Com pandemia, desigualdade racial no mercado de trabalho bate recorde
A Justiça tem determinado a penhora de salário para o pagamento de dívida, apesar de o Código de Processo Civil (CPC) proibir expressamente a medida. As decisões são geralmente contra devedores com rendimentos considerados acima da média e sem nenhum outro bem. O limite adotado pelos magistrados é de 30% dos vencimentos. A medida já foi autorizada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e tem sido usada nas mais diversas situações. A proprietária de um imóvel, por exemplo, obteve a penhora de Após aumentar durante a crise de 2015 e 2016 e não retroceder mais, a desigualdade racial no mercado de trabalho bateu recorde neste ano. Com a pandemia da covid-19 fechando milhões de vagas e obrigando o trabalhador informal a ficar em casa, a diferença na taxa de desemprego entre pretos e pardos e o restante da população alcançou em junho 5,45 pontos porcentuais, o maior patamar desde 2012 (início da série histórica). A última vez que essa diferença havia ultrapassado 5 pontos porcentuais foi em março de 2017, quando ficou em 5,24 pontos. Enquanto o desemprego atingiu 15,8% entre pretos e pardos em junho, entre brancos, amarelos e indígenas, ficou em 10,4%, segundo dados da Pnad contabilizados pela consultoria LCA. A diferença decorre, sobretudo, do fato de a população negra ocupar mais cargos que demandam pouca qualificação, que costumam ser os primeiros cortados em uma recessão. Grande parte dos negros também está no mercado informal e não pode trabalhar por causa das medidas de distanciamento social. Entre abril e junho, o número de pessoas nesse segmento caiu 24,9% na comparação com o mesmo período do ano passado. Foi o maior recuo entre todos os grupos analisados pelo IBGE. Ainda no segundo trimestre, houve uma redução de 24,6% nas vagas para trabalhadoras domésticas, que também concentram a população negra. O resultado disso foi que a taxa de desemprego entre mulheres negras (pretas, pardas e indígenas) atingiu 18,2% em junho, entre as brancas ficou em 11,3% e entre homens brancos, 9,5%. O economista Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV Social) lembra, porém, que outros motivos podem estar acelerando a desigualdade, como o preconceito. Isso porque o número de anos que os negros têm dedicado aos estudos cresceu 12,1% entre 2014 e 2019, enquanto entre os brancos o avanço foi de 7,5%, o que indica que a desigualdade na qualificação vem sendo reduzida. Apesar dessa mudança, a renda da população negra recuou 4,9% no período e a da branca cresceu 1,8%. “O que está ao alcance das pessoas pretas e pardas, o estudo, está sendo feito. No entanto, o rendimento vem caindo”, destaca Neri. O economista destaca ainda que a distância educacional entre negros e brancos pode voltar a crescer com a pandemia. Dados do IBGE mostram que 17,3% das crianças negras não receberam o material para estudar em casa em agosto. Entre brancos, foram 8,3%. Atuando há dez anos em um dos maiores bancos privados do País, Jessica Karine Gonçalves dos Santos, de 33 anos, está entre aqueles que estão elevando os anos de estudo da população negra. Hoje pós-graduada, ela começou na área de call center do banco e chegou ao cargo de analista de RH, mas foi demitida na pandemia. Jessica, que estava trabalhando em uma proposta para aumentar a contratação de negros pelo banco, diz nunca ter sofrido ataques diretos por causa de sua cor, mas conta que havia algumas atitudes que alimentavam a percepção de desigualdade. “Era possível sentir, em alguns casos, que eu era mais cobrada por resultados que os demais.” Após ser desligada do banco, Jessica criou o Negras No Poder, um grupo no WhatsApp apenas para mulheres negras. A ideia é que elas se apoiem e debatam temas ligados à inclusão. RACISMO ESTRUTURALApesar de a pandemia ter aprofundado a desigualdade racial, as diferenças entre negros e brancos sempre existiu. O economista Michael França, pesquisador do Insper, destaca que a discriminação é um custo maior na vida dos negros. “Se pegar duas pessoas que nascem com a mesma estrutura de renda, uma branca e uma negra, a tendência é que o branco ascenda um pouco mais porque os negros vão ter de pagar esse custo.” França, que estudou fecundidade, identificação racial e desigualdade no doutorado, aponta a necessidade de se atacar a presença de negros na televisão em papéis de subordinação como forma de reduzir a desigualdade racial. Para o sociólogo Mário Rogério, do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT), é essencial que as empresas debatam o assunto, dado que o costume dos funcionários e executivos é indicar e promover seus semelhantes. “Não existem placas nas empresas de que elas não contratam negros, mas a prática é procurar sempre os iguais. Homens brancos promovendo homens brancos. Esse é um movimento cotidiano que ninguém questiona. E é lógico: os negros ficam do lado de fora.” Membro da Rede de Economistas Pretas e Pretos, Danielle Nascimento lembra que a desigualdade racial no mercado de trabalho reflete as condições sociais das populações. “Se a pessoa não têm acesso à educação ou está em condição de vulnerabilidade, a distância (dela em relação a grupos privilegiados) aumenta na crise, quando as desigualdades tendem a crescer. O primeiro ponto que precisa mudar é o acesso a oportunidades.” COMO REDUZIR A DESIGUALDADE RACIAL NA SUA EMPRESA ●Diagnóstico: levante o número de funcionários negros e quanto eles representam em relação ao total●Plano de ação: trace metas de contratação e desenvolvimento de pessoas negras. Se tiver apenas um funcionário negro, ajude-o no desenvolvimento profissional●Comunicação: tenha um site com fotos que representam a diversidade. Um site apenas com fotos de pessoas brancas é uma mensagem excludente em um país de maioria negra●Equipe: tenha um líder para defender a prioridade da pauta e crie um grupo de pessoas para dar andamento às ações●Segurança: é preciso um ambiente seguro para as pessoas proporem mudanças e medidas de igualdade dentro da empresa●Educação: elabore material educativo com especialistas que sensibilize não só funcionários, mas fornecedores e
