, Engie, Equatorial, Neoenergia, Petrobras, B3, Bradesco, Santander, Itaú, Ambev, CSN, Litel e Vale. Ficaram de fora, portanto, empresas dos setores comercial e de serviços. VALOR ECONÔMICO
Empresas estudam esvaziar o caixa para evitar pagar dividendo com imposto em 2022
O empresariado brasileiro já estuda uma maneira de reagir ao início da taxação de 20% sobre os dividendos, conforme previsto no projeto de lei que apresenta a segunda fase da reforma tributária. Segundo grandes escritórios de advocacia ouvidos pela Folha, que atendem algumas das maiores empresas do país com planejamento tributário, as companhias estudam esvaziar o caixa este ano, antecipando o pagamento dos dividendos. Algumas pensam até em pegar empréstimo para remunerar os acionistas. Um dos efeitos colaterais dessa prática seria uma disparada no câmbio, uma vez que muitas filiais de multinacionais enviariam às suas respectivas matrizes, ao mesmo tempo, os dividendos de uma só vez. Tanto o PL 2.337/21, apresentado no final de junho pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, quanto o seu substitutivo, preparado pelo relator da reforma do Imposto de Renda, Celso Sabino (PSDB-BA), não preveem um período de transição para adoção do imposto sobre os dividendos, que já valeria para 2022. Segundo o advogado Ricardo Maitto, sócio na área de planejamento tributário do escritório Tozzini Freire, este é o ponto de maior preocupação das companhias. “O Brasil pode viver uma situação esdrúxula”, diz Maitto. “As empresas pagariam 20% sobre os dividendos para os acionistas, um desembolso feito ao longo de 2022 sobre os resultados de 2021, ou mesmo sobre resultados represados, de anos anteriores, enquanto estariam arcando com a atual carga tributária de 34% [que engloba 25% de IRPJ e 9% de CSLL] sobre o exercício de 2021. São mais de 50% de imposto”, afirma. Isso porque o valor sobre o qual é apurado o imposto da companhia é fechado em 31 de dezembro, encerramento do ano fiscal. O pagamento dos impostos ocorre em janeiro. Se este cenário se confirmar, diz Maitto, muitas grandes empresas, multinacionais inclusive, estariam dispostas a zerar o seu caixa em 2021, pagando dividendos antecipadamente, para não arcar com os 20% de imposto no ano que vem. “Algumas companhias estudam até pegar empréstimo em banco para antecipar o pagamento este ano”, diz. Na opinião do tributarista, a medida geraria efeitos colaterais sobre a economia. “Com o caixa esvaziado, não haveria capital para fusões e aquisições ou crescimento orgânico”, afirma. “Fora isso, se muitas multinacionais decidissem enviar, de uma vez, seus lucros para as respectivas matrizes, haveria um impacto importante no câmbio, o dólar iria disparar”. Maitto afirma que o Tozzini Freire tem feito uma série de estudos de impacto para os clientes, na tentativa de traçar estratégicas para o próximo ano fiscal, a partir do que foi apresentado até agora pelo governo. Na quarta-feira (21), em reunião com empresários na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Celso Sabino afirmou que a faixa de isenção de até R$ 20 mil para tributação de dividendos deve ser mantida, mas pode ser ampliada no caso de empresas pertencentes a um mesmo grupo, coligadas ou micro e pequenos negócios de uma mesma família. Para Bruna Marrara, sócia tributária do escritório Machado Meyer Advogados, o mercado já está encarando a tributação do dividendo como certa e estuda alternativas para não arcar com o ônus já no próximo ano. “É a tributação do saldo do lucro, um ponto muito controverso da reforma”, diz ela. “Você diz que a lei já passa a valer em 2022, mas vai distribuir o lucro dos anos anteriores. Não há salvaguarda do lucro gerado no regime anterior”, afirma. Neste caso, segundo Bruna, o mecanismo de tributação dos dividendos é por retenção na fonte. “A companhia recolhe, mas o ônus financeiro é do acionista”, afirma. “Se os dividendos somam R$ 100, por exemplo, a companhia recolhe R$ 20, paga o imposto, e chegam R$ 80 ao acionista”. A advogada lembra que, até 1995, os dividendos eram tributados em até 15%. Mas a lei 9.249/95 tornou o ganho isento, e houve um período de transição, diz. “A lei entrou em vigor em 1995 e somente o lucro gerado a partir de 1996 passou a ser isento”. Em