O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), reforçou ontem que a prioridade neste momento deve ser evitar o aumento do número de mortes por covd-19 e descartou que as atenções da cúpula do Parlamento estejam voltadas ao avanço de um dos pedidos de impeachment que tramitam na Casa contra o presidente Jair Bolsonaro. No entanto, ele repetiu que o impeachment pode entrar no pauta “em algum momento no futuro”. Maia também deixou no radar a possibilidade de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) ser criada para “investigar tudo que aconteceu na área de saúde durante a pandemia”.
“Neste momento, acho que com tantas vidas perdidas pelo Brasil e com o caso dramático de Manaus esse tem que ser o nosso foco”, disse Maia a jornalistas. Para o presidente da Câmara, porém, esta não é a hora adequada para tratar desses assuntos. “Acho que, neste momento, se a gente tira o foco do enfrentamento ao coronavírus, a gente transfere para o Parlamento uma crise política e deixa de focar no principal neste momento, que é tentar salvar vidas”, pontuou.
As declarações ocorrem em meio ao aumento da pressão nas redes sociais para que Maia aceite um pedido de afastamento contra Bolsonaro, devido ao agravamento da pandemia. A falta de oxigênio em Manaus, por exemplo, colocou em xeque a capacidade logística do governo em lidar com a crise. Além disso, declarações de Bolsonaro geraram críticas da oposição, que apresentou um novo pedido de impeachment.
A indignação aumentou ainda mais depois que foi revelado que o Ministério da Saúde recebeu avisos do governo do Amazonas sofre a falta de oxigênio dias antes do agravamento da situação no Estado, mas não teria adotado as medidas para evitar o colapso do sistema de saúde local.
Reservadamente, aliados de Maia afirmam que os recentes desabafos do presidente da Câmara contra o chefe do Poder Executivo foram motivados por um “possível cansaço” em relação aos ataques sofridos pelos bolsonaristas e pelo próprio presidente da República nas redes sociais. Os movimentos recentes de Maia também são interpretados como um aceno à oposição em meio à disputa pelo comando da Casa. Como alguns integrantes de partidos de esquerda vêm flertando com Arthur Lira (PP-AL), candidato apoiado por Bolsonaro, o parlamentar do DEM passou a mencionar a possibilidade de um impeachment no futuro.
A ideia seria passar aos parlamentares a percepção de que um processo de afastamento tem mais chances de avançar, se a Câmara for comandada por um aliado dele do que por um deputado alinhado ao Palácio do Planalto. Apesar do aceno aos processos que estão à Mesa, a lembrança de que o “timing” pode não ser o adequado também está relacionado ao fato de que Maia não poderia acatar um dos pedidos de impeachment durante o recesso parlamentar. Desde o ano passado, ele pediu em mais de uma oportunidade que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEMAP), se juntasse a ele na autoconvocação dos trabalhos do Congresso em janeiro, para que se pudesse analisar medidas relacionadas ao combate ao coronavírus, aos efeitos da crise e ao plano nacional de vacinação. O presidente da Câmara precisaria também contar com apoio majoritário da Casa.
Além do impasse técnico, a abertura de um dos processos de impeachment ainda esbarra na avaliação de Maia de que ainda não há o clamor popular necessário para levar atuais aliados do Planalto a votarem pelo afastamento de Bolsonaro. Integrantes do grupo político de Maia avaliam que Alcolumbre não cederá à pressão do correligionário. De olho em um cargo na Esplanada dos Ministérios após deixar o comando do Senado, o amapaense está disposto a segurar o recesso e, assim, evitar que presidente da Câmara articule a favor de Baleia ou acolha um dos pedidos de impeachment.
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