Consenso já (Luiz Carlos Trabuco Cappi)

Sempre em meio ao debate acirrado e franco, e respeitando os parâmetros da democracia, a sociedade brasileira já demonstrou que sabe buscar os consensos necessários para vencer seus momentos mais desafiadores. A partir de hoje, com a eleição das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, teremos pela frente mais uma oportunidade de exercer nosso talento em encontrar propostas convergentes para vencer mais um capítulo de importância histórica para a Nação: como pagar a conta fiscal da luta contra a pandemia no Brasil, voltar a crescer e criar milhões de empregos? Embora parecessem impossíveis, em diferentes ocasiões, inclusive na quadra histórica atual, foi possível construir soluções, como na árdua e demorada costura política de entendimentos para o duradouro pacto de transição à democracia, que resultou na Constituição de 1988.  Outro exemplo clássico é o Plano Real, de 1994, que possibilitou o fim da inflação, graças e após um esforço majoritário e continuado de várias tentativas de estabilização da economia ao longo de uma década. Em outubro de 2019, foi aprovada pelo Congresso a reforma da Previdência, o que demonstrou que o bom senso pode prevalecer mesmo em um clima de polarização política. As três costuras políticas se viabilizaram depois de muita negociação, compreensão dos limites e respeito às diferenças e divergências. Neste 2021, a agenda objetiva está definida, mas exige desde já a noção pragmática de que o consenso de um não representa necessariamente o consenso do outro. As reformas tributária e administrativa, as privatizações e as medidas do controle da dívida pública são tarefas que sobressaem como óbvias. Mas o caminho para chegar a elas, é pleno em obstáculos. O debate político é natural, mas não se pode colocar o País em compasso de espera. A questão é que consensos não se encontram em prateleiras, como produtos industrializados. São sim obras artesanais feitas a muitas mãos, demandam tempo, paciência e extrema dedicação. A reforma tributária é um exemplo dessa lógica. Há dois projetos no Congresso, um do Senado e outro da Câmara, prontos para votação, mas ambos dependem de acordo com o governo federal e os governadores – e há outra do Executivo. É possível, mas desde que todos se empenhem na ideia de que a reforma tributária não tem um protagonista, nem dono intelectual – ao contrário, este é um projeto altruísta, que pertence a todos. Concessões farão a diferença, e não as imposições.  Em relação à conjuntura, é consenso a renovada pauta ambiental, social e de governança. Hoje, em contraste com o que se via poucos anos atrás, não se pode ignorar os princípios ESG (Sustentabilidade, Transparência e Boa Governança).  No campo social, em ataque à desigualdade secular e ao racismo estrutural, sucedem-se mobilizações que apontam para o aumento da tomada de consciência, na sociedade, pela condenação tanto à inação frente a violências quanto a supressão de direitos civis. Há poucas dúvidas, em adendo ao tema, sobre a importância de uma política de criação de empregos no País. Milhões de postos de trabalho foram suprimidos durante a pandemia. Não haverá resgate social bem sucedido se o Congresso não contribuir para ajudar em salvar a dignidade das famílias.  É nesse contexto que se dá a renovação das Mesas do Congresso. Pode estar aí o ponto de largada para construção e execução de uma agenda inclusiva e racional para o Brasil. A Câmara dos Deputados e o Senado Federal são o principal fórum de consolidação dos consensos da nossa democracia representativa – uma síntese da nossa sociedade, que reflete seus anseios e realidades. Caberá a cada parlamentar e, em especial, aos novos dirigentes do Poder Legislativo, estabelecerem prioridades sobre que é imediato e o que poderá esperar. Que os sacrifícios dos momentos que passamos abram espaço para a busca dos consensos necessários em 2021. Essa é a esperança de todos os brasileiros. *PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BRADESCO. ESCREVE A CADA DUAS SEMANAS O ESTADO DE S. PAULO

