No modelo em estudo para a criação do BIP (Bônus de Inclusão Produtiva), que substituiria o auxílio emergencial, o governo avalia exigir que as empresas forneçam um curso de qualificação ao contratarem beneficiários do programa.
A medida seria uma forma de compensação dada pela companhia pelo fato de estar incluindo em seus quadros um funcionário com encargos trabalhistas reduzidos, dentro do sistema da Carteira Verde e Amarela.
Como mostrou a Folha, o governo está preparando uma proposta que libera três parcelas de R$ 200, com foco nos trabalhadores informais não atendidos pelo Bolsa Família.
A ideia é que o recebimento do auxílio possa ser associado ao fornecimento de um curso aos beneficiários, que, em sua maioria, têm baixo nível de qualificação.
Um dos modelos desenhados pelo Ministério da Economia previa parcerias com órgãos do sistema S, que seriam responsáveis por oferecer os treinamentos. No entanto, seria necessário uma rede bem mais ampla para atender às 30 milhões de pessoas que devem ser beneficiadas pelo BIP.
Um exemplo foi a medida adotada pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) que buscou exigir curso de qualificação profissional a quem pedir seguro desemprego pela segunda vez em dez anos.
Mas, sem uma ampla oferta de vagas, por exemplo, no Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), a ideia gerou pouco efeito na liberação de seguro desemprego desde 2013. Isso porque sem oferta por entidade pública, o benefício é concedido sem a obrigatoriedade de curso técnico.
O Pronatec recuou de quase R$ 4,7 bilhões em 2015 para uma previsão de R$ 100 milhões neste ano.
Membros da equipe econômica estudam, portanto, um modelo que não dependa de ampliação dos recursos públicos para a oferta de cursos profissionalizantes. Por isso, afirmam que pode ser adotado um novo caminho, com treinamento oferecido pelas próprias empresas.
Nessa possibilidade em avaliação, os beneficiados pelo BIP receberiam as três parcelas de R$ 200 enquanto procuram um emprego. Eles seriam autorizados a assinar contratos sob o modelo flexível da Carteira Verde e Amarela, que permitiria o trabalho por hora e teria encargos reduzidos.
Ao encontrar a vaga, essa pessoa teria de passar por um curso na empresa. O ônus do treinamento ficaria a cargo do empregador, sem custo ao funcionário.
De acordo com uma fonte que participa da elaboração da medida, existe a possibilidade de que o curso seja focalizado em pessoas mais jovens, assim como a redução dos encargos na Carteira Verde e Amarela.
O desenho do BIP, no entanto, prevê o pagamento das parcelas de R$ 200 para informais de todas as idades.
A movimentação da equipe econômica para criar um programa vinculado a contrapartidas é uma tentativa de evitar que o Congresso aprove uma liberação direta de recursos para o auxílio emergencial. Parlamentares já sinalizaram que podem criar a assistência mesmo que não haja corte de gastos em outras áreas.
A proposta do ministro Paulo Guedes (Economia) busca condicionar esse gasto extra com o benefício ao corte de despesas do governo. Para isso, vai propor a inclusão de uma cláusula de calamidade pública na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do pacto federativo, que retira amarras do Orçamento e traz gatilhos de ajuste fiscal.
O modelo de treinamento feito pela empresa também existe, por exemplo, nos casos de lay off, quando companhias fecham acordo coletivo para suspender o contrato de trabalho de funcionários por até cinco meses em momentos de crise.
Nesses casos, os empregados participam de curso ou programa de qualificação profissional oferecido pela própria empresa. No ano passado, por conta da pandemia, esses treinamentos foram oferecidos na modalidade não presencial, pela internet.
O mecanismo do lay off dá ao trabalhador o direito a uma bolsa de qualificação profissional, calculada de forma semelhante ao seguro-desemprego. O valor mensal tem por base os três últimos salários recebidos, não podendo ser inferior a um salário mínimo.
Para o beneficiário do BIP, não haveria o pagamento dessa bolsa. Ele receberia do governo as parcelas de R$ 200.
Segundo técnicos da equipe econômica, o objetivo do modelo desenhado para o BIP é estimular a qualificação profissional sem que isso represente um peso às contas públicas.
Desde o início do governo, a qualificação bancada com recursos públicos vem sendo substituída por iniciativas mais baratas ao Orçamento e com ampliação da parceria com o setor privado.
Com o discurso de que o formato atual do Pronatec não tem o efeito devido no mercado de trabalho, o governo começou a selecionar empresas de qualificação profissional para serem remuneradas de acordo com a efetiva empregabilidade dos alunos formados. Mas a medida ainda precisará ser expandida.
FOLHA DE S. PAULO