um cenário sem período de transição para a nova lei, vale mais para as empresas emitirem debêntures, ou seja, se endividarem, do que partirem para uma abertura de capital na Bolsa (IPO), diz Bruna. Na oferta primária, ações são vendidas pela empresa com objetivo de gerar caixa. “A nova lei, da maneira como está, gera impacto na estrutura de capital das companhias”, afirma. “Tem gente tendo ideias mirabolantes, como pagar remuneração via planos de previdência privada”, diz Luiz Eguchi, diretor de impostos da auditoria e consultoria empresarial Mazars. “Algumas empresas, porém, têm prejuízos acumulados. Elas estudam absorver as perdas este ano, para liberar patrimônio líquido a fim de distribuir os dividendos”. Segundo Eguchi, a consultoria já foi provocada por empresas para estudar essas possibilidades. Mesmo um empréstimo poderia ser mais vantajoso do que pagar o dividendo de 20%. “A despesa financeira gerada pela empresa pode ser considerada dedutível do Imposto de Renda. Ainda assim, a Receita pode questionar essa despesa”, diz. Outro efeito colateral de zerar o caixa, na opinião do diretor da Mazars, é a possibilidade de comprometer o pagamento para fornecedores no próximo exercício. “A situação está muito confusa”, diz Vander Giordano, vice-presidente institucional da Multiplan, uma das maiores administradoras de shopping centers do país. “Nós ainda estamos estudando o cenário e vamos aguardar a versão que será colocada em votação pelo relator, com novas mudanças”, diz o executivo, que participou nea quinta-feira (22) do evento “Os Impactos Econômicos da Reforma Tributária”, promovido pela CNI (Confederação Nacional da Indústria), que teve a participação de Paulo Guedes. Para o presidente da JSL Logística, Ramon Alcaraz, é “inteligente” retirar imposto do lucro bruto e passar para os dividendos. “Isso incentiva o reinvestimento na empresa, é o que acontece na maioria dos países”, diz o executivo. “Até no Paraguai, onde temos operações, as empresas pagam menos imposto sobre o lucro bruto e o sistema tributário é mais simples”, afirma. “O que não faz sentido é aumentar a carga efetiva sobre as companhias”, diz ele. A JSL também vai aguardar a proposta final do relator para
Maneira esperta de acabar com pisos salariais (Editorial)
O debate sobre a fixação de pisos salariais para diferentes categorias profissionais está longe de terminar. Entre os argumentos dos que defendem seu fim estão a necessidade de desburocratizar e simplificar as relações de trabalho, deixando que as condições do mercado estabeleçam a remuneração do trabalhador, e a necessidade de fixar apenas a remuneração mínima para todos os trabalhadores, independentemente de sua formação ou qualificação. Os que querem a preservação, de sua parte, argumentam que o piso corresponde à remuneração proporcional à complexidade e à extensão do trabalho e assegura remuneração digna a profissionais de diferentes qualificações. O que não se entende é a maneira esperta e quase sub-reptícia de acabar com o piso salarial de categorias relevantes, como fez o deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP) em texto aprovado pela Câmara em junho. Bertaiolli foi o relator, na Câmara, da Medida Provisória (MP) n.º 1.040. A MP busca melhorar o ambiente de negócios no País, sempre mal colocado nos relatórios sobre a facilidade para a operação das empresas nos diferentes países. Para isso, a MP facilita a abertura de empresas, protege os investidores minoritários e melhora a legislação do comércio exterior. O modo como Bertaiolli revogou o piso salarial de engenheiros, químicos, arquitetos, agrônomos e veterinários foi de uma simplicidade comovente. No projeto de conversão da MP, ele, como relator, incluiu nas disposições finais, sem justificar, a revogação da Lei 4.950-A, de 1966. É a lei que estabelece o piso para aquelas categorias profissionais. “Junto com o Ministério da Economia, buscamos revogar legislações que não possuíam mais sentido com a realidade”, disse ele ao Estado. “Não há justificativa para a retirada do salário mínimo desses trabalhadores”, reagiu o senador Fabiano Contarato (Rede-ES). Tendo agido de maneira discutível, o parlamentar poderia se justificar de modo mais claro respondendo a algumas perguntas. Por que o fez? Por que o fez sem discutir previamente e sem justificar o que fez? E por que o fez quando todo o País enfrenta problemas econômicos e sociais de gravidade e extensão raras vezes observadas em muitas gerações? Categorias profissionais estão se movimentando contra o fim do piso. O Senado pode derrubar a medida. O ESTADO DE S. PAULO
