A discussão sobre o futuro do trabalho cai, muitas vezes, na improdutiva polarização que reconhece apenas dois caminhos. De um lado, o modelo tradicional de emprego, com controle e subordinação. Do outro, a ausência de qualquer regulação, pautada no imediatismo e na liberdade irrestrita.
Tirar os trabalhadores de plataformas digitais do limbo regulatório em que se encontram é o próximo passo que o Brasil precisa dar, com urgência, para garantir segurança, proteção social e ganhos mínimos aos 22 milhões de brasileiros que prestam serviços com a intermediação de aplicativos móveis.
São entregadores, motoristas, encanadores, designers e manicures, entre tantos outros profissionais que merecem nosso respeito e que carecem de uma regulação específica para ampará-los nesse novo modelo de relação de trabalho, fruto da nova economia.
O iFood está pronto e aberto para estabelecer um diálogo com o Legislativo, o Executivo, a academia, a sociedade civil organizada e, claro, os próprios trabalhadores de plataformas digitais e os aplicativos que se utilizam desses profissionais. Adoraríamos que outras empresas caminhassem juntas conosco para proteger essas pessoas.
A ideia não é acabar com a legislação trabalhista existente, que tão bem tem servido a sociedade, mas abrir caminho para construir, coletivamente, um marco regulatório que não obrigue o trabalhador dessas plataformas a escolher entre ter mais benefícios e segurança na atividade ou ter menos flexibilidade e autonomia.
Como promotores dessa causa, que tem a garantia da dignidade do profissional como ponto de partida, defendemos que o conceito de segurança no novo modelo de trabalho ganhe amplitude inédita. Deve envolver o bem-estar físico, social e financeiro dos trabalhadores das plataformas. Na prática, falamos de prover acesso à seguridade social, seguro contra acidentes, vantagens em saúde e fundos de proteção em caso de doenças.
É preciso assegurar ganhos mínimos. A remuneração em plataformas digitais deve ser proporcional às horas trabalhadas e sempre acima do piso calculado na relação hora/salário mínimo vigente no país. Hoje no iFood, por exemplo, o ganho médio dos entregadores, por hora trabalhada, supera em até cinco vezes essa proporção.
Ouvir esses profissionais e garantir que tenham voz no diálogo com as empresas é imprescindível ao longo da construção da futura regulação e, sobretudo, nas próprias relações de trabalho. Portanto, é preciso prever transparência, facilidade de acesso às regras de uso e condições claras e objetivas.
A essa altura, você deve pensar no que querem os próprios trabalhadores. Segundo pesquisa do Instituto Locomotiva, dois em cada três preferem um modelo mais flexível de trabalho ao registro em carteira. Por isso, para o iFood, liberdade de escolha, independência e autonomia são direitos que devem ser reconhecidos e valorizados. Não só para entregadores, mas para todos os trabalhadores de plataformas digitais.
Lançadas as bases da discussão, nos tornamos agora todos protagonistas dessa revolução. O novo mundo, em permanente construção, exige de nós agilidade para impulsionar a tão necessária transformação também no mundo do trabalho e em suas regras. Isso beneficiará não somente os trabalhadores e as plataformas. A sociedade e a economia como um todo também ganharão relações cada vez mais sustentáveis e dignas.
Regular o trabalho desses profissionais é uma questão de ganha-ganha-ganha. Ganham os trabalhadores, que passam a contar com seguridade mínima. Ganham as empresas, que passam a ter segurança jurídica para investir e inovar. E ganha a sociedade, com a inclusão de milhares de trabalhadores no sistema de seguridade social.
A hora de construir juntos é agora.
FOLHA DE S. PAULO