‘No início de 2021, voltamos ao normal’, diz secretário do Tesouro
O secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, disse nesta quinta-feira, 5, que não há até o momento nenhum indicativo de segunda onda de covid-19 no Brasil e, por isso, não há razão para discutir agora prorrogação de políticas de combate aos efeitos da pandemia. “No início de 2021, voltamos ao normal, viramos a página”, afirmou. Nos últimos dias, diversos países na Europa anunciaram a retomada de medidas restritivas à população para tentar conter a segunda onda de contaminação por covid-19. O temor de que isso se repita no Brasil tem alimentado o debate sobre a prorrogação das medidas. “Se acontecer (uma segunda onda) em algum outro momento, o crédito extraordinário já é um instrumento que fica fora do teto (de gastos, mecanismo que limita o avanço das despesas à inflação) e pode ser usado”, disse. Funchal citou ainda a possibilidade, aventada pelo próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, de incorporar no pacto federativo alguns instrumentos do orçamento de guerra que facilitaram a ampliação de gastos e suspenderam temporariamente amarras fiscais. Segundo o secretário, esses instrumentos valeriam para outras eventuais futuras situações de calamidade. Orçamento de guerraComo antecipou o Estadão/Broadcast no início de outubro, o governo quer incorporar dispositivos do orçamento de guerra no texto da Proposta Emenda Constitucional (PEC) para regulamentar regras fiscais em casos de calamidade. A medida pode dar segurança para elevar gastos para continuar combatendo a covid-19, caso haja necessidade diante de uma eventual nova onda da pandemia. O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), disse ao Estadão/Broadcast na época que a intenção é “estabilizar todas as medidas” que o governo poderá adotar se a doença voltar a recrudescer, como já vem ocorrendo em países da Europa. Funchal disse que o Brasil precisa se estruturar para pagar a dívida contratada pelo governo para bancar as medidas de combate à pandemia da covid-19. Na semana passada, o Tesouro divulgou a projeção de que a dívida bruta do governo geral (DBGG) encerre 2020 em 96,0% do PIB, bem acima dos 75,8% verificados no fim do ano passado. A dívida deve passar a marca dos 100% do PIB em 2025. Segundo Funchal, já existem novas estimativas aproximando o rombo previsto para este ano a R$ 900 bilhões. O secretário defendeu a aprovação de reformas estruturais para garantir o reequilíbrio fiscal e a redução da dívida pública nos próximos anos. Segundo ele, a percepção de que a situação fiscal no Brasil se deteriorou tem levado a uma inclinação na curva de juros de longo prazo, hoje na casa dos 8%.
TRF anula autuação de empresa que pagou tributos no ‘período da graça’
Uma rede varejista de farmácias do Rio Grande do Sul conseguiu, por meio de um argumento pouco utilizado na Justiça, anular um auto de infração lavrado pela Receita Federal. A decisão, do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, que atende a região Sul, aborda o chamado “período da graça” – tempo em que o contribuinte pode pagar o que deve sem sofrer alguma sanção. O caso transitou em julgado (não cabe mais recurso) no dia 29 de outubro. A decisão é considerada inédita por advogados. O instituto ou período da graça está previsto no artigo 47 da Lei Federal nº 9.430, de 1996. De acordo com o dispositivo, o contribuinte submetido à fiscalização da Receita poderá pagar em até 20 dias, a contar da data de recebimento do termo de início de fiscalização, os tributos já declarados, com os mesmos efeitos da denúncia espontânea. Ou seja, sem as multas de mora e de ofício. No caso, a rede de farmácias, ao aderir à Medida Provisória (MP) nº 601, de 2012, que trouxe a chamada desoneração da folha de salários, passou a recolher a contribuição patronal do INSS sobre a receita bruta. A MP, de 28 de dezembro daquele ano, contudo, não foi aprovada pelo Congresso Nacional e perdeu sua validade no dia 3 de junho de 2013. A rede, porém, continuou recolhendo indevidamente sobre a receita bruta até dezembro de 2014, apesar de declarar que estava recolhendo sobre a folha de salários nas Guias de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIPs). No dia 18 de janeiro de 2017, foi notificada sobre o Termo de Instauração de Procedimento Fiscal aberto pela Receita Federal. Em 6 de fevereiro, a empresa recolheu a diferença entre os valores, em um total de R$ 1,1 milhão, e retificou as guias no dia