Adore os problemas que aparecem na carreira: eles ajudam a inovar (Marisa Eboli)
“Somente pensamos quando confrontados com um problema”, John Dewey, filósofo (1859-1952). De onde vem a inovação? Da comodidade? Da preguiça? De um sonho absurdo? Da pesquisa? Das guerras? Das situações de crises? Da necessidade de adaptação? Da solução de problemas? De personalidades inovadoras, onde quer que estejam? Quando a inovação é disruptiva, destruindo para construir o novo, o inusitado? Ou pode ser uma criação não disruptiva que se incorpora de forma indolor? Seja como for, o ser humano busca mais conforto e comodidade e tende para a acomodação. Mas nem todos e nem sempre. De fato, a inquietação também faz parte da natureza humana. Por vezes, somos estimulados a questionar o que vemos e isso impulsiona nossa criatividade. Esta é uma das origens da inovação. E é ela que promove as transformações no modo em que vivemos, nos nossos hábitos e consumo, seja no mundo dos negócios ou na sociedade. A crise causada pela pandemia do novo coronavírus gerou em todo o planeta a necessidade de sobrevivência e adaptação, pressionando todos para resolver seus problemas. Desafios brotaram por toda parte: da vacina ao home office, do auxílio emergencial à compra online, do treino esportivo virtual à escola via internet. De acordo com relatório do World Economic Forum, a resolução de problemas está no topo da lista, como a competência mais desejada. Mas afinal o que é isso? “É a capacidade de resolver problemas novos e mal definidos em ambientes complexos e do mundo real”. Ou seja, ter elasticidade mental para resolver problemas que nunca foram vistos e ser capaz de fazê-lo em um cenário que está mudando a uma velocidade acelerada. Ainda, segundo o relatório, para mais de um terço de todos os empregos em todos os setores, a solução de problemas complexos é uma das principais requisições. Não obstante, passamos a vida querendo não ter problemas. É curioso, qualquer tipo de felicitação, seja por aniversário, casamento, viagem, novo emprego ou nova casa, a mensagem é: “tomara tudo corra bem e não haja problemas”. Problema é mau e é um castigo dos deuses! Nunca encaramos problemas como algo positivo e bem-vindo em nossas vidas, seja na esfera pessoal ou profissional. No entanto, eles são fundamentais para se inovar e evoluir. “Problem Based Learning” é uma metodologia ativa muito apreciada. Justamente, começa com problemas. Então, as principais perguntas são: onde estão os problemas? Como encontrá-los e defini-los? Como podem gerar inovações? Ao fazer uma pausa na escrita deste artigo, liguei a TV e, circulando pelos canais, vejo o Boston Red Sox jogando beisebol contra o New York Yankees, multicampeão e o time mais popular dos EUA. Vale destacar que são arquirrivais, representantes de uma rivalidade histórica que se estende a outros esportes entre as duas cidades. Bingo! Daí foi impossível não relacionar minhas reflexões iniciais com o filme “Moneyball: o homem que mudou o jogo” (2012), dirigido por Bennett Miller e tendo como roteiristas Aaron Sorkin e Steve Zaillian. Aí está um bom exemplo de inovação e mudança, que foi baseado em fatos reais ocorridos durante a Major League Baseball (MLB) de 2001-2002, e descrito no livro “Moneyball: The Art of Winning an Unfair Game”, do escritor Michael Lewis. Trata-se de um caso raro de um time de beisebol (Oakland Athletic), mostrando a sequência de 20 vitórias consecutivas, pagando os menores salários da Liga daquela temporada. Estabeleceu um novo recorde. A se notar, o mesmo time havia começado o campeonato com uma sequência de onze derrotas seguidas. O que ocasionou tal mudança? Na temporada anterior (2000-2001) Billy Beane, gerente geral do clube, até que conseguiu um bom desempenho do time, mas perdeu duas fases antes da finalíssima da MLB, justamente para os Yankees. E o pior, também perdeu seus três melhores jogadores para os