Judiciário autoriza penhora de até 30% do salário de devedor
15% do salário de um coronel. Ele ganha R$ 18 mil e deve R$ 50 mil em alugueis. Um advogado conseguiu 15% sobre os R$ 14 mil recebidos por um delegado. A dívida de honorários é de R$ 30 mil. E um hospital obteve penhora de 20% do salário de R$ 5 mil de uma pessoa que tem dívidas hospitalares de R$ 51 mil. Nesses casos, os valores são descontados pelo próprio empregador, em cumprimento à determinação judicial, depositados em uma conta judicial, para posterior resgate pelo credor. Nas decisões, fica autorizada a penhora até o limite da dívida. O advogado Alexandre Matias, sócio da Advocacia Maciel, que atuou nos três casos, afirma que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) e o STJ possuem precedentes que relativizam a impenhorabilidade do salário até o limite de 30%, fazendo uma ponderação entre a dignidade da pessoa humana e a efetividade do pagamento da dívida. De acordo com ele, houve uma mudança significativa na redação do artigo que trata da impenhorabilidade no CPC de 2015. No novo texto não há o termo “absolutamente impenhoráveis”, previsto na norma de 1973, o que permitiria alguma flexibilização. A penhora, contudo, só tem sido adotada em casos excepcionais, quando esgotada a procura por outros bens, como dinheiro, imóveis e automóveis, listados no artigo 835 do CPC. E quando, por meio do Imposto de Renda, verifica-se o pagamento mensal de salário. “Às vezes, são vencimentos muito acima da média brasileira e, mesmo assim, o devedor se sente confortável em não pagar sua dívida”, diz Alexandre Matias. Ao analisar o pedido de um hospital (processo nº 0725233-88.2020.8.07.0000), a maioria dos desembargadores da 8ª Turma do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) foi a favor da penhora do salário de um paciente, vencido o relator, desembargador Mario-Zam Belmiro Rosa. Para ele, o artigo 833, inciso IV, do Código de Processo Civil de 2015 é claro e proíbe expressamente a medida. O desembargador Diaulas Costa Ribeiro, que apresentou o voto vencedor, destacou que a Corte Especial do STJ firmou o entendimento, em decisão de março de 2019, de que a regra geral da impenhorabilidade de salários pode ser afastada quando for observado percentual que assegure a dignidade do devedor e de sua família (EREsp 1582475). O julgador ainda cita decisão recente, publicada em junho deste ano, da 2ª Seção do STJ. O mesmo entendimento foi adotado em uma ação de despejo e cobrança de alugueis (EREsp 1701828). Segundo o advogado Luís Cascaldi, sócio de contencioso e consultivo cível do Martinelli Advogados, os pedidos de penhora de salário têm sido frequentes nas execuções, quando se diminui o campo de atuação de recuperação de crédito. “Nos deparamos com todos os tipos de decisão”, diz. No Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), afirma, existem juízes resistentes à adoção da medida. O advogado ressalta, contudo, que a tese ganhou mais força após o julgamento da Corte Especial do STJ, em 2019. “Nos casos em que o juiz vê que existe dinheiro de sobra, não há motivo para não pagar a dívida.” A 6ª Turma do TJ-DF também decidiu, por maioria, a favor da penhora numa ação de despejo e cobrança de alugueis, até o limite de R$ 50 mil. Para o relator, desembargador Alfeu Machado, “também merece proteção o direito do credor à satisfação de seu crédito (incluída a atividade satisfativa), uma vez que o salário de quase R$ 18 mil, ainda mesmo com penhora de 15%, continuará com valor que não compromete a subsistência do devedor ou de sua família”. No entendimento do magistrado, a medida “nem de longe configura sua ruína financeira, já que é devedor reconhecido em processo judicial, responsável pela satisfação do débito com seus bens, presentes e futuros, para o cumprimento de suas obrigações” (processo nº 0700218-54.2019.8.07.0000). Em um caso em que o advogado Alexandre Matias atua em causa própria, ele conseguiu decisão da 15ª Vara Cível de Brasília para penhorar 15% do salário de um delegado, que recebe cerca de R$ 14 mil mensais, para o pagamento de honorários. A dívida é de cerca de R$ 30 mil. O juiz João Luis Zorzo entendeu que a situação está entre as exceções previstas no artigo 833 do CPC. Isso porque o parágrafo 2º diz que essa vedação não se aplica para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como a valores excedentes a 50 salários mínimos mensais. Segundo o magistrado, existem diversos precedentes no STJ que reafirmam a natureza alimentar dos honorários advocatícios. A advogada Maria Tereza Tedde, do Salusse Marangoni Advogados, contudo, pondera que, além de haver uma proibição expressa da penhora de salários, essas decisões teriam que ser aplicadas apenas quando há fraude comprovada ou em casos muito excepcionais. “Dá um certo medo porque são questões muito subjetivas, como medir o que seria muito ou pouco ou suficiente para preservar a dignidade”, questiona. Para ela, como o Brasil segue cada vez mais os precedentes, é perigoso que essa orientação passe a ser aplicada de forma irrestrita. “Dependendo dos gastos, da quantidade de dependentes, mesmo um salário alto pode estar todo comprometido.” VALOR ECONÔMICO
