Ainda é cedo para dizer que governo Bolsonaro vai agonizar até morrer em 2022 (Luis Eduardo Assis)
Há quem se console ao pensar que o governo Bolsonaro agonizará até morrer, em 2022, da mesma forma que Tolstoi descreveu a morte de Ivan Ilitch: uma morte paulatina, progressiva, precisamente cruel, tão inevitável quanto necessária (“ora brilha uma gota de esperança, ora tumultua um mar de desespero”). Mas talvez não seja assim. Um ano na política brasileira, já se disse, equivale a uma era geológica. É fato que a gota de esperança veio com a divulgação do PIB do primeiro trimestre, que não foi muita coisa, mas o suficiente para embebedar o mercado financeiro, sempre pronto a manifestar seu humor hiperbólico. Como sempre, o IBGE deu destaque à variação dessazonalizada, ou seja, à variação ajustada através de modelos estatísticos que buscam livrar o número das variações típicas da época do ano. Esses modelos representam apenas uma aproximação do que seria uma situação normal. Também como é usual, ninguém prestou atenção a essa qualificação e as manchetes apenas registraram o crescimento de 1,2%. Sem o ajuste sazonal, porém, o IBGE informa que o PIB do primeiro trimestre caiu 1% em relação ao trimestre anterior e subiu também 1% em relação ao mesmo período do ano passado. É bom, mas não vale uma ressaca. Esse crescimento, todavia, é um tanto sinistro. A recuperação econômica se dá no contexto de alta no desemprego. O nível de atividade medido pelo Banco Central de março último estava quase no mesmo nível da média de 2014, mas a taxa de desemprego agora é de 14,7%, ante apenas 6,8% naquela época. Entre o final de 2014 e março de 2021 a população brasileira cresceu 5,1%, mas o total de desocupados aumentou 131%. Crescimento sem emprego é oco e agrada, no máximo, a alguns economistas. Por outro lado, a pressão inflacionária provocada pelo aumento do preço das commodities simultaneamente à desvalorização cambial ainda não atingiu em cheio a inflação do consumidor. É incomum que câmbio e commodities andem na mesma direção. A variação entre períodos móveis de 12 meses desde janeiro de 2000 mostra uma correlação negativa de 0,45 entre estes dois preços. No ano passado, por conta da aversão ao risco que acompanhou a pandemia, os dois andaram juntos, o que acarretou um aumento de 72% no preço das commodities em reais. Houve arrefecimento desde então, mas a pressão para repassar os custos para o consumidor está lá, represada, latente. No IGP-DI, a variação de 12 meses do índice de preços ao produtor estava em 46% em abril, ante apenas 6,5% nos preços ao consumidor. Desde o Plano Real – lá se vão 27 anos – essa diferença não era tão grande. Os preços no atacado não influenciam ainda mais a inflação do consumidor porque temos hoje 14,8 milhões de pessoas desocupadas, recorde histórico. É essa pletora de braços ociosos que faz com a inflação de serviços se contente com 1,45% nos 12 meses até abril, o que puxa para baixo o IPCA. Aqui mora o pesadelo do governo Bolsonaro. O crescimento que temos é incapaz de gerar empregos porque o setor de serviços, o que mais emprega, recua ao ritmo de 4,5% ao ano. Com o avanço da vacinação, malgrado o desmazelo do governo federal, é bem provável que esse setor avance e o desemprego recue. Considerando as pressões inflacionárias reprimidas, isso poderá fazer com que os preços ao consumidor aumentem ainda mais, instando o Banco Central a elevar os juros. Do ponto de vista eleitoral, é cedo para avaliar qual será o impacto líquido de uma combinação entre mais inflação e menos desemprego. Muita coisa ainda vai acontecer na economia nesses milhares de anos que nos afastam da escolha do novo presidente. Mesmo sem saúde, a morte do governo ainda é incerta. ECONOMISTA, FOI DIRETOR DE POLÍTICA MONETÁRIA DO BANCO CENTRAL E PROFESSOR DE ECONOMIA DA PUC-SP E FGV-SP. E-MAIL : LUISEDUARDOASSIS@GMAIL.COM O ESTADO DE S. PAULO
STJ pode ressuscitar ações judiciais de poupadores contra planos econômico
Uma questão processual poderá reabrir o prazo para que poupadores entrem com ações judiciais contra os planos econômicos dos anos 80 e 90 – Bresser, Verão e Collor -, a chamada discussão dos expurgos inflacionários. Se confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), “ressuscitaria” todos os casos já prescritos. O impacto seria de mais de R$ 150 bilhões para o sistema financeiro. Por enquanto, dos três ministros que votaram, dois se posicionaram pela possibilidade de reabertura do prazo. Mas a conclusão depende dos votos de outros dez. Os ministros da Corte Especial – a quem cabe a última palavra do STJ – pretendem concluir neste mês o julgamento. E o efeito do acórdão será repetitivo, vinculante para o Judiciário. Eles discutem se a ação coletiva interrompe o prazo para a propositura de ações individuais sobre o mesmo tema. Na prática, se eles entenderem que sim, os poupadores que não buscaram o Judiciário nas últimas décadas ainda terão chances de reivindicar o direito à correção pelas perdas decorrentes dos planos Bresser (1987), Verão (1989) e