Indústria aposta em cursos técnicos e mentorias para ampliar diversidade e inclusão

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Capacitação de mulheres, negros, PcDs e grupos minoritários é maneira que empresas encontraram para diversificar quadro de funcionários na indústriaPor Katia Simões — Para o Prática ESG, de São Paulo Ao realizar em 2022 um programa de capacitação de pessoas com deficiência (PcDs) para trabalhar em alto mar (offshore), a Constellation Oil Services, empresa de perfuração de petróleo e gás, quebrou uma das principais crenças do setor: PcDs não podem trabalhar embarcados. No total, 14 pessoas participaram de treinamentos em segurança de plataforma marítima e escape de helicóptero submerso. Cinco foram contratadas. “Comprovamos que a limitação está na nossa cabeça, isso nos dá muito orgulho”, diz Silvia Nunes, diretora administrativa. Ela enfatiza, porém, que nas operações offshore, em que os riscos operacionais são grandes, a inclusão de PcDs ainda continua sendo um desafio a ser vencido, especialmente em relação à segurança do trabalho. “Iniciativas como a nossa, porém, ajudam a amadurecer a pauta no setor e a impulsionar as mudanças necessárias para a garantia da igualdade de oportunidade para todos”, reforça. Com o mesmo pensamento, a Aker Solutions, que oferece produtos e serviços integrados para a indústria de energia, iniciou em dezembro de 2022, o Programa Mulheres a Bordo, a fim de acelerar a inserção de profissionais do sexo feminino na indústria de óleo e gás. Com duração de cinco meses, 300 horas de qualificação teóricas e práticas, incluindo visitas à planta de Subsea Lifecycle Services, em Rio das Ostras (RJ), o programa selecionou 20, entre 500 inscritas. “Trata-se de um mercado masculinizado e ao lançarmos o projeto queremos deixar claro que as mulheres, desde que capacitadas, podem atuar offshore”, diz Marcela Chamano, líder do programa de Diversidade e Inclusão da Aker no Brasil. O público feminino também é foco do programa de jovem aprendiz para a linha de manufatura, que, no ano passado teve 2000 inscritas e 20 selecionadas para uma capacitação de 900 horas. “Em 2022, tínhamos como meta alcançar 25% de mulheres em posição de liderança e 30% em todos os postos. Podemos dizer que evoluímos bem, com 26,8% entre os líderes e 25,8% na companhia como um todo.” Programas voltados às minorias começam a se multiplicar na indústria em decorrência do avanço da agenda ESG. Mas, ainda estão longe do patamar ideal. No setor de óleo e gás, por exemplo, um estudo global da consultoria McKinsey, de 2019, mostrou que a participação feminina era apenas 15%, sendo que metade das empresas analisadas não tinham mulheres em alta gerência, e o outro terço possuía só uma em posições de chefia. No mesmo relatório, a consultoria aponta que o problema não é exclusivo do setor de óleo e gás. A atividade manufatureira em geral tinha pouco menos de 20% de participação feminina em altos cargos e pouco mais de 30% em início de carreira. Farmacêuticas e de energia elétrica eram as empresas com mais mulheres em posições de liderança no setor industrial, mas de cerca de 30%, apenas. No Brasil, a diversidade, de maneira geral, é um desafio. Dados da empresa de recrutamento e seleção Vagas.com de 2022, que considera todos os setores, apontam que só 0,4% dos trabalhadores negros no mercado de trabalho ocupam cargos de diretoria, o mesmo percentual dos indígenas. Entre os brancos, a participação nas altas posições é quase o triplo, de 1,1%. Os negros também são minoria em postos de supervisão e coordenação (3,9%) e gerência (1,9%). O percentual de brancos nesses cargos é de 5,20% e 3,30%. “Tradicionalmente os negros estão na base da produção industrial. O desafio está em ampliar a participação a partir dos primeiros postos de liderança”, diz Renata Moraes, CEO da ImpulsoBeta, consultoria especializada em Diversidade, Equidade e Inclusão. “Existe preconceito de classe junto aos tomadores de decisão e só se quebra esse tipo de paradigma com aculturação da companhia e preparação bem-feita para recepção dos grupos minoritários”. Boa parte das companhias têm adotado o modelo de mentoria e treinamento de lideranças como instrumentos para mudar a cultura e garantir uma boa ambientação dos grupos minoritários. Na empresa de bens de consumo Unilever, que trabalha há 10 anos com políticas de gênero, as mulheres ocupavam em 2018, no Brasil, 53% dos cargos de liderança. Hoje, somam 56%. “Os talentos estão na organização, só precisam ter oportunidade”, diz Ana Paula Franzoti, diretora de RH. “O Programa Prontidão, direcionado a pessoas pretas, por exemplo, oferece mentoria, letramento sobre a questão racial tanto para mentores como para mentorados e ferramentas para aceleração de competências técnicas, emocionais e comportamentais dos profissionais negros”. Os resultados, segundo ela, foram significativos. Houve 33% de movimentação entre os 48 participantes, sendo 15% de promoção a cargos de gerência – destes as mulheres responderam por 70% – e 18% para coordenação. Em 2022, a Unilever colocou em prática o programa de mentoria “Não foi sorte, eu estou pronta”, que impactou cerca de 500 mulheres, de estagiárias a cargos de gerência, sendo 200 em mentorias individuais. “O grande desafio para ampliação dos grupos minoritários é garantir o letramento constante das pessoas, porque o viés do preconceito é estrutural. Isso vale tanto para o operador de fábrica quanto para diretor”, diz Franzoti. Na visão de Andrea Kohlrausch, CEO da Bibi Calçados, a mudança se dá pelo exemplo. Ela conta que quando, em 2010, a indústria iniciou o projeto da Fábrica de Talentos, em parceria com o Senai, voltado à capacitação de jovens para atuar na indústria calçadista, esse tipo de ação era rara. “Hoje, vemos muitas indústrias na Serra Gaúcha trazendo a escola para dentro da fábrica e isso impacta na formação de jovens que enxergam uma oportunidade de crescimento no polo calçadista.” Em 12 anos, 650 jovens passaram pela Fábrica de Talentos, a maioria de baixa renda. Só em 2022, a Bibi aplicou R$ 2 milhões no programa. Ricardo Sales, CEO da consultoria Mais Diversidade, observa que foi apenas em 2016 que a indústria passou a olhar o tema diversidade e inclusão com mais atenção. “Quem opera direto com o consumidor sente mais forte a pressão, sai