“O que mais preocupa é a total inabilidade do governo para propor um caminho para o ajuste fiscal”
A recessão causada pela covid-19 trouxe consigo um momento “benigno” em relação aos rombos fiscais de governos mundo afora, segundo o economista José Alexandre Scheinkman, professor das universidades Columbia e Princeton, nos Estados Unidos. Para conter a pandemia, os países foram obrigados a gastar mais, e os investidores em geral não estão cobrando dos governos taxas de juros maiores para seus títulos públicos por isso. Há anos em grave desequilíbrio nas contas públicas, a economia do Brasil teria, assim, um “certo tempo” para “respirar”, enquanto o País enfrenta a covid-19 e, ao mesmo tempo, se prepara para melhorar o problema fiscal no futuro, disse Scheinkman. Mas o brasileiro, radicado nos EUA desde os anos 1970, não crê que o País aproveitará a oportunidade. Ele diz não ver outra forma de enfrentar o problema: o Executivo federal precisa apresentar um bom plano sobre quanto o Estado vai arrecadar, como vai arrecadar e o que vai fazer com esse dinheiro, eliminando despesas pouco eficazes. Porém, como não vê no governo Jair Bolsonaro a capacidade de levar um plano desse tipo adiante, Scheinkman acha que uma solução deverá ficar apenas para depois das eleições de 2022. ● O governo federal ampliou seus gastos para fazer frente à crise da pandemia. Há limite para isso? É complicado saber, porque não temos ideia do que vem pela frente em termos de covid-19. O que está sendo experimentado na Europa e nos EUA é uma segunda onda. Não sei qual a perspectiva para o Brasil. Tanto no inverno americano quanto no verão brasileiro, muita gente faz atividades dentro de casa, com aquecimento ou ar condicionado. Se houver aumento (de casos de covid-19), o governo vai ter de fazer coisas. Agora, eventualmente, isso chega a um limite. ● Os gastos poderão ficar insustentáveis? O que mais me preocupa agora são duas coisas. Uma é a total inabilidade do governo para, pelo menos, propor um caminho para o ajuste fiscal no futuro. Esse governo tem sido incapaz de fazer planos para quase tudo. A outra é que, embora o problema do ajuste fiscal no Brasil obviamente seja de nível (pelo fato de o déficit e a dívida pública já serem muito altos), mais importante ainda é que gastamos muito mal. Um país que tem o nível de renda como o do Brasil e arrecada a porcentagem do PIB (Produto Interno Bruto) que o Brasil arrecada deveria ter um sistema de esgoto quase universal. Países mais pobres e que arrecadam menos do que o Brasil conseguem oferecer para uma grande fração de suas populações um sistema de esgoto. Mas nós não conseguimos. O nosso problema fiscal não é só de nível, é um problema de alocação. ● Por que o Brasil gasta mal? Os programas no Brasil, muitas vezes, existem há muitos anos e ninguém nunca passou tempo avaliando se fazem aquilo que foram desenhados para fazer. Isso ainda é piorado pela nossa instabilidade de regras. As regras no Brasil mudam todo dia. O Supremo (Tribunal Federal) toma uma decisão sobre um caso, no ano seguinte toma uma decisão sobre o mesmo problema completamente contrária, aí um juiz dá uma decisão contrária à segunda, aí vem uma nova decisão do Congresso. É absurdo viver num país em que mesmo a Corte Suprema muda de posição a todo tempo. ● A situação do Brasil é pior do que em outros países? Nosso problema de alocação e execução é pior do que o de outros países. Não é que nos outros países seja uma maravilha, mas há países que têm sistemas de alocação e execução muito melhores, porque fazem avaliação constante, como Nova Zelândia e Austrália. Temos um sistema de impostos que é muito ruim, e a principal proposta do governo, hoje em dia, que é a volta da CPMF (o tributo sobre transações digitais, uma das propostas da equipe econômica), vai só piorar o nosso problema fiscal. Um investidor de fora olha para isso e acha que o País não vai melhorar. ● O teto de gastos melhorou o problema fiscal? Vejo o teto de gasto (regra que limita o aumento das despesas do governo à inflação do ano anterior) como um último recurso. No sentido que ele dá pelo menos um limite, com algumas exceções – como durante a pandemia, quando essas exceções foram importantes e desejáveis. O teto nos força, se for mantido, a fazer as escolhas que precisam ser feitas. É um recurso que vale a pena ter, mas o mais importante é termos uma discussão séria sobre quanto o Estado vai arrecadar da economia brasileira e o que ele vai fazer com esse dinheiro, e como ele vai arrecadar. Nos falta uma discussão desse tipo. ● Se o governo mudar o teto, a economia pode entrar em nova crise? Não sei o que é mexer no teto. O teto é flexível. Já mexemos no teto no que podemos chamar de primeira crise da pandemia. Não acho que o teto restringe os gastos quando é preciso gastar, quando é realmente uma questão importante. Portanto, acho que deveria manter o teto. Se tiver uma segunda onda (de casos da covid-19), o governo vai ter de fazer como fez na primeira, fazer uma exceção, mas manter o teto. ● O diagnóstico de que o governo gasta mal parece claro, mas o que é preciso fazer para melhorar a qualidade dos gastos? O Executivo tem de chegar com a proposta. É muito difícil essa proposta nascer no Congresso, que é um grupo heterogêneo. Os progressos que fizemos, tanto na área fiscal quanto em outras, foram propostos pelo Executivo. O Plano Real foi proposto pelo Executivo. A criação de programas de transferência direta também foi pelo Executivo, assim como a unificação e ampliação desses programas. E são programas que deram bastante certo. Obviamente, há um papel importante do Legislativo para discutir essas propostas. E do Judiciário, para julgar se os programas estão dentro da lei. Mas, historicamente, o Legislativo não desenha programas desses do zero. Nos EUA, é a mesma