Maia ameaça com impeachment de Bolsonaro; PSDB e Solidariedade devem rifar Baleia

A decisão da Executiva do DEM de desembarcar do bloco de apoio à candidatura do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) e a disposição do PSDB e do Solidariedade de seguir o mesmo caminho levaram o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a ameaçar aceitar um pedido de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro. A eleição que vai escolher a nova cúpula da Câmara e do Senado está marcada para esta segunda-feira, 1.º. Ao ser informado pelo presidente do DEM, ACM Neto, na noite deste domingo, 31, de que a maioria dos deputados do partido apoiaria a candidatura de Arthur Lira (Progressistas-AL) para o comando da Câmara, e não Baleia, Maia ficou irritado. O presidente da Câmara ameaçou até mesmo deixar o DEM. A reunião ocorreu na casa dele, onde também estavam líderes e dirigentes de partidos de oposição, como o PT, o PC do B e o PSB, além do próprio MDB. Maia encerra o mandato à frente da Câmara nesta segunda-feira, 1º, e, segundo apurou o Estadão, afirmou que, se o DEM lhe impusesse uma derrota, poderia, sim, sair do partido e autorizar um dos 59 pedidos de afastamento de Bolsonaro. Integrantes da oposição que estavam na reunião apoiaram o presidente da Câmara e chegaram a dizer que ele deveria aceitar até mais de um pedido contra Bolsonaro. ACM Neto passou na casa de Maia antes da reunião da Executiva do DEM justamente para informar que, dos 31 deputados da legenda, mais da metade apoiava Lira. Pelos cálculos da ala dissidente, 22 integrantes da bancada estão com Lira, que é líder do Centrão. O PSDB e o Solidariedade têm reuniões marcadas para esta segunda-feira, 1º e, diante da fragilidade da candidatura de Baleia, também ameaçam rifá-lo. “Ou mostramos força e independência apoiando claramente o Baleia ou adeus às expectativas de sermos capazes de obter alianças e ganhar as próximas eleições. Se há algo que ainda marca o PSDB é a confiança que ele é capaz de manter e expressar. Quem segue a vida política estará olhando, que ninguém se iluda”, disse recentemente o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em um grupo de WhatsApp da bancada tucana. O ex-senador José Aníbal foi na mesma linha. “O PSDB assumiu compromisso com Baleia. Espero que cumpra. De outro modo, é adesão ao genocida”, afirmou Aníbal neste domingo, 31. Maia lançou a candidatura de Baleia à sua sucessão em dezembro, com o respaldo de uma frente ampla, que incluiu partidos de esquerda. Na ocasião, o líder do DEM, Efraim Filho (PB), assinou um documento no qual o partido avalizava o nome do MDB. Diante do racha, ACM Neto atuou para amenizar a crise. Saiu da casa de Maia e foi direto para a sede do partido. Conduziu a reunião da Executiva pedindo para que o DEM ficasse oficialmente neutro. Além das ameaças de Maia, partidos de oposição afirmaram que, com o abandono de Baleia por parte do DEM, também a esquerda poderia desembarcar da candidatura de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) ao comando do Senado. Até agora, Pacheco é o favorito para a cadeira de Davi Alcolumbre (DEM-AP). O candidato do Progressistas chegou a anunciar em sua agenda que, nesta segunda, 1.º, receberia o apoio do DEM, às 9h30. A operação, porém, foi abortada por ACM Neto, que pediu aos correligionários para não humilharem Maia. Nos bastidores, deputados comentavam neste domingo que o racha pode afastar o apresentador Luciano Huck do DEM. Huck planeja entrar na política para disputar a eleição para a Presidência, em 2022, e tem flertado tanto com o DEM como com o Cidadania ao defender uma frente de centro para derrotar Bolsonaro. O ESTADO DE S. PAULO

