Companhias testam novos métodos para avaliar funcionários; saiba quais são

Pesquisa mostra que maior parte dos profissionais considera os processos atuais injustos. Avaliar competências comportamentais é uma das apostas das empresas
Por Caroline Marino — De São Paulo

Não é de hoje que consultores de RH falam que os modelos de avaliação de desempenho precisam ser revistos. Com as mudanças sociais e a entrada das novas gerações no mercado de trabalho, o tema volta às discussões. Isso porque o processo tradicional não atende mais às necessidades atuais de competitividade para atração e retenção de talentos, além de agilidade na tomada de decisões.

Uma pesquisa feita pela consultoria WTW com 800 empresas no mundo, incluindo 95 no Brasil, que empregam 321 mil pessoas, e obtida com exclusividade pelo Valor, revela que apenas três em cada dez companhias brasileiras indicam que seus empregados sentem que seu desempenho é avaliado de forma justa. E, apesar de 91% das empresas identificarem a melhoria dos resultados do negócio como prioridade na gestão de performance, só 53% delas acreditam que isso está sendo alcançado.

Empresas começam a oferecer benefícios fora do escopo tradicional para atrair e reter talentos
Recrutamento interno ganha mais transparência nas empresas, diz pesquisa
Líderes brasileiros estão mais inseguros para conduzir e engajar equipes, entenda por que
Marcos Morales, diretor-executivo de trabalho e recompensas da WTW Brasil, explica que os processos que estabelecem metas e usam a chamada curva forçada, colocando os funcionários em categorias não olham para o que gera valor para a empresa e para os empregados. “Não é simplesmente checar se a pessoa atingiu as metas definidas em um ano, mas como essa performance se liga a uma visão mais ampla de carreira futura”, diz.

De acordo com ele, isso é ainda mais importante nos cargos operacionais. “Quando saímos das posições executivas, definir objetivos é como replicar a descrição de cargo. Não tem a ver com performance e, sim, com um processo burocrático”, afirma. Para ele, as empresas devem começar a avaliar competências comportamentais desde a base e pensar no que precisam no longo prazo para atingir os objetivos. “É uma construção de comportamentos que ajuda o profissional a crescer e dá insights de que tipo de movimentação na equipe deve acontecer e quem está preparado”.

Flavia Bizinella Nardon, da Gerdau, diz que a empresa passou a ter uma visão mais coletiva no processo de avaliação — Foto: Carol Carquejeiro/Valor
Flavia Bizinella Nardon, da Gerdau, diz que a empresa passou a ter uma visão mais coletiva no processo de avaliação — Foto: Carol Carquejeiro/Valor

Na visão de Luiz Barosa, sócio de consultoria em capital humano da Deloitte, o método tradicional não conversa com os modelos atuais trabalho. “Há uma incongruência: as companhias buscam colaboração e agilidade, mas ainda aplicam uma avaliação individualizada e que não foca no desenvolvimento”, afirma. De acordo com Barosa, é preciso sair do olhar de progressão de carreira e apostar no crescimento pessoal e profissional. E isso muda totalmente as avaliações. Na prática, segundo ele, as companhias devem avaliar continuamente as pessoas, mas olhar além do que foi entregue. É preciso entender como a atividade foi desempenhada levando em conta, além da percepção do líder, a opinião de pares e outras áreas. “As novas gerações, por exemplo, demandam por clareza no feedback, constância e oportunidade de desenvolvimento”.

“As empresas devem começar a avaliar competências comportamentais”, diz Morales, da WTW
Na Gerdau, empresa brasileira produtora de aço, a gestão de performance foi revista e, desde 2020, não existe mais a curva forçada, nem a “régua” de 1 a 5, em que somente são reconhecidos os que se destacam. Além disso, a companhia não analisa só as entregas numéricas, mas também o comportamento. “Não é só o que, mas como determinado projeto foi conduzido, se está dentro dos princípios da nossa cultura”, diz Flavia Bizinella Nardon, diretora global de pessoas e responsabilidade social da Gerdau.

Outra mudança é que a avaliação passou a ter uma visão coletiva. “Se apenas o gestor avalia, temos só um recorte da performance. Começamos a trazer opiniões de outros stakeholders”, diz Nardon. Para isso, foi implementada uma ferramenta de avaliação 360º. Nela, os funcionários podem pedir feedbacks para pares, subordinados ou áreas com as quais desenvolveram algum projeto, a qualquer momento. “Essas avaliações apoiam os gestores nas avaliações”, explica. Há algumas perguntas-chave que são respondidas como: “no projeto, o profissional teve comportamentos alinhados à cultura da empresa”, “fez entregas diferentes em determinado ciclo”, “vejo oportunidades de melhoria”.

