Congresso propõe uma nova lei por semana para regular trabalho em app

Já são 64 iniciativas sobre o tema no Congresso. Apenas neste ano, foram apresentadas 36 propostas para criar uma rede de proteção ao número cada vez maior de trabalhadores que recorrem a essas atividades como fonte única ou complementar de renda durante a crise. O volume representa, em média, uma iniciativa por semana. Na comparação com o ano passado, quando foram protocolados 26 textos, o aumento foi de 38,5%. Em 2018, foram somente dois projetos. Quando se analisa a data de apresentação, percebe-se o efeito do “breque dos apps” –manifestações realizadas por entregadores em julho para reivindicar taxas mais justas e ajuda com itens de proteção. No intervalo de 14 dias, de 26 de junho a 10 de julho, ápice do movimento de contestação à política das empresas, foram apresentados dez projetos de lei. Os dados foram levantados pela Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho), que compilou as ideias esparsas e formulou um único anteprojeto de lei a ser levado aos parlamentares. “Entrou no nosso radar essa avalanche de propostas para trabalhadores 4.0, do século 21”, diz Noemia Porto, presidente da Anamatra. O anteprojeto trata de um código de trabalho por plataformas digitais. A tarefa é árdua. Magistrados, MPT (Ministério Público do Trabalho), trabalhadores, empresas, congressistas e especialistas não se entendem. Porém, ganha força a corrente que defende proteção social. Os atuais projetos abordam temas diversos. Há propostas que exigem curso preventivo e de reciclagem, estabelecem instalação de câmeras e botão de pânico, e limitam em 10% ou 15% a comissão para o aplicativo. Hoje, a alíquota de algumas empresas é de 25%. Outros textos cobram justificativa para sanções a condutores, definem a Justiça do Trabalho para julgar ações contra plataformas e ao menos quatro reconhecem vínculo de emprego. “Hoje os entregadores estão pedindo o que os trabalhadores pediam no século 19. O que propomos são modalidades diversas de contratação, ora com vínculo, ora como autônomo, mas com o mínimo de direito trabalhista”, diz Porto. A discussão ultrapassa fronteiras. Na Califórnia, além de escolher o presidente dos EUA, eleitores foram às urnas na última terça (3) para, em referendo, definir se motoristas de apps devem trabalhar sem vínculo. Ficou decidido que sim. Por aqui, um dos projetos com mais chances de ser votado está quase perdendo a eficácia. O texto exige proteção a entregadores e usuários de delivery na pandemia. A calamidade pública, porém, expira em 31 de dezembro. À proposta do deputado Israel Batista (PV-DF) foram anexados projetos de outros congressistas. Um deles, do deputado Ivan Valente (PSOL-SP), estabelece medidas para prevenir riscos à saúde de entregadores e clientes, como pagamento remoto, preferencialmente, e fornecimento de equipamentos de proteção individual. “É um projeto para minorar as péssimas condições que pioraram na pandemia com o aumento da concorrência”, diz Valente. “Com o desemprego, se você tem uma moto, você se cadastra no aplicativo.” O texto exige que a empresa ofereça seguro contra acidentes e por infecção por doença contagiosa. Prevê ainda assistência financeira durante afastamento por acidente ou contaminação por coronavírus. O projeto deixa de fora questões trabalhistas. “A ideia foi facilitar a tramitação e a aprovação, levantar a exploração que está havendo. [O aplicativo] Cria uma ilusão de empreendedorismo, mas o trabalhador é explorado.” Valente espera a aprovação após as eleições municipais. Para ele, a iniciativa vai estimular a formulação de propostas para uma regulação permanente, como pretende a Anamatra. Relator da proposta, o deputado Fábio Trad (PSD-MS) discorda e destaca o caráter temporário. “Se for renovado o período excepcional [da calamidade], a tendência é óbvia no sentido de que vamos renovar também a vigência do projeto, se aprovado.” Segundo Trad, não há resistências para votação. “Não há, no projeto, nada que interfira na livre iniciativa, nas leis do mercado. Apenas há uma preocupação em se proteger normativamente os entregadores neste momento, porque eles estão à margem de legislação protetiva”, diz. Há propostas, no entanto, que buscam regulamentar relações trabalhistas entre apps e entregadores, como a do deputado Alexandre Padilha (PT-SP), ex-ministro da Saúde. O texto propõe mudar a lei da política nacional de mobilidade urbana para exigir que se comprove que as empresas não adotam medidas de estímulo e metas que incentivem jornadas de trabalho excessivas. O pesquisador do Ibre/FGV e da consultoria Idados Bruno Ottoni também advoga por mais direitos a motoristas e entregadores. “Hoje tem proteção zero, e é importante oferecer proteção para o indivíduo”. No entanto, o especialista em mercado de trabalho adverte para o risco de se regulamentar em excesso uma atividade que tem como combustível a inovação. “Aplicativo é uma tendência que veio para ficar. Precisa ser cuidadoso para não ter legislação burocrática que venha a inibir a livre iniciativa”, diz. A argumentação encontra eco em alas no Congresso. Líder do Novo na Câmara, o deputado Paulo Ganime (RJ) afirma que regular em excesso pode ser perigoso para setor e profissionais, além do risco de inviabilizar o negócio. “O mercado vai se ajustar por conta própria”, afirma. Ele critica o que chama de intervenção do Congresso em um mercado “inovador e moderno”. “Ninguém é obrigado a trabalhar como motorista de app ou entregador”, diz. “Quem trabalha nisso quer liberdade.” O discurso tem pontos de contato com o da ABO2O (Associação Brasileira Online to Offline). A entidade representa empresas de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg, como as plataformas digitais. Vitor Martins, diretor jurídico da entidade, diz que a associação não é contra ou a favor de regulação. Porém, diz buscar propor com o poder público novas formas de atuação. “Queremos colaborar com todos para que possamos ter um ambiente de negócios saudável, que incentive novos negócios e a pluralidade de participantes”, diz. “Qualquer regulação que crie barreiras vai dificultar a entrada de novos players no mercado.” Entre regulamentações não eficientes a associação cita a exigência de cursos adicionais por prefeituras, restrição de emplacamento no município e proibição de pagamento em dinheiro. ENTREGADORES DEFENDEM VÍNCULO FLEXÍVEL DE TRABALHO “Queremos ganhar o justo, o valor correto. A gente trabalha cada vez mais para ganhar cada vez menos”, diz

