Fusões e aquisições podem ter valor recorde no Brasil em 2021
Um grupo de empresas que encheu o caixa nos últimos tempos deve usar esses recursos para assediar os concorrentes nos próximos meses com ofertas agressivas de fusão ou aquisição, em busca de ganho de escala e de presença mais forte no digital. Com grandes movimentos no varejo (com a compra da Hering pelo Grupo Soma) e saúde (com a união de Hapvida e NotreDame Intermédica), o mercado já projeta um recorde histórico de operações em 2021. O início do ano já deu uma amostra desse apetite. Segundo a consultoria Dealogic, que coleta dados do mercado financeiro, já foram realizadas neste ano até aqui US$ 52,1 bilhões em operações de fusões e aquisições no Brasil, superando o valor de todo o ano passado, que foi de US$ 45,9 bilhões. Entre as empresas que devem liderar esse movimento, está a varejista Renner. Após colocar cerca de R$ 4 bilhões no caixa, a varejista gaúcha analisa diversos ativos para aquisição e a expectativa é que a empresa dê um passo mais firme no mundo digital. No mercado financeiro, as movimentações estão em ebulição. O Nubank atraiu um aporte de US$ 750 milhões liderado pelo Berkshire Hathaway, de Warren Buffett. O fundo americano Advent comprou uma fatia da empresa de pagamentos Ebanx. Já o BTG Pactual e a XP anunciam compras quase semanalmente. “O termômetro está em altíssima temperatura e teremos um volume extraordinário neste ano. Temos o efeito do represamento de operações no ano passado e da grande liquidez nos mercados”, diz o sócio do BTG Pactual Bruno Amaral, responsável pela área de M&A (fusões e aquisições). O executivo afirma que as operações de aquisições começaram a sair do papel no fim do ano passado, depois de uma maior distribuição das vacinas contra a covid-19 entre os países – o que deu ao mercado a chance de vislumbrar uma redução dos efeitos da crise sanitária na economia. Poder dos IPOsO responsável global do banco de investimento do Itaú BBA, Roderick Greenless, diz que o salto nas aquisições tem sido ajudado pelo aumento do número de empresas listadas na Bolsa, movimento que tem ganhado corpo no País por conta da taxa básica de juros em um dígito. Além de estarem capitalizadas e com acesso a investidores, as empresas listadas passam a poder dar ações como moeda de troca, facilitando as negociações. “As empresas capitalizadas estão se saindo melhor. Quem está com dinheiro no caixa, está indo às compras”, confirma o responsável pelo Bradesco BBI, Felipe Thut. Isso aparece nas documentações entregues pelas companhias listadas à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Análise dos comunicados das empresas de capital aberto feito pela MZ mostra que, no acumulado do ano, o número de documentos referentes a aquisições subiram 17% ante 2020, sendo que o setor de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg foi o líder em anúncios. Segundo o professor na Faculdade de Direito da USP e sócio do VMCA, Vinicius Marques de Carvalho, as mudanças trazidas com a pandemia afetaram as necessidades das companhias. “A crise atual, com todos os seus desdobramentos, radicalizou tendências e transformações estruturais, tanto na produção quanto no consumo”, afirma o especialista, ex-presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O presidente da Corporate Consulting, Luis Alberto de Paiva, diz que, assim como há empresas com apetite para compras, há outras em busca de comprador, por causa de seu alto endividamento. “Algumas empresas ficaram para trás na pandemia e acabaram ficando mais suscetíveis à venda. Há capital de diferentes origens, inclusive internacional, de olho nessas oportunidades, já que o endividamento reduz o valor das empresas”, diz. Na JK Capital, o número de transações em curso atingiu o maior volume de sua história. São 60 operações na mesa, 20% a mais do que a média dos últimos anos, diz o sócio da assessoria, Saulo Sturaro, que teve de ampliar o time para dar conta do trabalho. Segundo ele, os setores de saúde, logística e de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg têm puxado a tendência de aquecimento do mercado. Empresas esperam demais para venderEstudo global de desinvestimento corporativo da consultoria EY aponta que 95% dos negócios que foram alvo de aquisições admitem que deveriam ter vendido o negócio antes. Fabio Schmitt, da EY, diz que o tema é recorrente, dada a dificuldade de decisão de desinvestimento, principalmente quando o negócio vai bem. “As empresas devem sempre fazer uma avaliação de seu portfólio”, diz ele, definindo, em especial, se determinado ativo é essencial ou não ao negócio principal. A consequência de vender tarde demais, segundo a EY, é um valor mais baixo na negociação. O ESTADO DE S. PAULO
