Empregados demitidos após contraírem covid ganham dano moral

Funcionários demitidos por contraírem covid-19 ou pertencerem do grupo de risco têm recorrido à Justiça do Trabalho em busca do pagamento de danos morais, por discriminação, e mesmo reintegração. Foram distribuídos, neste ano, 12.676 processos com os termos covid e discriminação nas peças iniciais, segundo o Data Lawyer Insights, plataforma de jurimetria. Entre as ações já julgadas, porém, há poucas liminares ou sentenças favoráveis aos trabalhadores. É preciso comprovar não se tratar de uma simples demissão. As empresas podem demitir sem justificativas. Só há previsão de estabilidade, em meio à pandemia, para os deficientes. Está na Lei nº 14.020/20, em vigor desde julho, que institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública. As ações judiciais, contudo, estão sendo ajuizadas com base no artigo 1º da Lei nº 9029, de 1995, que proíbe a adoção de práticas discriminatórias no ambiente de trabalho. A jurisprudência já admite a reintegração para trabalhadores com HIV ou câncer, doenças graves capazes de causar estigma ou preconceito. O Tribunal Superior do Trabalho, inclusive, já editou súmula sobre o assunto (nº 443). Agora, a questão da covid- 19 começa a ser analisada no Judiciário. Um dos casos foi julgado pela 12ª Vara do Trabalho de Manaus. O juiz Antonio Correa Francisco condenou uma empresa de segurança a pagar R$ 10 mil de danos morais a um vigilante por dispensa discriminatória. Ele foi demitido após contrair a covid-19 e ficar afastado por 15 dias. Ao questionar o gerente sobre o motivo, recebeu, segundo o processo, a resposta de que “se não tivesse ficado doente, provavelmente não teria o contrato de trabalho finalizado”. No processo, o vigilante ainda alega ter contraído o vírus ao prestar serviços na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), onde vários colegas da empresa de segurança também ficaram doentes. Em abril, ele chegou a perder o colega de trabalho, com quem dividia o mesmo carro, por complicações da doença. Na sentença, o juiz destaca que, em maio, mês em que o vigilante foi infectado e dispensado, Manaus era considerada epicentro da pandemia no Brasil. Para o magistrado, a companhia não poderia deixar o trabalhador desamparado naquele momento (processo nº 0000514-85.2020.5.11.0012). No interior de São Paulo, uma decisão favoreceu um funcionário de uma indústria de componentes automotivos. Ele foi dispensado após cinco dias do retorno ao trabalho. Ele obteve liminar favorável à sua reintegração na Vara do Trabalho de Campo Limpo Paulista. Na ação, ele comprovou que contraiu a doença e ficou um mês internado e afastado por 60 dias. Na decisão, o juiz Marcelo Bueno Pallone afirma que o direito potestativo da empresa de rescindir o contrato não é absoluto e encontra limites no artigo 1º, inciso IV, da Constituição, ao tratar do valor social do trabalho (processo nº 0010886-94.2020.5.15. 0105). O magistrado cita no texto a Súmula 443 do TST. Como no processo, o funcionário continuou trabalhando mesmo no pico da pandemia, o juiz entendeu que, em uma primeira análise, a covid-19 poderia ser enquadrada como doença ocupacional. Um recente julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão recente, dá margem para essa interpretação. Os ministros declararam inconstitucional o artigo 29 da Medida Provisória (MP) nº 927/2020, que não considerava a covid-19 como doença decorrente do trabalho. Uma técnica de enfermagem de um hospital no Espírito Santo, que tem 60 anos e foi dispensada no meio da pandemia, também conseguiu o direito à reintegração. Ela alegou que foi discriminada por estar no grupo de risco. Ao analisar o caso, a juíza Lucy de Fátima Cruz Lago considerou que está na liberalidade da empresa escolher se mantém ou não um contrato de trabalho. Entretanto, afirma na decisão, “a resilição contratual, que tem como fundamento o fato de o empregado se enquadrar em grupo de risco do Covid-19, denota, em análise superficial, tratamento não isonômico e direcionado a um grupo com características específicas” (processo nº 0000597-45.2020.5.17.0009). Para a advogada Mayra Palópoli, sócia do Palópoli & Albrecht Advogados, essas são decisões isoladas. Ela afirma que não há, na legislação, estabilidade ao empregado que contraia a covid-19. Por não haver regra específica, acrescenta, aplica-se a regra geral que permite ao empregador dispensar imotivadamente um empregado. “Só haveria dispensa discriminatória em caso de ofensa à honra ou imagem do empregado em razão da doença adquirida”, diz. A reintegração, segundo a advogada Juliana Bracks, do Bracks Advogados, deveria ser aplicada apenas aos casos em que há estabilidade, uma vez que existe a liberalidade do empregador em demitir. Ela lembra que a Súmula 443, do TST, fala sobre doenças que trazem um estigma. “Será que a covid-19 é uma doença com estigma, em meio a uma pandemia. Acho essa tese meio forçada”, diz. A advogada entende que nos casos devidamente comprovados de discriminação deveria haver apenas o pagamento de indenização. “É meio contraditório determinar a reintegração de um trabalhador num ambiente em que ele está sendo discriminado”, afirma. Em meio à pandemia, para evitar essas ações judiciais, o advogado Marcos Alencar afirma que “é imprescindível que o empregador justifique a demissão sem justa causa, para que não venha a ser entendida como uma retaliação”.

