Um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontou que, proporcionalmente, o Brasil registrou no ano passado mais mortes por covid-19 do que 89,3% dos países do mundo. Segundo o estudo, o País também registrou a 11ª pior queda no índice de ocupação de pessoas em idade para trabalhar.
O comparativo sobre mortes considera as 179 nações com dados compilados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). E o dado sobre emprego leva em conta 64 países que têm estatísticas na Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A nota técnica “Mortalidade por covid-19 e queda do emprego no Brasil e no mundo” é assinada por Marcos Hecksher, assessor especializado da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Ipea. Ele ressalva no documento que comparações internacionais sempre precisam considerar uma série de fatores. Entre eles, está o fato de que o impacto da pandemia variou muito dentro de cada país. Mas, ainda assim, os números merecem ser comparados, diz.
“Entre 179 países com algum registro de morte por covid-19 em 2020 na compilação da OMS, o Brasil aparece com a 20.ª maior proporção de sua população vitimada. Dos demais 178 países com algum registro, 159 (ou 89,3%) tiveram menos mortes por 100 mil habitantes que o Brasil”, cita a nota técnica.
O texto acrescenta que países desenvolvidos que tiveram desempenho pior que o brasileiro – grupo que inclui Bélgica, Itália e Reino Unido, entre outros – têm uma proporção de idosos maior que a brasileira. E, como idosos eram mais vulneráveis aos efeitos da covid-19, foi preciso fazer um ajuste.
“Dentro do mesmo conjunto de 179 países em que o Brasil apresentou a 20.ª maior taxa bruta de mortalidade por 100 mil habitantes, o País passa a ter a 10.ª pior posição no ranking ajustado à composição demográfica (considerando a idade). Em 169 dos demais 178 países (94,9% do total), o total de mortes registradas por covid-19 foi menor do que se esperaria com o padrão de mortalidade brasileiro”, aponta o estudo. “Após o ajuste à distribuição populacional por faixa etária e sexo, sete dos nove países com indicador pior que o brasileiro passam a ser latino-americanos.”
Emprego recuou no País durante a pandemia
Segundo o levantamento, em 2019, antes da pandemia, o Brasil registrava o 25.º menor nível de ocupação entre 64 países com dados na OIT. À época, pouco mais da metade da população brasileira em idade para trabalhar (55,8%) estava ocupada. No ano passado, porém, esse índice caiu para 48,8%, a 16.ª menor taxa entre as nações do grupo.
A nota técnica ressalta ainda que o Brasil registrou em meio à pandemia a 11.ª pior queda entre os 64 países analisados. Em termos porcentuais, isso representa variação negativa pior que de 84,1% das nações analisadas.
Hecksher ressalva que o impacto no mercado de trabalho também não foi homogêneo. Para ele, é importante considerar aspectos como faixa etária e nível de escolaridade, por exemplo. Mas a nota aponta que os trabalhadores informais – grupo que responde pelas maiores proporções de trabalhadores nos países menos desenvolvidos – foram os mais afetados.
“Os indicadores analisados nesta nota apontam que os impactos conhecidos da pandemia de covid-19 em 2020 no Brasil foram fortes, não apenas em comparação às séries históricas do próprio País, mas também no contexto internacional. Nos períodos analisados, o Brasil e outros países latino-americanos estão entre os mais atingidos do mundo em perdas de vidas e de empregos. Países da Oceania, da Ásia e da Escandinávia figuram entre os menos atingidos nas duas dimensões em 2020”, diz trecho da nota técnica.
Covid fez crescer número de jovens ‘nem-nem’
Outro estudo publicado nos últimos dias, do economista Marcelo Neri, da FGV Social, mostra aumento da vulnerabilidade entre os mais jovens em meio à pandemia. Segundo o documento, ainda que de forma surpreendente, a evasão escolar tenha caído, chamou especial atenção a situação do grupo dos considerados “nem-nem”. Essa faixa é formada por aqueles que estão ao mesmo tempo fora do mercado de trabalho e de instituições de ensino.
“Com a chegada da pandemia depois do último trimestre de 2019, a taxa de jovens nem-nem, que se encontrava em 23,66% (da população brasileira), acelera, chegando ao recorde histórico de 29,33% no segundo trimestre do ano”, diz trecho do estudo “Juventudes, Educação e Trabalho: Impactos da Pandemia nos Nem-Nem”. O porcentual ficou em 25,52% no último trimestre de 2020.
Neri ressalta que, desde o fim de 2014, o Brasil já registrava piora em seus índices de desigualdade. Jovens entre 20 e 24 anos e adolescentes foram os mais prejudicados em termos de renda. A pandemia de covid-19 acentuou o problema.
O ESTADO DE S. PAULO