Com o fim das eleições municipais, governo e Congresso entraram na reta final do calendário legislativo dando prioridade nas discussões a propostas originadas fora do Ministério da Economia. Enquanto isso, as reformas gestadas pela pasta continuam sem data para deliberação.
O movimento mostra como a agenda do ministro Paulo Guedes (Economia) segue em compasso de espera mesmo após o término dos pleitos regionais, mencionados como um dos principais entraves para se debater a pauta econômica nos últimos meses.
Duas propostas do Executivo têm previsão de votação nesta semana na Câmara.
Uma delas é a proposta da Casa Verde e Amarela, programa habitacional lançado em agosto pelo ministro Rogério Marinho, do Desenvolvimento Regional. O texto tramita no Congresso por meio de medida provisória (MP), e tem aproximadamente um mês pela frente para ser aprovada e não perder a validade.
O outro texto com votação prevista para esta semana é o da BR do Mar, que muda regras para navegação no país. Apesar de levar a assinatura de Guedes (que também o defende), o texto foi criado originalmente pelo Ministério da Infraestrutura, de Tarcísio de Freitas (sendo depois discutido com outras pastas).
O projeto da BR do Mar foi alvo de pedido de urgência pelo governo. A medida tranca outros projetos caso não seja deliberado em 45 dias após a requisição. Mesmo alvo de controvérsias, o Executivo decidiu manter o regime.
Propostas mais amplas e vistas como prioritárias pela equipe econômica não têm previsão para votação.
O secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, citou nos últimos dias uma série de projetos considerados imprescindíveis para a situação do país.
“A solução é reforma estrutural, para cuidarmos estruturalmente da economia”, afirmou.
A lista apresentada inclui as privatizações, a proposta do Pacto Federativo, a reforma administrativa, a reforma tributária, medidas de liberação comercial, redução de subsídios, a autonomia do Banco Central e mudanças em marcos legais setoriais (como ferrovia, óleo e gás e a própria cabotagem).
O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), afirma que o governo ainda busca a aprovação de temas da agenda econômica na Câmara, como a autonomia do BC e a reforma tributária. “Continuamos tentando”, disse à Folha.
A proposta da Lei de Falências foi aprovada nos últimos dias, antes do segundo turno das eleições municipais. A equipe econômica já dá sinais de que parte relevante das propostas não deve avançar em 2020.
O secretário do Tesouro, Bruno Funchal, disse na semana passada que não seria “o fim do mundo” não aprovar neste ano as propostas que limitam gastos.
“Se for aprovada, é uma sinalização excelente porque você já reduz a incerteza em relação à trajetória da despesa para além de 2022. […] Mas a não aprovação para já não é o fim do mundo, porque o teto será cumprido até 2022 e 2023”, afirmou Funchal.
Antes defendida como uma prioridade, a PEC Emergencial foi elaborada com objetivo de diminuir despesas e tramita há mais de um ano no Senado.
Dependendo de sua extensão, o texto poderia abrir espaço no Orçamento para um programa social mais robusto que o atual Bolsa Família. Mas o relatório, discutido há meses pelo governo e pelo senador Márcio Bittar (MDB-AC), ainda não foi apresentado.
Segundo membros do Ministério da Economia, ao menos oito versões da PEC Emergencial foram elaboradas pelos técnicos da pasta, com diferentes graduações nas medidas de ajuste fiscal. No entanto, ainda não houve acordo entre os congressistas.
Em reuniões de governo, Guedes segue defendendo que a proposta preveja o mecanismo da desindexação. A medida, que poderia congelar aposentadorias, já foi rejeitada por Bolsonaro e enfrenta resistência no Congresso.
Também continuam indefinidos textos básicos para o funcionamento da máquina pública a partir do ano que vem, como o PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) e o PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual).
A indefinição do governo foi criticada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para quem o governo deveria ter começado o dia seguinte ao das eleições municipais com uma coletiva para falar qual é a pauta em que se tem interesse para os próximos dois meses.
Em entrevista ao portal UOL, Maia cobrou do governo federal uma posição mais clara sobre as pautas econômicas a serem discutidas até o fim do ano. Ele enfatizou a urgência da reforma tributária.
Maia ainda amenizou incertezas de investidores sobre o cenário fiscal após ter reafirmado que a proposta do Orçamento de guerra (que suspendeu regras orçamentárias em 2020) não vai ser prorrogada.
Além das indefinições trazidas pelo período eleitoral, auxiliares de Guedes atribuem dificuldades na pauta à eleição da Mesa Diretora da Câmara.
A avaliação é que parte da pauta do Ministério da Economia tem avançado no Senado, mas trava quando chega à Casa vizinha.
Nos últimos dias, Guedes afirmou a interlocutores que a disputa entre o atual presidente da Câmara e o deputado Arthur Lira (PP-AL) está inviabilizando a agenda econômica, que pode ser destravada apenas em fevereiro, após a escolha do comando da Casa.
Para o ministro, Maia quer avançar com a tramitação da reforma tributária, o que não é aceito por Lira. Ao mesmo tempo, Lira teria interesse em tocar as pautas prioritárias do governo para mostrar capacidade política de comandar a Câmara, mas Maia estaria segurando a pauta.
Diante das dificuldades, auxiliares de Guedes avaliam que a conta pela paralisia nas votações acaba caindo sobre as costas do ministro, que é o autor das medidas, sem desgaste para o Congresso ou para a ala de articulação do Palácio do Planalto.
O ESTADO DE S. PAULO