Após dois trimestres de queda, o crescimento de 7,7% no Produto Interno Bruto (PIB, soma de todo o valor gerado na economia num período) do terceiro trimestre foi recorde na série histórica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), iniciada em 1996. Com tamanha alta, a recessão iniciada no primeiro trimestre, por causa da pandemia de covid-19, ficou para trás? A resposta não é simples e pode ficar mesmo para 2021.
Quando o IBGE informou que o PIB do segundo trimestre despencou 9,7% sobre os três primeiros meses do ano, também uma queda recorde, a economia brasileira entrou em “recessão técnica”, confirmando o ciclo recessivo. Antes mesmo de sabermos que o PIB teve dois trimestres seguidos de queda – o que basta para caracterizar a “recessão técnica” -, o Codace, comitê independente da Fundação Getulio Vargas (FGV) que se dedica a marcar os ciclos da economia, já havia registrado o início de uma recessão no primeiro trimestre.
Tradicionalmente, economistas dedicados a estudar os ciclos econômicos levam mais tempo para registrar o início das recessões. Outros dados da atividade econômica, como aqueles do mercado de trabalho, são levados em conta, para além da simples variação do PIB. O registro do Codace/FGV foi atípico. Os impactos da pandemia de covid-19 foram tão fortes e evidentes que deixaram logo claro que a economia entrou em recessão – nos Estados Unidos, o comitê análogo do NBER, um dos mais antigos e tradicionais institutos de pesquisa econômica independente, também foi mais rápido do que o usual para registrar o início da recessão por lá.
Por outro lado, se foi fácil apontar quando a recessão da covid-19 começou, não basta que a economia volte a crescer para que um País saia do ciclo recessivo, explicou Paulo Picchetti, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV e um dos membros do Codace. É preciso verificar a magnitude da recuperação em relação à queda iniciada no atual ciclo recessivo e outros indicadores econômicos. Embora tenha sido recorde, o crescimento do PIB no terceiro trimestre foi insuficiente para apagar a queda do primeiro e do segundo trimestres.
Além disso, lembrou Pichetti, há incertezas em relação ao ritmo do crescimento econômico neste quarto trimestre e nos três primeiros meses de 2021. Os efeitos da “segunda onda” da pandemia, ou pelo menos da volta do crescimento de casos de covid-19, sobre a economia ainda não estão claros. Ao mesmo tempo, a redução do auxílio emergencial para trabalhadores informais – que passou de R$ 600 ao mês para R$ 300 ao mês desde setembro – e sua retirada a partir de janeiro de 2021 sugerem arrefecimento do consumo. O ano que vem poderá começar com uma retração do PIB, como já estimam alguns economistas.
Uma nova retração da economia no primeiro trimestre de 2021, após dois trimestres de avanço no segundo semestre deste ano, poderá ser classificada tanto como uma nova recessão quanto como uma continuidade da atual, disse Pichetti. O tamanho da recuperação neste segundo semestre e o espalhamento da retomada por todos os setores deverá ser levada em conta.
“Não sabemos se a recuperação do terceiro e do quarto trimestres leva pelo menos ao patamar do fim de 2019 nem qual será o recuo eventual no primeiro trimestre”, afirmou Pichetti, completando que não é fácil fazer qualquer afirmação sobre o fim da atual recessão sem saber qual será o desempenho da economia no primeiro trimestre de 2021. Esses dados deverão ser divulgados pelo IBGE no fim de abril ou início de maio.
O ESTADO DE S. PAULO