Recuperação sem emprego (Editorial)
Dezenas de milhões de brasileiros – desocupados, subocupados, desalentados e seus dependentes – continuam sem convite para a festa da recuperação econômica. A economia brasileira crescerá 5,05% neste ano, segundo a projeção do mercado divulgada pelo Banco Central (BC). Uma expansão de 4,8% é a nova aposta do pessoal do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).Também saíram os números do desemprego no trimestre móvel encerrado em abril: 14,8 milhões de desocupados, 14,7% da força de trabalho, nível recorde na série estatística iniciada em 2012. Nada parece indicar uma onda de contratações a partir de maio. Não houve melhora no mercado de trabalho, na passagem do trimestre de janeiro a março para o período de fevereiro a abril. Com a mudança do trimestre móvel, eliminou-se um mês e um mês se acrescentou ao conjunto, mas o cenário em quase nada se alterou. Além do contingente e da porcentagem dos desocupados, manteve-se o número dos desalentados (6 milhões). O total de subutilizados ficou praticamente igual, tendo passado de 33,2 milhões para 33,3 milhões de indivíduos. O grupo dos informais também pouco se alterou, tendo aumentado de 34 milhões para 34,2 milhões de trabalhadores. As pequenas diferenças foram insuficientes para mudar o cenário na passagem do trimestre findo em março para aquele terminado em abril. Além disso, nos dois períodos o quadro geral foi bem pior que o do ano anterior. No caso do trimestre janeiro-março, o desemprego passou de 12,2% em 2020 para 14,7% um ano depois. Quando a comparação envolve o período de fevereiro a abril, encontra-se uma diferença menor, de 12,6% para 14,7%. Os dois confrontos indicam uma sensível piora do mercado entre os dois anos. Nas duas comparações, os dados do ano anterior são confrontados com um recorde, a maior desocupação registrada na série iniciada em 2012. Na maior parte das demais economias emergentes e em quase todas as desenvolvidas houve dois movimentos bem diferenciados a partir do início da pandemia. No primeiro, como em todo o mundo, a desocupação cresceu de forma considerável. No segundo houve um claro aumento das oportunidades de trabalho. No Brasil ocorreu algo muito diferente: em nenhum trimestre de 2020 o desemprego chegou à taxa de 14,7%. No Brasil, como em dezenas de outros países, medidas de apoio aos negócios e de sustentação do emprego foram aplicadas pelo governo central. Mas o caso brasileiro tem algumas peculiaridades. As políticas de preservação do emprego e de ajuda às famílias mais necessitadas foram suspensas no começo deste ano e retomadas parcialmente a partir de abril. Apesar disso, a reação econômica prosseguiu no primeiro trimestre, mas sem melhorar as condições do mercado de trabalho. No trimestre fevereiro-abril a população ocupada, de 85,9 milhões de pessoas, ficou estável em relação ao contingente do trimestre de novembro a janeiro, isto é, da virada do ano. O número de pessoas ocupadas diminuiu, no entanto, 3,7% em relação ao período fevereiro-abril do ano passado. Seria muito otimismo atribuir essa redução a um abandono voluntário e tranquilo do mercado nesse intervalo de um ano. Também é preciso levar em conta os tropeços durante a retomada econômica a partir de maio do ano passado. A maior taxa mensal de crescimento da produção industrial, nesse período, ocorreu em junho de 2020. Foi uma expansão de 9,5% sobre o volume de maio. A partir daí o ritmo declinou seguidamente, chegou a 0,2% em janeiro deste ano e em seguida se tornou negativo, declinando 1% em fevereiro, 2,2% em março e 1,3% em abril. A evolução do consumo também foi irregular, mas muito menos negativa que a da indústria. As vendas do comércio varejista cresceram 0,5% em janeiro e 3,9% em fevereiro, declinaram 3,1% em março e aumentaram 0,7% em abril. Boa parte dos serviços ainda foi afetada pelas medidas de proteção contra a pandemia. Apesar disso, a economia avançou, enquanto o emprego retrocedeu. O ESTADO DE S. PAULO
Mulheres, em especial as negras, precisam se promover para alcançar liderança
