Desde o início da pandemia, o presidente Jair Bolsonaro e apoiadores, sempre quando confrontados sobre a negação da realidade da covid-19, saem com o discurso de que “economia é vida” e que o Brasil precisa voltar à normalidade mesmo diante de um cenário de contaminação e mortes.
Em maio, no pico inicial da doença, Bolsonaro atravessou a Praça dos Três Poderes na direção do Supremo Tribunal Federal acompanhado de um grupo de empresários para fazer pressão para que as medidas restritivas nos Estados fossem amenizadas.
Os empresários que estavam junto com o presidente naquele dia pregavam a volta dos negócios o mais rápido possível e a flexibilização do lockdown nas cidades porque, na visão deles, comprometia a recuperação econômica. A pandemia continuou e estímulos bilionários do governo federal garantiram os negócios (não houve, porém, a contrapartida de um planejamento sério para a boa prática de distanciamento social). A atividade econômica começou a se recuperar.
Sem um planejamento nacional para a segunda onda e a vacinação em massa, o Brasil jogou todo o esforço no lixo no “curto-prazismo”. Os brasileiros assistem assombrados o colapso do sistema de saúde de Manaus e o risco de uma crise nacional de falta de oxigênio.
Assim como a saúde está colapsando, será muito difícil a economia não escapar desse mesmo destino. O País não pode seguir também o negacionismo econômico. Muito tempo foi perdido esperando as eleições municipais.
Já sabemos que os políticos querem esperar as eleições da Câmara e Senado e só pensam em emendas, cargos… O que farão para impedir que o colapso do Amazonas chegue às cidades dos seus Estados, enquanto negociam votos na eleição do Congresso?
Sabemos também que o governo federal quer esperar a vitória dos seus dois candidatos (deputado Arthur Lira e senador Rodrigo Pacheco) para agir com as medidas econômicas.
Desde o dia de 15 de dezembro, quando o Estadão manchetou que a equipe econômica estudava a antecipação do 13.º para aposentados e pensionistas do INSS e do pagamento do abono salarial (uma espécie de 14.º salário a trabalhadores que ganham até dois mínimos), assistimos variações sobre os mesmos temas, além de liberação de FGTS e suspensão de impostos. Nada de concreto.
Já as grandes lideranças empresariais, os representantes das grandes confederações, CEOs de grandes conglomerados, banqueiros se encolheram. Não há nenhuma mobilização empresarial para evitar o pior. No máximo, doações que servem para aparecer bem na fita, de preferência no Jornal Nacional.
Acham mesmo que tem como dar certo para a economia continuar aguardando para ver no que dá sem uma ação rápida. A retomada não vai continuar do mesmo jeito. Depois, sem dúvida alguma, serão pródigos em bater na porta do governo para pedir subsídios, redução de impostos, Refis generosos e socorro financeiro da viúva.
Nos mais de 20 anos de cobertura econômica em Brasília, esta colunista já viu de tudo em matéria de pressão empresarial. Na última semana, a mais sofrida da pandemia até aqui, na agenda oficial do ministro Paulo Guedes não houve sequer uma reunião com empresários.
O que teve mesmo foi um encontro virtual realizado do outro lado da Esplanada, no Ministério da Saúde, com 28 empresários ligados à Fiesp sobre a campanha nacional de vacinação contra a covid-19. O Ministério da Economia não estava lá. Foram falar da importância da vacina para a retomada, mas não se viu nenhuma declaração contundente depois do encontro.
Reportagem do Estadão mostrou que os Ministérios da Saúde, Comunicações e Casa Civil foram taxativos: a vacinação ficará a cargo do governo, que garantiu ter imunizantes para toda a população. Ouviram, segundo relatos, que o governo já tem cerca de 500 milhões de doses contratadas. Como acreditar se nem dois milhões de vacinas da Índia estão garantidos? As poucas falas empresariais sobre o encontro foram todas de bastidores.
Por que se calam aqueles que costumam ser tão barulhentos? Na elite do nosso empresariado, não tem dia D nem hora H. É S, de silêncio.
O ESTADO DE S. PAULO