O presidente do Banco do Brasil, André Brandão, está garantido no posto, mas o pacote bilionário de redução de custos, anunciado na semana passada como uma das primeiras grandes ações de sua gestão, pode sofrer ajustes, apurou o Estadão/Broadcast. Eventuais mudanças estão sendo discutidas internamente, disseram três fontes, na condição de anonimato, e que descartam a reversão das medidas. O risco de revisão é monitorado com atenção pelo mercado, que vê em qualquer movimento nesta direção como uma nítida interferência política do governo Bolsonaro no banco, com ações listadas em Bolsa.
Internamente, executivos do BB estão em compasso de espera por eventuais ajustes. A orientação geral passada, contudo, é de que seja olhada a foto ampliada e que, na prática, “nada muda”. Dentre as possíveis mudanças, por exemplo, estaria a revisão da lista – já definida – de agências bancárias, que deve ser impactada pelo pacote. São 112 no total. Esse tipo de movimento, vale destacar, já estaria no radar – antes mesmo da repercussão do anúncio do pacote – e é visto como algo natural. Geralmente, revisões na rede de atendimento de bancos públicos podem desagradar prefeitos, com folhas de pagamentos nessas instituições e, portanto, negociações ocorrem a reboque.
Por ora, as medidas anunciadas pelo Banco do Brasil seguem o curso normal, dizem duas fontes. Hoje, por exemplo, o banco divulgou vagas para movimentação interna no âmbito da reorganização de sua rede de atendimento. A ideia da atual gestão do BB é recolocar parte do back-office, funcionários que atuam nos bastidores, para a linha de negócios da instituição.
O plano de reestruturação do banco prevê, por enquanto, o fechamento de 112 agências, sete escritórios e 242 postos de atendimento. Além disso, 243 agências seriam convertidas em postos de atendimento, 143 unidades de negócios seriam transformadas em Lojas BB (sem guichês de caixa) e ainda haveria relocalização compartilhada de 85 unidades de negócios e criação de 28 unidades de negócios.
Todo o programa, com previsão de ser completamente implementado no primeiro semestre, deve resultar em uma economia anual líquida de R$ 353 milhões só em 2021 e R$ 2,7 bilhões até 2025, sem considerar os planos de desligamentos voluntários, que, na estimativa do BB, devem gerar o corte de 5 mil pessoas. Com as medidas, o banco pretende ter uma atuação mais focada no público digitalizado e espera atrair de 5,5 milhões de novos clientes digitais em 2021, repetindo o mesmo feito do ano passado. Hoje, são 22 milhões.
Quem não gostou nada do plano foi o presidente Jair Bolsonaro, que alegou não ter sido avisado sobre as medidas e teve de dar explicações a parlamentares que o procuraram para reclamar do fechamento de agências em pequenos municípios. A lista de cidades que terão agências fechadas, contudo, ainda não foi revelada. Essa é exatamente uma das medidas que pode ser ajustada.
Sob a justificativa de que não havia sido informado do plano de eficiência do BB, Bolsonaro pediu a cabeça de Brandão, no comando do banco público desde setembro último. Vindo do HSBC, o executivo foi trazido à instituição justamente para reforçar a bandeira de um perfil de mercado e blindagem das empresas estatais no atual governo – o que, novamente, caiu por terra com o imbróglio. Fontes garantem que tanto o Ministério da Economia quanto o Planalto haviam sido informados do pacote – e do risco de imagem atrelado.
Eficiência
As medidas anunciadas pelo BB estão em estudo desde o fim do ano passado e geraram boatos de um novo programa de demissão voluntária, na época, confirmados posteriormente. Na primeira reunião anual com investidores e analistas, no fim de 2020, o próprio Brandão já havia sinalizado que eficiência era um dos pontos fortes da sua gestão. “Estamos na construção de uma agenda de eficiência”, disse, sem dar detalhes.
Após os panos quentes colocados pelo Ministério da Economia junto ao Planalto, Brandão aceitou permanecer no banco, mas, conforme pessoas próximas a ele, disse que não abriria mão do plano já desenhado. Entretanto, teria concordado em submeter à autorização prévia do Planalto ações no BB com impacto político. Essa seria, dizem fontes, a fatura que teria restado a Brandão pagar fora do banco.
Apesar da repercussão negativa do pacote, não será a primeira vez que o banco fechará agências sob a gestão Bolsonaro. Desde que o presidente assumiu, no início de 2019, o BB fechou as portas de mais de 400 agências, mais que o triplo das 112 programadas para o primeiro semestre de 2021. Em 2018, último ano do governo Michel Temer, também houve enxugamento da rede, com 127 unidades a menos. O movimento segue alinhado ao capitaneado pelos bancos privados, que têm diminuído a rede física com a maior digitalização dos clientes e a pressão da concorrência do lado das margens financeiras e rentabilidade.
A diferença entre a redução feita ao longo de 2018 e 2019 e o plano anunciado para 2021 está na velocidade e no objetivo. Lá atrás, as agências foram sendo fechadas aos poucos, uma de cada vez, para fazer ajustes na rede, sem alarde. Agora, quando a intenção é diminuir a rede como uma parte de um plano de reestruturação que envolve enxugar o quadro de funcionários via programas de desligamento voluntário, os encerramentos terão de ser feitos de maneira simultânea – o que gera um barulho maior e mais desgaste político.
No mercado financeiro, o anúncio foi recebido de forma positiva, com analistas que acompanham o BB elogiando o esforço do banco para se tornar operacionalmente mais eficiente e se alinhar às tendências de digitalização dos serviços financeiros. Eventuais mudanças no pacote, porém, preocupam.
Para o diretor de renda variável da Eleven Financial, Carlos Daltozo, qualquer revisão das medidas confirma ingerência política no BB, um problema que assombra o banco e que cobra seu preço com um desconto histórico em suas ações frente aos rivais privados. “O presidente Bolsonaro deveria se preocupar com a vacina. Uma mudança no pacote já é sinal claro de interferência política. Acho bem ruim”, afirma o analista de um banco estrangeiro, na condição de anonimato.
Procurado, o Banco do Brasil não comentou.
O ESTADO DE S. PAULO