Se você pedir para os seus amigos mais próximos que eles descrevam você com alguns adjetivos, quais seriam? Se perguntasse também para seus colegas de trabalho, eles citariam as mesmas características? E se você perguntar para um cliente, para alguém que o segue nas redes sociais ou a um ex-chefe? Todo mundo responderia a mesma coisa?
Ainda que você tenha uma relação diferente com cada pessoa, todo mundo usa a sua imagem para definir e descrever quem você é. E não é diferente no mercado de trabalho. Assim como qualquer empresa, criar uma marca pessoal (ou personal branding, como é chamada no mundo corporativo) faz parte de criar uma estratégia de carreira.
“O branding pessoal está ligado a você identificar aquilo que o faz ser quem você é, a junção de características, talentos e habilidades associada ao seu repertório acadêmico, pessoal e profissional. Combinados, esses itens criam a sua identidade. A partir do momento em que você identifica a sua essência, você consegue trabalhar a sua individualidade no mercado”, explica a estrategista em gestão de imagem e carreira Patrícia Dalpra.
Segundo especialistas, chegar a essa identidade e a como ela vai se expressar no mercado de trabalho é, antes de tudo, uma atitude ativa: defini-la é função do próprio profissional. Na hora de criar a sua imagem pessoal, as dicas não têm hierarquia. Ter um branding pessoal bem definido e trabalhado nas redes sociais vale tanto para o CEO da empresa quanto para o estudante em seu primeiro estágio.
Para entender por onde começar a criar a sua marca pessoal, o Estadão conversou com três especialistas no assunto. Veja abaixo 5 passos para trabalhar sua imagem:
Quem é você e pelo que você é conhecido
O primeiro passo para definir a sua imagem pessoal é o autoconhecimento. Para além do sentido psicológico da questão, se conhecer é saber quais são seus talentos e habilidades, com um destaque especial para as habilidades comportamentais, as soft skills.
“Diferentemente do que a gente fazia há 10 anos, quando os aspectos relacionados à parte acadêmica eram o que nos diferenciava, hoje – embora eles ainda tenham força – é o seu repertório, a sua colcha de retalhos, tudo o que você construiu na sua jornada que tem peso muito importante para sua marca pessoal”, explica Patrícia.
Uma das formas de identificar as forças e talentos é escrevendo uma autobiografia curta, entre cinco e sete páginas, aconselha a especialista.
“Conte a sua história com os pontos mais importantes, não só com foco profissional. A partir dessa reflexão, você consegue fazer uma retrospectiva de todas as passagens da sua vida, identificar forças que você teve, dificuldades e como as superou. Consegue encontrar talentos que você ativou em determinado momento, refletir sobre como você conseguiu atingir um objetivo e traçar uma linha para identificar as suas forças e habilidades.”
No entanto, muitas vezes, é difícil que a pessoa perceba uma característica como um talento. Há coisas que são tão fáceis para ela executar que passa batido e deixa de ser visto como força para ser encarado como algo que todo mundo faz. Para isso, a especialista recomenda uma pesquisa de percepção de imagem.
Para saber quem você é:
Escreva uma autobiografia com as passagens importantes da sua vida, não só profissional; ao escrever, vai conseguir identificar suas forças, dificuldades que enfrentou e como as superou
Faça três listas sobre sua vida profissional, descrevendo a) aquilo no que é bom e entrega, b) aquilo que faz mais ou menos, e c) aquilo no que é ruim; o que acha que precisa desenvolver mais?
“Eu faço com quem se relaciona comigo de forma pessoal, familiar e profissional. É a forma como essas pessoas veem o profissional a partir das diversas personas que ele representa e vemos se a marca que estamos deixando está alinhada com o que queremos passar. Por mais que o branding pessoal esteja relacionado à nossa essência, é muito mais o que os outros veem de nós. A partir do momento que você entende qual é a sua marca, você vai induzir que a pessoa te veja como você é”, diz Patrícia.
Ao olhar para as habilidades e talentos, é preciso também identificar os pontos de melhoria que podem fazer falta para o seu desenvolvimento profissional.
“Faça três listas: uma com o que você é bom, aquilo que só você entrega, outra com o que você faz mais ou menos e a terceira com o que você é ruim. Isso é importante para você entender as suas potencialidades, o que você pode entregar para o mercado. É uma foto para avaliar se faz sentido. Por exemplo, às vezes, você não é tão bom em inglês, mas será que você precisa investir nisso? Muitas vezes, a gente investe tempo no que não somos bons sem precisar”, destaca a consultora de carreira Ana Minuto.
Qual é a sua imagem nas redes sociais
Com a variedade de redes sociais, uma das formas mais práticas de começar a trabalhar a imagem pessoal é pela presença digital, que precisa estar alinhada com os pontos que você traçou na parte de autoconhecimento.
“Antes, o primeiro contato entre empresa e empregador era na entrevista. Hoje, o primeiro contato é jogar o nome do candidato no Google e a presença digital dele vai impactar na minha decisão de seguir ou não com aquela pessoa. Quem não tem força digital acaba não tendo o valor da marca e a competência técnica percebidas”, explica Patrícia.
Para isso, o primeiro passo é identificar quem é o seu público e em quais redes sociais ele está. Esse estudo prévio ajuda a não perder tempo gerando conteúdo para as redes que possam não ter muita serventia para o seu propósito de carreira.