IGP-M dispara e provoca nova onda de negociação entre lojistas e shoppings
A disparada do IGP-M, índice utilizado na correção dos contratos de aluguel, tem colocado lojistas e shoppings novamente na mesa de negociação. Nos primeiros meses da pandemia, as partes chegaram a um acordo para a suspensão do aluguel no período em que os estabelecimentos ficassem fechados. Agora, com os shoppings reabertos mas com movimento ainda abaixo do ano passado, os inquilinos pressionam as redes para evitar o repasse integral do IGP-M, que acumula alta de 24,25% em 12 meses, bem acima da inflação medida pelo IPCA, que subiu 3,14% no período. Embora as vendas do varejo estejam se recuperando mês após mês, a melhora ainda não é uniforme. De acordo com a Associação de Lojistas de Shoppings (Alshop) e a Associação Brasileira dos Lojistas Satélites (Ablos), as vendas ainda são de 25% a 30% menores do que no mesmo período de 2019 – o que inviabiliza um aumento nos custos neste momento, dizem. “Qualquer argumento no sentido de não absorver esse aumento do IGP-M é válido. As vendas ainda não voltaram ao patamar do ano passado. Além disso, os lojistas não têm conseguido repor os estoques em razão da falta de insumos da indústria”, diz o diretor institucional da Alshop, Luis Augusto Ildefonso. Ele explica que, desde o início da crise, os shoppings têm cedido nas negociações. “Se em abril e março houve algum endurecimento, logo depois, em maio e junho, houve concessões para não aumentar a vacância”, afirma. “Agora, em função das vendas mais baixas, há a expectativa de que haja acertos em relação a esse ajuste do IGP-M”. Ele aponta que os shoppings perderam “poder de bala” em razão do fechamento de lojas e do menor fluxo de clientes. Para o presidente da Ablos e da rede de vestuário TNG, Tito Bessa Júnior, a aplicação do reajuste certamente levaria ao fechamento de lojas. “Temos que rever como os contratos foram feitos lá atrás. Se eles (os shoppings) não aceitarem, vai haver nova onda de fechamento de lojas”, alerta. A Associação Brasileira de Franchising (ABF) – setor que amargou queda de 6,9% nas vendas do terceiro trimestre na comparação anual – enviou cartas aos shoppings pedindo a troca do IGP-M pelo IPCA para fins de reajuste do aluguel. Também cobrou a isenção do 13º aluguel e o cancelamento da taxa de repasse, um pênalti de até 10 aluguéis pago ao shopping para o repasse do ponto a outro comerciante. “Na minha visão, tem mudado muito a relação das franquias com os shoppings. Antigamente, o lojista praticamente implorava para ter um ponto. Agora, com a pandemia e a criação de novos canais de vendas, os shoppings terão de mostrar aos lojistas a que vieram”, avalia o presidente da ABF, André Friedheim. “As forças estão um pouco mais equilibradas, porque o varejista se reinventou.” DiálogoProcuradas, as maiores redes de shoppings do País – Aliansce Sonae, BRMalls, Iguatemi e Multiplan – não deram entrevista sobre o tema. Mas advogados que atuam no ramo confirmam que o diálogo entre as partes têm sido a solução para evitar tanto a debandada de lojistas quanto a ausência completa de um ajuste nos aluguéis. O sócio do escritório especializado no mercado imobiliário VBD Advogados, Olivar Vitale, acredita que a aplicação integral do IGP-M nos reajustes oneraria demais aos inquilinos neste momento de crise econômica e sanitária. Portanto, estaria sujeita a questionamentos legais. “Eu entendo que o IGP-M nas alturas cria um ônus excessivo para o locatário em benefício ao locador, o que permitiria uma revisão do contrato justificado pela pandemia, que é fator externo fora do controle das partes”, diz. “O IGP-M está em quase 25% em 12 meses, mas nem o valor do aluguel, nem o valor de compra e venda do imóvel subiram 25% em 12 meses”, argumenta o advogado, explicando que a aplicação integral do IGP-M daria um ganho desequilibrado ao shopping. Segundo Vitale, ainda não há um número grande de disputas que foram parar na Justiça. No entanto, a tendência é de alta. “O número de casos está crescendo e deve continuar assim à medida em o IGP-M não para de subir e as datas de reajustes contratuais vão chegando”, alerta. Em paralelo, a prática da renegociação de contratos entre as partes também vem crescendo – o que não era tão comum no mundo dos negócios pré-pandemia. “A tônica tem sido a renegociação. Os lojistas não suportam pagar valores tão altos. E os shoppings não querem ficar vazios. Então têm que encontrar um espaço de entendimento e convencimento”, relata o sócio do escritório NFA Advogados, Carlos Ferrari. Segundo ele, as principais soluções têm sido a aplicação parcial do IGP-M ou a troca do indexador para o IPCA, por exemplo. Poder de barganhaAs conversas com as redes de restaurantes, que têm pontos em diversos shoppings, caminham para a aplicação do reajuste previsto em contrato, mas ao mesmo