O governo federal arrecadou R$ 3,3 bilhões no primeiro da série de três leilões de concessões em infraestrutura que o Ministério da Infraestrutura batizou de InfraWeek. Foram leiloados três blocos com 22 aeroportos, todos eles com disputa entre interessados.
A Companhia de Participações em Concessões do grupo CCR arrematou dois dos três lotes, os da região Sul e Central, com ofertas agressivas. Ofereceu ágios de 1.534,36% e 9.156%, respeticamente. A francesa Vinci ficou com aeroportos da região Norte.
Em média, o leilão teve ágio de 3.822,61% em relação ao valor mínimo das áreas. O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes, disse que o resultado positivo, principalmente em meio à pandemia, é uma vitória do presidente Jair Bolsonaro e reforça a agenda liberal do governo.
“Começamos nossa InfraWeek com o pé direito. Diziam que a gente era louco de colocar projetos em meio à pior crise no setor aeroportuário. Faremos leilão de 28 ativos e teremos 28 sucessos. É uma grande vitória do presidente Bolsonaro”, afirmou.
O valor arrecadado refere-se à parcela da outorga que será paga à vista. Os contratos preveem ainda o pagamento de outorga variável a partir do quinto ano de concessão, em valor total estimado de R$ 14,5 bilhões, e investimentos mínimos de R$ 6,1 bilhões.
A CCR foi responsável pelo maior lance, de R$ 2,1 bilhões, pelo bloco Sul, composto por nove aeroportos na região Sul do país, incluindo os de Curitiba e Foz do Iguaçu, ambos no Paraná. A oferta equivale ao dobro da segunda proposta, feita pela espanhola Aena.
Além de Curitiba e Foz do Iguaçu, a concessão inclui os aeroportos Navegantes (SC), Londrina (PR), Bacacheri (PR), Joinville (SC), Pelotas (RS), Uruguaiana (RS) e Bagé (RS), que juntos movimentaram 12,4 milhões de passageiros em 2019. O contrato prevê investimentos de R$ 2,85 bilhões.
A CCR levou também o bloco Central, com proposta de R$ 754 milhões. Nesse bloco estão os aeroportos de Goiânia (GO), São Luís e Imperatriz (MA), Teresina (PI), Palmas (TO) e Petrolina (PE), com movimentação de 7,3 milhões de passageiros em 2019.
Em entrevista após o leilão, o diretor-presidente da CCR, Marco Cauduro, afirmou que os elevados ágios refletem a avaliação da empresa sobre o potencial de crescimento do tráfego nos aeroportos, que considerou também a possibilidade de sinergia na movimentação de cargas com outras concessões de infraestrutura da empresa.
Ele disse que a situação financeira da empresa lhe permite arcar com os elevados desembolsos. “A CCR é empresa consolidada, com balanço robusto, mais de R$ 5 bilhões em caixa e capacidade de contratar empréstimos e financiamentos adicionais.”
A surpresa da disputa foi a proposta da francesa Vinci pelo bloco Norte, que tem como principal ativo o aeroporto de Manaus (AM), por onde escoa boa parte das exportações realizadas pela Zona Franca.
O grupo francês, que já opera o aeroporto de Salvador (BA), ofereceu inicialmente R$ 420 milhões pelo bloco, ágio de 777,41%, contra R$ 50 milhões do consórcio Aerobrasil, grupo que administra o aeroporto de Belo Horizonte junto com os operadores Zurich Airport International (Suíça) e Munich Airport International (Alemanha).
O novo concessionário terá ainda de gerenciar e investir ao menos R$ 1,4 bilhão na melhoria dos aeroportos de Porto Velho (RO), Rio Branco e Cruzeiro do Sul (AC), Tabatinga e Tefé (AM) e Boa Vista (RR). Os aeroportos do bloco tiveram 4,6 milhões de passageiros em 2019.
Para o grupo francês, a região amazônica representa uma sinergia com sua operação na Guiana Francesa, que tem voo direto para Paris. A empresa vê em Manaus potencial para a implantação de um hub de interligação entre as Américas como o aeroporto do Panamá.
Em vídeo gravado em português, o presidente da Vinci Airport, Nicolas Notebaert, disse que a entrada do grupo na região Norte está atrelada a uma estratégia de consolidar a atuação do grupo no Brasil e na América Latina, além de estimular “aeroportos verdes”, que respeitem políticas ambientais.
“Acreditamos no potencial desses aeroportos [do Norte] na recuperação pós-pandemia pelo seu potencial de carga e logística para o escoamento dos produtos. Estamos confiantes na perspectiva de crescimento das indústrias de alto valor, de eletrônicos, e os aeroportos desempenham papel fundamental”, disse Notebaert.
Os contratos de concessão leiloados nesta quarta têm duração de 30 anos. O ministro da Infraestrutura disse que os investimentos podem ficar acima dos previstos, caso os novos concessionários descubram outras oportunidades de negócios.
Empolgado em seu discurso após o leilão, o ministro exagerou na força e danificou a base usada para a batida de martelo que normalmente encerra esse tipo de concorrência. Ele defendeu que o programa de concessões reforça o compromisso de Bolsonaro com a agenda liberal.
A declaração ocorre em um momento de questionamentos do setor financeiro com relação à estratégia de combate à pandemia, diante da percepção de que a falta de controle prejudicará a retomada do crescimento econômico do país.
Nesta quarta, Bolsonaro e representantes da área econômica, como o ministro da Infraestrutura, participam de jantar com empresários e banqueiros, em uma tentativa de reaproximação. Gomes disse que o resultado do leilão será levado como exemplo de avanço na agenda liberal.
“Vamos ver as privatizações tomando corpo. Aquelas que não dependem do Congresso estão andando e as que dependem do parlamento também estão começando a tomar corpo, como é o caso de Eletrobras e Correios”, afirmou.
Na quinta (8) e na sexta (9), o governo federal leiloará ainda a Fiol (Ferrovia de Integração Oeste Leste) e cinco terminais portuários. Pelas estimativas do Ministério da Infraestrutura, os projetos desta fase de concessões públicas têm potencial para gerar 200 mil empregos diretos e indiretos.
Os leilões da InfraWeek servirão de teste com os investidores para as próximas rodadas deste ano, que contarão com até 50 projetos. Dentre eles estão as BRs 153 e 163, a Novadutra, os portos do Espírito Santo e de Santos e outros 16 aeroportos, incluindo Congonhas (SP) e Santos Dumont (RJ).
Juntos, esses empreendimentos devem atrair mais R$ 84 bilhões e gerar 2,9 milhões de empregos diretos e indiretos. Deste total, o setor ferroviário deve concentrar R$ 41,6 bilhões em investimentos, seguido pelos terminais portuários (R$ 32 bilhões).
O calendário de leilões entrou na propaganda oficial do governo como “o maior programa de concessões de infraestrutura do mundo”.
FOLHA DE S. PAULO