Economia de gatilhos prevista em PEC é menor do que gasto com auxílio

A economia potencial prevista com as medidas de ajuste da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que autoriza uma nova rodada de auxílio é de R$ 150 bilhões em dez anos para União, Estados e municípios. Para os cofres do governo federal seriam poupados R$ 34,3 bilhões em uma década, valor inferior ao limite estipulado de R$ 44 bilhões para a nova rodada do benefício.

Os cálculos são do especialista em contas públicas e diretor de estratégias públicas da MAG, Arnaldo Lima. “A economia potencial de gastos na União é inferior à extensão do auxílio emergencial, que passa a ser essencial para a proteção da população mais vulnerável, especialmente diante da segunda onda e das medidas de lockdown”, diz Lima, ex-secretário adjunto de Política Econômica no Ministério da Fazenda e diretor de Políticas Fiscais e Sociais no antigo Ministério do Planejamento. Para os Estados, ele calcula economia de R$ 54,7 bilhões e nos municípios, de R$ 60,9 bilhões.

No governo, Lima contribuiu para as estimativas de economia de várias medidas, incluindo cálculos relacionados ao teto de gastos (regra que proíbe que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação), reforma da Previdência e na própria formulação do Orçamento. Até agora, o Ministério da Economia e nem o senador Marcio Bittar, relator da PEC no Senado Federal, apresentaram dados com o ganho caso os gatilhos sejam acionados. Eles são considerados o coração da PEC para a equipe econômica, que trava uma queda de braço contra o próprio presidente Jair Bolsonaro e parlamentares para que essas contrapartidas não sejam desfiguradas na votação da Câmara e pela manutenção do valor de R$ 44 bilhões de gastos com o pagamento do auxílio.

Na madrugada desta quarta-feira, 10, a Câmara dos Deputados aprovou em primeiro turno o texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que recria o auxílio emergencial a vulneráveis e institui mecanismos de ajuste nas despesas, como congelamento de salários de servidores, quando há elevado comprometimento das finanças de União, Estados e municípios. O sinal verde veio depois de o próprio presidente Jair Bolsonaro ter endossado, a contragosto do Ministério da Economia, uma tentativa de fatiar a PEC para deixar de fora parte das medidas duras. A investida acabou não vingando. O segundo turno da votação deve ser nesta quarta também.

O maior ganho potencial de R$ 92,9 bilhões é justamente a trava para promoções nas carreiras. O congelamento dos salários por mais dois anos daria uma economia de R$ 56,9 bilhões nas três esferas de governo. Com apoio do próprio Bolsonaro, há um movimento para desidratar a potência dos gatilhos, blindando as categorias de forças de segurança especialmente. Outros servidores também querem ficar fora do alcance do ajuste.

Facultativo
Nos Estados e municípios, a PEC já prevê um acionamento de gatilhos facultativo, quando as despesas correntes chegarem a 95% das receitas correntes. O governador e prefeito que não acionar essas medidas de contenção de gastos não poderão receber aval do Tesouro Nacional para novos empréstimos.

Segundo Lima, o mercado vai olhar com lupa a possibilidade de aprovação do congelamento da progressão automática no primeiro momento e reforma administrativa (que prevê uma reformulação do RH do Estado, com novas regras para contratar, promover e demitir servidores) no segundo momento. “Sem essas medidas, o teto dos gastos não terá sustentabilidade”, diz.

Os cálculos feitos por Lima apontam também como seria a economia de gastos caso a PEC original, apresentada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, em novembro de 2019 tivesse sido aprovada. Ela contava com a redução de jornada de trabalho e dos salários do funcionalismo em até 25%. Dessa forma, a potência da PEC emergencial seria de R$ 281,6 bilhões em 10 anos. A União garantiria uma economia de R$ 65,1 bilhões. Já Estados conseguiriam reduzir os gastos em R$ 100,5 bilhões e municípios, em R$ 116,1 bilhões.

A redução da jornada e do salário foi abandonada, porém, antes mesmo da apresentação do parecer inicial do relator senador Márcio Bittar (MDB-AC) e pelos cálculos de Lima seria responsável sozinha por um impacto de R$ 131,8 bilhões em 10 anos.

O economista da MAG destaca que é importante preservar os gatilhos que ainda permanecem no texto. Ele lembra que o teto de gasto não faz reforma fiscal, mas ajuste concentrado em grande parte da redução nas despesas discricionárias, as que não são obrigatórias, como investimentos. “A PEC emergencial fortalece o teto, pois também reduz as despesas obrigatórias, proporcionando reformas fiscais duradouras”, defende.

Para Lima, caso os gatilhos sejam aprovados da forma que saíram do Senado, a tendência é que o funcionalismo público apoie, no futuro, outras reformas fiscais para conseguir espaço no Orçamento para futuras negociações salariais.

Com uma lista de 38 países pesquisados nas mãos, Lima aponta que o Brasil registrou o oitavo maior déficit do governo central em 2020, o que reforça, segundo ele, a necessidade do governo federal em conseguir conciliar a aprovação do auxílio emergencial com responsabilidade fiscal.

A Câmara deve iniciar hoje a votação da PEC Emergencial, que libera o pagamento do auxílio aos mais vulneráveis.

O ESTADO DE S. PAULO

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