Governo busca apoio do agronegócio a texto da reforma tributária

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Por Adriana Fernandes e Anna Carolina Papp Avaliação da equipe econômica é de que resistência do setor é um dos principais entraves ao avanço da proposta no CongressoNa articulação para a aprovação da primeira etapa da reforma tributária, o Ministério da Fazenda mapeou as resistências à proposta no Congresso, e identificou o setor do agronegócio como um dos principais focos de oposição às mudanças nos impostos que incidem sobre bens e serviços. A avaliação é de que essa resistência seria ainda maior do que a feita pelo setor de serviços, que há anos vem liderando uma frente contrária à aprovação da reforma no Congresso e defendendo a tese de criação de uma nova CPMF – rejeitada pela equipe atual.Ao se cadastrar nas newsletters, você concorda com os Termos de Uso e Política de Privacidade.A equipe econômica aposta em “diálogo transparente” e em material informativo para derrubar “mitos” que o governo Lula considera que foram sendo construídos nos últimos anos para impedir o avanço da criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). O ministro da Economia, Fernando Haddad, já conversou com o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República, Paulo Pimenta, para afinar a comunicação da reforma tributária, que ele vê como central na sua estratégia de política econômica para o crescimento. Segundo o deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), diretor da Frente Parlamentar do Agronegócio – e que será o vice-presidente da instituição –, o setor tem participado ativamente no Congresso dos debates em torno da reforma tributária, tanto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 110 quanto da 45. A primeira cria a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), unindo PIS e Cofins, e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), unindo ICMS e ISS. Já a 45 substitui cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um Imposto sobre Bens e Serviços e um Imposto Seletivo sobre cigarros e bebidas alcoólicas. “Fomos propondo um conjunto de medidas, e nos sentimos muito próximos de posições que estão esboçadas no relatório que foi apresentado pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Há ainda pontos a detalhar, mas houve um avanço”, afirmou. Ribeiro relatou o texto de autoria do deputado Baleia Rossi (MDB-SP). ‘Cadeia toda’Ele diz que a FPA pleiteia que o setor seja contemplado “na amplitude da sua cadeia”. “Muitas vezes se dissemina uma imagem de que o setor é menos taxado em relação a outros setores da economia, como comércio e indústria. Quando nós vemos como um todo a cadeia, vemos que a elevada taxação que existe no Brasil também atinge o setor agro”, diz. Já a Confederação Nacional do Agronegócio avalia que, nos projetos de reforma tributária que tramitam no Congresso (como as PECs 45 e 110), o “aumento da carga tributária recai nos insumos, nas vendas dos produtos agropecuários e, também, na cobrança do Imposto de Renda da atividade rural”. Texto de reforma costurado por Haddad deve ser mistura de PECsO novo texto de reforma tributária será mesclado da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 110) do Senado e da PEC 45, em tramitação na Câmara, para a construção da proposta do governo Lula a ser apresentada até abril, de acordo com compromisso assumido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Segundo apurou o Estadão, a proposta deve permitir a devolução do imposto cobrado no preço dos produtos em forma de crédito para famílias de baixa renda, num cenário de eliminação da isenção do PIS/Cofins dos produtos da cesta básica – política considerada distorcida pela atual equipe econômica. Hoje, os itens da cesta básica são isentos, mas o beneficio alcança pobres e ricos. A isenção acabaria, mas as famílias com menor renda receberiam a devolução do imposto embutido nos produtos que compram. O governo ainda não bateu o martelo se vai fazer um modelo de IVA dual (um tributo federal e outro dos Estados e municípios), previsto na PEC 110. Ou criar logo o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o IVA nacional, que reúne todos os impostos sobre consumo e está no desenho da PEC 45. A expectativa é de que a equipe econômica opte pela criação do IBS, substituindo cinco tributos – PIS, Cofins, IPI (federal); ICMS (estadual) e ISS (municipal). Segundo a diretora de cursos da York University e coordenadora executiva do grupo de trabalho sobre IVA do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Melina Rocha, o agronegócio em geral possui uma série de regime e tratamento especiais e tem medo de perdê-los porque a reforma do IVA propõe e extinção de benefícios e regimes diferenciados de tributação. “Mas eles não veem que as vantagens que a reforma vai trazer, especialmente para os exportadores. É um grande benefício, em termos de possibilidade de compensação de crédito e devolução do crédito acumulado”, diz Melina, que participou como técnica do texto da PEC 110. Ela aposta que o secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, fará um resgate da PEC 45, já que foi um dos seus autores técnicos. Segundo ela, deve-se manter mecanismo da PEC 110 para compensação de perdas na transição para a Zona Franca de Manaus. Zona Franca“A negociação foi feita com eles, mas achamos que a própria questão da PEC não ter sido votada na foi por conta da pressão da Zona Franca e do agronegócio”, destaca a tributarista, que lembra que faltou quórum na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para a votação. Segundo ela, um dos grandes pontos de discussão é o IPI. Na PEC 110, o relatório manteve o IPI para trazer o apoio da Zona Franca. Já na PEC 45, o IPI é extinto e é incorporado. Vanessa Rahal Canado, do Insper e ex-assessora do Ministério da Economia para a reforma tributária, atribui as resistências do agronegócio e de serviços ao fato de que os setores olham apenas a foto de curto prazo, sem ver o impacto na cadeia como um todo. É o caso do produtor rural, que tem uma alíquota nominal de zero e não quer ser taxado com uma