Collor I e II (1990 e 1991). Isso porque haveria uma mudança na contagem do prazo que o poupador tem para entrar com a ação na Justiça. Pela regra geral, eram 20 anos a partir da implementação do plano econômico. Assim, ninguém mais teria tempo hábil para buscar o Judiciário. O formato atualmente em debate no STJ, porém, garantiria um prazo extra. O poupador teria dez anos – a metade do prazo total – contados a partir do encerramento da ação coletiva, para buscar, individualmente, o seu direito na Justiça. O caso concreto que chegou à Corte Especial envolve uma poupadora do Rio Grande do Sul (Resp nº 1233314) que diz ter sofrido prejuízos com o Plano Verão. Ela entrou com ação judicial contra a Caixa Econômica Federal (CEF) no ano de 2009. Mas o seu direito foi considerado prescrito tanto na primeira como na segunda instância da Justiça. O prazo de 20 anos, afirmaram o juiz e os desembargadores, havia se esgotado um ano antes. A poupadora recorreu ao STJ. Afirmou que associações em defesa do consumidor ingressaram com ação coletiva para tratar do mesmo tema no ano de 2007, o que interrompeu o prazo de prescrição da ação individual. O advogado Eduardo Davoglio, representante da poupadora no processo, diz que o artigo 240 do Código de Processo Civil (CPC) e os artigos 202 e 203 do Código Civil dão respaldo à afirmação. Consta nos dispositivos que a prescrição poderá ser interrompida por ato judicial que “constitua em mora o devedor”. O advogado sustenta que a citação dos bancos, feita nas ações coletivas, ou seja, informando sobre os valores devidos aos poupadores, cumpre esse papel. “As entidades entraram com as ações em nome dos consumidores. O poupador tem a opção de esperar por aquela ação para, se achar necessário, entrar com o seu processo individual”, diz. Esse caso está em julgamento, na Corte Especial do STJ, desde 2016. Naquela ocasião, somente o relator, ministro Luis Felipe Salomão, proferiu voto. Ele se posicionou contra a reabertura do prazo. Houve um pedido de vista e o processo ficou parado por cinco anos. Voltou à pauta na quarta-feira, com os votos dos ministros Herman Benjamin e Nancy Andrighi. Ambos entenderam pela possibilidade do prazo mais amplo. Na quarta-feira, o debate foi suspenso por um pedido do ministro Mauro Campbell, que prometeu trazer o voto na próxima sessão da Corte Especial, marcada para o dia 16. Pelo regimento do STJ, não seriam mais possíveis novos pedidos de vista. Herman Benjamin e Nancy Andrighi afirmam que há jurisprudência no tribunal permitindo a interrupção do prazo. “A legislação dá a opção ao jurisdicionado de ingressar com a ação coletiva ou utilizar título executivo judicial para requerer a execução individual”, disse Benjamin, citando o artigo 240 do CPC. Os dois ministros levaram em conta ainda dispositivos do Código de Defesa do Consumidor. “Uma sentença julgada procedente em ação coletiva, tem o efeito de tornar certa, de forma automática, a obrigação do réu de indenizar danos individuais decorrentes do mesmo ato ilícito”, disse Nancy. Esse efeito, acrescentou, está presente em todas as ações coletivas, “mesmo que não versem sobre direito consumerista”. Na ocasião, o relator, ministro Salomão, defendeu novamente o seu posicionamento. “O que estamos tratando aqui não é execução individual ou prazo para execução individual da sentença coletiva. Mas de reavivar um prazo para as ações individuais que, hoje, estão mortas”, frisou. Para Salomão, o desejo de interromper a prescrição com a ação coletiva se choca com os princípios da segurança jurídica e da legalidade. Ele destacou que a ampliação do prazo poderá, inclusive, impactar o acordo de pagamento firmado entre bancos, poupadores e o governo. “Se nós reconhecermos que as ações coletivas interrompem o prazo para as ações individuais, o tribunal terá dado com uma mão e tirado com a outra. Porque vão voltar todas aquelas ações individuais. Vai ser uma avalanche”, afirmou. O chamado “acordão” foi homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no ano de 2018. Na época falava-se em cerca de 730 mil ações judiciais em curso. Os bancos se comprometeram em pagar a diferença entre o índice inflacionário vigente no período e o de atualização monetária usado para a correção das poupanças. Já o poupador, como contrapartida, ao aceitar a proposta, tem que desistir do processo judicial. O prazo de adesão se encerra no ano de 2025. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) detalha, por meio de nota, que o impacto da questão seria de “ao menos” R$ 150 bilhões porque, segundo estudo técnico elaborado pelo economista Bernard Appy, as cifras ficariam entre R$ 300 bilhões e R$ 400 bilhões. Mas a entidade pondera que estimativas mais precisas dependeriam de se saber qual é o exato universo de poupadores, “podendo alcançar inclusive todos os casos que já estavam prescritos”. Na nota, a Febraban afirma ainda que se o prazo for reaberto “haverá uma eternização dos conflitos, com reflexos para todas as áreas, incluindo consumo, previdenciária e ambiental”.
