Os dirigentes das grandes confederações empresariais entraram em campo para barrar o corte de 30% nos recursos das entidades do Sistema S para financiar o programa do governo Jair Bolsonaro de inclusão de trabalhadores informais no mercado de trabalho no pós-pandemia da covid-19.
A ideia do governo é dar uma bolsa de R$ 550 para jovens de baixa renda e trabalhadores informais fazerem cursos de especialização, com R$ 275 pagos pelo Sistema S e a outra metade pela empresa. A proposta foi incluída na Medida Provisória (MP) que renovou o programa emergencial de estímulo ao emprego de corte de jornada, salários e suspensão dos contratos de trabalho. A proposta acabou não sendo votada na semana passada depois de uma articulação política das confederações.
O projeto é a “menina dos olhos” do ministro da Economia, Paulo Guedes, que nas últimas semanas vinha buscando em reuniões reservadas apoio do setor empresarial e dos dirigentes patronais para conseguir o financiamento fora do Orçamento do governo federal, canalizando os recursos via o Sistema S.
Antes de assumir o cargo, Guedes prometeu “meter a faca” nos recursos do Sistema S. A uma plateia de empresários, o então futuro ministro da Economia disse, em dezembro de 2018, que com ‘interlocutor bom’, corta 30%; se não, corta 50%.
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, que tem na sua aba o Sesi e Senai, diz que o sistema S não aguenta o corte de 30% dos recursos. Segundo ele, todos foram surpreendidos negativamente porque estava sendo negociado um acordo com Guedes de um repasse “espontâneo” de R$ 2 bilhões de todo o sistema em 2022, como se fosse uma bolsa para o aluno para ele “comprar um computador, pegar um ônibus, fazer um almoço”.
“Mas a gente faria isso de maneira espontânea e analisando com o ministério onde estão as pessoas mais vulneráveis, jovens que não trabalham e nem estudam”, diz Robson.
Segundo ele, não há sombra de recursos para um corte dessa magnitude. “Vai acabar em três anos com o sistema”, diz Robson, que prevê o fechamento de 400 escolas de treinamento. Juntos, de acordo com ele, Sesi e Senai recebem cerca de R$ 8 bilhões.
A MP previu, porém, um custo de R$ 41 bilhões para os dois programas em três anos, a ser financiado pelo Sistema S e complementarmente pelos fundos de Amparo ao Trabalhador (FAT) e de Erradicação da Pobreza.
Os presidentes das entidades passaram, então, a se perguntar, nos bastidores, quem do governo havia “patrocinado” a colocação do pacote de emprego, que tem dois tipos de programas, dentro da MP. Depois de uma articulação rápida, conseguiram barrar a votação antes do recesso de julho e agora negociam com o relator, deputado Christino Aureo (PP-RJ), outras fontes de financiamento.
Necessidade de qualificação
Ao Estadão, o relator diz que há uma necessidade desses mecanismos de qualificação. Ele diz que incluiu no relatório da MP o programa porque é medida que conecta o auxílio pago a quem teve o contrato suspenso ou o salário reduzido como uma rampa de acesso ao mercado na fase da retomada da economia. Segundo ele, o debate sobre as fontes de recursos do programa, como recursos do orçamento, do Sistema S ou do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), será feito nas próximas semanas.
O relator teve videoconferência com o presidente da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), Vander Costa. “É um equívoco tirar recursos da capacitação profissional para uma bolsa direta em dinheiro ao trabalhador que poderá ser usada para outras finalidades, como compra de alimentos, por exemplo”, disse Costa. Ele alerta que juristas apontam que pode haver um desvio constitucional da previsão de recursos do Sistema S, voltado para qualificação e treinamento. “Mais do que dar dinheiro para o cidadão, o Brasil precisa de mão de obra de qualidade”, afirmou.
Segundo ele, o setor está disposto a ampliar o leque das pessoas que podem ser qualificadas, incluindo jovens que ainda não estão atuando no segmento, mas resiste à ideia da bolsa direta ao trabalhador. O presidente do Sebrae, Carlos Melles, diz que, nas conversas com Paulo Guedes, o ministro não falou do corte de 30% dos recursos. “Não posso acreditar que tenha vindo dele a proposta. Tirar recursos do Sistema é desastroso”, se queixa.
Em webinar organizada pelo Banco Mundial sobre relatório do impacto da crise na pandemia da covid-19, o secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Bianco, defendeu a proposta de criação do Benefício de Inclusão Produtiva (BIP), como um instrumento poderoso de incorporação no mercado de trabalhadores informais que ficaram relegados para evitar o efeito “cicatriz” da pandemia.
Para ele, é uma oportunidade impar amadurecimento institucional para o Sistema S. “Nós temos que fazer com que esse trabalho em conjunto tenha um foco e o Sistema S tenha uma redenção do ponto de vista da percepção social, de trabalhar para incluir jovens no mercado de trabalho”, disse.
O ESTADO DE S. PAULO