tempo, embutem um desconto no valor de locação. Esses acordos têm sido feitos com duração de quatro a seis meses. “É uma questão que estará na mesa durante todo o próximo ano”, diz o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci. Ele afirma que, na maioria das conversas, tem prevalecido o bom senso, mas que há casos em que as negociações têm sido mais duras. Como as conversas são feitas caso a caso, redes maiores tendem a ter posição mais confortável. “A gente leva uma pequena vantagem. Praças de alimentação que não tinham vaga hoje estão com tapumes. Quantas empresas estão abrindo de 50 a 100 lojas por ano, com metade disso em shoppings?”, pondera o presidente da IMC (International Meal Company), das marcas KFC e Pizza Hut, Newton Maia. Ele diz que quando negocia a abertura de novas lojas com as administradoras, os aluguéis de restaurantes já abertos em outros shoppings de uma mesma rede entram na conversa, para buscar acordos mais vantajosos. O ESTADO DE S. PAULO
Estatais têm salários médios de até R$ 31 mil, 13 vezes a média do brasileiro
As estatais brasileiras pagam salários médios de até R$ 31,3 mil – isso sem contar as remunerações das diretorias executivas, que chegam a ganhar em média até R$ 2,9 milhões por ano. O dado faz parte de um levantamento inédito do governo federal. O documento evidencia números superlativos – e muitas vezes contrastantes com a realidade brasileira – de várias dessas empresas. No ano passado, a renda média do brasileiro ficou abaixo de R$ 2,5 mil. Produzido pelo Ministério da Economia, o ‘Relatório Agregado das Empresas Estatais Federais’ reúne dados das 46 estatais de controle direto da União e consolida informações contábeis, de gastos com pessoal e reajustes salariais de pelo menos os últimos cinco anos, entre outros números. O levantamento, ao qual o Estadão/Broadcast teve acesso em primeira mão, será divulgado hoje pelo governo e também mostra que a União precisou aportar no ano passado R$ 17 bilhões em 18 dessas estatais, que são dependentes do Tesouro. Um dos indicadores que mais chamam a atenção nas estatais brasileiras são os salários. A remuneração média mais alta, de R$ 31,3 mil, é paga a funcionários da PPSA, estatal responsável por gerir os contratos de partilha oriundos de leilões do pré-sal – e já prometida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para a fila das privatizações, apesar da resistência do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. A PPSA tem 57 funcionários. Já a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) conta com 1,5 mil empregados e tem o terceiro salário médio mais alto entre as estatais, de R$ 20,7 mil, ficando atrás apenas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) nesse ranking, de R$ 29,2 mil. Mas diferentemente da PPSA e do BNDES, a Codevasf é uma estatal dependente do Tesouro – ou seja, que precisa de aportes da União para bancar custeio e despesas com pessoal. O relatório do governo revela que a companhia precisou de R$ 2,7 bilhões do governo nos últimos cinco anos. A Codevasf é também uma das empresas mais cobiçadas pelos políticos, pois responde por obras e projetos de agricultura irrigada, oferta de água e revitalização de bacias hidrográficas em todos os Estados do Nordeste. TransparênciaCom o relatório, o governo espera dar cada vez mais transparência a situação das estatais brasileiras, uma das principais recomendações da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A expectativa é de que os dados consolidados e padronizados possam cercar o Executivo de argumentos em decisões extinção ou privatização de empresas públicas – agenda prometida pela gestão Bolsonaro, mas que pouco avançou até agora. “É uma consolidação das informações de forma padronizada. Isso é um legado. Esse tipo de material, somado a esforço de avaliação profunda das 46 estatais, é uma transformação na maneira como se gere essas empresas”, afirmou ao Estadão/Broadcast o secretário Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord de Faria, que assumiu o posto em agosto após a saída de Salim Mattar. Para Mac Cord, mais do que um “retrato”, o relatório traz um “filme” que mostra a evolução das estatais em termos de custos de pessoal, nível de dependência do Tesouro e evolução do patrimônio líquido. “Vamos conseguir monitorar o cumprimento de políticas públicas pelas estatais. A função dessas empresas não é se perpetuar em cima de falhas de mercado”, disse. “É o primeiro passo para se ter radiografia completa das estatais brasileiras”, afirmou o secretário de Coordenação e Governança das Empresas Estatais, Amaro Luiz de Oliveira Gomes. No cargo há dez meses, o servidor de carreira do Banco Central atuou nos últimos dez anos como membro do International Accounting Standards Board (IASB), em Londres, representando a América Latina. Desigualdades e dificuldadesEm algumas situações, as estatais evidenciam desigualdades na execução de políticas públicas, restritas a algumas capitais. É o caso das estatais de transporte público, como a Trensurb, no Rio Grande do Sul, e a CBTU, que atua em Belo Horizonte, Recife, Maceió, João Pessoa e Natal. Ambas já estão no Programa Nacional de Desestatização (PND). Elas receberam R$ 5,7 bilhões em aportes do Tesouro nos últimos cinco anos, dinheiro que serve para subsidiar os passageiros dessas cidades. As duas estatais se somam as outras 15 empresas públicas sob controle direto da União que já estão na mira do governo para desestatização: Ceagesp, CeasaMinas, Codesa, Porto de