Home office elimina fronteiras e pode ser nova estratégia de crescimento

Se o trabalho é remoto, ele pode ser feito de qualquer lugar —cidade, estado ou país. Com a expansão da modalidade impulsionada pela pandemia, contratações a distância devem aumentar e modificar não só o mercado de trabalho mas também as estratégias de desenvolvimento nacionais. Alguns países têm inclusive liberado vistos temporários específicos para trabalhadores remotos, caso das Bahamas, como forma de compensar a queda no turismo. A tendência é anunciada por especialistas desde a revolução digital dos anos 1990, mas ainda não havia decolado como previsto. Embora o valor das exportações de serviços esteja crescendo mais rápido do que de mercadorias globalmente, ele ainda é inferior. Mas com a adaptação forçada ao trabalho remoto durante a quarentena, novas ferramentas corporativas virtuais e a perspectiva de introdução do 5G, caem algumas das principais barreiras que travavam esse cenário: a reticência das empresas e as limitações tecnológicas. A avaliação consta no relatório “Um Novo Mundo de Trabalho Remoto”, elaborado pelo programa Futuro do Trabalho da Universidade de Oxford em parceria com o Citi. Para os pesquisadores, as economias emergentes devem a partir de agora mirar mais no exemplo indiano do que no chinês para crescer. Segundo o economista Carl Benedikt Frey, que chefia o programa, foi a aposta nos serviços que levou à expansão da classe média indiana. Para além dos call centers, a Índia se destaca também na exportação de serviços corporativos terceirizados (como contabilidade, recursos humanos, TI e serviços legais). O relatório reconhece que o caso indiano é favorecido pelo bom nível educacional da população e o domínio do inglês, mas aponta que outros países com características distintas também têm tido sucesso. Um exemplo é o das Filipinas. O país criou em 1995 zonas econômicas especiais com incentivos fiscais voltadas para call centers. A iniciativa acabou atraindo diversas multinacionais, como Accenture, Dell, Oracle e JP Morgan, que montaram escritórios de serviços no país para reduzir seus custos. Apesar dessa facilidade, o economista Sérgio Firpo, do Insper, questiona a viabilidade do Brasil se integrar dessa forma à economia mundial. Para além da barreira do idioma, ele destaca a baixa qualificação dos trabalhadores, resultado de falhas na formação educacional. De fato, as exportações de serviços no Brasil cresceram menos em valor na última década do que a de mercadorias, ao contrário da tendência global ser de alta em serviços. O mercado internacional seria uma possibilidade apenas para a elite dos trabalhadores brasileiros, diz Firpo. Isso de fato já acontece em funções que exigem alta qualificação. Esse nicho é explorado, por exemplo, pela HW (Hayman Woodward), empresa do ramo de imigração sediada nos EUA, que lançou em maio um braço focado em recursos humanos. Segundo Leonardo Freitas, presidente da HW, a empresa tem intermediado diversas contratações remotas de funcionários brasileiros para empresas estrangeiras, principalmente nas áreas de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg e telemedicina. Nesse caso, a contratação é direta, e não terceirizada, como no modelo largamente utilizado na Índia. Paulo Moraes, diretor da consultoria de recursos humanos Talenses, conta que está em busca de um recrutador para uma multinacional, sem nenhuma restrição geográfica. O profissional a ser contratado vai ter a função de selecionar pessoas para essa empresa no Brasil e no Canadá. Outro segmento que investe nesse mercado são os sites de trabalho freelancer. A proposta dessas plataformas é nivelar trabalhadores e empregadores globalmente, eliminando as fronteiras físicas em atividades que podem ser feitas à distância —cenário semelhante ao projetado pelos pesquisadores de Oxford. No entanto, um estudo publicado em 2016 sobre a plataforma Upwork observou que as empresas (majoritariamente de países desenvolvidos) tendem mais a contratar profissionais de outros países desenvolvidos do que daqueles em desenvolvimento. “Apesar da economia potencial de custos com remunerações mais baixas, empregadores parecem antecipar problemas com contratações de localidades geográfica, social e culturalmente distantes. A magnitude dessa diferença é impressionante tendo em vista que o objetivo da plataforma é agregar e integrar mercados de trabalho”, escrevem os autores do estudo. Mas essa diferença cai quando profissionais de países emergentes apresentam um histórico comprovado de trabalhos concluídos em seus perfis —o efeito é inclusive mais significativo para eles do que para profissionais de países desenvolvidos, concluem os pesquisadores. Se a nível internacional persistem barreiras de cultura e idioma, nacionalmente a história é outra. A divisão entre funções de baixa e alta qualificação continua, dado que apenas as últimas tendem a admitir um desempenho remoto, mas dentro desse estrato podemos esperar maior dispersão geográfica, avalia Firpo. Com o trabalho remoto, um engenheiro de Salvador, por exemplo, pode permanecer em sua cidade trabalhando para uma empresa paulista em vez de migrar em busca de uma vaga de melhor remuneração. Isso pode levar no longo prazo a uma redistribuição de renda em termos regionais e gerar ganhos de produtividade com a contratação dos melhores a nível nacional, avalia. “A gente pode até resolver um pouco o problema de redistribuição de renda no topo com a realocação dessas ocupações entre regiões, mas quando olhamos para o trabalhador qualificado e o não qualificado, essa diferença vai aumentar”, afirma. FOLHA DE S. PAULO