times ricos. “Somos doadores de órgão para o NY Yankees”, diz Beane, referindo-se à folha de pagamento do seu time em comparação com os orçamentos milionários dos concorrentes. Frente à situação ingrata de ter que reconstruir o time com parcos recursos, Beane presta atenção às teorias do economista Peter Brand, um nerd recém-formado em Yale e que se dedicou a estatísticas e probabilidades. Seus interesses o levaram a uma séria análise de custo-benefício dos jogadores deste esporte. Para Peter, Beane deveria contratar jogadores baseado em seus KPIs (Key Performance Indicator), que apontavam para nomes subvalorizados da Liga. Adequando-se ao seu orçamento restrito, Beane e Brand montaram um time que, a princípio, não tinha muito crédito, mas que, durante a temporada, provou ser a melhor aposta na história do esporte. Gastou menos dinheiro e usou jogadores que não recebiam atenção dos olheiros, porque tinham tido alguma contusão, algum problema ou por já serem considerados velhos. Esse terremoto nas escolhas mudou completamente a forma dos empresários do setor investirem no esporte. E foi uma restrição – o baixo orçamento – que forçou a inovação. Para se ter um time vencedor não é sempre necessário seguir apenas os conselhos dos veteranos olheiros da equipe. Até o próprio técnico do Oakland Athletic sentiu que sua experiência estava sendo menosprezada. É o conhecimento tácito dando lugar ao explícito: análise de dados, análise de informações, números, estatísticas, Big Data, entre outros. Um problema já existente no mundo do beisebol foi resolvido com novas abordagens e estratégias, mudando as regras e o modelo de negócio desse esporte. De fato, os times gigantes da Costa Leste passaram a adotar as mesmas estratégias de contratação e gestão. É lógico que essa mudança também exigiu de Beane uma liderança forte e eficaz, pautada por ideais, coragem para romper com a situação vigente e muito conhecimento, aspectos essenciais para provocar mudança organizacional. Diante de um problema grave e recorrente, foi capaz promover uma importante inovação. Marisa Eboli é doutora em Administração pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP e especialista em educação corporativa. É professora de graduação e do mestrado profissional na FIA Business School (meboli@usp.br). O ESTADO DE S. PAULO
Com escolas fechadas e sem promoções, pandemia já paralisa a carreira de pais
Milhões de pais, na maior parte mães, deixaram de trabalhar porque a pandemia obrigou o fechamento de creches e escolas. Mas, para muitos que mantiveram seus empregos, as demandas com os filhos também afetaram sua atividade, embora de maneira menos visível. Eles têm trabalhado menos horas, recusaram novas atribuições, ou decidiram não aceitar uma promoção ou procurar um novo emprego. É o que os economistas chamam de margem intensiva – o quanto as pessoas trabalham em oposição a quantos estão na ativa. E isso é mais difícil de ser quantificado nas estatísticas oficiais de emprego. Mas há evidências de que os pais que estão empregados retardaram sua carreira enquanto o retorno das creches e escolas continua prejudicado. E isso tem efeitos de curto prazo sobre sua vida profissional e também de longo prazo sobre suas carreiras, segundo uma pesquisa, porque os empregadores dos Estados Unidos costumam penalizar as pessoas que trabalham menos do que costuma ser o seu pleno rendimento. “Acho que muitas mulheres que não foram obrigadas a sair de casa se consideram com sorte, mas foram forçadas a se calar, assumir uma posição menos exigente, de nível inferior”, disse Maria Rapier, que tem três filhos e deixou seu emprego onde dirigia um departamento e participava de reuniões da diretoria. “Mesmo que mantenham o emprego, elas não conseguem colaborar plenamente porque metade do tempo ficam olhando seu laptop para ver como estão os filhos e a roupa suja amontoando.” Na Bay Area, onde vive, algumas escolas ficaram fechadas no ano passado, e sua abertura neste último trimestre não está garantida. “Estou aqui sentada inserindo dados e sei que, com minha formação e experiência, poderia estar na mesa onde decisões são tomadas”, afirmou. “Isso foi um choque para o meu ego. Mas também para minha profissão porque sou boa no tocante à tomada