seguinte, valendo-se do instituto da graça. Ainda assim foi mantida pela fiscalização a autuação de cerca de R$ 1,1 milhão, com correção e multa de ofício de 75% – hoje seriam cerca de R$ 2,4 milhões. Por isso, o contribuinte resolveu levar o caso à Justiça Para os advogados que assessoram a farmácia, Víctor Arns Passos e Bruno Silva de Oliveira, do escritório Arns & Silva de Oliveira Advogados Associados, seria o caso de aplicar o instituto da graça porque houve a declaração do débito na GFIP sobre a folha de salários e apenas um pagamento a menor, como se ainda fosse desonerada. Em primeira instância, o juiz extinguiu a ação sem a análise do mérito por entender que não era a via adequada. Na 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, contudo a empresa ganhou por maioria, após julgamento estendido. O relator tinha sido contrário ao contribuinte por entender que não se sustentaria a tese de que o pagamento realizado em 7 de fevereiro de 2017 abrangeu valores já declarados, uma vez que houve a retificação das GFIPs após o início da ação de fiscalização. Contudo, foi vencido. O desembargador Rômulo Pizzolatti abriu a divergência ao entender que o pagamento efetuado é satisfatório à extinção do crédito tributário e para declarar a nulidade do auto de infração. Foram então dois votos a um a favor do contribuinte, o que levou ao julgamento da turma estendida, onde Pizzolatti foi seguido pelos demais desembargadores, em dezembro de 2018. (Processo nº 5004616-89.2017.4.04.7112/RS) A Fazenda Nacional entrou com embargos de declaração no TRF, que foram negados. Depois recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, decidiu, no dia 20 de agosto, não conhecer do recurso especial por envolver reexame de provas. O processo transitou em julgado no dia 29 de outubro. Segundo o advogado Víctor Arns Passos, a decisão traz um importante precedente sobre o instituto da graça, que tem sido pouco utilizado, mas que pode representar uma grande economia para empresas que declararam o débito e que, por algum motivo, não efetuaram o pagamento. De acordo com Passos, outras farmácias que passaram por essa situação acabaram optando por entrar em parcelamentos. O advogado Leo Lopes, do escritório FAS Advogados, destaca que a maior parte dos casos que tratam do instituto da graça está no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que em geral analisa se o respectivo tributo poderia ser considerado “já declarado” na abertura da fiscalização, como exige o artigo 47 da Lei nº 9.430. Para o advogado, o julgamento do TRF da 4ª Região foi correto, tendo em vista que o Fisco já possuía as informações necessárias para a cobrança do tributo que buscava fiscalizar. O uso do instituto da graça é raro, segundo Carlos Navarro, do escritório Galvão Villani Navarro, porque envolve um débito declarado e não pago que deve ser quitado em até 20 dias após o início da fiscalização. “Normalmente quando uma empresa declara e não paga é porque ela não tem uma posição de caixa favorável. Depois ela acaba quitando na época que tem o caixa e não necessariamente coincide com o momento de uma eventual intimação fiscal.” Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não retornou até o fechamento da edição.
Risco de segunda onda do coronavírus aumenta pressão por medidas de auxílio
A segunda onda da covid-19 já registrada em países da Europa e nos EUA fez subir a pressão em uma ala do governo e também no Congresso pela prorrogação das medidas de combate aos efeitos da pandemia, principalmente o auxílio emergencial – cujo pagamento, a princípio, será encerrado em dezembro. Mas de olho no risco fiscal, a equipe econômica começou a costurar uma solução legal para fechar a porta a uma eventual corrida de ministérios para autorizar gastos na reta final do ano, deixando pagamentos “pendurados” para 2021 por meio dos chamados “restos a pagar” (despesas transferidas de um ano para o outro). Segundo apurou o Estadão/Broadcast, a intenção da equipe econômica é publicar uma portaria para delimitar quais restos a pagar da pandemia poderão ser pagos no ano que vem. Será um procedimento especial único para as despesas que foram feitas com base no chamado orçamento de guerra e que vão ficar para 2021, criando uma espécie de cinturão de segurança para a gestão fiscal no ano que vem. Aprovado pelo Congresso, o orçamento de guerra tirou várias amarras de regras fiscais para permitir ao governo ampliar os gastos no combate aos efeitos da pandemia. A portaria está em