O jantar entre o presidente Jair Bolsonaro e empresários brasileiros foi marcado pela escalação de vários membros do governo para assegurar que haverá um esforço para trazer a revitalização da economia, que anda combalida pela nova onda de infecções e pelos sucessivos recordes de mortes por covid-19. Embora temas como reformas estruturais tenham sido abordados, a principal tônica do encontro, segundo os presentes, foi a vacinação no ritmo mais acelerado possível.
Não houve detalhamento, porém, de como essa intenção vai ser colocada em prática, ainda que empresários tenham cobrado “envolvimento pessoal” do presidente na busca de mais vacinas e na resolução da crise sanitária da covid-19 ainda este ano. Apesar da resposta positiva em relação à vacinação, Bolsonaro deixou claro que não vai mudar sua postura crítica a lockdowns, apesar de o distanciamento social ser uma medida recomendada por cientistas, especialmente em momento de alta de número de casos e mortes.
A postura do presidente no encontro foi elogiada por empresários. “Foi uma conversa boa, eu gostei, me deu tranquilidade”, definiu Rubens Menin, controlador de MRV, Banco Inter e da rede de televisão CNN. Segundo o empresário, Bolsonaro também se comprometeu com a austeridade fiscal e com as reformas, que são outras demandas do setor produtivo.
A aproximação entre empresários e Bolsonaro vem na esteira de uma carta, divulgada no fim de março, em que economistas e banqueiros cobravam uma mudança na condução do governo em relação à economia e ao combate à pandemia. O encontro, realizado na casa do empresário Washington Cinel, da empresa de segurança Gocil, reuniu diversos empresários, alguns deles apoiadores do presidente desde a campanha de 2018.
Bolsonaro foi o último a falar. E recebeu aplausos ao se comprometer com a imunização da população, para que ela ocorra da maneira mais rápida possível – segundo um dos presentes ao encontro, foi “ovacionado” ao dizer isso. O presidente destacou que o País tem duas fábricas próprias de vacina – uma da Fiocruz, no Rio de Janeiro, e outra do Instituto Butantan, em São Paulo – e afirmou que vai fazer de tudo para acelerar o processo de vacinação.
O presidente também tentou instar os empresários a focar nos aspectos positivos do governo, e não apenas nos negativos. Entre os motivos citados para essa visão mais benévola da atual administração, Bolsonaro citou o leilão de aeroportos, realizado na quarta-feira, 7, e que trouxe R$ 3,3 bilhões para o caixa do governo, com ágio de até 9.000% sobre os valores iniciais.
Em entrevista à CNN, o presidente do Conselho da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, Claudio Lottenberg, disse que o ambiente do jantar foi de cordialidade. Para ele, as falas do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e do ministro da Economia, Paulo Guedes, chamaram a atenção.
“Ele (Campos Neto) chamou a atenção para reformas estruturantes que aconteceram no período da pandemia e que não ocorreram em outros países, e essa é uma sinalização positiva a respeito do momento”, disse Lottenberg. “(Paulo Guedes) Também fez uma constatação importante, de que o País, a despeito do que se acreditava, teve PIB negativo, mas não tão negativo quanto se imaginava”, prosseguiu.
O presidente do Conselho do Einstein elogiou ainda o ministro Marcelo Queiroga, ressaltando que o novo chefe da Saúde tem se mostrado preocupado com a questão da vacinação, do uso de máscaras e da necessidade de distanciamento social. Lottenberg indicou, contudo, que a questão do lockdown generalizado – tido por epidemiologistas como uma medida urgente, mas que enfrenta críticas de Bolsonaro – não foi debatida. “Não polemizamos em relação a isso”, disse.
Vaivém de discursos
Desde o início da pandemia, o discurso do presidente em relação ao combate à pandemia de covid-19 mudou diversas vezes, muitas vezes de um dia para o outro. No passado, ele chegou a ironizar a vacinação, a declarar que não se vacinaria (ele ainda oficialmente não o fez, embora sua faixa etária já possa ser imunizada no Distrito Federal) e a colocar dúvidas sobre a Coronavac, de origem chinesa e produzida em parceria com o Butantan.
Nesta quarta-feira, 7, o Brasil atingiu a marca de 10% da população imunizada pela primeira dose da vacina, sendo que cerca de 80% do contingente tomou a Coronavac. Após mais de 70 dias de um ritmo de vacinação considerado lento, o País tem registrado recordes de mortos pela covid-19. Na terça-feira, 6, foram mais de 4,2 mil óbitos. Até agora, mais de 341 mil pessoas já perderam a vida na pandemia.
Segundo Rubens Menin, questionamentos sobre o viés ideológico do presidente e suas ações abruptas – que foram sentidas não só na questão da pandemia, mas também nas trocas de direção das estatais Petrobrás e Banco do Brasil – ficaram de fora da pauta da noite. “Foi uma conversa de alinhamento, não de confusão.”
Tropa de elite
Para acalmar os ânimos do empresariado, que criticou duramente o governo Bolsonaro em declarações recentes, o Planalto escalou uma comitiva considerável: o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara; Onyx Lorenzoni, ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência; Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central; Fabio Faria, ministro das Comunicações; Tarcísio Freitas, da Infraestrutura; Marcelo Queiroga, da Saúde; e Paulo Guedes, ministro da Economia, entre outros.
Entre os empresários, discursaram Rubens Ometto (da Cosan), Claudio Lottenberg (presidente da Confederação Israelita do Brasil), André Esteves (BTG Pactual) e Alberto Saraiva (fundador do Habib’s). Do lado do governo, falaram Campos Neto, Guedes e, por fim, Bolsonaro.
O ministro das Comunicações, Fábio Faria, afirmou após o jantar que os presentes no evento apoiam o governo e o trabalho dos ministros. “O recado foi este”, disse. Em conversa com jornalistas, após o evento, Faria afirmou que a conversa foi amistosa e que não houve cobranças por parte dos empresários. “Todos sabem do esforço que estamos fazendo. Precisamos de união, ninguém aguenta mais politização”, disse, prometendo, como Bolsonaro, que o Brasil vai acelerar o processo de vacinação.
O ESTADO DE S. PAULO