Com telebralho e excluindo gasto com Saúde, custeio da máquina recua no 1º semestre

O custo de funcionamento da máquina pública com, por exemplo, diárias e viagens; água, luz e esgoto; copa e cozinha; e com funcionários de apoio caiu no primeiro semestre deste ano ante mesmo período do ano passado não só do Poder Executivo (excluindo as despesas do Ministério da Saúde) como também do Legislativo, Judiciário e Ministério Público da União. A queda desses gastos está diretamente relacionada ao uso do teletrabalho durante a pandemia. O comportamento dessas despesas foi detalhado em documento inédito do Tesouro chamado Boletim Foco em Custos e antecipado ao Valor. As despesas analisadas foram registradas até 30 de junho Segundo o Boletim Foco em Custos, considerando apenas as despesas com o funcionamento do Executivo (excluindo o Ministério da Saúde), Legislativo, Judiciário, Ministério Público da União e Defensoria Pública da União, o custo teve uma queda nominal de 6,54%, passando de R$ 25,536 bilhões para R$ 23,866 bilhões. O Ministério Público reduziu essas despesas em 14%; o Judiciário, em 11%, o Executivo, em 6%, e o Legislativo, em 4%. Apenas a Defensoria Pública da União teve aumento, que foi de 38% passando de R$ 95 milhões para R$ 131 milhões na comparação entre o primeiro semestre deste ano com o mesmo período de 2019. Mas o boletim mostra ainda que, considerando na conta as despesas do Poder Executivo com o funcionamento do Ministério da Saúde que saltaram de 55% de R$ 8,223 bilhões no fim do primeiro semestre do ano passado para R$ 12,731 bilhões, o custo total sobe 11,25%, de R$ 33,904 bilhões para R$ 37,721 bilhões. Esse valor também inclui as diferenças causadas por ajustes de metodologia. “O incremento do item material de consumo no Ministério da Saúde (custos de funcionamento do Poder Executivo) devido, preponderantemente, ao aumento em custos de materiais farmacológicos distribuídos pelo Sistema Único de Saúde (SUS); de materiais reagentes para diagnóstico clínico e materiais de assepsia e equipamentos de proteção individual para ação preventiva contra o coronavírus”, informa o boletim. A coordenadora de informações de custos do Tesouro, Rosilene Souza, e o auditor federal de finanças e controle Edelcio de Oliveira explicaram que não é possível afirmar que a trajetória a partir de agora é de queda das despesas com o funcionamento da máquina, ou seja, despesas com diárias e viagens, copa e cozinha ou com pessoal de apoio. O comportamento desses gastos depende de uma análise sobre se a redução vista até o momento, excluindo o forte aumento relacionado aos gastos do Ministério da Saúde, veio acompanhada ou não de uma entrega do serviço a população ou ainda da manutenção do teletrabalho. Por exemplo, se estiver ocorrendo redução de despesa porque um serviço não está sendo prestado, isso poderá implicar aumento de gasto futuro para colocar o trabalho em dia no pós-pandemia. O gerente de informações de custos, Giuliano Cardoso, reforçou que reduzir custos é bom, porém, mas é preciso ter um olhar também para a qualidade do serviço que está sendo entregue. “Às vezes se reduz, reduz, mas você tem perda na entrega”, frisou, destacando que é preciso diminuir despesas mas ter ganho de produtividade. Ou seja, é preciso olhar o custo de um serviço não só do lado financeiro e fiscal, mas também as entregas, ou seja, se o serviço está sendo entregue à sociedade na qualidade esperada. O desafio do Tesouro, segundo os técnicos, é justamente conseguir mensurar a qualidade dos serviços prestados. Os custos de funcionamento do governo estão na rubrica insumos de operação e manutenção, que também inclui despesa com mão de obra. Para se chegar ao custo total, é preciso considerar ainda os insumos financeiros, que incluem gastos com aposentadorias e beneficio emergencial. A soma do insumo de operação e manutenção e financeiros totalizou R$ 1,732 trilhão no primeiro semestre deste ano, ante R$ 1,019 trilhão do mesmo período de 2019. A expansão foi concentrada nos insumos financeiros, que aumentaram 79% para R$ 1,603 trilhão no primeiro semestre deste ano.