análise na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e deverá ser publicada até o próximo dia 15. Por essa regra, apenas os restos a pagar processados ficarão de pé de um ano para o outro. O carimbo de “processado” é dado quando o governo reconhece a dívida, ou seja, quando o bem ou serviço é entregue, ou há o reconhecimento de um direito ao recebimento daquele recurso. Com isso, gastos não processados (ou seja, houve apenas a promessa de despesa, sem avanço) não permanecerão para os próximos anos como restos a pagar. No caso do auxílio, só quem fizer jus ao benefício em dezembro de 2020 poderá receber qualquer eventual valor pendente em 2021. Com a decisão, a expectativa da equipe econômica é fechar qualquer brecha legal que possa permitir aos ministérios deixar uma fatura muito grande para 2021. Segundo apurou a reportagem, alguns órgãos consultaram informalmente a área econômica sobre a possibilidade de empenhar recursos destinados originalmente à crise para outras áreas que estão com orçamento muito apertado em 2021. A prorrogação do auxílio emergencial está sendo cobrada porque o governo demora em apontar uma solução para o fim do benefício. Uma das propostas defendidas é a concessão de mais dois auxílios por meio de medida provisória. Há quem defenda a inclusão dessa prorrogação na Medida Provisória 1.000, que estendeu o auxílio até o fim desteano com valor de R$ 300. A MP ainda não foi apreciada pelo Congresso. PressãoEssa pressão foi reforçada por pesquisa da Confederação Nacional do Transporte (CNT) com o Instituto MDA, divulgada na semana passada, na qual 72% dos entrevistados defenderam a prorrogação do benefício por mais alguns meses a partir de janeiro de 2021. “É impressionante como o governo não conseguiu pautar ainda esse debate (a alternativa ao fim do auxílio)”, disse Pedro Fernando Nery, consultor do Senado. Para ele, há hoje um “abismo” que separa os dias 31 de dezembro e 1.º de janeiro de 2021, quando não haverá mais o auxílio. O economista destaca que está contratada alta da pobreza, do desemprego e da desigualdade. “Alguma coisa terá de ser feita. Não consigo pensar num assunto mais urgente.” Para Manoel Pires, coordenador do Observatório Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE), é muito provável que depois do verão uma segunda onda da covid possa atingir o Brasil. “Seria adequado para o governo manter uma estratégia pela qual uma eventual renovação do benefício seguisse a ideia de redução gradual”, recomendou. Segundo ele, isso pode envolver uma redução do valor do benefício nos próximos dois meses, dando tempo para avaliar quais são os reflexos de uma segunda onda lá fora e como poderia se planejar para atuar no Brasil. Já o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), disse que o Brasil tem uma onda longa da covid e que a preocupação deve ser maior no verão com os voos que partem da Europa para o Brasil. Ele garante que não há planos de renovação do Estado de calamidade e nem de auxílios. “Se tivermos um fato extraordinário, todas as cartas serão colocadas na mesa, mas hoje estamos caminhando para uma não renovação do Estado de calamidade e vamos tratar do Renda Brasil”, disse. O Renda Brasil ou Cidadã é o novo programa que o governo estuda em substituição ao Bolsa Família. Lideranças do Congresso Nacional também já cogitaram a possibilidade de remanejar eventuais “sobras” dos gastos contra covid para investimentos públicos. Em julho, a Casa Civil avaliou consultar o Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a possibilidade de empenhar em 2020 gastos com obras e investimentos a serem executados apenas nos próximos anos. Revelada pelo Estadão/Broadcast, a consulta era um pedido do Ministério do Desenvolvimento Regional, e acabou sendo suspensa após ser interpretada pelo mercado como tentativa de drible ao teto de gastos, que limita o avanço das despesas à inflação.
Só 5% da indústria está preparada para as oportunidades do digital
Só 5% da indústria está preparada para aproveitar ao máximo as oportunidades do ambiente digital, segundo pesquisa da PwC com 2.380 executivos, de 76 países. Intensivas em https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg, as transcenders, como vêm sendo chamadas as empresas de ponta, são reconhecidas por exigirem que seus funcionários colaborem no trabalho de toda equipe e sejam capazes de exercer múltiplas funções. Como consequência, as transcenders têm margem de lucro ao menos 17% maior do que a das concorrentes.