de decisões estratégicas.” Pesquisa realizada pela Mourning Consult para o The New York Times durante o ano escolar, das 468 mães que trabalham fora e responderam à pesquisa, um terço respondeu ter trabalhado menos horas durante a pandemia para cuidar dos filhos e um quinto passou a trabalhar em meio período. Segundo a pesquisa, 28% recusaram novas responsabilidades no emprego, 23% não se candidataram a um novo trabalho e 16% não buscaram uma promoção. O Census Bureau – agência americana de pesquisas estatísticas – realiza pesquisas com as famílias semanalmente. No último registro, cobrindo de 23 de junho a cinco de julho, 26% das pessoas inquiridas com filhos impossibilitados de ir à creche ou à escola por causa da pandemia disseram que um adulto na casa teve de reduzir as horas de trabalho pagas na última semana por causa do problema. Um quarto pediu demissão para cuidar das crianças, e um quinto usou ausências remuneradas, como férias ou dias sem trabalhar por causa de doença, para se ocupar da família. “Ninguém fala sobre isso”, disse Misty Heggeness, economista do Census Bureau. “Apesar de essas pessoas estarem na ativa, veremos uma queda no campo da igualdade de gênero se não dermos atenção à margem intensiva.” Mãs trabalham menosMães sozinhas que não vivem com outro adulto em idade ativa foram as que tiveram a maior redução nas horas trabalhadas e são as que têm menos probabilidade de recuperar esse tempo, segundo dados da pesquisa do Census Bureau. Meghan McGarry, que tem uma filha de sete anos, possui uma empresa de organização do lar em Houston, e seu marido trabalha no setor de petróleo e gás. Mesmo que a demanda por seus serviços tenha aumentado, ela cortou as horas de trabalho de quatro para uma e não acha que voltará à atividade integral antes do outono no hemisfério norte. “Escolhi essa carreira por causa da sua flexibilidade, sabendo que haveria fases boas e ruins. Mas nunca imaginei que essa fase ruim duraria 15 meses.” Outras mulheres temem os efeitos sobre sua carreira. Jaishree Raman, diretora de TI em Norman, Oklahoma, está em licença não remunerada de seis meses, depois de três décadas trabalhando. Seu pai necessita de cuidados, e a família não quer contratar uma cuidadora durante a pandemia. Ela também ajuda seu filho adulto que vem se submetendo a uma quimioterapia e necessita de cuidados extra para não se expor ao coronavírus. “Era uma culpa constante, não me sentindo capaz de fazer tudo que costumava fazer no emprego. Não pedia um aumento porque achava que a empresa estava me fazendo um enorme favor”, ao acomodar sua necessidade de cuidar dos seus familiares. Ela teme que será difícil retornar ao trabalho depois da pausa. “O que posso dizer? Não posso falar em burnout (ou síndrome de esgotamento profissional), pois isso é interpretado como fraqueza.” Quanto aos pais, eles também trabalharam menos. Jacob, que mora em Dobbs Ferry, Nova York, é consultor e mede seu trabalho diário em consultas de 15 minutos. Com sua filha menor em casa e a mulher trabalhando o dia inteiro com pesquisas de medicamentos para a covid, ele cortou suas horas de consultoria em 20%. “Não tive escolha, não temos babá. A cada cinco minutos, tinha de ver como a minha filha estava.” Ele conseguiu retomar sua atividade plena só recentemente, quando a família se mudou para um lugar onde as escolas estão abertas e inscreveram a filha num acampamento de verão administrado pela escola. O ESTADO DE PAULO
Puxada por energia, prévia da inflação fica em 0,72% em julho, a maior para o mês desde 2004
Puxado pela alta de 4,79% da energia elétrica, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), uma prévia da inflação oficial, ficou em 0,72% em julho, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta sexta-feira, 23. Foi o maior resultado para o mês desde 2004, quando atingiu 0,93%, mas desacelerou frente ao 0,83% de junho. Em 12 meses, a alta acumulada é de 8,59%. A energia elétrica teve o maior impacto individual no índice, respondendo por 0,21 ponto porcentual no resultado total. Em junho, quando entrou em vigor a bandeira tarifária vermelha patamar 2, em meio à crise hídrica, que afeta a produção de energia nas hidrelétricas, a alta foi de 3,85%. Também pesou no IPCA-15 o reajuste