Santos, ABGF, EMGEA, Casa da Moeda, Nuclep, Serpro, Dataprev, Ceitec, EBC, Correios, Eletrobrás e Telebrás. Um dos caso mais emblemáticos das dificuldades financeiras das estatais é o da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH). Responsável pela gestão de 40 hospitais universitário federais no País, ela presta serviços de média e alta complexidade pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e registra necessidade crescente de aportes da União. Foram R$ 1,7 bilhão em 2015, R$ 2,8 bilhões em 2016, R$ 3,6 bilhões em 2017, R$ 4,5 bilhões em 2018 e R$ 5,1 bilhões em 2019. A EBSERH tem hoje 35, 7 mil empregados, com salário médio de R$ 9,8 mil. Até agora, o governo não deixou claro o que pretende fazer para solucionar o déficit crescente da empresa. Diretores de estatais podem ganhar em média até R$ 2,9 milhões por anoDiretores, presidentes e membros de conselhos fiscais e de administração podem ganhar remunerações muito elevadas à frente de estatais brasileiras, principalmente nas maiores empresas públicas do País, e especialmente entre as de capital aberto. Na Petrobrás, os membros da diretoria executiva receberam, em média, R$ 2,9 milhões em 2019. Os integrantes dos conselhos de administração e os membros do conselho fiscal ganharam, em média, R$ 194,3 mil e R$ 132,4 mil, respectivamente. No Banco do Brasil, membros da diretoria executiva, inclusive o presidente, receberam, em média, R$ 1,6 milhão no último ano. Os integrantes dos conselhos de administração e fiscal ganharam na média entre R$ 89,8 mil e R$ 90,3 mil. Na Eletrobrás, os membros diretoria executiva receberam R$ 1,019 milhão em média por ano. Os conselheiros de administração e fiscais ganharam, na média, respectivamente, R$ 176,4
Startup Loft cria banco de talentos de profissionais negros
Depois de o Magazine Luiza ter anunciado um programa de trainee só para candidatos negros, outras empresas também decidiram avançar em iniciativas destinadas à diversidade social. A Loft, startup de compra e venda de imóveis, montou um banco de talentos exclusivo para profissionais negros. Na última semana, a empresa recebeu 151 currículos que serão analisados para as 46 vagas de trabalho atualmente abertas. Processo seletivo. Os inscritos já participaram de um encontro virtual com representantes da direção e do comitê de diversidade negra da Loft. Na ocasião, os participantes puderam tirar suas dúvidas sobre a companhia, e também sobre os próximos passos em relação ao processo de seleção das vagas abertas. Controverso. Embora algumas empresas tenham buscado investir mais em iniciativas inclusivas, elas sofre pressão de classes contrárias ao que consideram segregação da sociedade. No caso do Magazine Luiza, o Ministério Público do Trabalho de São Paulo recebeu denúncias por suposta ‘discriminação’ no programa de treinamento, mas o órgão concluiu que ação da varejista é legítima e não há ato ilícito. O ESTADO DE S. PAULO
Papel de incluir negros está com as empresas, diz reitor da Zumbi dos Palmares
Apesar da desigualdade de oportunidades ainda elevada entre brancos e negros, o Estado brasileiro já produziu avanços significativos no campo das ações afirmativas e hoje o maior desafio para incluir negros cabe ao setor privado, afirma José Vicente, fundador e reitor da Universidade Zumbi dos Palmares. “O Estado já andou um bom caminho nessa direção com a criação de cotas para universidade e em concursos públicos para diversos órgãos. Quem ficou para trás foi o ambiente privado, as empresas precisam correr atrás do prejuízo”, disse ele ontem durante a Live do Valor. Vicente esclarece, no entanto, que ainda poderia partir do governo algum tipo de ação para estimular a presença de negros no mercado de trabalho. “Já temos consensos que a prática de trabalho escravo é inadequada, assim como problemas na área ambiental. Estamos abrindo espaço para aqueles que estão em desvantagem, como deficientes físicos e o público LGBTQ+, mas o tema raça ficou de fora, então seria adequada uma legislação que pudesse regular esse tipo de intervenção”, acrescentou. Para Vicente, no cenário ideal o melhor seria que as próprias empresas tomassem a iniciativa para incluir mais negros em seus quadros do que esperar algum tipo de exigência legislativa, principalmente por questões históricas, como o desemprego tradicionalmente mais elevado entre pretos e pardos do que na população branca. “Estávamos numa situação calamitosa antes da pandemia e agora as coisas tomaram um sentido de emergência e risco de caos social. Vamos ter de enfrentar esses problemas e gostaria que as empresas reconhecessem que têm uma necessidade, não só estratégica mas ética [de contratar mais negros]”, disse. Também nessa direção foi produzido o Índice de Inclusão Racial Empresarial (IIRE), desenvolvido com o DataZumbi, instituto de pesquisas da Universidade Zumbi dos Palmares, para medir a participação de negros no mercado de trabalho. Em 23 empresas analisadas, 29% têm profissionais negros, e só 6,6% em cargos de diretoria e conselho. “O nosso país tem poucas informações sobre o impacto do racismo estrutural. As pesquisas que temos são mais voltadas para as políticas públicas, não temos nada para dentro do ambiente das empresas como uma ferramenta ou mecanismo para medir como estamos e como seguir adiante”, afirma. Situações de crise como a trazida pela pandemia evidenciam como a falta de participação dos negros na tomada de decisão política é prejudicial à sociedade. “Em dezembro acaba o auxílio governamental e salve-se quem puder. Para esse tipo de coisa, se não tiver um negro [participando das decisões], vamos continuar a ser uma nação cindida.” O reitor da Zumbi dos Palmares também lembra que, apesar de ainda hoje segmentos da sociedade resistirem a políticas públicas como as cotas raciais, a atuação do Estado é essencial e absolutamente legítima para equilibrar as desigualdade. “Para cada uma das situações em que há desigualdade, o Estado tem obrigação ética, moral e constitucional de agir. Não é favor nenhum, é cumprir a função do próprio Estado”, disse. VALOR ECONÔMICO