Feira virtual oferece oportunidades para estudantes

O Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) realizará a partir da próxima segunda-feira, 9, a primeira EXPO CIEE Virtual, evento com foco na capacitação e inclusão profissional de jovens no mercado de trabalho. A programação é online e gratuita. Durante cinco dias os participantes poderão assistir palestras e cursos sobre temas como intercâmbio, inteligência emocional, entrevista, investimentos, como escrever a sua história na internet e empreendedorismo universitário. Estão previstos painéis com profissionais de grandes empresas do mercado, como LinkedIn, Google, Pepsico e The Walt Disney Company Brasil. Além das palestras e cursos, também será possível participar de vestibulares online e realizar testes vocacionais. O evento disponibilizará cerca de 8 mil vagas de estágio e aprendizado. Durante a feira, o Google irá lançar novos cursos gratuitos na plataforma Ateliê Digital para ajudar profissionais em início de carreira, que estejam buscando colocação no mercado de trabalho ou queiram desenvolver pequenos negócios. As aulas são em vídeo e ensinam habilidades digitais básicas, como pesquisar vaga de emprego, criar planilha para organizar tarefas, fazer um currículo, dar e receber feedback e planejar uma reunião de trabalho. As primeiras lições serão lançadas na segunda-feira, 9, e até março de 2021 serão disponibilizados onze treinamentos. A meta da empresa é, em parceria com o CIEE, capacitar 100 mil jovens até o final do ano. Para participar do evento, os interessados devem se inscrever gratuitamente no site. ContrataçõesTambém presente na EXPO CIEE Virtual, o LinkedIn lançou uma pesquisa que aponta que as contratações no Brasil voltaram aos níveis de pré-pandemia, mas não devem compensar o aumento do desemprego. O levantamento identificou que, no País, as cinco vagas que seguem crescendo em ritmo constante são: consultor de negócios, engenheiro de software Java, desenvolvedor Frontend, vendedor e desenvolvedor Dotnet. Já em relação às habilidades cuja demanda cresce globalmente de forma mais rápida desde o início da pandemia estão: programação, marketing digital, previsão financeira, análise de dados e metodologia ágil. A plataforma também anunciou o lançamento de uma ferramenta para ajudar profissionais a encontrarem novas oportunidades de trabalho. O Career Explorer mapeia empregos que correspondam às habilidades técnicas e comportamentais, as soft skills, do candidato. Além de ver possíveis vagas, também é possível encontrar cursos do LinkedIn Learning para preencher as capacidades ausentes. Inicialmente, a ferramenta está em inglês, a previsão é de que novos idiomas sejam adicionados nos próximos meses. Em parceria com a Microsoft, o LinkedIn também oferece cursos de aprendizado gratuitos em português. FOLHA DE S. PAULO

Pandemia faz rentabilidade de empresas do Brasil retroceder 11 anos

A pandemia do novo coronavírus acelerou a queda da rentabilidade das empresas brasileiras para o menor nível desde 2009. A taxa de retorno chega a ser mais baixa do que o custo de capital, que representa o preço do dinheiro para a empresa, segundo nota do Centro de Estudos do Mercado de Capitais (Cemec/Fipe), referente ao mês de setembro. Na prática, isso significa que os investimentos podem demorar um pouco mais para voltar, o que tornaria a retomada da economia mais lenta. Segundo o trabalho, que avaliou a situação financeira de 460 empresas no País, os investimentos das companhias caíram de 4,33% do Produto Interno Bruto (PIB), no ano passado, para 2,79%, no segundo trimestre de 2020. A queda interrompeu um ciclo de alta iniciado a partir de 2016, quando havia despencado para 2,47%. Segundo Carlos Antonio Rocca, coordenador do Cemec-Fipe e responsável pelo trabalho, duas variáveis têm correlação positiva com a decisão das empresas