de 52% justamente nessa bandeira tarifária, que passou a cobrar R$ 9,492 a cada 100 kWh consumidos (frente a R$ 6,243 em junho). Com isso, o grupo habitação ficou com a maior alta do mês: 2,14%, equivalente a 0,33 ponto porcentual do índice geral. Além da energia elétrica, o grupo teve aumentos nos preços do gás de botijão (3,89%) e no gás encanado (2,79%). A segunda maior contribuição veio do grupo transportes (1,07%), seguida por alimentação e bebidas (0,49%). As únicas quedas foram registradas em saúde e cuidados pessoais (-0,24%) e comunicação (-0,04%). Nos transportes, a alta de 1,07% foi puxada pelas passagens aéreas (35,64%), que haviam caído 5,63% em junho. Os preços dos combustíveis (alta de 0,38%) desaceleraram em relação a junho (3,69%), mas a gasolina, com alta de 0,50% em julho, acumula variação de 40,32% nos últimos 12 meses. Por outro lado, houve deflação no grupo saúde e cuidados pessoais (-0,24%), como reflexo do reajuste de -8,19% nos planos de saúde autorizado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em 8 de julho, retroativa a maio de 2021. É a primeira vez que a ANS autoriza um reajuste negativo. Com isso, o IPCA-15 de julho reflete as frações mensais relativas aos meses de maio, junho e julho. O ESTADO DE S. PAULO
Maior parte das empresas abertas não se adaptou à LGPD
A maioria das companhias de capital aberto ainda não se adaptou à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Levantamento do escritório JPN Advogados mostra que 59% das empresas listadas em bolsa de valores não designaram, até o momento, o profissional conhecido como “encarregado”, considerado peça-chave e que funciona como canal de comunicação entre as empresas e os donos dos dados pessoais. Caso não estejam adequadas às novas regras, as empresas podem sofrer sanções a partir de 1º de agosto. “A mera ausência de indicação de um encarregado, com divulgação da sua identidade e informações de contato de forma pública pelas empresas em seus sites, constitui violação expressa à LGPD”, diz o advogado Allan Turano, um dos responsáveis pelo levantamento. A lei fala expressamente que a identificação do encarregado deve estar disponível no site da empresa. “O mais importante é o canal de contato. A lógica por trás é que o titular dos dados tenha um canal para se comunicar com alguém, que receberá a mensagem e dará uma resposta”, afirma o advogado. As penalidades por infração à lei são pesadas. Incluem advertência, a possibilidade de suspensão do direito de tratar dados pessoais e multa. A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) poderá multar empresas em até R$ 50 milhões. Além da ANPD, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) e o Procon também podem aplicar sanções. Para Turano, o risco reputacional é maior do que o risco das sanções. Entre as empresas que ainda não identificaram seus encarregados estão companhias do setor varejo, aéreas, saúde e consumo, todas com base grande de clientes pessoas físicas. A lei foi criada em 2018 e foi dado um período para as empresas se ajustarem. “Mais da metade das companhias abertas não está adaptada e isso assusta. Pode ser que elas já tenham feito alguma adaptação, mas não chegaram ao nível de maturidade que se esperava. A adequação é constante, e as empresas sempre precisarão revisar processos e atualizar políticas”, diz o advogado. Na Justiça já há diversas decisões condenando empresas que violam a LGPD ao pagamento de indenizações aos donos dos dados pessoais. “A lei já está em vigor. Na prática, isso já permite que algum consumidor acione a Justiça e entre com um processo”, afirma Turano. O encarregado é uma figura brasileira análoga ao Data Protection Officer (DPO) no exterior. Para que possa exercer os direitos previstos na lei, as pessoas devem contatar o encarregado, que recebe as requisições e adota providências necessárias. Ele pode ser um funcionário interno ou um prestador de serviços externo. A pesquisa do JPN Advogados identificou que a maior parte dos encarregados já designados (83%) são pessoas físicas. Mas somente 33% identificaram o nome do encarregado. Além disso, apenas 55% das empresas possuem um canal de comunicação para exercícios dos direitos previstos na LGPD. VALOR ECONÔMICO