Desemprego entre jovens é maior na Amazônia
O avanço do desmatamento na Amazônia não tem representado a criação de mais empregos e oportunidades para jovens da região. Nos nove Estados que compõem a Amazônia Legal, quem tem entre 18 e 24 anos de idade encontra muito mais dificuldade para entrar no mercado de trabalho do que no resto do país. Enquanto 58% dos jovens nessa faixa etária fazem parte da população economicamente ativa na Amazônia, o percentual sobe para 71% no restante do Brasil. O quadro é apenas um pouco melhor entre os jovens adultos, de 25 a 29 anos. Os dados fazem parte do primeiro levantamento mais aprofundado sobre a estrutura de emprego da região, realizado por pesquisadores do projeto Amazônia 2030. VALOR ECONÔMICO
O emprego no pós-anestesia
O recrudescimento do coronavírus no Hemisfério Norte e a alta de casos no Brasil batem de frente com a avaliação da equipe econômica de que é baixa a probabilidade de ocorrência de uma segunda onda da doença por aqui. Há quem diga que ela já chegou. Ou que a primeira onda nem passou. Aposta-se no Ministério da Economia que o Brasil estaria próximo de atingir a imunidade de rebanho. Polêmica, a tese pressupõe que a linha de corte é ter 20% da população imune, e não 60%, como é o conceito mais amplamente utilizado. E que há mais pessoas contaminadas do que mostram as estatísticas. Isso está na base do plano A, sem segunda onda. O plano B, com segunda onda, é prorrogar o auxílio emergencial e outros programas de socorro, em versões mais enxutas do que em 2020. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já adiantou que, nessa hipótese, os gastos com o enfrentamento da doença, que chegaram a 8,4% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020, cairão pela metade. O plano A é o que se materializa no momento, disse o secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida. Mantido o plano principal, a pergunta é o que acontecerá com a economia brasileira a partir do dia 1º de janeiro de 2021. Se o fim do auxílio emergencial interromperá o processo de retomada e se o encerramento do BEm, que permitiu suspender ou reduzir proporcionalmente jornada de trabalho e salários, fará o desemprego saltar. Apesar dos elogios de Guedes, não há planos para perenizar o BEm, informou Sachsida. A resposta do governo para o futuro da atividade econômica parece dividir 2021 em dois momentos. No inicial, deve predominar o impulso que será dado com a injeção de R$ 110 bilhões na economia no fim de 2020. São benefícios sociais ainda não desembolsados, saques emergenciais do FGTS e incríveis R$ 50 bilhões em poupança feita pelas famílias que receberam o auxílio emergencial. O segundo momento depende de coisas que, infelizmente, não são 100% certas: a chegada da vacina e a continuidade do processo de retomada. Principalmente no setor de serviços, que está atrasado se comparado à indústria e ao comércio. O mercado de trabalho é uma incógnita ainda maior. Há, na equipe econômica, quem esteja muito preocupado com a onda de desemprego que se formará no pós-pandemia. O fenômeno, aliado ao fim do auxílio emergencial sem um substituto à altura, poderá trazer custos eleitorais importantes para o presidente Jair Bolsonaro. Mas Sachsida afirmou e repetiu que haverá crescimento da taxa de ocupação em 2021. Isso porque o grosso do desemprego está nos informais. E esses atuam majoritariamente no setor de serviços, que está retornando. A ver. O professor Sergio Firpo, do Insper, acredita que o ano de 2021 poderá refletir mais fielmente o estrago que a crise provocou no emprego, pois não haverá mais os programas de apoio. Ele estima que perto de 8 milhões de brasileiros informais hoje estão em casa, recebendo o auxílio emergencial. Quando o benefício acabar, sairão em busca de ocupação e engrossarão as estatísticas. Os informais poderão voltar à atividade, como espera Sachsida, mas talvez não consigam a renda que tinham antes da crise, disse Firpo. Ele teme que, para a situação ficar ruim como estava no início de 2020, ainda falte muito. O emprego formal, por sua vez, já estava em redução antes da pandemia, impactado pela https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg. Uma válvula de escape tem sido a abertura de microempresas de uma pessoa só. As pessoas estão se reinventado, avalia Sachsida. Essa tendência está em rota de colisão com uma das principais discussões da agenda fiscal: a revisão dos gastos tributários. Esses gastos, que são na verdade “não arrecadações” permitidas a setores específicos, somarão R$ 307,93 bilhões em 2021. A ideia é analisar se estão gerando o resultado esperado. E acabar com os que não estiverem. O maior gasto tributário do Brasil é o Simples, com R$ 63,9 bilhões. Pelo alto custo, sua manutenção deveria ser avaliada, diz a área técnica. Mas essa é uma leitura dos “cabeça de planilha”, como diz nos bastidores o assessor especial do Ministério da Economia Guilherme