de investir. Uma delas é a expectativa de crescimento da demanda. A outra está relacionada à rentabilidade e o custo do dinheiro. Quando a taxa de retorno cobre o custo médio de capital, a situação para as companhias investirem é favorável. Pelos dados do Cemec, no entanto, o País vive uma situação inversa: no segundo trimestre, a remuneração do capital estava em 7,4% ao ano enquanto o custo do capital era de 11,4%. Em 2009, esses números eram de 11,5% e 11,4%, respectivamente. O mesmo ocorre com a taxa de retorno do acionista, que no segundo trimestre estava mais baixa que os juros médios pagos numa aplicação em títulos públicos atrelados à Selic – taxa básica da economia. Na lista do Cemec, aparecem empresas como Embraer, Via Varejo e Tecnisa, entre muitas outras. Em todos eles, a taxa de retorno do acionista despencou. Procuradas, as empresas não quiseram falar do assunto. Mas, em entrevista concedida ao Estadão no início da semana, o presidente da Embraer, Francisco Gomes Neto, afirmou que o plano estratégico para 2021-2025 traz “uma perspectiva boa de crescimento e de melhora de rentabilidade” da empresa. Capacidade ociosaRocca acrescenta que, além da taxa de retorno e custo do capital, outros fatores importantes pesam na decisão de investimentos das empresas. Um deles é a elevada capacidade ociosa das companhias, que já estava baixa antes mesmo da covid-19. “O problema é que a expectativa é que o PIB só retorne aos níveis de 2019 em 2022 ou 2023”, diz o coordenador do Cemec. Segundo ele, todos os fatores para a tomada de decisão de investimentos não estão bons. Exemplo disso, é que os níveis de confiança caíram e de incerteza subiram. Apesar de uma melhora em relação aos primeiros meses da pandemia, os indicadores estão distantes dos patamares de 2018 e 2019. Para o presidente da Trevisan Escola de Negócios, VanDyck Silveira, o grande do problema do Brasil é que ano após ano o País investe menos que o resto do mundo e que os demais emergentes. “Vivemos um processo de estagnação que coaduna com um processo de aumento de inflação, que começa a aparecer, perda de emprego e renda e um cataclisma fiscal.” Na avaliação dele, se o País não fizer as reformas necessárias, esse quadro não vai mudar e continuaremos com perspectivas sofríveis de investimentos. “Ou a empresa é grande e tem capacidade de buscar fontes de recursos fora ou não se consegue investir.” Nesse quadro, é mais vantajoso colocar o dinheiro em aplicações financeiras do que investir na produção. Dívida financeiraA dívida financeira bruta das empresas avaliadas pelo Centro de Estudos do Mercado de Capitais (Cemec/Fipe), sem considerar Petrobrás, Eletrobrás e Vale, teve aumento de 24,1% em junho comparado com dezembro de 2019. O valor alcançou R$ 1,446 trilhão. Segundo o trabalho, esse aumento é decorrente do aumento das operações de crédito bancário, favorecido pelas medidas emergenciais de aumento da liquidez adotadas pelo Banco Central a partir de março de 2020, e também do impacto da desvalorização cambial sobre o valor em reais da dívida em moeda estrangeira. A participação da dívida em moeda estrangeira no total saltou de 27,9%, em 2019, para 34%, no segundo trimestre deste ano. Já a proporção de empresas grandes com endividamento considerado excessivo saltou para 25,4% em junho de 2020 – nível próximo do observado em 2016. Para Carlos Antonio Rocca, do Cemec, apesar da queda na geração de caixa e aumento da dívida e das despesas financeiras, os principais indicadores de solvência e liquidez ainda se situam em níveis menos preocupantes do que os observados em 2015 e 2016. É importante lembrar, no entanto, que a amostra é constituída principalmente de empresas “médias grandes e grandes”, não sendo, portanto, representativa da grande massa de pequenas e médias empresas brasileiras, destaca o estudo. O ESTADO DE S. PAULO