Líderes devem analisar proposta da Economia sobre mudança no IR antes de envio ao Congresso
Aliados do governo no Congresso afirmam que a proposta do Ministério da Economia para aumentar a faixa salarial que terá isenção no imposto de renda está quase pronta, mas, antes de seguir ao Parlamento, passará pelo crivo dos líderes partidários. Como o aumento tem sido considerado tímido, o objetivo da revisão pelos parlamentares antes do envio é evitar problemas na aprovação do que sobrou da reforma tributária. “Guedes tem que entrar em acordo com a Câmara”, diz Cezinha da Madureira (PSD-SP), líder da bancada evangélica. O deputado ainda avalia que apesar da decisão de fatiar a reforma, que deverá ser separada em cinco, o Congresso vai aprovar as mudanças. “Arthur Lira (PP-AL) [presidente da Câmara] é um trator. Ele vai aprovar o que quiser”, disse Cezinha. FOLHA DE S. PAULO
Aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda gera resistência no Ministério da Economia
Promessa da campanha eleitoral ainda não cumprida pelo presidente Jair Bolsonaro, o aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) entrou forte na discussão da reforma tributária no Congresso e vai exigir da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, jogo de cintura para compensar a perda de arrecadação sem comprometer a espinha dorsal do desenho das outras mudanças previstas no sistema tributário. Uma das preocupações entre os técnicos do Ministério Economia é de que o debate em torno do IR, sempre muito acalorado e popular, não ofusque e atrapalhe a aprovação da reforma tributária na Câmara este ano. Além da criação de um projeto que cria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) substituindo os impostos PIS/Cofins, a proposta de reforma fatiada inclui um projeto amplo que o governo planeja na tributação do IR tanto das empresas como das pessoas físicas, inclusive com alterações nas aplicações de investimentos de renda fixa. O projeto de reforma no IR já está em fase final de elaboração pela equipe econômica para ser validado pelo presidente. Com a eleição em 2022, o Congresso já deu sinais de que vai trabalhar para um aumento maior da isenção, enquanto a equipe econômica trabalha com a possibilidade de elevar para o limite um patamar até R$ 2,5 mil, considerado baixo pelos parlamentares depois de anos sem correção da tabela. Uma corrente forte no Congresso quer aumentar o limite para R$ 4 mil e outra defende um meio termo para a faixa de isenção subir para R$ 3 mil. A última vez que a tabela do IPRF foi corrigida pela inflação ocorreu em 2015. O represamento da correção é motivo de insatisfação na população que é atingida pela mordida da Receita. Hoje, a isenção hoje só vale para quem ganha até R$ 1.903,98 por mês. Nas eleições de 2018, Bolsonaro prometeu aumentar a faixa de desoneração para até cinco salários mínimos. O mesmo compromisso foi seguido na época pelo seu oponente, o candidato do PT na época, Fernando Haddad. Bolsonaro não quer ir para as eleições sem cumprir a promessa. Para desonerar de um lado, o governo terá que pesar a mão em outros pontos das mudanças no IR, se não quiser perder arrecadação. Pelo projeto em discussão, a alíquota do IR cobrado das empresas deve cair de 25% para 20%, num prazo de dois anos. Para compensar, o governo deve propor a volta da tributação dos lucros e dividendos para a pessoa física. O ESTADO DE S. PAULO
Internet ‘salva’ pequeno e fortalece líderes
O avanço da digitalização no varejo, que ampliou a venda dos pequenos negócios pelo canal on-line em vários cantos do país, não impediu o aumento da concentração no setor. Vem crescendo o número de lojistas digitais desde 2020, mas a crise, que fechou pontos, secou o crédito e fez disparar as vendas virtuais de grandes varejistas, também acelerou a consolidação no comércio. No varejo alimentar, com base em dados do ranking anual associação brasileira de supermercados (Abras), as cinco maiores redes do país responderam por 33,3% do faturamento do autosserviço em 2020, versus 32,1% um ano antes. As cinco maiores redes – Carrefour, Assaí, GPA, Big (Ex-Walmart) e Grupo Mateus – adicionaram às suas vendas R$ 27,3 bilhões em 2020, em relação a 2019. Na lista das 20 maiores, essas cinco foram as que mais ganharam participação em 2020 (1,1 ponto, para 33,3%). O grupo de empresas que avançou menos está no piso do ranking. As varejistas que ocupam da 16ª à 20ª posição ganharam, em conjunto, apenas 0,1 ponto, para 2,8%. No total, as 20 maiores cadeias passaram de uma fatia de 45,8% em 2019 para 47,7% em 2020. Esses cálculos consideram os números do ranking da Abras, das 500 maiores redes, de 2019 e de 2020, divulgado em maio. O Valor incluiu as vendas do Big e do Grupo Mateus, que não aparecem no levantamento da associação, mas são públicos. As vendas do Carrefour incluem o Atacadão. O Assaí foi separado do GPA em 2020 e aparece desta forma no ranking de cada ano. No varejo de duráveis (eletrônicos e eletrodomésticos), dados da GfK Brasil, coletados a pedido do Valor, mostram que varejistas com atuação nacional, em mais de quatro Estados, atingiram fatia de 88% nas vendas de janeiro a abril deste ano, versus 86% no acumulado de 2020 e 84% em 2019. Essas redes nacionais são 30% do total de grupos com atuação no país. Ou seja, as cadeias regionais, que são 70% da base total, têm apenas 12% das vendas hoje. E essa fatia vem caindo – era 16% em 2019 e 14% em 2020. De janeiro a abril, as vendas (em valor) nas redes nacionais cresceram 46% e nas regionais, 26%, relata a GfK. A consultoria não cita nomes de empresas no levantamento, mas segundo ranking da Similarweb baseado em visitações a sites, as maiores são Mercado Livre, Americanas, Amazon, Magazine Luiza e Casas Bahia (Via). Na venda física, Magazine, Via e Lojas Americanas estão entre as