Projeto de autonomia do Banco Central pode ser alterado pela Câmara
Aprovado pelo Senado, o projeto de autonomia do Banco Central pode sofrer modificações na Câmara. O partido Novo, de viés liberal, se prepara para tentar enxugar a proposta que recebeu aval dos senadores para reduzir os chamados acessórios que foram colocados para o BC. O texto mantém o controle dos preços como objetivo central, mas inclui ainda duas novas metas acessórias, sem prejuízo à principal: suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego no País. O governo concordou com a redação da proposta, apesar de o BC ser historicamente contrário a ampliar o escopo da atuação. “Há a questão sobre quais são os objetivos do Banco Central. Um deles é o pleno emprego, isso não é papel do BC”, disse o líder do Novo na Câmara, Paulo Ganime (RJ). Atualmente, cabe ao Banco Central garantir o poder de compra da moeda nacional, zelar pela liquidez da economia, manter as reservas internacionais em nível adequado, estimular a formação de poupança, zelar pela estabilidade e promover o aperfeiçoamento do sistema financeiro. A bancada do Cidadania na Câmara ainda quer analisar o projeto com mais atenção, mas a legenda é defensora do duplo mandato. “Nós achamos que cabe também ao BC olhar pelo desenvolvimento econômico, não dá para ver a questão da estabilidade da moeda, isoladamente do desenvolvimento”, disse o líder do partido, Arnaldo Jardim (SP). Mandato fixoA proposta ainda estabelece mandatos de quatro anos, prorrogáveis por mais quatro, para os diretores da instituição que hoje podem ser nomeados e demitidos livremente pelo presidente da República. Caso o projeto seja aprovado neste ano e Roberto Campos Neto seja indicado em 2021 para permanecer no cargo, ele poderia ficar, ao todo, dez anos à frente do BC. Para o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio, a proposta dos senadores deve ser mantida. “Significa dar mandatos estáveis à diretoria do banco, mantendo-o preservado de pressões políticas”, disse. Para ele, a autonomia do BC trará, assim, mais segurança aos investidores brasileiros e estrangeiros e maior solidez ao sistema financeiro nacional.Os deputados devem ter ainda tempo para se debruçar sobre o texto aprovado pelos senadores. A expectativa é de que o texto chegue ao plenário da Casa somente depois do fim do primeiro turno das eleições municipais, no dia 15. Na Câmara, existe outra proposta de autonomia do BC, a do Projeto de Lei Complementar n.º 112, enviado pelo governo. Sob a relatoria do deputado federal Celso Maldaner (MDB-SC), a proposta conta com o patrocínio do presidente da Câmara, deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ). No entanto, em meio à pandemia do novo coronavírus, ela acabou ficando parada. Uma diferença fundamental do projeto da Câmara é que ele prevê apenas dois objetivos para o Banco Central: estabilidade de preços e estabilidade financeira.
Inflação de outubro atinge 0,86%, maior resultado desde 2002
Com nova alta de preços dos alimentos, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 0,86% em outubro deste ano, o maior valor para o mês desde 2002. O resultado é superior ao crescimento do mês imediatamente anterior, setembro, que teve resultado de 0,64%. No ano, a inflação acumula alta de 2,22% e já avançou 3,92% nos últimos 12 meses. O resultado veio acima da média das expectativas dos analistas ouvidos pelo Projeções Broadcast, que era de 0,84%. Para o mês, os grandes destaques foram o arroz, com aumento de 13,36% nos preços, e o óleo de soja, com crescimento de 17,44%. O grupo de Alimentação e Bebidas, que até desacelerou em relação a setembro (que teve aumento de 2,28%), ficou com crescimento de 1,93% em outubro, com o maior impacto no índice, 0,39 ponto porcentual. De acordo com o IBGE, a desaceleração no grupo de alimentos aconteceu por conta de altas menores em alguns itens. Arroz e óleo, por mais que tenham tido altas relevantes em outubro, tiveram resultados ainda maioress em setembro – 17,98% e 27,54%, respectivamente. Mas houve também alta em outros alimentos, que, em alguns casos, superaram as variações do mês anterior, como nos casos dos tomates (18,69%, ante 11,72% em setembro), frutas (2,59%, ante deflação de 1,59% em setembro) e batata-inglesa (17,01%, ante deflação de 6,30% em setembro). Para alimentação, mesmo neste cenário de altas, quedas também foram registradas, como na cebola (-12,57%), cenoura (-6,36%) e alho (-2,65%). Outros destaques de crescimento para o mês de outubro foram: setor de transportes, que aumentou, mas em menor medida, com 1,19%, e impacto de 0,24 ponto porcentual no resultado. Artigos de residência, 1,53%, com impacto de 0,06 p.p., e seguro voluntário de veículo, 2,21%. Este em particular registra um cenário diferente, já que vinha de sete meses de quedas. As 16 regiões pesquisadas para composição do índice nacional apresentaram alta no mês. O destaque fica para a cidade de Rio Branco, no Acre, com 1,37%. O menor índice foi registrado na região metropolitana de Salvador, com 0,45%.