Preços afetam 87% das micros, afirma Simpi

Em meados de março, o microempresário Marcos Rogério Lima fechou a sua marcenaria por causa do isolamento social imposto pela pandemia. Em agosto, reabriu a empresa num salão bem menor, ocupando uma área que era um terço da que tinha em março, e sem funcionários: só ele e o sócio tocando o negócio. O enxugamento da empresa, que já era micro, foi necessário para se adaptar aos novos tempos. No início da reabertura, o movimento estava fraco. “Mas, de um mês e meio para cá, aumentou de um jeito… Estamos lotados de serviço”, conta. No entanto, o marceneiro não está conseguindo atender a esse maior movimento por causa da falta de matérias-primas. E, quando há disponibilidade do produto, o preço de mercado é muito mais alto do que se praticava anteriormente. Pesquisa do Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo (Simpi) mostra que em outubro 87% das empresas enfrentavam dificuldades com alta de preços de matérias-primas e insumos. Duas em cada três tinham problemas com falta de matérias-primas e insumos usados nas linhas de produção. E também 68% delas sofriam com atraso nas entregas dos insumos. “Estou na fila de espera para comprar muitos materiais”, diz Lima. Ele se abastece em atacadistas especializados em materiais para marcenaria e, pelo seu porte, não consegue comprar diretamente da indústria. O microempresário diz que, no momento, faltam no mercado chapas brancas de MDF e ferragens, como dobradiça, puxador e fechadura de alumínio, que ele usa na produção dos móveis. “Em alguns lugares, encontro cola, mas o varejo diz que o estoque está no fim e não vai ter mais o produto.” Além da escassez, Lima se assustou com os aumentos de preços, quando há disponibilidade de matéria-prima para comprar. No caso das chapas brancas de MDF, por exemplo, que normalmente custavam R$ 150, hoje saem por R$ 230. É um aumento de 53%. Para acomodar essas pressões de custos, Lima diz que já reajustou entre 15% e 20% o preço dos móveis que produz. O aumento ocorreu até mesmo para orçamentos fechados, antes de ele constatar a alta da matéria-prima. Quanto à escassez de insumos, a saída encontrada pelo microempresário foi ampliar o prazo para entrega do serviço para 30 dias. O ESTADO DE S. PAULO

