Tardio, mas ainda necessário. Essa é a avaliação de alguns dos setores que mais adotaram as medidas de redução de salário e jornada e de suspensão de contratos no ano passado, e que viviam a expectativa da reedição do programa.
As medidas provisórias 1.045 e 1.046, publicadas na edição desta quarta-feira (28) do Diário Oficial da União, recriam o programa de manutenção do emprego e da renda e colocam novamente em vigor a flexibilização de regras trabalhistas, como o limite para o uso de férias coletivas ou a antecipação de feriados. As duas têm validade de quatro meses e poderão ser prorrogadas pelo governo.
“Embora esteja saindo um pouco atrasada, vai ajudar muito o setor, que estava precisando de alguma medida para aguentar mais um tempo”, diz Joaquim Saraiva, presidente da Abrasel-SP (Associação de Bares e Restaurantes de São Paulo).
Há cerca de um mês, chefs e proprietários de restaurantes iniciaram uma mobilização nas redes sociais para cobrar a renovação da medida que autorizava a suspensão de contratos ou a redução de jornada e salário.
Criado em 2020 com a MP 936, depois convertido na Lei 4.020, o programa perdeu a validade no fim do ano, com a expiração do decreto de calamidade pública. Uma outra medida provisória apresentada pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido) no ano passado (MP 927) também teve boa parte de seu conteúdo recuperado na publicação desta quarta.
Leandro Almeida, assessor jurídico da FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de São Paulo), diz que os empresários “aguardavam ansiosamente por essas medidas”, uma vez que os últimos meses foram de restrições para o funcionamento de boa parte das atividades econômicas.
Nesta quarta, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou a ampliação no horário de funcionamento do comércio a partir do dia 1º de maio. “O setor vem passando por medidas restritivas, deixando as empresas com muita dificuldade de caixa. Vem em boa hora”, afirma Almeida.
Jorge Matsumoto, advogado trabalhista no Bichara, critica o atraso da publicação das novas medidas provisórias. “Chegou depois do período mais crítico de restrições, que abalou o fluxo de caixa das companhias”, diz.
Para ele, porém, o período de garantia de emprego previsto no programa que permite o corte de salário e jornada e suspensão de contratos coloca as empresas em uma situação de fragilidade.
“Ter de manter o vínculo durante o acordo e no período posterior é problemático. As empresas precisam desse socorro, mas quando você coloca essa obrigação, fica complicado”, afirma.
Ainda assim, Matsumoto diz que o conjunto de medidas vai permitir uma previsibilidade maior no planejamento das empresas para os próximos quatro meses. “Vai ser um alívio importante poder queimar férias, postergar o pagamento do terço constitucional e ainda adequar a mão de obra atual à demanda.”
Na indústria, o programa de manutenção do emprego e da renda é visto como importante para 84% das empresas ouvidas em uma sondagem especial feita pela CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Segundo a pesquisa realizada com 552 empresas, 35% pretendem usar as possibilidades previstas no programa. A maioria delas disse que optaria pela suspensão do contrato de trabalho.
Nesse modelo, o trabalhador fica sujeito a dois tipos de remuneração. Se a empresa estava enquadrada no Simples Nacional em 2019 (rendimento anual de até R$ 4,8 milhões), ele recebe 100% do benefício a que teria direito no seguro-desemprego, que é de até R$ 1.911,84.
Caso a empresa seja maior, esse trabalhador receberá 70% do valor do seguro-desemprego por meio do BEm (benefício emergencial) mais uma ajuda compensatória custeada pelo empregador.
Esse complemento equivalerá a 30% do salário que ele recebe, mas terá natureza indenizatória, ou seja, não incide sobre ele Imposto de Renda nem contribuição previdenciária.
Na avaliação da advogada trabalhista Cassia Pizzotti, do Demarest, as medidas dão condições de as empresas adiarem novas demissões enquanto a economia não se recupera. “As duas MPs acabam suprindo um vácuo, pois ajudam a resolver temporariamente a situação e trazem alternativas para as empresas pelos próximos quatro meses”, diz.
Com a MP 1.046, as empresas voltam a ter mais liberdade para antecipação de férias e feriados. Por acordo individual, o trabalhador poderá utilizar períodos de férias antes mesmo de ter completado 12 meses no emprego.
Essa norma também autorizou as empresas a atrasarem o pagamento do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) das competências de abril, maio, junho e julho deste ano, que passarão a vencer a partir de setembro.
O diferimento nesse recolhimento também foi autorizado no ano passado. A diferença é que neste ano o pagamento deverá ser feito em quatro parcelas. Em 2020, foram seis.
MEDIDAS PREVISTAS NA NOVAS MEDIDAS PROVISÓRIAS DE PROTEÇÃO AO EMPREGO
FGTS
As empresas poderão optar pelo adiamento do recolhimento do FGTS
Isso valerá para os valores que seriam recolhidos nos meses maio, junho, julho e agosto
As parcelas deverão ser pagas em quatro pagamento a partir de setembro
Férias coletivas
A empresa pode comunicar os funcionários com antecedência de 48 horas e não há necessidade de avisar sindicato ou governo
Férias individuais
A empresa pode antecipar férias não vencidas ainda
O pagamento será feito no mês seguinte e o ⅓ de férias poderá ser pago somente no fim do ano
Feriados
A empresa pode antecipar as folgas de todos os feriados até o fim do ano, mesmo os religiosos
O funcionário precisa ser avisado 48 horas antes e os dias sem trabalho vão para o banco de horas
Redução de salários e jornada e suspensão de contrato
Nova medida permite reduções de 25%, 50% e 70% na jornada e no salário
O trabalhador receberá pelo menos o salário mínimo
O governo pagará o BEm (benefício emergencial)
Na suspensão de contrato, o BEm equivalerá a 100% do seguro-desemprego
Em empresas fora do Simples Nacional, quem tive o contrato suspenso receberá 70% do valor do seguro-desemprego mais um complemento equivalente a 30% do salário
FOLHA DE S. PAULO