Guedes aposta em troca no Senado e na Câmara para destravar agenda liberal

O ministro da Economia, Paulo Guedes, aposta suas fichas na troca dos comandos da Câmara e do Senado para destravar sua agenda liberal (reformas tributária, administrativa e fiscal, além de privatizações, entre outros pontos) no Congresso. O governo trabalha nos bastidores para garantir a eleição dos seus dois candidatos, o deputado Arthur Lira (PP-AL) – chamado pelo presidente Jair Bolsonaro de segundo homem do Executivo –, e o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Mas, independente dos candidatos que saírem vitoriosos na eleição marcada para esta segunda-feira, 1º, a equipe econômica, antes mesmo de retomar a pauta anterior de reformas, terá que se equilibrar na divisão de dois tipos de agendas que dominaram a cena nas últimas semanas. De um lado, a agenda de emergência para o enfrentamento da covid-19, que envolve além da prorrogação do auxílio emergencial (pago a informais, desempregados e beneficiários do Bolsa Família), a pressão para a renovação do BEm (o programa que garante um complemento de renda para os trabalhadores que tiveram salário e jornada reduzidos), a renegociação do Pronampe, voltado para o crédito de micro e pequenas empresas, um novo Refis (pagamento de débitos tributários) e demandas setoriais, como a dos bares e restaurantes, que ganharam como padrinho o presidente Jair Bolsonaro, e a dos caminhoneiros para a redução do preço do diesel. Na outra agenda, a pressão pelo pagamento da fatura dos compromissos assumidos para eleger os dois candidatos do governo, que inclui emendas parlamentares para obras públicas e demandas por mais recursos no Orçamento de 2021, que ainda não foi votado. De imediato, o ministro terá que reforçar a barreira para evitar a divisão do seu próprio superministério na reforma ministerial. Guedes não aceita essa repartição, mas nos bastidores apoia Lira (cujos aliados defendem a divisão) porque vê na união de Baleia com os partidos de oposição risco para o avanço da agenda liberal no Congresso. O grupo do Centrão favorável a Lira tem defendido a cisão do ministério da Economia (com a recriação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) desde meados de agosto do ano passado, quando foi lançado o Plano Pró-Brasil, programa que previa ampliação de investimento com recursos públicos, mas que não avançou. Na época, lideranças do Centrão queriam mais estímulos do governo para a retomada do emprego e crescimento mais rápido, o que incluía mudanças no teto de gastos, a regra constitucional que atrela o crescimento das despesas à inflação. RiscosEssa disputa do time político com o econômico representa um risco que o ministro pode enfrentar mais tarde entre os aliados do governo na agenda econômica de 2021. Um contratempo pode ser no apoio que o ministro espera de Lira para a nova CPMF, o imposto sobre transações para bancar a redução nos encargos que as empresas pagam sobre os salários dos funcionários, chamada de desoneração da folha de pagamento. O adversário de Lira, o deputado Baleia Rossi (MDB-SP), em entrevista no programa Roda Viva, da TV Cultura, fustigou Guedes . “Recordo que quando o Centrão tentou derrubar ou pelo menos desestabilizar o ministro, quando queriam furar a qualquer custo o teto de gasto, o presidente Rodrigo Maia (da Câmara) e outros líderes o apoiaram na condução da economia”, disse Baleia, que não fechou as portas para um diálogo mais tarde com Guedes, se eleito. “O ministro tem que ter um pacote bem amarrado para os primeiros meses da gestão do novo presidente da Câmara porque depois fica mais difícil e questões políticas se sobrepõem”, disse Marcos Mendes, pesquisador do Insper e consultor que acompanha em detalhes a pauta econômica no Congresso. Mendes lembrou que Guedes tem ainda a batalha do Orçamento e o crédito especial para o cumprimento da chamada regra de ouro, que proíbe que o governo se endivide para pagar gastos de custeio, como salários. Segundo Mendes, será importante observar se o Centrão vai mostrar afinamento com o governo ou se vai aumentar o custo como fez no Orçamento de 2020. O especialista diz que só vale o ministro insistir na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) emergencial se o texto, que prevê redução nas despesas obrigatórias, principalmente com servidores, for mais forte em corte de gastos do que o parecer do senador Marcio Bittar (MDB-AC). Ele sugere ainda foco na reforma tributária com empenho para votar a Contribuição de Bens e Serviços (CBS) para substituir o PIS/Cofins, que vem perdendo há anos arrecadação por causa da grande judicialização. Em encontro online com representantes de 34 associações empresariais, o candidato Arthur Lira ouviu pedido para aprovação de projetos para atacar o Custo Brasil. Um dos organizadores do evento, o diretor-geral da Associação Brasileira da Indústria de Cervejas (Cerv Brasil), Paulo Petroni, disse que há uns dez projetos no Congresso com potencial de reduzir em um terço o custo Brasil, se aprovados em 2021. “Trata-se de um trabalho contínuo, pois custo não para de crescer. Precisamos de celeridade para resolver os pontos prioritários”, disse Petroni. Três agendas econômicas em conflito. Entenda:1) Itens da pauta de pressão por renovação das medidas dadas na pandemia: Prorrogação do auxílio emergencial por mais algum meses Prorrogação do BEm, que complementa a renda dos trabalhadores que tiveram salário e jornada reduzidos, mas o modelo pode ser alterado Alongamento do prazo de oito meses de carência para o início do pagamento dos empréstimos feitos pelo Pronampe para micro e pequenas empresas Nova ampliação do Pronampe para bares e restaurantes Nova Refis (parcelamento de dívidas tributários) Redução do PIS/Cofins para reduzir preço do diesel e medidas de compensação com corte de renúncias 2) Pauta liberal do ministro da Economia, Paulo Guedes: PEC emergencial reforçada com a desindexação (tirar “amarras”) do Orçamento e mudanças no abono salarial e PEC do pacto federativo (com nova distribuição de receitas entre União, Estados e municípios) Reforma tributária com uma nova CPMF e desoneração da folha de salários Reforma administrativa e redução de gastos com pessoal Carteira Verde Amarela (um novo programa com custo menor para contratação de informais) Bolsa Família ampliado, com benefício médio maior, número maior