Com alta dos alimentos, inflação de outubro atinge 0,86%, maior resultado desde 2002

Os alimentos encareceram novamente, ainda que em ritmo mais moderado, e as remarcações de preços ficaram mais difundidas, incluindo eletrodomésticos e serviços de salões de beleza, mostrou o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de outubro. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o indicador oficial de inflação do País avançou 0,86% mês passado, ante 0,64% em setembro. Foi a maior taxa para meses de outubro desde 2002, quando a perspectiva da eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para seu primeiro mandato elevou as cotações do dólar. Diante do número divulgado nesta sexta-feira, 6, analistas voltaram a ajustar para cima as estimativas para a inflação fechada de 2020, para algo entre 3% e 3,5%, mas se manteve a avaliação geral de que o quadro não é tão negativo, diante da meta de 4% perseguida pelo Banco Central (BC). Para Vitor Vidal, economista da XP Investimentos, a elevação recente do IPCA é um “choque temporário, por mais que seja prolongado”. Segundo João Fernandes, economista e sócio da gestora de recursos Quantitas, o número de outubro “reforça as preocupações” recentes, mas “ainda há muitos fundamentos para continuar caracterizando essa inflação como algo temporário”. Assim, não há “um processo persistente de piora da inflação”. O número de outubro sinalizou para uma pressão mais “prolongada” e “reforçou preocupações” porque houve aumento do “índice de difusão”, que mede a proporção de itens com alta de preços, diante do total monitorado. Segundo o IBGE, esse índice foi de 68% em outubro (ante 63% em setembro), o maior do ano, numa série histórica curta, iniciada em janeiro. A inflação de alimentos, ainda que tenha arrefecido (para 1,93%, ante 2,28% em setembro), respondeu quase pela metade do avanço agregado do IPCA, com impacto positivo de 0,39 ponto porcentual no total. O próprio aumento da difusão da inflação em setembro e outubro – em agosto, o índice foi de 55% – foi puxado pelos alimentos, disse Pedro Kislanov, gerente do IPCA. Só que a continuidade do avanço dessa difusão da inflação na passagem de setembro para outubro sugere que as altas de preços estão espalhadas para além dos alimentos. “Realmente, a alta está mais espalhada pelo índice de maneira geral. Foi uma difusão maior (em outubro). Boa parte é nos alimentos, mas há outros componentes”, afirmou Kislanov. Isso pôde ser visto na aceleração da inflação dos grupos vestuário (1,11% ante 0,37% em setembro, na segunda alta seguida) e artigos de residência (1,53% ante 1,0% em setembro). Embora seu impacto seja pequeno (contribuiu com 0,06 ponto na alta de outubro), os preços dos artigos de casa tiveram a segunda maior variação entre os nove grupos do IPCA. A alta de outubro foi influenciada por eletrodomésticos e equipamentos, com avanço de 2,38%, ante 0,47% em setembro. O espalhamento da inflação também foi visto nos serviços. O subíndice do IPCA que engloba apenas esses gastos ficou em 0,55% em outubro, ante 0,17% em setembro, na maior alta desde fevereiro, quando a taxa ficou em 0,68%. Segundo Kislanov, boa parte dessa aceleração se deveu a um movimento pontual nas passagens aéreas – alta de 39,83% em outubro, contribuindo com 0,11 ponto de alta no agregado, após as fortes quedas nos primeiros meses da pandemia de covid-19. Só que o avanço incluiu também serviços como manicure (que acelerou de 0,37% em setembro para 0,75% em outubro) e cabeleireiro e barbeiro (que passou de -0,37% para 0,64%), no que pode ser uma reação à retomada de atividades muito afetadas pelo isolamento social por causa da covid-19. “Esse índice de difusão mais alto, que indica espalhamento da inflação, pode indicar uma retomada gradual da economia após período mais crítico da pandemia”, afirmou Kislanov, ponderando, por outro lado, que “o cenário ainda é de muita incerteza, com desemprego acima de 14%”. A dinâmica da inflação de alimentos, apesar do arrefecimento em outubro, foi a mesma de setembro. O arroz (com 13,36%) e o óleo de soja (17,44%) seguiram como destaques na alta do indicador dos alimentos para consumo no domicílio (que avançou 2,57%). No ano, esses produtos acumulam altas de 59,48% e 77,69%, respectivamente. As carnes subiram 4,25% (impacto positivo, isoladamente, de 0,11 ponto), ligeiramente abaixo dos 4,53% de setembro. Houve aceleração nos preços do tomate (18,69% ante 11,72% em setembro), das frutas (2,59% ante -1,59% em setembro) e da batata-inglesa (17,01%, ante -6,30% em setembro). Segundo Kislanov, o movimento é explicado, principalmente, pelo lado da oferta. O dólar elevado incentiva as exportações e leva à redução da disponibilidade de soja e arroz no mercado doméstico. Ao mesmo tempo, o auxílio emergencial pago pelo governo aos mais pobres e aos trabalhadores informais, para mitigar a crise, “ajuda a sustentar esses preços em patamar elevado”, já que é direcionado prioritariamente para o consumo de alimentos. Apesar disso, o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, disse que mantém “a perspectiva de que o choque de alimentos vai se reverter e criar um viés de baixa para os demais itens”. Por isso, muitos economistas veem uma acomodação da inflação nos próximos meses, entrando por 2021. Em relatório, o economista Alberto Ramos, do Goldman Sachs, classificou o IPCA acumulado em 12 meses (3,92%) de “moderado”, especialmente “quando se leva em conta que a inflação de alimentos no domicílio subiu para 18,40% no mesmo período”. Para ele, a recessão causada pela covid-19 tende a manter a demanda em baixa, arrefecendo a inflação, que corre mais riscos de subir caso as “preocupações com a sustentabilidade fiscal de médio prazo” provoquem novas rodadas de alta no dólar.

