A possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir pela inconstitucionalidade do Decreto n.º 2.100-1996, editado para anular a ratificação da Convenção 158-1982 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), põe em estado de alerta os empresários brasileiros. Há justo receio de imobilização da mão de obra em período de instabilidade econômica e política. O número de empregados e o custo final da folha de pagamento devem ser flexíveis e adaptáveis, para prevenir atrasos de pagamentos e de encargos, que tornem as empresas inviáveis.
Julgo desnecessário entrar em detalhes. Registro, porém, que se a ratificação vier a ser confirmada pelo Supremo Tribubal Federal (STF), todo trabalhador demitido será titular do direito de submeter a rescisão contratual a julgamento da Justiça do Trabalho, com a pretensão de ser reintegrado.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1.625, ajuizada em 19/6/1997 e distribuída ao falecido ministro Maurício Corrêa, continua à espera de julgamento. Pedidos de vista regimental obstruíram-lhe a tramitação. Decorridos 25 anos, ainda aguarda a manifestação dos ministros Dias Toffolli (pediu vista regimental em 14/9/2016), do decano Marco Aurélio (prestes a se aposentar, em 12/7) e de Kassio Nunes Marques, o mais moderno.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê a dispensa do empregado por justa causa nas hipóteses do artigo 482. O prudente empregador evita, entretanto, imputar-lhe a prática de falta grave. Demite e paga a indenização prevista no artigo 10.º, I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e outras parcelas fixadas em lei, para evitar as incertezas da reclamação trabalhista.
O transplante da Convenção 158, aprovada em 2/6/1982, para a legislação trabalhista interna lhe acrescentará obscuro complicador. O artigo 4.º prescreve: “Não se dará término à relação de trabalho do empregado exceto se houver justificativa relacionada à capacidade ou conduta, ou fundada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço”. O artigo 7.º ordena: “Não se deverá considerar terminada a relação de emprego de um trabalhador por motivos relacionados a sua conduta ou rendimento antes que lhe seja oferecida a oportunidade de se defender das acusações contra ele formuladas, a menos que não se possa pedir razoavelmente ao empregador que lhe conceda essa possibilidade”. O artigo 8.1, por sua vez, determina: “O trabalhador que considerar injustificado o término da relação de trabalho terá o direito de recorrer a organismo neutro, como um tribunal, tribunal do trabalho, câmara arbitral ou árbitro” (tradução livre).
O convênio internacional, redigido com a falta de clareza e objetividade dos textos da OIT, procura desestimular, dificultar e, se possível, impedir a dissolução do vínculo empregatício. Provém da Recomendação 119, aprovada em 5/6/1963, quando se acreditava no contrato de trabalho indissolúvel e vitalício.
Garantir a longevidade do emprego sempre esteve entre os propósitos dos legisladores trabalhistas brasileiros. Vejam-se, nesse sentido, os artigos 492/500 da CLT, em desuso, que asseguram estabilidade ao empregado com mais de dez anos de serviço na mesma empresa. Essa fase, no Brasil, se encerrou com o advento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), aprovado pela Lei n.º 5.107-1966.
Dentre os 185 países integrantes da OIT, apenas 35 ratificaram o polêmico convênio. Aponto como exemplos Chipre, França, Austrália, Bósnia Herzegovina, Antígua e Barbuda. A maioria adotou posição cautelosa, pela impossibilidade de prever os resultados da incorporação do texto à legislação interna.
A economia brasileira é frágil. O artigo 443 da Consolidação dificulta a contratação por tempo determinado. Na maioria das vezes se admite empregado por prazo indeterminado. A experiência revela que a extinção da relação de emprego, por ou sem justa causa, é onerosa, arriscada e indesejável. As medidas legais de proteção não foram suficientes, entretanto, para evitar o desemprego, hoje calculado em cerca de 14,8 milhões, além de 6 milhões de desalentados.
A ratificação da Convenção 158 aprofundará o temor ao contrato formal. Antes de anotar a Carteira de Trabalho e Previdência Social o empregador sopesará os riscos e avaliará as dificuldades de eventual demissão. Na dúvida, não contratará. A urgente solução consiste na regulamentação do inciso I do artigo 7,º da Constituição federal, que assegura a proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa, “nos termos de legislação complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”. A correta regulamentação deverá considerar a realidade social, econômica, sindical e empresarial, na busca do ponto de equilíbrio. O receio de não poder dispensar deverá levar, cada vez mais, a investimentos destinados à redução da mão de obra.
Aviso aos incautos: até o momento a maioria do STF é pela inconstitucionalidade do decreto de denúncia.
ADVOGADO. FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO