O tamanho dos impostos brasileiros reflete os desafios que o governo tem para resolver as demandas da sociedade, mas a distribuição da carga tributária precisa ser revista, avaliam os especialistas que participaram do seminário online ‘O Brasil deve aumentar impostos para combater a pobreza?’, realizado na manhã desta quinta-feira (24).
Estiveram no evento a economista Vilma Pinto, assessora da Secretaria da Fazenda do Paraná, Jefferson Nascimento, que é coordenador de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil, e Samuel Pessôa, pesquisador associado ao Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas) e colunista da Folha. O seminário foi mediado pelo repórter especial da Folha Fernando Canzian.
Uma pesquisa recente do Datafolha para a Oxfam Brasil mostrou que a maior parte dos brasileiros é favorável a aumentar a tributação para financiar políticas sociais, em um cenário de crescimento da pobreza e da desigualdade, como reflexo dos efeitos da pandemia da Covid-19.
Desde 2017, o apoio ao aumento de tributos mais que dobrou, passando de 24% dos entrevistados para 56%. Além disso, nove em cada dez defendem que a redução da desigualdade deve ser prioridade do governo.
No seminário, Nascimento disse que a pesquisa pode ser um indicativo de que as pessoas estão mais conscientes da importância das políticas sociais e elas também sabem que essas políticas não surgem do nada.
“Falar de mais impostos, em um país como o Brasil, pode ter como foco a redistribuição da carga tributária, em vez de simplesmente aumentá-la”, afirmou Nascimento.
“O Brasil gasta mais que outros países e tem um desempenho pior em quase todas as áreas, talvez menos na saúde. Ao mesmo tempo, somos uma sociedade que outorgou benefícios para uma classe de trabalhadores, e a gente tem de rever a forma como remunera e aposenta servidores públicos”, disse Pessôa.
Vilma lembrou que o nível de carga tributária reflete a tentativa do governo de cumprir suas funções. O Brasil tem uma carga elevada, parecida com a de países de economia avançada, mas tributa muito o consumo e pouco a renda comparando com a média dos países desenvolvidos.
“É preciso avançar na agenda da progressividade e de simplificação desse sistema, reduzindo a quantidade de regimes e de tributos”, disse.
A economista também ressaltou a importância de o país rever suas renúncias fiscais para determinados setores, a partir de métricas que avaliem o retorno que esses programas trazem. “Temos um estoque estimado em 4,3% do Produto Interno Bruto de renúncias, pelos benefícios concedidos. O debate sobre como reduzir esse gasto foi ampliado recentemente, o que é positivo.”
Nascimento acrescentou que a pesquisa também aponta que a percepção de que reduzir a desigualdade é prioritária é mais clara entre os mais jovens, o que aponta que os brasileiros que nasceram após a Constituição de 1988 parecem acreditar nos compromissos que a Carta prevê.
É preciso construir um estado que caiba dentro da arrecadação, disse o economista do Ibre/FGV. “Vamos ter de fazer um pouco de tudo: rever subsídios tributários, fazer programas para aumentar a carga tributária em alguns casos e continuar com a agenda de reformas para reduzir gastos. O Brasil gasta duas vezes e meia mais com a Justiça do que outros países. Pode ter uma forma de tornar isso mais barato, para sobrar para outras áreas.”
Questionado sobre a alternativa de reduzir impostos no Brasil para aumentar a eficiência, Pessôa complementou que a relação entre eficiência econômica e baixa carga tributária não é sempre clara. “Por outro lado, quando a carga sobe muito, acaba ficando disfuncional.”
O resumo, disse, é que há um grande espaço para aumentar a eficiência da carga tributária no Brasil.
FOLHA DE S. PAULO