Copom mantém Selic em 2%, mas abandona compromisso de não subir juros

O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central manteve a taxa básica de juros em 2% ao ano nesta quarta-feira (20), mas decidiu abandonar o compromisso de não subir juros nas próximas reuniões, o chamado de “forward guidance”.

Isso significa que o Copom voltará a analisar o cenário econômico geral a cada reunião e poderá elevar a Selic, mas não especificou quando. No mercado, estima-se que os juros possam subir ainda no primeiro semestre e que terminem o ano pouco acima de 3%.

“Em vista das novas informações, o Copom avalia que essas condições [para a manutenção do ‘forward guidance’] deixaram de ser satisfeitas já que as expectativas de inflação, assim como as projeções de inflação de seu cenário básico, estão suficientemente próximas da meta de inflação para o horizonte relevante de política monetária”, diz o BC no comunicado da decisão.

“Como consequência, o ‘forward guidance’ deixa de existir e a condução da política monetária seguirá, doravante, a análise usual do balanço de riscos para a inflação prospectiva”, afirma o texto.

No cenário principal do BC, que considera estimativas de mercado para os juros, as projeções para a inflação são de 3,6% para 2021 e 3,4% para 2022. Os resultados estão próximos do centro das metas para esses dois anos (3,75% e 3,50%, respectivamente).

Na decisão desta quarta, a autoridade monetária reafirma que mesmo sem o instrumento, o BC poderá manter a Selic no patamar atual. “O Comitê reitera que o fim do forward guidance não implica mecanicamente uma elevação da taxa de juros pois a conjuntura econômica continua a prescrever, neste momento, estímulo extraordinariamente elevado frente às incertezas quanto à evolução da atividade”, diz o comunicado.

“As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se em níveis acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação.”

No comunicado, o comitê repetiu que a inflação permanece com fatos de risco em duas direções. A baixa atividade econômica pode puxá-la para baixo. Por outro lado, a piora nas contas públicas com o prolongamento das políticas fiscais de resposta à pandemia podem puxar os preços para cima. Para o BC, o risco fiscal elevado segue puxando para cima esse balanço de risco.

“O Comitê entende que essa decisão [de ainda não mexer nos juros] reflete seu cenário básico e um balanço de riscos de variância maior do que a usual para a inflação prospectiva e é compatível com a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante, que inclui o ano-calendário de 2021 e, principalmente, o de 2022”, diz o Copom.

O BC também afirma no comunicado da decisão que a inflação se prolongou além do esperado, mas reiterou que esse movimento é temporário e reflete a recente elevação no preço de commodities internacionais e seus reflexos sobre os preços de alimentos e combustíveis.

“Apesar da pressão inflacionária mais forte no curto prazo, o Comitê mantém o diagnóstico de que os choques atuais são temporários, ainda que tenham se revelado mais persistentes do que o esperado.”

Na última decisão de 2020, em dezembro, o Copom já tinha anunciado que retiraria em breve o compromisso de não subir juros.

Esse compromisso é um instrumento secundário de política monetária, chamado de “forward guidance”, ou prescrição futura. Nele, o BC garantia não subir juros a menos que as expectativas de inflação sejam elevadas acima da meta ou que o regime fiscal seja alterado.

Como o comitê avalia que a taxa Selic está próxima do seu limite mínimo, recorreram ao recurso para tentar diminuir a especulação em torno da taxa básica de juros futura e aumentar o estímulo à economia sem cortar ainda mais os juros.

Na ata da reunião anterior, o BC esclareceu que retirar o instrumento não significa uma alta automática nos juros. Ou seja, mesmo sem o “forward guidance”, o comitê pode decidir manter a taxa com base na análise da conjuntura.

A decisão veio em linha com as expectativas de mercado –todos os economistas consultados pela Bloomberg projetavam a manutenção da taxa.

Esta é a quarta reunião seguida em que não há alteração na Selic, após um longo ciclo de queda iniciado em julho de 2019.

Para o BC, o aumento do número de casos e o aparecimento de novas cepas do vírus, principalmente em economias desenvolvidas, poderá afetar a atividade.

A autoridade monetária, no entanto, demonstrou otimismo com as vacinas e novos programas de estímulos. “Novos estímulos fiscais em alguns países desenvolvidos, unidos à implementação dos programas de imunização contra a Covid-19, devem promover uma recuperação sólida da atividade no médio prazo”, avalia.

Para o comitê, a baixa atividade econômica favorece a manutenção dos juros em patamares baixos nos países desenvolvidos, favorecendo os emergentes.

“A presença de ociosidade, assim como a comunicação dos principais bancos centrais, sugere que os estímulos monetários terão longa duração, permitindo um ambiente favorável para economias emergentes.”

Em relação à atividade econômica brasileira, segundo o BC, indicadores referentes ao fim do ano passado têm surpreendido positivamente, mas não contemplam os possíveis efeitos do recente aumento no número de casos de Covid-19.

“Prospectivamente, a incerteza sobre o ritmo de crescimento da economia permanece acima da usual, sobretudo para o primeiro trimestre deste ano, concomitantemente ao esperado arrefecimento dos efeitos dos auxílios emergenciais”, analisa.

O BC reafirmou ainda que considera importante a continuação do processo de reformas econômicas, que estão em tramitação no Congresso.

O controle da inflação é a principal atribuição da autoridade monetária. Para isso, o BC define a meta da taxa básica de juros.

Quando a inflação está alta, o Copom sobe os juros com o objetivo de reduzir o estímulo na atividade econômica, o que diminui o consumo e equilibra os preços. Caso contrário, o BC pode reduzir juros para estimular a economia.

A inflação oficial, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), fechou 2020 em 4,52%, acima da meta definida pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), de 4%, mas dentro da tolerância de 1,5 ponto percentual para cima e para baixo.

Até setembro, as expectativas giravam em torno de 2%, com o efeito deflacionário (redução de preços) da crise e da queda na atividade econômica. As estimativas se elevaram com a alta nos preços de alimentos e combustíveis. Desde então, o BC afirma que o movimento é temporário.

Segundo o relatório Focus desta semana, no qual o BC divulga as projeções do mercado, os economistas subiram mais as expectativas de inflação para 2021, que ficaram em 3,43%. Há um mês, a estimativa era de 3,37%. A meta para o ano é de ​3,75%, com tolerância 1,5 ponto percentual.

Antes da pandemia, em fevereiro, a autoridade monetária havia indicado que a taxa ficaria em 4,25% ao ano nas reuniões seguintes, depois de cinco reduções seguidas. O BC retomou o ciclo de queda da Selic com a deterioração do cenário econômico. Até agosto, os juros caíram em todas as reuniões, mas o ciclo de queda foi interrompido em setembro.

O ESTADO DE S. PAULO

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