Baixa qualificação trava crescimento na América Latina, diz OIT

Região acumula quatro décadas de atraso em relação a EUA e Europa; Brasil vai mal em ranking de capacitação

Eduardo Sodré
SÃO PAULO

Um extenso relatório divulgado em junho pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) mostra uma das razões de países da América Latina terem dificuldades para superar crises e manter crescimento consistente de suas economias.

O diagnóstico está no círculo vicioso da baixa produtividade relacionada à capacitação da mão de obra, e não vem de agora.

“A maioria dos países da América Latina e do Caribe, mesmo antes da crise sanitária e econômica derivada da pandemia da Covid-19, apresentou uma estagnação tanto da produtividade do trabalho quanto da produtividade total de fatores”, diz o relatório.

Claudio Maggi, consultor da OIT e autor do texto, destaca que o abismo em relação a EUA, Europa e Ásia se ampliou. “A produtividade do trabalho [na América Latina] tem diminuído persistentemente em termos comparativos com o resto do mundo durante as últimas quatro décadas.”

Nesse cenário, os dados analisados pela OIT revelam que o Brasil ocupa posição crítica.

Um dos tópicos mostra o preparo dos profissionais para atuar no mercado de trabalho do futuro, em que a https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg se fará mais presente em todas as atividades. O país aparece na 36ª posição neste ranking, que reuniu 37 nações. O critério de pontuação foi elaborado pelo Fórum Econômico Mundial e se refere ao ano de 2020.

Ao conhecer o relatório, especialistas das áreas de RH e de capacitação profissional apontaram que os problemas não se devem apenas à formação técnica, mas também a posturas das empresas e dos funcionários no mercado nacional.

“A baixa produtividade é um problema ligado, na maior parte das vezes, a má gestão, ambientes inflexíveis e falta de reconhecimento da equipe”, afirma Carolina Martins, especialista em recursos
humanos.

“Como consequência, há altos índices de turnover [rotatividade de funcionários] e absenteísmo, desmotivação da equipe, falta de comprometimento e até insatisfação dos clientes pelas entregas de baixa qualidade.”

Para Alexandre Slivnik, vice-presidente da ABTD (Associação Brasileira de Treinamento e Desenvolvimento), o acúmulo de funções e também as distrações dos tempos modernos, como as redes sociais, prejudicam o rendimento dos trabalhadores.

“Como explicar a baixa produtividade e o aumento do burnout? Na realidade, muitas vezes, o problema não está na quantidade de horas trabalhadas, mas, sim, na qualidade das horas dedicadas ao trabalho. Quanto maior o foco, maior será a produtividade.”

Tanto na opinião dos especialistas consultados como no relatório da OIT, o tema formação aparece com destaque. E não se trata somente do preparo específico para o mercado de trabalho.

“Uma vez que a formação básica nas escolas é precária, temos jovens que saem despreparados para o mercado de trabalho, e isso acaba reverberando na baixa produtividade”, afirma Rosana Daniele Marques, sócia da Croma Recursos Humanos.

“Para compensar a perda na produtividade, vemos um achatamento dos salários oferecidos e um aumento de vagas de emprego de baixa qualificação, retroalimentando um círculo vicioso.”

É sabido que esses problemas educacionais atingem principalmente as camadas mais pobres da população. Nas faixas de renda mais altas, contudo, o Brasil conta com profissionais superqualificados, como ressalta a advogada Liz Dell’Ome, que é especializada em legislação sobre vistos de imigração para trabalhadores brasileiros.

“Quando têm acesso [à educação], os profissionais do nosso país são mais qualificados que os de outras nações”, diz a advogada.

“Para conseguir um bom posto no Brasil, já é requerida uma maior base acadêmica em comparação aos EUA, onde há mais oportunidades de bons trabalhos em diferentes níveis”, afirma Liz, que é membro da Aila (Associação Americana de Advogados de Imigração).

Mas apesar de terem uma base acadêmica sólida, muitos desses profissionais não reconhecem o próprio potencial em relação a mercados globais, analisa a advogada.

“A gente viabiliza a contratação no exterior de muita gente que tem medo do idioma, mas o dinamismo e a capacidade de pensar estrategicamente são características que o brasileiro possui.”

Contudo, o número de trabalhadores qualificados é muito pequeno diante da população, o que pode gerar distorções em alguns setores do mercado interno —e isso contribui para o agravamento do quadro apontado pela OIT.

“Sentimos muito esse impacto de dois anos para cá com a bolha de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg, resultado do crescimento rápido desse segmento. A escassez de profissionais fez com que aqueles que estavam no mercado fossem valorizados”, afirma Gabriel Zamboni, responsável pela área de RH da 7Stars Ventures, que investe em startups.

“As próprias organizações precisam desenvolver uma mentalidade voltada à capacitação dos profissionais. Se formos olhar caminhos, esse é um ponto primordial.”

https://www1.folha.uol.com.br/seminariosfolha/2022/08/baixa-qualificacao-trava-crescimento-na-america-latina-diz-oit.shtml

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