Governo planeja recorrer ao STF contra derrubada de veto à desoneração
Apesar de ter cedido em votação no Congresso, o governo planeja recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal) contra a prorrogação, até o fim de 2021, da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia. Segundo membros do governo, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) é obrigado a apresentar uma fonte para compensar a desoneração da folha. Na avaliação dos interlocutores, como o recurso não foi discriminado pelos congressistas, só restaria ao Executivo recorrer à Justiça. Na avaliação de integrantes do Planalto, há precedente para que o Supremo derrube o ato dos parlamentares. A decisão final de ir à Justiça, caberá a Bolsonaro e passará por análise da SAJ (Subchefia para Assuntos Jurídicos). O ministro Paulo Guedes (Economia) queria que, em vez de prorrogar a medida para alguns setores, o incentivo tributário fosse amplo. Em troca, seria criado um novo imposto de forma que a arrecadação federal fosse mantida. A ideia, na prática, era deixar de taxar a contratação de mão de obra e arrecadar de outra fonte. Diante da reação negativa do Congresso em debater a criação de um imposto durante o período eleitoral, o governo decidiu enviar apenas após as eleições o projeto que estabelece uma nova CPMF ou fonte de compensação atrelada à desoneração da folha de pagamentos de todos os setores. Apesar da adesão de interlocutores do Palácio do Planalto à votação que estende a medida por mais um ano, pelo menos três assessores de Guedes relataram à Folha que membros da pasta continuam defendendo que a questão seja levada à Justiça. Na articulação política do governo, a ação no STF é dada como quase certa. Haveria, de acordo com eles, disposição em usar a interpretação de que a lei em questão fere a Constituição. Com isso, poderiam torná-la sem validade. O argumento do time de Guedes é que, desde novembro do ano passado, quando entrou em vigor a reforma da Previdência, fica proibido conceder novos descontos que reduzem a arrecadação que banca as aposentadorias do setor privado. Portanto, para a equipe econômica, seria necessária uma nova alteração na Constituição para que a derrubada do veto (ou seja, a postergação da desoneração) seja legal. Parecer da Câmara, entretanto, contestou o argumento da Economia e concluiu que a prorrogação não seria inconstitucional. A conclusão da Mesa Diretora da Câmara é que estender o benefício estaria de acordo com Constituição, pois o incentivo fiscal já é dado a empresas de setores com alto grau de mão de obra. Técnicos afirmaram que, como a desoneração da folha já existia, a medida poderia ser prorrogada, pois a reforma da Previdência impediria apenas a criação de novos benefícios. Procurado, o Ministério da Economia não quis comentar se pretende acionar a Justiça. A desoneração da folha, adotada no governo petista, permite que empresas possam contribuir com um percentual que varia de 1% a 4,5% sobre o faturamento bruto, em vez de 20% sobre a remuneração dos funcionários para a Previdência Social (contribuição patronal). Isso representa uma diminuição no custo de contratação de mão de obra. Atualmente, a medida beneficia companhias de call center, o ramo da informática, com desenvolvimento de sistemas, processamento de dados e criação de jogos eletrônicos, além de empresas de comunicação, companhias que atuam no transporte rodoviário coletivo de passageiros e empresas de construção civil e de obras de infraestrutura. O incentivo tributário terminaria em 31 de dezembro de 2020. O Congresso, nesta quarta, decidiu estender esse prazo até o fim de 2021. Empresários desses 17 setores, que reúnem cerca de 6 milhões empregos diretos, dizem que não suportariam um aumento de custo e que 1 milhão de pessoas poderiam perder os empregos com o fim da desoneração. Nos últimos anos o governo recorreu ao TCU (Tribunal de Contas da União) e ao STF quando entendeu que a derrubada de vetos fazia com que a lei aprovada deixasse de cumprir regras fiscais ou constitucionais. A ideia do governo agora seria recorrer ao STF e posteriomente mandar novo projeto ao Congresso prevendo desonerar a folha de pagamentos de todos os setores, mas atrelado a uma fonte de compensação. Em uma rede social, o ministro Bruno Dantas, do TCU, reconheceu que o debate sobre a prorrogação de isenções fiscais era político e estava sendo tratado pelo Congresso, o foro competente. “Juridicamente, porém, vejo inconstitucionalidade na lei que pode surgir da derrubada do veto por afronta à Lei de Responsabilidade Fiscal”, escreveu. Nesta quarta, após a derrubada do veto pela Câmara, o líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO), afirmou que a decisão de judicializar era do