Desistência de busca por emprego diferencia crise atual de anteriores

A pandemia de covid-19 contribuiu para o aumento das desigualdades no mercado de trabalho, principalmente entre os mais vulneráveis, de forma diferente do que foi visto em crises anteriores. Desta vez, o impacto da pandemia foi maior na chamada taxa de inatividade entre mulheres, negros e jovens do que na taxa de desemprego desse público se comparado com os anos de 2015 e 2016.

A taxa de inatividade agrega os brasileiros desempregados e que deixaram de procurar o posto de trabalho. Considerando os dias atuais, as medidas restritivas de isolamento social impostas pela crise sanitária fizeram com que uma parcela maior de jovens, mulheres e negros simplesmente desistiram de procurar emprego. O diagnóstico consta de análise sobre “Desigualdades no mercado de trabalho e pandemia da covid-19” feita pelos pesquisadores Joana Simões Costa, Ana Luiza Neves de Holanda Barbosa e Marcos Hecksher, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e antecipada ao Valor.

Pelas estimativas apresentadas no levantamento, a transição de pessoas ocupadas para inatividade entre o primeiro e segundo trimestre de 2020 aumentou no mercado de trabalho, especialmente entre mulheres, negros e jovens. Por outro lado, a transição da ocupação para o desemprego não apresentou mudança significativa. No período, a taxa de inatividade das mulheres passou de 7,60% do primeiro para o segundo trimestre de 2019 para 11,8% no mesmo período de 2020. Enquanto para os homens, saiu de 4,8% para 7,8%. Situação parecida é verificada nas estimativas que consideram raça e cor. No caso dos não brancos, a taxa de transição da ocupação para a inatividade passou de 7,10% do primeiro para o segundo trimestre de 2019 para 11,2% na mesma base de comparação e para os brancos subiu de 4,70% para 7,60% no mesmo período.

“A diferença da crise de 2020 em relação à crise anterior, ocorrida em 2015 e 2016, se caracteriza não apenas por sua magnitude, mas também pela intensa transição dos ocupados, não para o desemprego, e sim para a inatividade. Assim, apesar de ter sido observado um aumento da taxa de desemprego, é a queda expressiva na taxa de participação que mais se sobressai na pandemia da covid-19”, informa a análise do Ipea. Segundo o levantamento, entre o primeiro e segundo trimestres de 2020, a pandemia se refletiu em um intenso aumento nas chances de sair da condição de ocupado para inatividade e redução das chances de conseguir um emprego. “Foi uma crise marcada pela forte retração tanto da oferta quanto da demanda de trabalho. Tais movimentos levaram a taxa de ocupação a patamares sem precedentes no mercado de trabalho brasileiro”, destaca a análise.

Questionada sobre se o pagamento do auxílio emergencial pelo governo para minimizar os efeitos da crise entre os mais vulneráveis não seria uma justificativa para o aumento da taxa de inatividade, Joana negou essa possibilidade e disse que o benefício foi importante para que as pessoas pudessem ficar mais tempo em casa pois tinham a subsistência garantida pelo governo. A expectativa é que com a retomada da economia seja reduzida a taxa de inatividade, mas destacou a necessidade de adoção de medidas estruturais para diminuir as desigualdades. A pesquisadora afirmou que a inatividade teve alta significativa em 2020 porque o país foi atingido pela pandemia quando ainda se recuperava dos impactos da crise de 2015. “A taxa de desemprego não subiu tanto quanto subiu a de inatividade. As pessoas estão participando menos do mercado de trabalho. Elas não foram para situação de desemprego, mas direto para inatividade”, disse Joana.

VALOR ECONÔMICO

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