maiores. “Não se pode dizer que o avanço das marcas nacionais na pandemia é algo necessariamente ruim ao mercado ou ao cliente. Há forte competição entre as cadeias, e elas têm ressaltado a existência de uma intensa disputa em preço desde o ano passado” diz Fernando Baialuna, diretor de varejo da GfK. Na avaliação de Alberto Serrentino, sócio fundador da Varese Retail, mesmo que o digital tenha ajudado os médios e pequenos desde a pandemia, “o rolo compressor de grandes empresas, principalmente no setor eletroeletrônico, como Magazine Luiza ou Via Varejo, é algo desproporcional, que desequilibra as forças”. Somadas, as duas redes venderam R$ 70 bilhões em 2020, R$ 13 bilhões a mais que em 2019. É como se, em um ano, elas adicionassem a seus números o equivalente a duas Lojas Cem, rede forte do interior palista. Já no alimentar, a aceleração do atacarejo bem acima da média deu novo gás a essa concentração. Apesar do “boom” dos mercadinhos de bairro na pandemia, que favorece os pequenos negócios, a alta não chegou perto da expansão do atacado. “O atacarejo é um canal que vai muito bem na crise e ele pesa mais nas vendas das grandes cadeias, como no GPA [que tinha Assaí como subsidiária], no Atacadão, controlado pelo Carrefour, e no Grupo Mateus”. O atacarejo cresceu 20% neste ano até maio, segundo dados da Nielsen, e o autosserviço, 12%. Para Ronaldo Vasconcelos, sócio da RV3 Consultores, focada em recuperação judicial e gestão financeira, as grandes redes têm acesso ao mercado de capitais e fizeram emissões de debêntures, que reforçaram o capital de giro, e ofertas de ações – parte desses recursos foi para aquisições. “Com caixa mais reforçado, elas ainda conseguiram ampliar mais seus estoques que as redes menores, num momento que faltavam produtos”, diz o advogado. O volume de ofertas de varejistas na B3 em 2020 superou o acumulado da última década. Sobre as emissões de dívida de varejistas, foram 12 até junho – em 2020 atingiram 16, calculou o Valor com base em dados da Anbima, associação de entidades do mercado financeiro. Medidas tomadas pela administração antes da crise ainda têm peso nessa conta. O Carrefour comprou o Makro em 2019, adicionado quase R$ 3 bilhões em vendas (5% da receita do Carrefour na época). O Magazine Luiza fechou acordos de cessão de pontos de redes locais no Nordeste e Nordeste antes da crise. E a Americanas tem comprado startups para o seu “marketplace” (shopping virtual) desde 2017. Isso tudo amplia escala e acelera a concentração. Há também o peso do digital nesse processo, mas essa questão é um pouco mais complexa. É fato que a aceleração do marketplace ajuda o pequeno e médio lojista. Americanas e Submarino têm cerca de 90 mil vendedores, e o Magalu, 50 mil – em ambas o número dobrou em um ano. Mas a boa fase dos marketplaces pode estar fortalecendo também as grandes redes. A rede Pão de Açúcar abriu loja no Mercado Livre, e o Big, dono do Sam’s Club, tem acordo com a Americanas desde 2020. Consultores lembram que nesse novo jogo de forças, é interessante aos regionais que as grandes plataformas sejam rentáveis. “As redes líderes têm que buscar essas parcerias para conseguir montar estruturas digitais viáveis por causa da logística cara e complexa no Brasil. Por isso, há essa parceria entre elas. Cabe ao pequeno negócio aprender a explorar esse novo ecossistema que está sendo criado”, diz Baialuna. VALOR ECONÔMICO
Autismo demanda adaptação de empresas para incluir profissionais no mercado
No dia 8 de maio, o empresário Elon Musk apresentou o Saturday Night Live, um dos programas de maior audiência na televisão norte-americana, e revelou que tinha autismo: “Na verdade, estou fazendo história esta noite como a primeira pessoa com Asperger a apresentar o Saturday Night Live.” A declaração do bilionário fundador e CEO da Tesla deu força à discussão sobre a inclusão de autistas no mercado de trabalho e, ao mesmo tempo, ressaltou as dificuldades para alavancar esse processo de diversidade ligado a pessoas neurodiversas. Apesar da declaração dada por Musk – a nomenclatura Síndrome de Asperger foi descontinuada nos últimos anos (leia mais abaixo) -, a realidade mostra que o mercado de trabalho não só precisa avançar no número de autistas contratados como deve buscar maneiras para tornar o ambiente profissional confortável para pessoas com o Transtorno do Espectro do Autista (TEA). Segundo a pesquisa Pessoas com Deficiência e Emprego, divulgada em maio pela Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Estado de São Paulo, 35% das pessoas entrevistadas (que têm algum tipo de deficiência) estão desempregadas. Na população brasileira, o desemprego passa de 14%. Conclusão do próprio levantamento, feito com 8.485 pessoas, diz que aquelas com algum tipo de deficiência cognitiva (incluindo autismo) são as que mais encontram barreiras para a inclusão no mercado de trabalho. Para Gabrielle Ramos, product owner (gerente de produto) em uma empresa de Belo Horizonte e autista de nível 1 (leve a moderado, leia mais abaixo), o que falta para que as pessoas com TEA entrem no mercado de trabalho é incentivo e adaptação: “Quando os processos seletivos forem adaptados para autistas, não vão faltar pessoas para ocupar as vagas no mercado”. Gabrielle corrobora a tese de que quanto mais aparente é o autismo dos candidatos mais rápida é a exclusão em processos seletivos. “Já fui excluída em 1 minuto de um processo seletivo porque minha condição era muito ‘aparente’ e me disseram isso. Outra vez fui excluída de um processo no qual eu era a única candidata.” As entrevistas e dinâmicas em grupo podem ser desconfortáveis para pessoas neurodiversas e, se elas deixam transparecer a condição, já são descartadas. Atualmente, Gabrielle trabalha numa empresa de viagens que há mais de dois anos efetuou sua