Reforma fortalece tríade de ministros

A reforma ministerial reconfigurou a relação de poder no Palácio do Planalto com a chegada de dois ministros civis ao quarto andar, restringindo o espaço dos militares. Mesmo assim, o núcleo mais forte do entorno do presidente Jair Bolsonaro, após a dança das cadeiras, é uma tríade com dois militares e um civil. O grupo mais influente junto a Bolsonaro contempla o ministro das Comunicações, Fábio Faria, o agora ministro-chefe da Casa Civil, general Luiz Eduardo Ramos, e o secretário especial de Assuntos Estratégicos (SAE) e secretário interino de Comunicação, almirante Flávio Rocha, o “ministro sem pasta”.

Com o tempo, esse grupo deve agregar mais um civil: a nova ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda. À medida que a campanha eleitoral se aproximar, e o presidente ficar mais dependente do Centrão, a ministra indicada pelo bloco, e responsável pela articulação política, deverá se fortalecer, apostam aliados. É sintomático o avanço dos civis na sede do Executivo. Até o ano passado, os quatro ministros palacianos eram militares: Ramos, então ministro da Secretaria de Governo (Segov); Walter Braga Netto, então na Casa Civil, e agora remanejado para o Ministério da Defesa; Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); e Jorge Oliveira, ministro da Secretaria-Geral (SG) da Presidência, que entrava na contabilidade como egresso da Polícia Militar, e atualmente despacha no Tribunal de Contas da União (TCU).

O novo desenho palaciano agora contempla dois deputados licenciados no quarto andar: Onyx Lorenzoni (DEM-RS), ex-Casa Civil que voltou ao palácio realocado na SG; e a novata Flávia Arruda (PL-DF), que recentemente assumiu a Segov e tem potencial para formar dupla com Faria no concorrido núcleo duro do presidente. De longe, o ministro civil, da chamada “ala política”, mais influente junto a Bolsonaro é Fábio Faria. No jargão palaciano, ministro forte é aquele que está a um lance de escadas do presidente. Por isso, embora tenha gabinete no Bloco R da Esplanada, Fábio Faria ganhou uma sala no segundo andar do palácio, e passe livre ao gabinete presidencial, no terceiro andar. O deputado licenciado é combativo nas redes sociais se o assunto é a defesa do governo e do presidente, mas é considerado um político de trato afável e perfil conciliador, nas reuniões privadas. Mais que combativo, Faria é quem orienta os demais auxiliares sobre a linha de defesa do governo nas redes sociais. Ele foi o primeiro ministro a reagir nas redes sociais à decisão do ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal (STF) que obrigou o Senado a instalar a CPI da Covid, iminente palanque preferencial da oposição. A CPI vai comprovar uma “atuação responsável e íntegra”, registrou Faria no Twitter.

O ministro é o autor da ideia de criar um “vacinômetro” e articulou o recente jantar de Bolsonaro com empresários, em São Paulo, como reação à carta de banqueiros e economistas com críticas à condução da economia e da crise sanitária. Ele também se aproximou do almirante Flávio Rocha, e costurou para que o militar assumisse a Secretaria de Comunicação no lugar do empresário Fabio Wajngarten. Segundo o próprio Ramos e outras fontes, o auxiliar mais próximo de Bolsonaro é o almirante Flávio Rocha, que passou a acumular a SAE, que tem status de ministério, com a Secom. A relação de Rocha com o presidente remonta há pelo menos 20 anos. Eles se conhecem desde quando o almirante era assessor parlamentar da Marinha e frequentava o gabinete do então deputado Jair Bolsonaro. Por fim, o general Luiz Eduardo Ramos, amigo de Bolsonaro desde os tempos da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), sobreviveu às várias tentativas do Centrão, e também de fogo amigo no governo, de derrubá-lo do cargo. Diante do acirramento da crise política, cedeu a função de interlocutor do Planalto com o Congresso, mas “caiu para cima”, na Casa Civil.

Faria, Ramos e o almirante encabeçam o grupo de ministros das alas política e militar que atuam nos bastidores para neutralizar a chamada ala ideológica, de onde emergem as crises mais estridentes do governo. Três expoentes dessa ala já sofreram degola: o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub, o ex-chanceler Ernesto Araújo e o ex-Secom Fabio Wajngarten. O assessor especial da área internacional, Filipe Martins, é um remanescente do grupo, mas que está na linha de tiro dos ministros políticos e militares. Heleno e Onyx são apontados como ministros com menos influência na tomada de decisões estratégicas. Contudo, têm lugares cativos junto a Bolsonaro pelo histórico de lealdade e confiança. Em contrapartida, o novo ministro da Defesa, Braga Netto, pode perder influência nas decisões estratégicas ao se deslocar para a Esplanada. “Com ele, agora, não é mais só descer as escadas para falar com Bolsonaro”, pondera uma fonte militar. Braga Netto, entretanto, joga em dupla com Ramos, e tem laços estreitos com Bolsonaro.

Ex-presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), e ex-primeira-dama do Distrito Federal, Flávia Arruda é o primeiro nome que o Centrão emplaca no primeiro escalão. Ela é próxima do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), mas foi alçada ao posto pelo ministro Ramos, graças à sintonia fina estabelecida com o general quando era presidente da CMO. “Creditaram a indicação da ministra ao Arthur Lira, mas na realidade ele soube pela Flávia que ela estava sendo indicada”, disse Ramos ao Valor. “Quem escolheu a Flávia foi o presidente da República, a partir de quatro nomes que eu apresentei a ele.” Em paralelo, Flávia tem tudo para agradar Bolsonaro: primeiro de tudo, a confiança de Ramos. Além disso, ela é discreta, quer fugir dos holofotes para não irritar o presidente. E, nos bastidores, é considerada hábil e conciliadora. Se tiver atuação decisiva para costurar uma saída política para o impasse envolvendo a Lei Orçamentária de 2021, que descarte o veto presidencial, a ministra tende a se consolidar no núcleo forte do entorno presidencial, diz um expoente do Centrão.

Ao fim e ao cabo, porém, quem realmente tem voz e poder de ação no governo continua sendo o núcleo da “copa e cozinha”: os filhos – senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), e vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) -; o titular da Secretaria de Assuntos Jurídicos, Pedro Nunes; e o chefe de gabinete, Célio Faria. “Esse é o grupo que realmente manda”, resume uma fonte palaciana.

VALOR ECONÔMICO

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