Brasileiros querem trabalhar em empresas sustentáveis

Pesquisa indica que 48% recusariam um emprego não alinhado a valores sociais e ambientaisPor Jacílio Saraiva, Para O Valor Metade dos profissionais brasileiros (50%) deixaria o emprego se não nutrisse um sentimento de pertencimento à empresa e quase a mesma parcela (48%) recusaria uma posição não alinhada a valores sociais e ambientais. Os dados, obtidos com exclusividade pelo Valor, estão na nova edição do Workmonitor, estudo global que a consultoria em recursos humanos Randstad realiza há 20 anos. O levantamento atual ouviu 35 mil profissionais, de 18 a 67 anos, empregados ou não, em 34 países. Férias sem limite é benefício para atrair nova geraçãoGeração Z impõe nova forma de trabalhar; saiba como“Profissionais querem justiça psicológica no quiet quitting”, diz Adam Grant“A pesquisa constata que os profissionais, mais do que nunca, desejam fazer parte de organizações que promovam um ambiente de trabalho inclusivo e apresentem responsabilidade social e ambiental claras”, afirma Fábio Battaglia, CEO da Randstad Brasil. “Com a maior conscientização sobre questões ambientais, os trabalhadores querem que as empresas sejam um reflexo das causas em que acreditam.” Na comparação global, os brasileiros valorizam mais os propósitos do empregador (88%) do que pares internacionais (77%) e consideram mais importantes os objetivos da companhia, no que se refere à sustentabilidade, diversidade e transparência (77,5%), do que o resto do mundo (73%). Quase metade dos profissionais no Brasil (48%) não aceitaria um emprego que não estivesse sintonizado com valores sociais e ambientais, enquanto globalmente esse resultado é de 42%”, complementa Battaglia. Na prática, continua o consultor, o ESG (práticas ambientais, sociais e de governança, do inglês) passou a ser um pilar essencial para corporações que querem se tornar competitivas no mercado de trabalho. O estudo também mostrou que a estabilidade e a flexibilidade no emprego são ativos caros para a mão de obra. “É quase uma unanimidade entre os brasileiros que o trabalho é importante [95%], índice muito superior ao global [72%]”, afirma. Mas a pandemia fez com que as pessoas não abrissem mão da maleabilidade nos expedientes, explica. Em comparação à média global, os talentos locais declaram a importância da flexibilidade em relação ao horário (92%) e local de trabalho (87%), índices acima dos 83% e 71%, respectivamente, registrados no resto do mundo. Dados do Workmonitor indicam que mais de um terço dos brasileiros (31%) já pediu demissão porque a direção não oferecia flexibilidade suficiente (27% na taxa global) e 53% deixariam um emprego se fossem impedidos de aproveitar a vida (48% no mundo). “Chamou a atenção a busca por estabilidade, apontada por 96% dos brasileiros e com 92% de média global, especialmente após os movimentos recentes de ‘great resignation’ [grande renúncia] e ‘quiet quitting’ [desistência silenciosa]”, destaca. “Isso mostra que os executivos estão atentos a eventos macroeconômicos ou crises que possam impactar o mercado de trabalho.” Depois de estudar os números do relatório, a orientação de Battaglia para as diretorias é ampliar os canais de escuta com as equipes. “A escassez de currículos persiste e as organizações devem, continuamente, monitorar as expectativas dos empregados e atuar para reter e atrair talentos”, orienta. “Propiciar um ambiente inclusivo, dar espaço à flexibilidade e engajar pelo alinhamento de propósitos e valores gera senso de pertencimento, aumento da produtividade e fidelidade dos funcionários, que impulsionarão a marca empregadora da companhia.” Veja, a seguir, as principais percepções dos brasileiros quando o assunto é ESG: https://valor.globo.com/carreira/noticia/2023/01/20/brasileiros-querem-trabalhar-em-empresas-sustentaveis.ghtml