Executivo, mas que avaliava que isso não iria acontecer. Na votação no Senado, o líder do governo na Casa, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), afirmou que apoiaria a derrubada, mas ressaltou que o veto era fundamentado por uma afronta à constitucionalidade. “Lembro até que, hoje, durante os entendimentos com os líderes, o ministro do Tribunal de Contas da União Bruno Dantas chamava a atenção de que a decisão política poderia ser tomada, mas ele ainda entendia que haveria problemas de constitucionalidade na derrubada do veto, ou seja, é importante que a gente possa revisitar esse tema para poder viabilizar o acordo”, afirmou. Bezerra afirmou que uma saída poderia ser encontrada no relatório do senador Marcio Bittar (MDB-AC) da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial, onde seria possível “dar a saída constitucional para que a derrubada do veto não venha a ser discutida judicialmente.” Integrantes do time de Guedes, porém, não acreditam que essa solução citada por Bezerra seja viável. O Congresso está em ritmo lento por causa das eleições municipais, e uma PEC tem tramitação lenta nas duas Casas. Além do impasse jurídico, a postergação da medida que beneficia 17 setores da economia também envolve a necessidade de corte de R$ 4,9 bilhões em gastos previstos para o próximo ano. Esse tipo de desoneração precisa ser compensada pelo Tesouro Nacional e, assim, é considerada uma despesa. Como o Orçamento tem um teto (norma que impede o crescimento dos
Tempos sombrios (Everardo Maciel)
São inquietantes as notícias que chegam no início de novembro desta inacabável e insidiosa pandemia: as eleições norte-americanas podem consolidar tendência recente de renúncia à cooperação internacional e estimular o populismo e o desrespeito às regras democráticas; já é certo que os Estados Unidos estão profundamente divididos, num clima que pode evoluir para confrontos violentos, e têm um bizarro sistema eleitoral, mormente se comparado ao moderno sistema brasileiro; a Europa está sofrendo com a segunda onda da covid-19 e atentados terroristas motivados por intolerância religiosa; e inexiste perspectiva concreta para distribuição, em curto prazo, de vacina contra a doença que está infelicitando a humanidade, especialmente nos países pobres. Aqui, insistimos com polêmicas infantilizadas ou incompreensíveis, como a obrigatoriedade ou não de aplicação de uma vacina que, infelizmente, ainda não está disponível. As redes sociais são utilizadas por autoridades, de forma banal, para emitir bisonhos comentários sobre fatos corriqueiros ou proferir xingamentos a adversários do dia. As eleições municipais são um tedioso espetáculo de promessas inviáveis e de disputas por rendosos cargos políticos. Definitivamente, não estamos bem. Parece que ninguém está levando a sério o aumento do desemprego e da pobreza, a crise fiscal dos Estados e municípios, a insolvência de empresas, a instabilidade do câmbio, as ameaças inflacionárias, a necessidade de proteção para os vulneráveis, a possibilidade de uma segunda onda da pandemia. Não se conseguiu promover um debate consistente sobre esses temas e outros associados à crise sanitária, ao contrário do que está sendo feito em muitos países. Na Alemanha, a chanceler Angela Merkel, com a serenidade habitual, adverte que o inverno será duro e difícil, e pede aos compatriotas que assumam conduta solidária e empática. Na Nova Zelândia, a primeira-ministra Jacinda Ardern lembra que seu vitorioso enfrentamento da pandemia é fundado na firmeza e na antecedência. O Congresso nem sequer conseguiu aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias e instalar a comissão mista para tratar do Orçamento de 2021. Algumas iniciativas parlamentares para mitigar os rigores da crise ainda não lograram prosperar, como o Projeto de Lei n.º 3.566/2020, apresentado pelo deputado André de Paula, na Câmara dos Deputados, tratando da indispensável moratória tributária para as micro e pequenas empresas, e o Projeto de Lei n.º 578/2019, apresentado pelo senador Álvaro Dias, no Senado, que propicia a conversão da Bolsa Família em emprego, sem custo fiscal. É indispensável que sejam apresentadas mais iniciativas voltadas para arrostar a crise, especialmente pelo Executivo. Em lugar disso, persiste a pretensão de aprovar uma ampla reforma tributária, com severos impactos sobre preços, setores e entes federativos, com base em reuniões por videoconferência, apresentações em PowerPoint e divulgação de exercícios econométricos que pretendem projetar um futuro longínquo a partir de suposições precárias. Quando se retira o véu das agendas ocultas, percebe-se que se pretende, por exemplo, reduzir a carga tributária de geladeiras e automóveis de luxo para aumentar a de