contratação, mas adaptações foram necessárias para tornar o cotidiano mais agradável. “Com um mês na empresa eu escrevi uma carta sobre o que adaptar e me ajudaram. As reuniões são mais rápidas, usam menos metáforas e reduziram o barulho”, relembra. Para ela, além de empresas divulgarem que estão criando cotas para minorias, para aumentar diversidade e inclusão com igualdade de gênero, igualdade racial e pessoas com deficiência, falta trabalhar com esses aspectos dentro da corporação após as contratações. “Publicar sobre diversidade é fácil, mas quando alguém diferente chega é excluído. Se conseguirmos quebrar os paradigmas com informações sobre o autismo, já vai ajudar muito.” Iniciativas ajudam autistasPara ajudar empresas que desejam começar a contratar pessoas com autismo, Izabel Barros, cofundadora da Associação da Síndrome de Asperger no Transtorno do Espectro do Autismo (ASA-TEA MG), uma associação que reúne familiares e profissionais em prol dos direitos dos autistas, ressalta que a compreensão é o primeiro passo. “Muitas vezes as empresas preferem contratar pessoas com deficiência que é cadeirante, por exemplo, porque constroem uma rampa e está tudo bem. Com um autista a rampa não é física, é uma rampa que a gente chama de atitudinal. Essas rampas atitudinais demandam um maior afeto, um olhar mais aberto, sair da caixinha. Não é só uma barreira física”, ela explica. Para tornar o mercado mais inclusivo, Izabel desenvolveu com a ASA-TEA um trabalho de perfilamento dos autistas para direcioná-los às vagas mais adequadas. “As pessoas acham que o autista só serve pra arrumar prateleira e não é bem assim. A gente procura talentos para sair do empilhar caixa, porque as pessoas com TEA têm talentos apurados e hiperfoco.” Ao contratar estas pessoas, muitos empresários são surpreendidos com o desempenho dos novos funcionários, Izabel garante: “Eles (autistas) vão além das expectativas quando você encontra o talento certo”. A inclusão é um caminho que passa por iniciativas como a ASA-TEA, mas também pela escolha que empresários e profissionais de Recursos Humanos fazem de contratar autistas. Renata Transmonte, gerente de People da everis Brasil, ressalta a importância de que empresas contratem pessoas com TEA: “O autismo precisa ter mais espaço igual às outras diversidades. Eu diria para outras empresas conhecerem mais esse mundo e se abrirem”. A everis Brasil é uma das empresas que patrocina o Autismo Tech, um evento online idealizado pela Faculdade de Informática e Administração Paulista (Fiap) que promove a capacitação em https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg para pessoas autistas. Além de um hackathon com premiação de R$ 20 mil, o evento também conta com Trilhas de Conhecimento nas áreas de QA (Testes de Softwares), Games e Salesforce Developer. Quer debater assuntos de Carreira e Empreendedorismo? Entre para o nosso grupo no Telegram pelo link ou digite @gruposuacarreira na barra de pesquisa do aplicativo.Inscrições para as capacitações estão abertas até 20 de junho – no dia 18 de junho é comemorado o Dia do Orgulho Autista. A everis será a responsável pela trilha de QA do evento e, para Renata, esta é a oportunidade perfeita para incluir mais autistas no mercado: “Nós olhamos para as capacidades, e não as limitações. E, nesse momento, as características dos autistas são diferenciais para a empresa.” Autismo e Síndrome de AspergerApesar de Elon Musk ter dito que possuía a Síndrome de Asperger, essa denominação foi descontinuada. Lorenzo Natale, psicólogo clínico em Belo Horizonte, esclarece que Asperger era uma denominação utilizada pela Classificação Internacional das Doenças (CID-10) e pelo Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (DSM-IV) para descrever os casos leves de autismo. “O avanço científico das pesquisas evidenciaram que a Síndrome de Asperger e o autismo ‘clássico’ na verdade eram variações de um mesmo transtorno”, diz Natale. Além disso, acrescenta ele, a mudança tornou a comunicação entre profissionais mais objetiva. Atualmente, as pessoas com Asperger
Cresce a contratação de estagiários negros nas companhias
As contratações de estagiários autodeclarados pretos e pardos quase triplicaram no início de 2021. Foram 743 admissões no primeiro trimestre, ante 250 nos primeiros três meses de 2020 – um aumento de 197%, de acordo com a Companhia de Estágios, empresa de seleção de estagiários, trainees e aprendizes. O levantamento foi feito a partir de uma base com 3.347 estudantes negros admitidos entre 2018 e 2020. “Esse indicador tem aumentado ano a ano”, diz Tiago Mavichian, CEO e fundador da Companhia de Estágios. De acordo com o estudo, a convocação de universitários negros subiu 96% entre 2018 e 2019 e 150% de 2018 para 2020. Uma das principais razões da escalada dos números é o crescimento da quantidade de programas de estágio com metas de diversidade racial. Em 2017, 42% das ações de seleção conduzidas pela Companhia de Estágios tinham essa preocupação. Em 2018, 61%. Em 2019, 80%, e em 2020, 87%. Outra mola propulsora é a queda da exigência dos empregadores em relação às atividades anteriores dos candidatos. “As organizações estão contratando mais jovens sem experiência prévia”, diz Mavichian. Em 2018, apenas 6% dos negros garantiram estágios sem anotações no currículo. No ano passado, esse número alcançou 19% – um salto de 217% em três anos. É o caso de Yasmin Carneiro Barreto, 20 anos, há dois como estagiária do escritório de advocacia Mattos Filho, um dos maiores do país, com 1,4 mil funcionários. “É a minha primeira experiência profissional”, diz a auxiliar jurídica, no terceiro ano do curso de direito da Universidade Federal Fluminense. Ela integra a equipe de prática de infraestrutura e energia, junto com três sócios da banca. “Auxilio os advogados nas demandas