Brasil precisa de ajuste fiscal de R$ 300 bilhões para estancar dívida crescente

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Por Luiz Guilherme Gerbelli e Anna Carolina Papp Para evitar que dívida bruta chegue a 90% do PIB em cinco anos, País precisa tomar medidas impopulares que esbarram em agenda políticaBRASÍLIA E SÃO PAULO – O governo tem pela frente uma dura batalha para acertar o rumo das contas públicas e estancar o endividamento crescente do Brasil. Com pouca margem de manobra para conduzir o ajuste fiscal, as projeções dos analistas indicam que a dívida do País deve alcançar 90% do Produto Interno Bruto (PIB) nos próximos cinco anos. Para reverter esse quadro, de uma dívida considerada alta para uma economia emergente, o tamanho do ajuste necessário, segundo analistas, é da ordem de R$ 300 bilhões – tanto em corte de gastos como em aumento de receitas. É esse montante bilionário que pode tirar a economia brasileira do rombo previsto para este ano e levá-la para um superávit primário capaz de estabilizar o endividamento do País.Ao se cadastrar nas newsletters, você concorda com os Termos de Uso e Política de Privacidade.Chegar nesse valor, no entanto, não é tarefa fácil e vai implicar ações impopulares. “As medidas vão envolver a sociedade: uma parte vai precisar pagar imposto, outra parte vai perder algum privilégio”, afirma Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da Ryo Asset. Ele reforça que a trajetória atual da dívida pública deixa a economia brasileira muito vulnerável. “Qualquer choque global será mais difícil de ser absorvido. Não é um nível confortável.” A dificuldade para “arrumar a casa” se dá, sobretudo, porque o Brasil enfrenta uma combinação perversa. O Orçamento do País já é bastante engessado, dificultando qualquer corte de gastos. Por outro lado, há pouco ou nenhum espaço para o aumentar as receitas, num cenário de elevada carga tributária. “Os pagamentos com Previdência Social e outros benefícios somam quase 50% dos gastos públicos. Outros 20% são gastos de salário do funcionalismo federal”, afirma Flávio Serrano, economista da BlueLine Asset Management. “De largada, 70% dos gastos estão contratados para pagar salário e Previdência.” Neste mês, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou um pacote fiscal com potencial de transformar o rombo previsto nas contas do governo federal para este ano, de R$ 231,5 bilhões, em um superávit de R$ 11,1 bilhões. As medidas são focadas no aumento de receitas e incluem a volta da cobrança de impostos federais sobre os combustíveis – que ainda não está definida – e um programa de refinanciamento de dívidas tributárias. O pacote também prevê, em menor grau, corte de despesas, com revisão de contratos e programas do governo. Porém, o próprio Haddad já reconheceu que o plano é ambicioso e que algumas medidas serão frustradas. Assim, em vez de entregar as contas no azul, como almeja sua planilha, ele se comprometeu a pelo menos reduzir o déficit de 2023 de 2,1% do PIB% para 1% do PIB – o que representa um rombo próximo a R$ 100 bilhões. Essa avaliação, no entanto, diverge das projeções de muitos especialistas. Segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), o País teria de fazer um superávit primário de 2,5% do PIB em 2023 para estabilizar a dívida pública. A instituição avalia que, como muitas das medidas anunciadas são incertas tanto do lado da receita como da despesa, o pacote deve se limitar a reduzir o rombo deste ano para 1,3% do PIB. Nesse cenário, projeta a dívida para 77,8% em 2023, beirando 80% do PIB em 2024. “Esse plano foi