O Brasil já vinha mergulhado em incertezas. De repente, o número de incertezas cresceu e sua intensidade se multiplicou.
A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin de anular as condenações do ex-presidente Lula pela Justiça Federal de Curitiba, mais o adiamento da decisão da Segunda Turma, também do Supremo, de votar pela parcialidade ou não do então juiz Sérgio Moro abriram um leque de incertezas na área jurídica, pelos desdobramentos que essas decisões podem produzir.
Abriram novas incertezas também na área política, na medida em que embaralharam o jogo sucessório para as eleições de 2022. Como voltou a ser elegível, o ex-presidente Lula passou a ser forte candidato à Presidência da República, a menos que nova sentença do Supremo reverta outra vez as coisas. A principal consequência tende a ser a polarização político-eleitoral entre Lula e Bolsonaro.
Até agora, as esquerdas estavam desaparecidas do cenário eleitoral. A decisão de Fachin tende a levar o presidente Bolsonaro a escolher Lula como seu inimigo principal e a concentrar sobre ele toda a artilharia de que dispõe.
Nesse sentido, perde importância a estratégia eleitoral anterior de Bolsonaro, que foi a de pulverizar o centro (não confundir com o Centrão) e sempre esvaziar os possíveis candidatos dessa faixa, como os governadores João Doria e Eduardo Leite, ou eventualmente outros, como o ex-governador Ciro Gomes; o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta; e o apresentador de TV Luciano Huck.
Em paralelo, há algumas semanas, vinha sendo costurada uma aliança da maioria dos governadores contra a política ou a falta de uma política consistente no combate à covid-19. Não está claro se esse novo foco de oposição ao governo federal perderá importância diante do crescimento da candidatura Lula ou se, ao contrário, produzirá aglutinação de forças dos segmentos contrários tanto a Bolsonaro quanto a Lula. A ver.
As incertezas anteriores, por sua vez, determinam o aumento de incertezas na área econômica. O presidente Bolsonaro vinha praticando uma política oscilante e pouco coerente. A disposição de seguir inspiração liberal, como um mínimo de austeridade fiscal, certo incentivo a privatizações e de encorajamento – ma non troppo – às reformas, vinha sendo permeada e quebrada por políticas de cunho populista. Entre elas estão as intervenções nas estatais para tentar conter o avanço das tarifas da energia elétrica e dos preços dos combustíveis, com o objetivo direto de conter a insatisfação dos caminhoneiros. Bolsonaro tentou explorar, também, o sentimento contrário da população aos sacrifícios impostos pelo confinamento social e pelo fechamento de postos de trabalho.
Já não se sabia ao certo que tipo de política econômica Bolsonaro elegeria para reverter a impopularidade acumulada pelas lambanças no enfrentamento da pandemia e tentar chegar inteiro às eleições de 2022: se uma política de cunho liberal ou de aprofundamento da política populista. Essa incerteza agora se acentua porque, muito provavelmente, o próprio Bolsonaro seguirá vacilante. Mas já nas próximas semanas, terá de decidir de quanto será o valor da nova rodada de auxílio emergencial, como será compensada e que impulso dará às reformas.
No dia a dia da economia, o recrudescimento das incertezas tende a se traduzir em aumento do “seguro de risco Brasil”, que se manifesta pelo ganho extra cobrado pelo investidor para ficar com títulos do Tesouro do Brasil CDS (veja gráfico acima). E, também, pela maior procura por moeda estrangeira (veja o gráfico abaixo), alta da inflação, adiamento dos investimentos e aumento dos juros. Falta saber em que proporção isso se dará. No próximo dia 17, o Banco Central deverá rever o nível dos juros básicos (Selic) hoje nos 2% ao ano. São duas as opções: alta de 0,25 ponto porcentual ou logo de 0,50.
O ESTADO DE S. PAULO