Eu sou uma das lideranças femininas mais influentes atuando na agenda de diversidade, equidade e inclusão do ambiente de negócios do Brasil na atualidade, e meu trabalho foi reconhecido pela ONU. Sou responsável, por exemplo, por uma das ações afirmativas mais contundentes que o setor do agronegócio brasileiro já teve notícias. Escrevo isso no primeiro parágrafo deste artigo e não preciso de muita imaginação para ter certeza de que entre quem me lê surgem perguntas assim: “Como é que ela pode ser tão arrogante? Como é que ela não tem medo de ser interpretada como ‘marketeira’? Exibicionista demais, se ela fosse mesmo tudo isso, ela não precisaria anunciar. Humm… se ela está se autopromovendo assim é porque deve ser ruim.” Eu entendo perfeitamente todos esses comentários. Mas, e você que os fez ou pensou e não verbalizou, já parou para se perguntar de onde vem essa interpretação da minha afirmação? Guarda essa pergunta com você e falaremos sobre ela logo mais adiante, agora vamos falar sobre dados. Mulheres em posição de liderança ainda são objetivos de estudo para avanço social e mercadológico, quase nunca representadas nos conselhos das empresas e em números inexpressivos na C-Suite, somos reflexo da contradição social. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) em sua pesquisa sobre diversidade nas organizações nos mostra que empresas com mulheres em cargos de liderança reportam um crescimento de 5% a 20% nos lucros se comparadas com empresas do mesmo setor sem mulheres nestes cargos. Corroborando essa linha, pesquisa da Mckinsey nos mostra que indústrias com mulheres na liderança obtêm um resultado 48% superior na operação e consequentemente uma força de faturamento 70% em comparação com as concorrentes. Esse cenário perde toda a beleza e o impacto quando descobrimos que ocupamos apenas 3% dos cargos de liderança do Brasil, embora sejamos maioria entre as pessoas com maior qualificação técnica possuindo maior número de especializações e grau de escolaridade. Diante desse cenário volto para a pergunta que deixei: de onde vem a interpretação de que uma mulher reconhecendo publicamente seus feitos soa como desconfortável? Vem dos vieses que guiam nosso sistema de avaliação e julgamento que nos impedem de reconhecer uma mulher competente, e mais que isso, nos impedem de reconhecer e comunicar nossos feitos! Não existe uma pessoa debaixo deste céu que seja livre de vieses inconscientes que atuam diretamente na avaliação – equivocada – e julgamento sobre os outros. Fato é que essas avaliações geralmente são guiadas pelos estereótipos conectados aos papéis de gênero e etnia. Em razão do contexto social estruturalmente racista e androcêntrico, nós temos menos probabilidade de receber crédito por nossas ideias, somos mais frequentemente interrompidas nas reuniões e no geral temos menos influência entre as equipes. Quem diz isso não sou eu, é a pesquisa da psicóloga Laurie Rudman na State University of New Jersey e publicada no Journal of Personality and Social Psychology. Mulheres negras são sempre lidas a partir desses estereótipos e eles nunca correspondem a nossa realidade, em sendo assim, minhas amigas, uma das maneiras mais eficazes e eficientes de ser lida pelo que você de fato é chama-se autopromoção. Como fazer autopromoçãoAutopromoção é uma ferramenta de mobilidade de carreira e que para usá-la da maneira mais estratégica quanto possível o primeiro passo é desmistificar o que você entende por autopromoção. Sua primeira tarefa é deixar de lado a crença de que o bom trabalho fala por si! Não, ele não fala! Claro que algumas das suas realizações podem cair no radar de pessoas importantes, mas isso é raro! Se você começar esse trabalho de autopromoção de forma estruturada vai ficar surpresa ao descobrir que quase ninguém conhece todas as suas realizações e habilidades, não por falta de interesse, mas porque num mundo hiper conectado como o nosso, as coisas precisam ser informadas. É sua função fazer com que as pessoas saibam sobre seu trabalho, por que ele é importante e como beneficia outras pessoas. Existe um problema estrutural na nossa sociedade que está institucionalizado nas organizações e é por isso que precisamos nos mover de forma a eliminar a possibilidade de que sejamos interpretadas de forma equivocada por aquilo que somos. A transformação ocorre primeiro do lado de dentro, entendendo quem somos e como contribuímos para a todo. Depois operamos grandes mudanças de paradigmas do lado de fora, compartilhando nossos valores e alcançando posições de influência que nos permita alcançar os números incríveis que temos notícias nas pesquisas impactando positivamente as organizações e a sociedade. Ana Bavon é advogada especialista em direitos civis e integrante da Comissão de Ética, Diversidade e Igualdade do Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial (IBDEE). Especialista em estratégias de Diversidade e Inclusão (D&I) em empresas, é fundadora e CEO da B4People Cultura Inclusiva. O ESTADO DE S. PAULO