“O tom de se comunicar com o público vai ser o que mais te representa. Não adianta só querer transmitir uma ideia e não saber como. Depois de pensar em tudo o que você é e no que você quer, você precisa pensar em como apresentar esse conteúdo. Enxergar a melhor forma que o público vai entender a sua forma de pensar e manter um contato presente com eles”, explica o especialista em comunicação e imagem Thiago Silva.
O conteúdo tem que ser só sobre mim?
Na hora de escolher o que vai para as redes, os especialistas aconselham relacionar os conteúdos com os seus objetivos profissionais e com o que você definiu na fase do autoconhecimento.
“Precisa existir uma coerência em todos os meios em que eu estou inserido, no online e no offline. Eu não posso ser uma coisa no privado e outra no público. As empresas de recrutamento já fizeram toda a pesquisa nas redes sociais. A partir do momento em que você se expõe, por mais que seja algo pessoal, ele não é pessoal o suficiente para não impactar na sua vida profissional”, explica Patrícia.
A especialista Ana Minuto recomenda ir além dos temas diretamente relacionados com o trabalho exercido e abordar também assuntos que impactam direta ou indiretamente na carreira e na vida.
“No meu LinkedIn, por exemplo, eu passo três dias falando sobre carreira e dois dias falando sobre mim. Eu era do carnaval, então hoje eu falo o que isso me trouxe de aprendizado para a profissão. Nós somos a mesma pessoa e podemos usar as nossas soft skills e hard skills a favor de quem nós somos.”
A marca pessoal tem a ver com aparência física?
De acordo com os especialistas consultados, um item muito importante do branding pessoal é a imagem, que precisa ter coerência e consistência com as definições de marca pessoal descobertas lá na fase do autoconhecimento. Com cada vez mais telas e menos contato físico, o jeito de pensar na aparência mudou também.
“Um desafio que a gente está enfrentando é que antes íamos para o trabalho e usávamos maquiagem e pensávamos em uma roupa para sair. Eu não tinha que pensar em um ambiente iluminado, numa parede que não tem ninguém passando, no barulho da casa. Mas a imagem funciona em qualquer lugar e essas preocupações vão de acordo com a imagem que eu quero passar para as outras pessoas”, explica Ana Minuto.
“Quando a gente olha para a imagem não é sobre mim, é sobre nós. Eu estar minimamente organizada para te receber é um sinal de que me dediquei, uma contrapartida ao tempo que você está me dedicando”, continua.
Branding pessoal e networking
O networking, ou seja, a sua rede de contatos, é uma parte importante da construção da sua marca pessoal. Faz parte da estratégia de branding entender como gerenciar essa rede de relacionamentos e, principalmente, como ativá-la.
“Tem o newtorking direto, como conhecer o diretor de tal empresa e saber no que ele pode te ajudar, e tem a rede indireta, como conhecer alguém que conhece outro alguém. É preciso estar conectado para entender com quem você se relaciona, o que pode extrair de cada pessoa e como ativar cada um desses contatos, porque, para cada um deles, é necessário uma abordagem e um objetivo”, aconselha Patrícia.
Expandindo o networking
Perfil: preencha todas as informações do perfil do LinkedIn sobre quem você é suas áreas de afinidade, assim como talentos identificados
Mapa: mapeie profissionais de áreas ou empresas do seu interesse, peça para segui-los, entenda o que são e o que fazem
Conversas: faça contato e interaja em postagens dos profissionais que admira e que podem te ajudar com vaga ou com novos contatos.
A especialista Ana Minuto destaca que criar essa rede de relacionamentos é um dos grandes desafios dos profissionais que pertencem a algum grupo minorizado, como negros, LGBTQIA+, indígenas, pessoas com deficiência, entre outros. “O networking é um dos motivos que faz com que as minorias não consigam estar em alguns lugares”, diz.
O primeiro passo para começar a construir a sua rede de relacionamentos digitalmente pode ser pelo LinkedIn. Ana aconselha que, para fazer boas conexões, é preciso, ainda que minimamente, preencher todos os campos do perfil com informações sobre quem é você (não se esqueça dos objetivos e talentos descobertos na parte do autoconhecimento), as suas áreas de afinidade e começar a acessar pessoas.
“Dentro das pessoas com quem você se conectar, com o tempo você vai perceber quem pode ser o meu mentor, por exemplo. Não precisa necessariamente ter uma relação diária, mas pode ser uma pessoa para quem você vai olhar e acompanhar o que ela está fazendo. Precisa ter a famosa cara de pau. Por exemplo, se você quer o trabalho X na empresa Y, você vai seguir pessoas que trabalham naquela empresa e entrar em contato. Alguém vai te responder.”
Com esses passos em mente, fica mais fácil começar a trabalhar a marca pessoal tanto no mundo online quanto no offline. Mas os especialistas alertam que o processo de criação de um branding pessoal é contínuo e requer atualização.
“É preciso ter ciência que nada é para sempre. Branding e carreira não são estáticos. É preciso, a todo momento, conhecer o seu público, saber com quem você está falando, entregar para as pessoas o que elas precisam e não o que você quer. Uma forma de fazer isso de maneira constante é por enquetes do Instagram, por exemplo”, explica Ana Minuto.
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