relativas aos clientes desses setores, pesquiso questões regulatórias e elaboro petições, memorandos e minutas”, diz. As atividades ainda incluem revisão de contratos, elaboração de defesas em processos administrativos e auditoria de ativos em operações de fusões e aquisições. “Sempre vi a imagem do negro desassociada do ambiente profissional, o que reforça o racismo na empregabilidade brasileira e contribui para que o ambiente jurídico seja majoritariamente branco e elitizado”, diz Yasmin. “Precisamos que isso mude.” Há dois anos, o Mattos Filho criou o Soma Talentos, um programa para universitários autodeclarados negros que estão no 1º ou 2º ano de direito. Oferece aulas de inglês e “português jurídico”, além de trilhas de capacitação e mentoria com os sócios. A iniciativa está na terceira edição e recebeu 1.713 inscrições, para oportunidades em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Dos 33 estudantes que ingressaram nas duas primeiras chamadas, 29 permanecem no escritório. Somente este ano, na terceira convocação, o Soma Talentos acumulou 562 inscrições, encerradas em maio. São dez vagas disponíveis. “Também organizamos um treinamento, antes da contratação e do onboarding, voltado ao letramento racial e vieses inconscientes, para os gestores que acompanharão os jovens”, diz Renata Maiorino, diretora de desenvolvimento humano do Mattos Filho. De acordo com ela, o movimento serve também para encaminhar mais profissionais negros a postos de liderança. “Esse é um dos principais objetivos, além de fomentar ‘role models’ e a diversidade racial.” Entre os atuais sócios, mais de 20% começaram como estagiários. Hoje, o escritório tem uma sócia e uma gerente de recursos humanos autodeclaradas negras. Dos 235 estagiários do quadro atual, 22,5% são pretos ou pardos. Na multinacional de bens de consumo P&G, dos 103 estagiários do escritório central de São Paulo, 25% se autodeclaram negros. Já nas contratações de iniciantes feitas entre julho de 2020 e junho de 2021, 38% são negros, diz Thatyana Souza, gerente sênior de talentos, equidade e inclusão. No ano passado, a companhia de quatro mil funcionários no Brasil criou um programa de desenvolvimento focado em estudantes negros. O “P&G para Você” inclui 12 meses de bolsa integral de inglês, mentorias com gerentes e treinamentos em “soft skills” (habilidades ligadas ao comportamento). Depois do período de curso, os candidatos fazem um teste de proficiência no idioma e, se aprovados, ingressam em um estágio gerencial, considerado a principal porta de entrada do grupo. “Precisamos desenvolver um ambiente que inclua”, diz Thatyana. Na opinião da executiva, o inglês fluente é uma das principais barreiras para o ingresso dos jovens. “Como somos uma multinacional, escolhemos investir no idioma antes do dia 1 na empresa, para que o candidato tenha acesso às mesmas oportunidades.” Em três edições, a iniciativa de capacitação recebeu 1.320 inscrições e acaba de ser ampliada. Antes concentrada no escritório paulista, foi expandida para todas as fábricas da marca no Brasil (SP, RJ e AM), com 50 vagas. Em um ano, foram contratados sete participantes para o programa gerencial e outros quatro começarão até julho. Uma nova chamada será aberta no segundo semestre. Thatyana diz que a representatividade de talentos negros e pardos na companhia chega a 32%, sendo que 10% ocupam cadeiras gerenciais. Na P&G há cinco meses, Bianca do Nascimento Barreto, 21, entrou no estágio gerencial em marketing para a marca Pantene. Estudante do terceiro ano do curso de relações internacionais da Universidade de São Paulo (USP), participa de projetos de ecommerce e do relacionamento com influenciadores. “Dou suporte para qualquer iniciativa da Pantene, como durante o BBB21, quando liderei três envios de itens para a casa e a promoção atrelada a uma prova do líder.” Bianca estabeleceu contato com a P&G em uma feira de recrutamento na USP. Depois disso, ficou de olho nas comunicações de vaga da fabricante. “A oportunidade de ser efetivada como gerente fez a diferença no momento de escolher a companhia”, diz a universitária, em seu primeiro estágio. Na Bayer, a visão de futuro também norteia a entrada de novos funcionários negros. No ano passado, a empresa criou o Liderança Negra, programa de trainees exclusivo para profissionais negros que atraiu mais de 25 mil interessados em um mês. Com 19 vagas em cinco cidades, 16 foram ocupadas por mulheres – os selecionados têm entre 22 e 30 anos. A ideia é trazer mais inovação para a companhia, diz Patrícia Leung, líder de employer branding, university relations e onboarding
Economistas passam a prever alta do PIB maior que 4% neste ano
Os economistas do mercado financeiro alteraram suas projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2021 e passaram a prever alta superior a 4%. Conforme o Relatório de Mercado Focus, divulgado nesta segunda-feira, 7, pelo Banco Central, a expectativa para a economia este ano passou de alta de 3,96% para elevação de 4,36%. Para 2022, o mercado financeiro alterou a previsão do PIB de alta de 2,25% para 2,31%. A expectativa para o nível de atividade foi feita em meio à pandemia da covid-19, que derrubou a economia mundial em 2020 e continua sendo um fator de desgaste em 2021. Entretanto, a economia brasileira tem mostrado reação nos últimos meses. Na semana passada, o IBGE informou que o PIB cresceu 1,2% nos primeiros três meses de 2021, na comparação com o trimestre anterior. Os números confirmaram que a economia brasileira iniciou o ano em expansão, dando sequência à recuperação dos danos causados pela pandemia, embora o ritmo tenha perdido força – a alta foi menor que a registrada nos dois trimestres anteriores. Ainda assim, o resultado foi suficiente para levar o PIB de volta ao patamar do quarto trimestre de 2019 