Governo estuda bancar parte de salário de jovem e acima de 55 anos para incentivar emprego
O governo estuda pagar uma parte do salário de trabalhadores de 18 a 29 anos ou com mais de 55 anos, por tempo determinado, para incentivar sua contratação por empresas na retomada pós-pandemia de covid-19. O tema foi discutido pelo deputado Christino Áureo (Progressistas-RJ), relator da medida provisória que recriou o programa de manutenção de empregos na crise, com o ministro da Economia, Paulo Guedes, na última quinta-feira, 1.º. Ao Estadão/Broadcast, Áureo afirma que a proposta em discussão é o governo pagar um bônus, cujo valor ainda será definido, diretamente ao trabalhador. A empresa bancaria o restante do salário e recolheria os encargos (como contribuição previdenciária e FGTS) sobre essa parcela da remuneração. A soma do bônus e do salário precisaria ser ao menos equivalente ao piso nacional, hoje em R$ 1,1 mil. A ideia de uma transferência direta substitui propostas anteriores de reduzir tributos cobrados pelas empresas sobre esses contratos. No fim de 2019, o governo chegou a propor ao Congresso o programa Emprego Verde e Amarelo, que desonerava a contribuição previdenciária, do salário educação, do Sistema S e do FGTS sobre os salários, mas a medida não vingou. A proposta de desoneração chegou a ser retomada, mas o rumo do debate migrou para o pagamento direto aos trabalhadores. A discussão vem num momento de aumento na taxa de desemprego, tema que é uma das cobranças sobre o presidente Jair Bolsonaro, que pretende buscar a reeleição em 2022. São quase 14,8 milhões de trabalhadores em busca de um emprego, segundo dados do trimestre até abril divulgados pelo IBGE. O modelo segue uma das premissas do próprio Benefício Emergencial (BEm), pago a quem teve redução de jornada e salário ou suspensão de contratos durante a crise. Com o BEm, o governo bancou uma parte da remuneração dos trabalhadores para evitar que eles fossem demitidos. Agora, o chamado Bônus de Inclusão Produtiva (BIP) serviria como incentivo para que o profissional seja contratado. Na avaliação do deputado, o modelo é bom para os trabalhadores, que terão acesso a novas oportunidades, e para as empresas, que gastarão menos em salários e encargos para contratar. O texto final deverá ter travas para evitar substituição de mão de obra, isto é, que as companhias demitam funcionários hoje sob a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para contratar sob o novo desenho, mais barato. O programa também terá um público definido: além da idade dos trabalhadores (18 a 29 anos ou mais de 55 anos), a previsão é incluir profissionais com remuneração até 1,5 salário mínimo (equivalente hoje a R$ 1.650). A duração máxima do contrato seria de dois anos, segundo as discussões preliminares, com previsão de cursos de qualificação durante o período. Segundo o deputado, o valor do bônus dependerá da disponibilidade do Orçamento. Também está sendo discutido como compatibilizar o programa com o teto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à inflação. A intenção, diz o relator, é que o programa seja implementado ainda este ano. DegrausO BIP para incentivar a contratação de trabalhadores é um dos “degraus” da política que está sendo articulada pelo relator com os técnicos do governo. “Estamos desenvolvendo um desenho em degraus, com uma rampa de superação de desigualdade”, afirma Áureo. O deputado explica que o bônus para complementar o salário seria o “BIP tipo 2”. O “BIP tipo 1” é o bônus que já tem sido propagado pelo ministro Paulo Guedes em suas aparições em público. A estratégia é incluí-lo também no texto já em tramitação no Congresso Nacional. O BIP tipo 1 seria uma forma alternativa de inclusão dos trabalhadores mais jovens, que receberiam treinamento no próprio local