livros, mensalidades escolares e consultas médicas, em nome de uma enganosa e regressiva alíquota única. A existência de um número grande de alíquotas efetivas no ICMS não pode ser pretexto para instituição de uma alíquota única. Vedação à implantação de regimes especiais e à redução de base de cálculo já representaria uma enorme simplificação. Debates sobre as propostas estão interditados, limitando-se a exposições formais de representantes setoriais, ouvidas com a indiferença de um frade de pedra. Negociações, quando existem, são operadas em ambiente privado, traduzindo uma peculiar forma de privatização da reforma tributária. O Estado não pode demitir de si a responsabilidade de conduzir reformas de tal envergadura, em que se exigem imparcialidade e prevalência do interesse público. *CONSULTOR TRIBUTÁRIO, FOI SECRETÁRIO DA RECEITA FEDERAL (1995-2002)
Liberdade para trabalhar (Almir Pazzianotto Pinto)
O trabalhador, tal como o conhecemos hoje, é fruto da primeira Revolução Industrial. Sua existência como classe data do final do século 18. Surge com a invenção das primeiras máquinas de fiar e de tecer na Inglaterra. Até então esse trabalho era executado em casa, com a utilização de equipamentos toscos, de reduzida capacidade produtiva. A esse respeito escreveu Jurgen Kuczynski: “Antes de la introducción de las máquinas, el hilado y tejido de materias primas se hacía em la casa del trabajador. Su mujer y su hija hilaban el hilo que el marido tejía; o bien lo vendían cuando el padre de família no lo trabajaba en persona. (…) De esta manera vegetaban los trabajadores en una existencia tranquila, llevando una vida pacífica y ordenada llenos de piedad y dignidade. Su bienestar material era mucho mejor que el de sus sucessores” (Evolución de la Classe Obrera, Ed. Guadarrama, Madri). A Revolução Industrial provocou o aparecimento de grandes unidades industriais construídas pela iniciativa privada. Karl Marx sintetiza de forma magistral a passagem da economia rudimentar para o processo de produção industrial. Leia-se o que escreveu no Manifesto do Partido Comunista, cuja primeira edição inglesa data de 1850: “A indústria moderna transformou a pequena oficina do antigo mestre da corporação patriarcal na grande fábrica industrial capitalista. Massas de operários, amontoados nas fábricas, são organizadas militarmente. Como soldados da indústria, estão sob a vigilância de uma hierarquia completa de oficiais e suboficiais. Não são somente escravos da classe burguesa, do Estado burguês, mas também diariamente, a cada hora, escravos da máquina, do contramestre e, sobretudo, do dono da fábrica. E esse despotismo é tanto mais mesquinho, odioso e exasperador quanto maior é a franqueza com que proclama ter no lucro seu objetivo exclusivo”. Ignoro o nome do inventor do relógio de ponto. Creio ter sido alguém informado pelo desejo de impor disciplina ao processo de fabricação, para obter da força de trabalho os melhores resultados. Alguém – como Frederick W. Taylor, pai da gestão científica (Scientific Management), ou Henry Ford, criador da linha de montagem – empenhado em garantir à livre-iniciativa “prodigioso desenvolvimento da produtividade por meio do desenvolvimento da https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg”, como registrou Louis Althusser em prefácio para o livro primeiro de O Capital. No Brasil a sujeição do empregado comum à rigidez do horário e à assiduidade é disciplinada na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e na Lei do Repouso Semanal Remunerado. Qualquer que seja a forma de remuneração, nunca se pode atrasar ou deixar a oficina antes de se encerrar a jornada. O tempo destinado ao repouso ou à alimentação e o intervalo entre jornadas são delimitados. A lei o obriga a registrar o ponto quatro vezes por dia. O custo da mão de obra é um dos principais componentes do custo final. É natural que o empregador procure conseguir o máximo rendimento dos assalariados. A Constituição da República e a CLT traçam limites à duração diária e semanal da jornada, determinam que horas extras não ultrapassem o limite de duas e que sejam pagas com o acréscimo mínimo de 50%. Férias e repouso semanal são calculados proporcionalmente às faltas não justificadas. Nos estabelecimentos com mais de dez empregados a anotação da hora de entrada e saída deve ser feita “em registro manual, mecânico ou eletrônico” (artigo 74). O isolamento determinado pela pandemia de covid-19 acelerou a expansão do teletrabalho. Na residência o empregado iniciará a jornada sem os atropelos habituais. Economizará os gastos com transporte individual ou coletivo. Se quiser, terá alguns minutos para atividades físicas, tomará o café da manhã ouvindo ou vendo as últimas notícias, irá ao