Afif Domingos, que nos anos 1990, como presidente do Sebrae, pressionou o governo federal a criar o regime. Pressupõe que, se não houvesse o Simples, as microempresas pagariam integralmente seus impostos. Isso não condiz com os fatos. A cada ano, cerca de 700 mil microempresas são excluídas do Simples por inadimplência. Em 2020, por causa da pandemia, não haverá exclusão. E há uma discussão relevante se o Simples é, afinal, um gasto tributário. “É, coisa nenhuma”, afirma Afif. O Tribunal de Contas da União (TCU) alertou para a falta de clareza do conceito de gasto tributário. O economista José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), exemplifica: exportações não pagam impostos, mas isso não é classificado como renúncia. A Constituição determina essas operações sejam feitas sem impostos. Da mesma forma, a Carta assegura tratamento tributário diferenciado às micro e pequenas empresas. Por analogia com as exportações, também os descontos tributários do Simples não seriam gastos tributários. Criado com o intuito de viabilizar pequenos negócios, o Simples é reflexo da disfuncionalidade do sistema tributário brasileiro. Se pagar impostos certinho, como quer a maioria dos empreendedores, fosse menos complexo e mais barato, talvez o regime não fosse necessário. Embora seja um clamor geral da sociedade, a reforma tributária gira em torno de seu próprio eixo há 30 anos. O governo Bolsonaro caminha para ser o décimo desde a Constituição de 1988 a fracassar na transposição dessa muralha. VALOR ECONÔMICO
Guedes diz que voltará a falar sobre CPMF e cita cobrança sobre Pix
O ministro Paulo Guedes (Economia) afirmou nesta quinta-feira (19) que pretende voltar a falar sobre a criação de um imposto sobre transações após o período eleitoral. Ele afirmou que o plano para o tributo inclui a taxação do envio de recursos por meio do Pix, novo sistema de transferências e pagamentos instantâneos. Em videoconferência promovida pelo banco Bradesco, com apresentação em inglês, o ministro comparou as transações digitais a uma rodovia com pedágios. Para ele, as operações deveriam ser cobradas, com alíquotas baixas, que poderiam ser de 0,10% ou 0,15%. Estudos iniciais do Ministério da Economia previam alíquota de 0,20% para o novo tributo aos moldes da extinta CPMF. Aos convidados da reunião, o ministro disse que o Pix é um mecanismo interessante que permite a realização de transferências por custo baixo. Depois, completou dizendo que o governo pode pensar em taxar um pouco do que chamou de “tráfego nessa estrada”. Segundo ele, o imposto seria cobrado das pessoas que trafegam nessa especie de rodovia digital. Guedes afirmou que “por um milagre” a reforma tributária poderia ser destravada ainda neste ano. Segundo ele, durante o período eleitoral, foi criada uma narrativa falsa sobre a CPMF, sigla que ele rejeita. Por isso, afirmou que parou de tratar sobre o tema. Ele ponderou que vai falar sobre o assunto novamente após as eleições. No encontro, o ministro disse que há entendimentos equivocados sobre o imposto e disse que as cobranças não atingirão diretamente os bancos. O setor bancário é abertamente contra a criação do novo tributo. Em outubro Guedes fez críticas e chamou de “casa de lobby” a Febraban (Federação Brasileira de Bancos), que já se posicionou contra a nova CPMF. O ministro voltou a fazer essas afirmações na reunião com o Bradesco. Ele afirmou que a Febraban paga economistas para falarem mal do novo imposto. Os participantes reagiram dando risadas. Em seguida, ele disse que a concentração no setor não é culpa dos bancos, que usaram a estratégia para sobreviver em um país como o Brasil, e não para explorar os brasileiros. Guedes também criticou a proposta de reforma tributária que tramita na Câmara. Segundo ele, para manter a arrecadação do governo, a alíquota do imposto sobre consumo estudado pelos deputados deverá ser superior a 30% o que, segundo ele, vai matar o comércio e gerar desemprego. Por isso, ele argumenta que é importante encontrar uma base tributária ampla que incida sobre as transações. Ao repetir que o governo não subirá impostos, Guedes afirmou que o novo tributo permitiria a extinção de outros existentes hoje, especialmente os que incidem sobre a folha de salários. O ministro disse que pretende reduzir impostos para as empresas. Segundo ele, se a companhia reinveste seu lucro em inovação e mais emprego, pode ter taxas mais baixas. Por outro lado, ele ressaltou que o governo vai propor tributação sobre a distribuição de dividendos de empresas aos acionistas. Guedes se posicionou contra a criação de um imposto sobre grandes fortunas. O tributo geraria fuga de capitais do Brasil, afirmou. Sem dar detalhes, o ministro também disse que o governo estuda formas de tributar grandes empresas digitais, como Google e Amazon. Ao falar sobre a necessidade de baixar a dívida pública do Brasil em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), Guedes listou medidas para viabilizar essa redução. Entre as ações, disse que é possível “até vender um pouco de reservas”. Segundo ele, ter uma reserva de US$ 400 bilhões ou US$ 500 bilhões é necessário quando o real está sobrevalorizado, o que não estaria ocorrendo atualmente. Hoje, as reservas internacionais do Brasil estão próximas a US$ 350 bilhões. Como forma de reduzir a dívida imediatamente, já que o Brasil segue registrando déficit fiscal, Guedes defendeu a venda de ativos do governo e a devolução de recursos de bancos públicos à União. FOLHA DE S. PAULO