de trabalho (do inglês “on job training”), mas sem vínculo formal de trabalho. Nesse modelo, o profissional teria a remuneração assegurada pelo valor do salário mínimo/hora, hoje em R$ 5, com jornada máxima de quatro horas diárias. Metade da bolsa seria paga pela empresa e a outra metade, pelo governo. Guedes já citou diferentes valores, de R$ 275 ou R$ 300, como possibilidades para o pagamento do BIP tipo 1 pelo governo. Áureo afirma, porém, que ainda não foi batido o martelo sobre quanto será o bônus exato. Há ainda outro braço dessa camada do programa, o Bônus de Incentivo à Qualificação (BIQ), cujo formato está em discussão. Segundo o relator, ainda não está definido se serão vagas previamente disponibilizadas (no âmbito do Sistema S, por exemplo) ou se haverá um pagamento para que o próprio trabalhador busque um curso de qualificação. A segunda alternativa é considerada mais frágil para o controle de qualidade e do cumprimento de objetivos. Segundo Áureo, as empresas poderão usar todas as ferramentas ao mesmo tempo. “Se quiser, pode contratar nas três modalidades, BIP 1, BIP 2 e CLT”, afirma. Redução de jornada e suspensão de contratoOutra medida que deve ser incluída no relatório, diz o deputado, é a conversão do BEm como uma política perene para momentos de crise. O programa, que permitiu acordos individuais e coletivos para redução de jornada e salário em 25%, 50% ou 70%, ou ainda suspensão de 100% do contrato, ficaria acessível por meio da decretação de calamidade, reconhecida em âmbito nacional. A implementação ficaria dependendo da disponibilização de recursos. “O BEm se mostrou um instrumento efetivo de amortecimento da crise”, diz Áureo. “Ele é mais uma política do que um programa. Não temos que ficar em toda legislatura futura dizendo como vai ser”, acrescenta. Segundo ele, é importante ter essa medida “na prateleira”, pronta para ser acionada assim que pressionado o “botão de calamidade”. O deputado faz questão de ressaltar ainda que a medida valerá para situações específicas, em tragédias de largo alcance e com impactos econômicos evidentes. Essas diretrizes estarão explícitas na lei. Para ele, o sinal verde dado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ao BEm é um indicativo positivo para a adoção desse tipo de política. O ESTADO DE S. PAULO
Vagas para PCD são infladas para cumprir lei, e não fazer inclusão
Na última terça-feira, 29, o psicólogo e ator João Paulo Lima, de 28 anos, recebeu a notícia que muitos esperam: foi aprovado em um processo seletivo de uma fintech para trabalhar no setor de atendimento ao cliente. A busca começou em abril deste ano, quando precisou deixar o emprego na Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência de São Paulo. João Paulo, que possui paralisia cerebral e é deficiente físico, esteve até a última terça no grupo das quase 25 mil pessoas com deficiência e reabilitados que foram desligadas dos seus trabalhos formais no primeiro trimestre deste ano. Para conseguir o emprego, além de superar as dificuldades convencionais que pessoas com deficiência (PCD) enfrentam no mercado, ele também precisou superar uma barreira estatística: o número de PCDs e reabilitados desligados no País atualmente é maior que o número de contratações. As informações são do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que de dezembro a abril tem registrado mensalmente um saldo negativo de admissões comparadas às demissões. O número contrasta com a categoria de pessoas sem deficiência, cujo índice se manteve positivo desde janeiro de 2021, apesar de o desemprego atingir 14,8 milhões de brasileiros. Os dados ainda sinalizam que o saldo para contratações de PCDs são negativos na maioria das atividades econômicas e em todos os tipos de deficiência e nos diferentes graus de instrução. “A gente costuma dizer que, quando esse tipo de situação ocorre, o atributo ‘pessoa com deficiência’ está se sobrepondo aos outros atributos, como econômico e escolaridade”, afirma o economista Fábio Bentes, da Confederação Nacional do Comercial de Bens, Serviços e Turismo. Segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, diferentes motivos explicam a menor quantidade de admissões em relação aos desligamentos de deficientes nos últimos meses. Instabilidade no empregoIvone Santana, chefe-executiva da Rede Empresarial de Inclusão Social (Reis), acredita que a queda na absorção de pessoas com