Sob ingerência do Planalto, Congresso elege cúpula

Marcada pela forte interferência do Palácio do Planalto, a sucessão no comando do Congresso se tornou um embate polarizado entre o bolsonarismo e seus adversários e uma espécie de largada para as articulações que miram 2022. Parlamentares vão escolher nesta segunda-feira, 1º, os novos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado. Os candidatos que contam com apoio do governo federal chegam ao dia da eleição com ampla vantagem sobre seus concorrentes diretos em votos declarados, conforme os placares do Estadão. O deputado Arthur Lira (PP-AL) supera em mais de 100 votos declarados o adversário Baleia Rossi (MDB-SP) – candidato apoiado pelo atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Entre os senadores, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que conta com o aval do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e do Planalto, já recebeu apoios públicos que, se confirmados, garantiriam sua vitória na disputa. O presidente Jair Bolsonaro não poupou esforços para impulsionar as campanhas dos candidatos aliados. O governo federal recorreu à prática da liberação de emendas e promessas de cargos para arregimentar apoios para Lira e Pacheco. Dessa forma, reforçou seus laços com o Centrão. O Estadão revelou que, a partir de dezembro, 285 parlamentares puderam indicar o destino de R$ 3 bilhões para seus redutos eleitorais, de acordo com planilha informal que listou verbas do Ministério do Desenvolvimento Regional. Dos 235 deputados que dizem votar em Lira, segundo dados de domingo, 31, do placar, 140 aparecem na planilha do governo indicando recursos extras para obras em seus Estados. No caso dos senadores, dos 41 que declaram votar em Pacheco, 24 foram beneficiados. As eleições, porém, serão realizadas por meio de votações secretas. O ESTADO DE S. PAULO