Economistas cobram ação contra covid

O agravamento da pandemia no país levou um grupo de economistas de diferentes matizes ideológicas e mesmo de pensamentos econômicos diversos a assinar uma carta com críticas e sugestões ao governo para a condução do combate à covid-19. Entre os 509 que assinaram o documento até a noite de ontem, estão nomes como Roberto Setubal, João Moreira Salles, Pedro Malan, Pedro Parente, Arminio Fraga, Persio Arida, Edmar Bacha, Luís Stuhlberger, José Olympio Pereira e Rubens Ricupero, Affonso Celso Pastore, Elena Landau, Gustavo Loyola, Ilan Goldfajn, Ana Carla Abrão Maílson da Nóbrega. A carta, batizada de “O País Exige Respeito; a Vida Necessita da Ciência e do Bom Governo – Carta Aberta à Sociedade Referente a Medidas de Combate à Pandemia”, apresenta uma compilação de dados para mostrar como a falta de eficácia no combate à pandemia já custou caro ao país. O texto, inicialmente revelado por Merval Pereira em sua coluna em “O Globo”, lembra a queda de 4,1% do PIB no ano passado, a taxa de desemprego de 14%, a maior da série histórica, e também aponta que a redução do nível da atividade custou perda de arrecadação tributária apenas no âmbito federal de 6,9%, aproximadamente R$ 58 bilhões. Além disso, cita dados do Banco Mundial que apontam que o atraso na vacinação irá custar em termos de produto ou renda não gerada nada menos do que estimados R$ 131,4 bilhões em 2021, supondo uma recuperação retardatária em dois trimestres.

Bonomo: Ações de fechamento seriam mais efetivas se fossem coordenadas — Foto: Ana Paula Paiva/Valor A ideia de produzir o documento surgiu em grupo de WhatsApp chamado de Economistas do Brasil, que existe há cerca de cinco anos e tem mais de 200 integrantes. Preocupados com o andamento da pandemia, decidiram produzir um documento que contasse com dados e servisse de alerta e chamamento às autoridades públicas para melhora na gestão contra a covid-19. Depois de algum debate, escolheram cinco redatores: Cláudio Frischtak, Marco Bonomo, Sandra Rios, Paulo Ribeiro e Thomas Conti, que levaram duas semanas para produzir o texto, que ficou pronto no sábado. “É uma carta longa, com números, sem caráter panfletário. Isso foi fundamental para conseguir o apoio de tanta gente de peso”, frisa Bonomo.

“Ficamos duas semanas tentando achar uma redação que fosse equilibrada. Que fosse alicerçada em dados, em evidências, não em achismo”, diz Frischtak, acrescentando que a carta tem um “tom sóbrio”, embora seja “dura”. “Houve esforço de todos nós para chegar a algo equilibrado, que retrate a emergência da situação. As consequências para o país são terríveis.” Bonomo explica que o primeiro objetivo da carta é tentar mudar a trajetória de combate à pandemia e afirma que não é correto o debate que contrapõe medidas de saúde à recuperação da economia. “A economia não vai se recuperar enquanto não resolvermos o problema da saúde. Quanto mais se atrasa a saúde, mais vai atrasar a recuperação da economia”, diz.

Neste sentido, os redatores fazem ampla defesa da aceleração da vacinação e destacam que os recursos federais para compra de vacinas somam R$ 22 bilhões, “uma pequena fração dos R$ 327 bilhões desembolsados nos programas de auxílio emergencial e manutenção do emprego no ano de 2020”. “Impressiona a negligência com as aquisições, dado que, desde o início da pandemia, foram desembolsados R$ 528,3 bilhões em medidas de combate à pandemia, incluindo os custos adicionais de saúde e gastos para mitigação da deteriorada situação”, diz a carta. “Nesta perspectiva, a relação benefício custo da vacina é da ordem de seis vezes para cada R$ 1 gasto na sua aquisição e aplicação. A insuficiente oferta de vacinas no país não se deve ao seu elevado custo nem à falta de recursos orçamentários, mas à falta de prioridade atribuída à vacinação”, diz a carta. Além da recomendação para que o governo acelere o ritmo da vacinação, o texto conclui com outras sugestões: incentivar o uso de máscaras tanto com distribuição gratuita quanto com orientação educativa; implementar medidas de distanciamento social no âmbito local com coordenação nacional e criar mecanismo de coordenação do combate à pandemia em âmbito nacional.

O texto destaca ainda o “papel da liderança”, ressaltando que, “apesar do negacionismo de alguns poucos, praticamente todos os líderes da comunidade internacional tomaram a frente no combate ao covid-19 desde março de 2020”. A carta critica a postura do governo brasileiro, afirmando que “o desdenho à ciência, o apelo a tratamentos sem evidência de eficácia, o estímulo à aglomeração, e o flerte com o movimento antivacina caracterizou a liderança política maior no país”. “As medidas de fechamento seriam muito mais efetivas se fossem coordenadas”, diz Bonomo. “Na maior parte dos países, teve liderança nacional que coordenou. No Brasil, temos uma liderança que combate o combate à pandemia.”

VALOR ECONÔMICO

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