deficiência a partir de janeiro pode estar relacionada ao fim da validade da Lei 14.020, de julho de 2020, que vetava a demissão de PCD sem justa causa até 31 de dezembro do ano passado. A lei deixou de ser aplicada a partir de 2021 por estar submetida ao Decreto Legislativo nº 6, que reconhecia estado de calamidade pública no País até dezembro. A lei, de fato, freou em 2020 as demissões de PCDs e reabilitados. Entre agosto e novembro, o Caged registrou mais admissões que desligamentos. Em janeiro de 2021, sem mais a vigência da lei, o número de desligamentos voltou a acontecer. Ivone lamenta que as pessoas com deficiência ainda precisam superar o despreparo de gestores e a falta de uma cultura de acessibilidade nas empresas “que não estão comprometidas com a inclusão”. Nelas, segundo a diretora da Reis, “as pessoas com deficiência são as primeiras a serem demitidas”. José Carlos do Carmo, auditor fiscal da Superintendência Regional do Trabalho em São Paulo, também reconhece e identifica que “a PCD não tem estabilidade no emprego”. Carmo é responsável por fiscalizar se as empresas cumprem a Lei de Cotas, que prevê a contratação obrigatória de PCDs e reabilitados a partir da quantidade de funcionários que uma organização possui. “Contratar não se trata de benevolência, mas de uma obrigação legal. É necessário que haja uma real política de valorização da diversidade”, afirma o auditor. As pessoas com deficiência ainda estão em desvantagens em tempos de pandemia. Por estarem dentro de grupos de risco, elas se tornam alvo de demissões uma vez que não podem trabalhar presencialmente ou podem gerar encargos trabalhistas se forem contaminadas. Para João Paulo Lima, “se de um modo geral o custo para manter um funcionário com deficiência é maior por uma questão da acessibilidade, o empregador vai querer mandar esse funcionário embora porque, se ele já é grupo de risco, imagina se ele pega covid?”, reflete. Funcionários ‘caros’A falta de acessibilidade dentro das empresas também são razões que os empregadores dão para não admitirem PCDs ou para optar pela contratação apenas daqueles que exigem pouca adaptação. A pesquisadora Maiza Hipólito, que investigou a inserção das pessoas com deficiência no setor industrial para sua tese de doutorado, identificou em seus estudos que parte das empresas, sobretudo as mais antigas, têm dificuldades para adaptar o espaço físico e eliminar as barreiras arquitetônicas. Os motivos prejudicam não somente a inserção, mas também a manutenção dos PCDs nas empresas. O problema se agrava, de acordo com a pesquisa, quando muitas áreas na indústria apresentam riscos maiores aos funcionários. “Na mineração, tem muitas atividades para adaptar por conta de aparelhos grandes e pesados. Em uma das mineradoras que eu entrevistei, os prédios são muito antigos e difíceis de promover a acessibilidade”, explica Maiza. Preconceito e capacitismoEm meio a várias barreiras que dificultam o acesso da pessoa com deficiência ao mercado de trabalho, uma delas é a principal, segundo a opinião unânime dos entrevistados: o preconceito. “Tecnicamente chamamos de ‘barreira atitudinal’ e que representa a maneira preconceituosa como as pessoas com deficiência são tratadas”, explica José Carlos Carmos. Para Ivone Santana, que também é diretora do Instituto Parités, responsável por promover a cultura de inclusão de PCDs em empresas, “ainda enfrentamos uma sociedade extremamente capacitista e que o preconceito e o despreparo de gestores, das empresas e a falta de acessibilidade ainda prevalecem”. O capacitismo é o nome dado ao preconceito que atinge pessoas com deficiência, que são julgadas sob o estereótipo de não serem capazes de realizar determinadas tarefas. As empresas alegam que, muitas vezes, mesmo oferecendo vagas, não encontram pessoas para preenchê-las, pois acreditam que elas não têm as qualificações ou requisitos necessários para os cargos, como por exemplo ensino superior completo”, afirma a psicóloga Paolla Vicentim, líder de projetos da ASID (Associação Social para Igualdade de Diferenças). Maiza Hipólita também contesta o argumento das empresas sobre a qualificação e o nível educacional dos profissionais. “Muitos empregadores afirmam que as pessoas com deficiência não são qualificadas. Mas por que a qualificação não pode acontecer no ambiente de trabalho?”, questiona a pesquisadora. Os dados do Caged apontam que mesmo os PCDs