Avaliar o comportamento é, inclusive, um dos principais pontos segundo Anderson Sant’Anna, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da FGV. Ele ressalta que as empresas buscam hoje pessoas com senso de dono, colaborativas e empáticas, mas ainda avaliam mais os resultados do que o processo. “Não adianta um gerente trazer resultados, mas a equipe adoecer”, afirma. Segundo ele, o trabalho mudou e as empresas estão usando as mesmas ferramentas da era industrial. “Avaliam o resultado final, como se estivessem em uma produção, porém, lidam hoje com inovação e criatividade”, afirma. Sant’Anna recomenda que as companhias invistam em mais treinamentos para os gestores. “Ele [líder] deve entender o que está por trás de uma meta batida, o que o funcionário aprendeu, o que faria diferente, e ajudá-lo a construir a carreira”.

Segundo a pesquisa da WTW, os líderes têm papel crítico na avaliação justa do desempenho, porém, menos de 40% dos entrevistados concordam que os gestores são eficazes nessa tarefa.

Quando questionados sobre as barreiras que os impedem de avaliar adequadamente o desempenho de seus subordinados, 72% afirmam desconforto em explicar a diferenciação, 59% preocupação em desmotivar os avaliados abaixo das expectativas, e 43% querem evitar lidar com empregados de baixo desempenho.

Com isso em mente, a Suzano, fabricante de papel e celulose, implementou no final de 2022 uma nova plataforma de avaliação de performance que continua analisando as entregas, mas de maneira colaborativa e dando mais peso ao comportamento. Para ter mais assertividade no processo, a companhia precisou capacitar a liderança. “Estamos numa jornada de cultura que fomenta duas frentes do líder que inspira e transforma: a simplificação e o desenvolvimento de times, pontos essenciais para a gestão da performance”, explica Beatriz Salvatori Olivares, diretora de gente e gestão da Suzano. Nesse sentido, o primeiro passo foi a implementação de ações internas de conscientização e esclarecimentos do novo método para toda a empresa, incluindo vídeos, workshops e materiais de apoio.

A segunda etapa é voltada a cursos para a liderança, feitos em parceria com consultorias especializadas. “Já abordamos como os gestores devem se preparar para dar feedbacks, qual o seu papel e, agora, vamos falar sobre segurança psicológica, como criar um ambiente de confiança, conexão e abertura para fazer a troca de maneira construtiva e sem viés”, conta.

A https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg também passou a ter um papel fundamental nas avaliações de desempenho, segundo Barosa, da Deloitte. “É a partir da coleta e análise de dados que a companhia consegue tomar decisões mais inteligentes, como ações de desenvolvimento, movimentações internas, reconhecimento e, até, desligamentos”, explica. O uso de ferramentas tecnológicas permite, ainda, que multinacionais contem com processos de avaliações unificados em todas as unidades, permitindo a movimentação de talentos.

“A https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg é base para todo o trabalho de gestão de pessoas, a melhor maneira de termos as informações rapidamente e, assim, tomar decisões”, diz Nelia Lapa, vice-presidente de recursos humanos da Hydro, multinacional da indústria do alumínio. A empresa, que possui 140 unidades pelo mundo, conta com um sistema integrado de RH com todas as funções da área. E, em 2020, a gestão de performance passou por uma reformulação.

A cultura da empresa, segundo Lapa é “data driven”, com processos organizacionais orientados por dados. A companhia usa um software de business intelligence que gera dashboards, painel visual que contém informações, métricas e indicadores da empresa, com acompanhamento das avaliações e análise individual de performance para decidir sobre promoções, sucessão, transferências e ações de desenvolvimento.

“Isso permite flexibilidade e os profissionais podem acompanhar seu desempenho, percebendo que as avaliações geram ações concretas. A vice-presidente de RH global, que fica em Oslo, na Noruega, consegue ver em tempo real os talentos de toda a empresa, o que aumenta a exposição global dos funcionários e facilita a mobilidade”, ressalta. De 2020 até agora, a Hydro realizou 3.185 promoções, e 4.600 movimentações de área, sendo 127 transferências para outro país.

https://valor.globo.com/carreira/noticia/2023/02/27/companhias-testam-novos-metodos-para-avaliar-o-funcionario.ghtml

Compartilhe