Justiça aplica LGPD para proteger dados de trabalhadores
A Justiça do Trabalho começa a aplicar a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) para obrigar empresas a tratar os dados de trabalhadores. No Rio Grande do Sul, a cooperativa Ecocitrus foi condenada em primeira instância a aplicar a nova legislação para a proteção dessas informações, no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1 mil. A decisão é a primeira favorável aos trabalhadores em 12 ações civis públicas ajuizadas pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação de Montenegro e Região. A LGPD (Lei nº 13.709, de 2018) está em vigor desde setembro e, a partir de agosto, começam a poder ser aplicadas as sanções por descumprimento da norma, como multa de até 2% do faturamento do ano anterior, limitado a R$ 50 milhões. Até agora, nas 12 ações civis públicas ajuizadas pelo sindicato, há duas sentenças beneficiando empregadores, a JBS e a Biocitrus, que teriam comprovado em juízo que já fizeram adaptações. A entidade também fez acordo com o Frigorífico Sul Norte, segundo o advogado que representa o sindicato, Daniel Paulo Fontana, do Gregory & Fontana Advogados. Mas ainda não há desfecho para as demais. No caso da Ecocitrus, o sindicato alega descumprimento sistemático na proteção de dados e o compartilhamento de informações, sem as cautelas necessárias. Ainda argumenta que o tratamento de dados é compartilhado pela internet, em desatenção ao Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14), ao não observar o respeito à intimidade e à privacidade. A entidade também pede indenização por danos morais. A decisão foi proferida pela juíza Ivanise Marilene Uhlig de Barros, da Vara de Montenegro (RS), que integra o grupo de trabalho para acompanhamento da implementação da LGPD do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Rio Grande do Sul. Ao analisar o caso, ela destacou que os trabalhadores têm direitos assegurados na LGPD para que seus dados sejam protegidos. Segundo a magistrada, a cooperativa não “demonstrou por nenhum meio a implementação de um único dispositivo da LGPD”. Determinou que a Ecocitrus implemente e comprove nos autos as práticas relacionadas à segurança e sigilo de dados, sob pena de multa, e que indique um encarregado (ação nº 0020043-80.2021.5.04.0261). Encarregado de Proteção de Dados da Ecocitrus (DPO), Alisson Possa afirma que “a Autoridade Nacional de Proteção de Dados do Brasil (ANPD) ainda não dispôs sobre esses assuntos”. Para ele, “causa espanto e temeridade a possibilidade de um juízo singular definir padrões que poderão causar prejuízos não só para uma empresa, mas para a sociedade brasileira inteira, ao abrir uma caixa de pandora de possibilidades de entendimentos diversos sobre o que é ou não adoção de medidas adequadas à observação da LGPD”. Já Fontana explica que as ações judiciais foram movidas pelo sindicato para que as empresas da região garantam que os trabalhadores terão seus dados preservados. De acordo com ele, havia a percepção de que muitas delas ainda não se preocupavam com a LGPD. Porém, depois das ações judiciais, várias passaram a tomar medidas mais efetivas para cumprir a lei o mais rápido possível. No caso da JBS, a situação foi bem diferente. A juíza Ivanise constatou existir um manual de privacidade, inclusive com a designação de um encarregado. Considerou também um recurso tecnológico usado para o tratamento dos dados pela companhia (processo nº 0020014-30.2021.5.04.0261). Procurada pelo Valor, a JBS informou, por meio de sua assessoria de imprensa, não ter nada a acrescentar. Decisão nesse mesmo sentido foi dada à Biocitrus. No caso, a empresa apresentou contrato de prestação de serviços para a consultoria e assessoria jurídica na adequação à LGDP (processo nº 0020017-82.2021.5.04.0261). Procurada pelo Valor, a Biocitrus não deu retorno até o fechamento da edição. Essas ações civis públicas, segundo a advogada Fernanda Muniz Borges, sócia do FAS Advogados, servem de alerta para as empresas que precisam se adequar à nova legislação, não só em relação a dados de terceiros. Para ela, é necessário fazer um mapeamento das informações coletadas de funcionários, para verificar se são realmente relevantes para o trabalho a ser exercido. VALOR ECONÔMICO