em termos de volume. No Focus desta segunda, a projeção para a produção industrial de 2021 passou de alta de 5,50% para 6,10%. No caso de 2022, a estimativa de crescimento da produção industrial passou de 2,30% para 2,40%. Inflação cada vez mais acima da meta, segundo projeçõesPara o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do país, a expectativa do mercado para este ano subiu de 5,31% para 5,44%. Segundo o Banco Central, essa foi a nona semana seguida de alta na expectativa. O centro da meta de inflação, em 2020, é de 3,75%. Pelo sistema vigente no país, será considerada cumprida se ficar entre 2,25% e 5,25%. Com isso, a projeção do mercado fica cada vez mais acima do teto do sistema de metas. A meta de inflação é fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Para alcançá-la, o Banco Central eleva ou reduz a taxa básica de juros da economia. Em 2020, pressionado pelos preços dos alimentos, o IPCA ficou em 4,52%, acima do centro da meta para o ano, que era de 4%, mas dentro do intervalo de tolerância. Foi a maior inflação anual desde 2016. Para 2022, o mercado financeiro elevou de 3,68% para 3,70% a estimativa de inflação. No ano que vem, a meta central de inflação é de 3,50% e será oficialmente cumprida se o índice oscilar de 2% a 5%. Taxa básica de juros em 5,75% no fim do anoO mercado financeiro manteve em 5,75% ao ano a previsão para a Selic no fim de 2021. Com isso, os analistas seguem estimando novas altas dos juros em 2021. Em março, na primeira elevação em quase seis anos, a taxa básica da economia foi aumentada pelo BC para 2,75% ao ano. E, na semana passada, o Copom elevou o juro para 3,5% ao ano. Para o fim de 2022, os economistas do mercado financeiro mantiveram a expectativa para a taxa Selic em 6,50% ao ano, o que pressupõe que a taxa de juro básico continuará subindo no próximo ano. O ESTADO DE S. PAULO
‘Isentar imposto é fortalecer o consumo’, diz presidente da Frente Parlamentar de Reforma Tributária
Presidente da Frente Parlamentar Mista de Reforma Tributária, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), avalia que o sentimento do plenário da Câmara é o de elevar a faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para R$ 3 mil. Segundo ele, esse é um meio termo entre o desejo político dos parlamentares e do presidente Jair Bolsonaro de aumentar o limite para R$ 4 mil e o da equipe econômica de elevar o valor para até R$ 2,5 mil. O limite atual é de R$ 1,9 mil por mês. Segundo o Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), a tabela acumula uma defasagem de 113,09% desde 1996. A inflação acumulada foi 346,69%, enquanto as correções somaram 109,63%. A falta de atualização tem levado o brasileiro a pagar mais imposto a cada ano e deixado mais trabalhadores fora do limite de isenção. Caso as correções tivessem sido feitas, de acordo com o Sindifisco, estariam isentos os salários até R$ 4.022,89 O aumento da isenção do IRPF é uma promessa de campanha do presidente Bolsonaro. Já está acertado que a medida será incluída nas etapas da reforma tributária que a Câmara vai discutir esse ano após a divisão dos projetos feita com o Senado. Cotado para assumir uma das relatorias da reforma, Miranda defende a criação de uma faixa adicional do IRPF para tributar os supersalários com alíquota efetiva de 30% – hoje a maior alíquota é de 27,5% para ganhos acima de R$ 4.664,68. “A discussão que sempre foi tratada é que quanto maior for a isenção, maior a geração de emprego porque esse imposto que deixar de ser pago vai para o consumo”, afirma. Veja a seguir os principais trechos da entrevista: O que esperar de mudanças no Imposto de Renda?Existe um sentimento muito forte da volta da tributação de lucros e dividendos. A ideia é trabalhar com o que já existiu para não criar animosidade. Retornaria o que já foi, 15% no passado. Eu defendo 20%. Por quê?Para podermos reduzir um porcentual maior do IR das empresas. Para chegar mais perto de uma competitividade com os Estados Unidos. Qual o objetivo de cobrar lucros e dividendos, que ninguém entendeu ainda? Não é arrecadar. Quanto menor for a alíquota do IRPJ, mais lucro as empresas terão. A tendência é que as empresas sigam o caminho das empresas americanas quando o imposto foi reduzido lá: um reinvestimento maior. Não tem furo. As empresas com mais lucro vão contratar mais, contribuindo com uma arrecadação e um consumo maior. O que pode sair de mudanças no IR para pessoas físicas?Eu defendo uma faixa de isenção até R$ 4 mil reais, aumentando o número de faixas com uma extra para tributar o que muitos chamam de supersalários. Para tributar o extrateto (o teto do funcionalismo é de R$ 39,2 mil). Para aqueles que conseguiram ganhos acima do teto salarial do Brasil. Com a faixa de isenção aumentando, a tendência é que a alíquota real, efetiva, fique na casa dos 30%. O que se quer é usar o teto salarial do setor público?Isso mesmo. O extrateto. O próprio servidor que ganha acima do teto, hoje muito criticado pela sociedade, pagaria uma alíquota maior. É preciso fazer uma reformulação do IR para aumentar o poder de compra, fazendo com que a alíquota de 27,5% seja acima de R$ 10 mil. O aumento da faixa de isenção para R$ 4 mil não representaria uma perda de arrecadação muito grande que exigiria compensação depois?Essa é uma visão errada. Isenção da classe média baixa e pobre é fortalecimento do consumo e geração do emprego na ponta. A arrecadação tende a aumentar. Temos que tomar cuidado com a narrativa. Nos bastidores do governo, se fala num aumento da faixa de isenção para até R$ 2,5 mil.A Câmara não discutiu isso ainda. Pode ser R$ 2,5 mil? Pode, já é um poder de compra a mais para a população. Pode ser R$ 3 mil, pode ser R$ 4 mil. Se bem conheço, vai ser um meio termo que a Câmara vai buscar. O relator vai vir com R$ 4 mil, porque