computador adquirido de acordo com o modelo escolhido e executará as tarefas do dia ou antecipará as do dia seguinte. Não haverá horário rígido para a refeição feita em casa ou encomendada no delivery. Se necessário, interromperá o trabalho para ajudar a esposa, correr ao supermercado e dar atenção aos filhos. Desde que execute a tempo os serviços sob sua responsabilidade, organizará com liberdade a jornada de acordo com sua melhor conveniência. A libertação do ponto é uma das vantagens do teletrabalhador. Esgarça o regime de subordinação inerente ao contrato. Sobre a nova e revolucionária modalidade de trabalho pesa, contudo, ameaça de regulamentação detalhada, com o perigo de causar prejuízos a ambas as partes, destruindo avançada e liberal forma de trabalho assalariado. Infelizmente, trouxemos de Portugal a prolixidade barroca das Ordenações Afonsinas (século 15), Manuelinas e Filipinas (século 16/17). A Lei n.º 13.467/2017 reformou a CLT. Antecipou-se à pandemia ao lhe acrescentar cinco dispositivos sobre teletrabalho (artigos 75-A, B, C, D, E). Bastará interpretá-los de forma racional e aplicá-los com boa-fé e inteligência para que esse veículo de modernização não se perca. ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST)
A segurança jurídica no home office (José Pastore)
Assustou bastante a manchete do Estado de 19/10/2020 segundo a qual as ações trabalhistas envolvendo home office aumentaram 270% em curto período de tempo. Mais preocupante ainda são as tentativas dos parlamentares para regular o assunto. O deputado Cleber Verde (Republicanos-ma) pretende que as empresas sejam responsáveis pelos acidentes de trabalho que acontecerem durante o home office. O deputado Rubens Otoni (PT-GO) quer preservar por lei todos os adicionais dos servidores públicos: auxílio transporte, adicional noturno, adicionais de periculosidade e insalubridade e outros. O deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) pretende que as empresas realizem vistorias na casa dos trabalhadores. Vários projetos de lei estabelecem para todas as empresas jornadas de trabalho rígidas no home office. E assim vai. A reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) deu um passo importante ao estabelecer regras inteligentes para o home office. Entre elas, deixou para empregados e empregadores a faculdade de negociar jornadas de trabalho. No home office não há obrigatoriedade de controle de ponto, a menos que as partes assim decidam. No campo da saúde e segurança, a lei estabeleceu que o empregador deve instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, sobre as precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho. Os empregados assinam um termo de ciência, comprometendose a cumprir as precauções definidas. Ao comprovarem que instruíram seus empregados de maneira correta, os empregadores ganham argumentos para evitar condenações por eventuais acidentes de trabalho ocorridos nas residências dos empregados. O fornecimento e manutenção de equipamentos para a prática do home office também são assuntos de negociação entre empregados e empregadores e devem constar de contrato escrito. A lei deixou claro, ainda, que o fornecimento de tais equipamentos não tem natureza salarial. Apesar de a referida lei conter regras claras, amigáveis e realistas, a insegurança jurídica reaparece e se fortalece com a explosão de ações na Justiça do Trabalho, cuja solução pode demorar anos. Sabe lá qual será a decisão de um juiz daqui a 4 ou 5 anos? Como o home office tende a se propagar em muitas empresas, é importante a definição de ações que venham a reduzir as novas fontes de insegurança. Nesse sentido, são bem-vindos os inúmeros acordos coletivos já realizados por empresas junto com os sindicatos laborais. Muitos definem regras claras de jornadas de trabalho com previsão de pagamento de hora extra quando ultrapassados os períodos de trabalho negociados. Outros garantem recursos para compra e manutenção de equipamentos. E, muito importante, grande parte desses acordos prevê a criação de uma comissão de empregados e empregadores para supervisionar os diferentes aspectos do home office, em especial as regras que garantem as proteções da saúde e segurança dos trabalhadores. Como o negociado prevalece sobre o legislado, esses acordos têm força de lei e protegem as partes contra a insegurança futura. É o melhor caminho a ser seguido. A adoção de regras rígidas estabelecidas por lei mais atrapalha do que ajuda, pois as peculiaridades das diversas situações exigem adaptações que só podem ser adequadamente estabelecidas por negociação coletiva. A Fecomercio-sp lançará em breve uma cartilha com sugestões para empregados e empregadores reduzirem a referida insegurança jurídica. O ESTADO DE S. PAULO