A Justiça do Trabalho do Distrito Federal negou pedido do Ministério Público do Trabalho (MPT) para condenar a rede de churrascarias Fogo de Chão a pagar indenização por danos morais coletivos e reintegrar funcionários demitidos durante a pandemia. Em maio, o restaurante dispensou cerca de 400 funcionários em decorrência de queda de faturamento gerada pela crise. Essa é a primeira sentença nas três ações civis públicas movidas pelo MPT contra a Fogo de Chão em Brasília, São Paulo e no Rio de Janeiro. Todos os pedidos de liminar feitos para reintegração dos funcionários estão suspensos.
Em sua defesa, a rede diz que não teve alternativa senão demitir. Alega que oferece refeições por meio da modalidade rodízio, com atendimento presencial, e foi obrigada a suspender o funcionamento de todas as unidades, em razão da crise sanitária. Na época das demissões, a Fogo de Chão chegou a afirmar que pagaria cerca de 80% dos direitos trabalhistas. Os outros 20% ficariam por conta dos governadores estaduais, com base no artigo 486 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). De acordo com o dispositivo, caso ocorra a paralisação das atividades de uma empresa motivado por ato da autoridade municipal, estadual ou federal, a indenização pela demissão “ficará a cargo do governo responsável”.
O Ministério Público do Trabalho (MPT), contudo, resolveu questionar as demissões. Alega nas ações que as dispensas não poderiam ser realizadas sem prévia negociação coletiva com os sindicatos que representam os trabalhadores e sem a adoção de medidas alternativas prévias à dispensa. O órgão ainda afirma nos processos que se trata de uma grande empresa internacional que comercializa ações na Bolsa de Nova Iorque e foi vendida em 2018 à Rhone Capital por US$ 560 milhões (cerca de R$ 3 bilhões), cuja sociedade empresária possui condições de solver eventuais débitos de natureza trabalhista.
Para o MPT, a conduta da Fogo de Chão “ é ilícita e desproporcional, pois ultrapassa o poder diretivo do empregador”. Nos processos, pede indenização por danos morais coletivos e a reintegração dos funcionários. Ao analisar o caso, a juíza do trabalho substituta Elysangela de Souza Castro Dickel, da 5ª Vara do Trabalho de Brasília, considerou legal as demissões. Entendeu que ficou clara a necessidade de dispensa coletiva de empregados pela Fogo de Chão “em decorrência da restrição ao exercício de suas atividades por causa da pandemia de covid-19, que assolou não só o país, mas o planeta como um todo durante boa parte deste ano, a qual ainda persiste”.
De acordo com a decisão (ação civil pública nº 0000522-13.2020.5.10.0005), diante da drástica redução de seu faturamento, presume-se não ter restado outra alternativa à Fogo de Chão, “para evitar sua recuperação judicial ou falência”. A juíza acrescenta que não há base legal para lastrear o pedido do MPT, uma vez que o artigo 477-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), introduzido pela lei da reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017), afirma que as dispensas individuais ou coletivas equiparam-se para todos os fins e não tem necessidade de autorização prévia de entidade sindical para sua efetivação.
A magistrada também afirma na sentença que o empregador pode dispensar seus empregados, ressalvadas as hipóteses de estabilidade, de acordo com seu poder diretivo. Para ela, não houve vulneração à dignidade da pessoa humana dos empregados demitidos, porque eles receberam suas verbas rescisórias, puderam sacar seu FGTS e seguro-desemprego. Advogado da rede Fogo de Chão no processo, Maurício Pessoa, do escritório Pessoa Advogados, diz que “a sentença foi muito serena e destacou que a empresa colocou os interesses dos trabalhadores acima de tudo”. A rede, acrescenta, avaliou que as dispensas seriam mais benéficas aos trabalhadores do que a adesão aos programas governamentais, pelo tempo de casa e a média salarial.
“A conduta da Fogo de Chão foi legal e assegurou todos os direitos dos trabalhadores. Ainda estamos em um momento de pandemia e as empresas estão passando por dificuldades, torcendo para que as coisas logo se restabeleçam”, afirma o advogado. O Ministério Público do Trabalho foi procurado pelo Valor, mas não retornou até o fechamento desta edição.
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