Maia diz que reforma tributária deve vir antes de autonomia do BC nas prioridades

Defendido por agentes do mercado financeiro e uma das bandeiras da equipe econômica do governo Jair Bolsonaro, o projeto de autonomia formal do Banco Central deve avançar na Câmara, só após a reforma tributária, no que depender do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Para ele, o projeto que estipula mandatos fixos para a diretoria do BC não é urgente no curto prazo. “Aceito votar autonomia do Banco, aceito, é claro, votar os depósitos voluntários, mas aí temos que organizar melhor a pauta até o fim do ano. É só o governo ter boa vontade na reforma tributária”, disse Maia, ao participar de evento organizado pelo banco Itaú, nesta sexta-feira, 6. “A reforma tributária tem importância muito maior que autonomia do Banco Central”, disse. O projeto de autonomia do BC foi aprovado nesta terça-feira, 3, pelo Senado e agora precisa do aval dos deputados para virar lei. O texto mantém o controle dos preços como objetivo central, mas inclui ainda duas novas metas acessórias, sem prejuízo à principal: suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego no País. O governo concordou com a redação da proposta, apesar de o BC ser historicamente contrário a ampliar o escopo da atuação. Maia já reclamou outras vezes da falta de empenho e atuação do governo para se aprovar a medida. Na semana passada, acusou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, de ter vazado informações sobre conversa que os dois tiveram no dia de decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que manteve em 2% a taxa Selic. Ao Estadão, Maia criticou articulação do presidente do Banco Central em alertar sobre os reflexos para a economia da dificuldade do Congresso em avançar com as votações da pauta de ajuste fiscal. Segundo o presidente da Câmara, Campos Neto tentou fazer uma articulação política, sem combinar, o que não seria papel dele, mas dos ministros da Economia, Paulo Guedes, e de articulação política, Luiz Eduardo Ramos. Nesta sexta-feira, o presidente da Câmara lembrou que havia uma proposta de autonomia do BC semelhante na Câmara, mas que não foi votada, e disse que não comentou até agora sobre o tema porque não foi procurado pelo governo. “Se eu conseguisse conversar com alguém do governo, eu poderia te responder, mas ninguém me procura. Não vou conversar com a imprensa antes de conversar com o governo”, disse. Como o Estadão/Broadcast mostrou ontem, deputados já se articulam na Câmara para modificar o projeto aprovado pelo Senado. O partido Novo, por exemplo, quer enxugar a proposta que recebeu aval dos senadores para reduzir os chamados acessórios que foram colocados para o BC. Sobre a reforma tributária, Maia deu sinais de que quer aprovar o projeto antes de deixar a presidência da Casa e acredita que com acordo pode fazer isso rapidamente. O ESTADO DE S. PAULO