é o que o presidente Bolsonaro queria, a economia deve vir com R$ 2,5 mil e a Câmara deve chegar a R$ 3 mil. O sentimento do plenário é dar uma isenção de R$ 3 mil. Hoje, o desejo político é dar R$ 4 mil. O valor de R$ 2,5 mil é muito pouco. A discussão que sempre foi tratada é que, quanto maior for a isenção, maior a geração de emprego. Esse imposto que deixa de ser pago vai ser consumido. Bomba, na ponta, o comércio. Qual será o futuro do projeto da CBS formulado pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes?Lá atrás eu previa que ninguém ia permitir um imposto único sobre consumo, o IBS (Imposto sobre bens e serviços). Isso não existe. O governo federal estaria ignorando que tem uma megaestrutura da Receita Federal e teria que ter outra estrutura para cuidar do IBS. É uma simplificação que fica muito cara para a União. Com o IBS dual (um para o governo federal e outro para Estados e municípios), o governo mantém a estrutura dele para cuidar do imposto dele. Estados e municípios poderão ter uma estrutura diferenciada. A votação do CBS na Câmara é muito mais fácil de aprovar. O relatório vai vir bem diferente do projeto apresentando pelo governo. Nós estamos vivendo um momento em que a desoneração do consumo é necessária. Virá algo muito favorável para o setor produtivo. No projeto que cria a CBS, qual a melhor solução para afastar as resistências?Tem que tomar cuidado especial com o setor de serviços. Uma análise mais cautelosa do impacto, mas principalmente não gerar nenhum aumento de carga para o setor produtivo. A simplificação não é mais resposta. Ela é importante, porque diminuiu o custo do setor produtivo, mas não resolve o poder de compra. É preciso gerar emprego e só se gera com as pessoas consumindo mais. A mudança no
Plano é chance histórica de virar o jogo na taxação das grandes empresas
Por quatro décadas os impostos corporativos globais mergulharam numa “corrida para baixo”, que permitiu às grandes multinacionais reduzir suas cargas tributárias, canalizando seus lucros para jurisdições de baixa taxação. O acordo desse fim de semana entre os ministros das Finanças dos países do G-7 oferece uma oportunidade de mudar o jogo para reverter esse processo – e assegurar que as empresas estarão visivelmente dando uma contribuição justa à recuperação no pós-pandemia. Para ele ser bem-sucedido, as maiores economias do mundo precisarão aderir de uma forma mais ampla. Mas isso é do interesse delas. O acordo subverte um século de prática tributária em que os lucros são taxados só onde as empresas têm presença física. Em vez disso, qualquer país onde as maiores e mais lucrativas empresas do mundo realizarem vendas terá o direito de tributá-las em “pelo menos 20% do lucro que exceder uma margem de 10%”. Os ministros das Finanças também se comprometeram com um imposto mínimo global de ao menos 15%, numa base país a país. O acordo representa ainda uma retomada da cooperação multilateral e da liderança construtiva dos EUA depois dos anos Trump – mesmo que isso se encaixe nos esforços do governo Biden de bancar seus planos de gastos, elevando os impostos corporativos internos. Sem ele, porém, empresas americanas poderiam se movimentar mais em direção a paraísos fiscais. Se implementado, o acordo remove a ameaça de tarifas dos EUA contra países europeus que planejam taxar unilateralmente as gigantes de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg americanas. Qualquer compromisso traz imperfeições e decepções. A realocação de lucros com propósitos fiscais será confinada às cem maiores empresas globais e àquelas que realizarem “superlucros”. Mas mesmo esse alcance limitado capturará muitas das gigantes tecnológicas americanas visadas pelos europeus. A margem de 10% exigirá regras complexas. O um quinto dos lucros acima desse nível aberto à tributação internacional será relativamente pequeno, embora seja uma melhora em relação à situação atual. E o importante é que a mudança permite a taxação por países onde as empresas têm vendas, e não só onde elas estão baseadas. Mais coisas poderão ser erguidas sobre essa fundação no futuro. O imposto mínimo global de 15% está bem abaixo dos 21% que o governo Biden propôs em abril. Grupos ativistas dizem que é baixo demais. Mas a formulação “pelo menos” permite aos países adotarem alíquotas maiores. Muito importante, também, é o acordo para aplicá-lo “numa base país a país”. Isso significa que as empresas não poderão pagar uma taxa mínima média encaminhando parte dos lucros para países que cobram mais impostos e parte para regimes que cobram menos ou nenhum imposto. Em vez disso, se uma empresa pagou menos que o mínimo em qualquer país individualmente, seu país de origem poderá compensar a diferença para chegar ao piso global ou àquele que esse país implementou. Se um número suficiente de países grandes concordar em fazer o mesmo, não haverá incentivos para as empresas transferirem lucros para locais que cobram impostos baixos. Os paraísos fiscais não terão poder efetivo de veto, e o modelo de negócios de imposto zero entrará em colapso. Um acordo no âmbito do G-20 poderá bastar para isso – mas a cláusula “país a país” terá de permanecer no acordo. Faz sentido essas regras serem abraçadas pelas grandes economias, incluindo as duas maiores. A China poderá relutar em ter suas multinacionais pagando impostos em outros países. Mas é de seu interesse receber receitas de, digamos, uma empresa como a Apple, e ter um sistema fiscal global estável. Para os EUA, abrir mão de alguma receita fiscal de empresas americanas presentes em outros países poderá abrir caminho para o recolhimento de muito mais. Ninguém ganha com um sistema tributário do tipo “Velho Oeste”, em que todos tentam ganhar à custa dos outros. A chance de mudar isso não deveria ser perdida. VALOR ECONÔMICO