sinalizado como um pacote de medidas preliminares. É preciso fazer um pouco mais”, afirma Vilma Pinto, diretora da IFI. Ela destaca, porém, que o anúncio é relevante como uma sinalização de que o governo está preocupado com o ajuste fiscal. “Desde a PEC da Transição, a discussão do Orçamento estava muito focada no aumento de gastos, o que acende alertas. Por isso, o pacote é importante para mostrar que o governo está preocupado com a trajetória da dívida.” Continua após a publicidade Sem uma solução clara para o rumo das contas públicas, há uma piora da percepção dos investidores com o rumo da economia brasileira, o que pode se desdobrar em saídas de capital do País, com impacto no câmbio e na inflação. Corrida pelo ajusteDesde a administração de Dilma Rousseff, sucessivos governos buscam encontrar uma solução estrutural para as contas públicas. “Há uma dificuldade no Brasil que também se deve ao tamanho do conflito distributivo do País. O horizonte político dos parlamentares é curto, o que atrapalha o avanço de qualquer agenda desse ajuste”, afirma Barros. “O político acaba preocupado em ter vantagem hoje e não olha o médio prazo.” No governo Michel Temer, houve a criação do teto de gastos, que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior – regra que, porém, foi quebrada diversas vezes na gestão de Jair Bolsonaro. A atual equipe econômica já afirmou que vai apresentar uma nova proposta de regra fiscal até abril. No futuro, portanto, a expectativa para o tamanho da dívida do País também vai passar pelo novo modelo de âncora fiscal do País. Vilma aponta que, mais do que uma nova regra fiscal, a sustentabilidade da dívida depende do avanço em uma agenda de governança, que inclui revisão periódica de despesas, planejamento a médio prazo e a criação de conselhos fiscais. “É preciso pensar na qualidade do gasto público”, destaca. Essa metodologia de mudança na gestão de gastos públicos tem sido a aposta da ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, que criou uma Secretaria de Avaliação e Monitoramento de Políticas Públicas e um conselho de acompanhamento de risco fiscal e judicial. Em entrevista ao Estadão, ela reconheceu, porém, que sua atuação na revisão de gastos tem um “limite”: a agenda política de Lula. O que pode ser feitoEntre os analistas, uma série de estudos mostram quais caminhos o País pode traçar para resolver o dilema das contas públicas. Um ponto de partida seria melhorar a gestão de programas sociais e fazer a revisão do Cadastro Único – o que poderia trazer uma economia de R$ 28

Volta do imposto sindical é vista como retrocesso por especialistas

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Cobrança ao trabalhador passou a ser opcional em 2017; governo nega retorno de taxa compulsória, mas não detalha alternativasBRASÍLIA | Do R7, em BrasíliaMARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL – 18.1.2023O retorno da contribuição sindical obrigatória é visto como um retrocesso por especialistas consultados pelo R7. A discussão voltou à tona após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmar que a suspensão, em 2017, foi um “crime”. A extinção do imposto compulsório foi uma das mudanças acarretadas pela reforma tributária, implementada durante a gestão de Michel Temer (MDB). A afirmação de Lula foi dada após reunião com entidades representativas, na quarta-feira (18), e levou o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, a rebater a fala do presidente. Ele reforçou que não prevê a retomada da obrigatoriedade do imposto sindical. Embora negue a volta do imposto, Lula tem sido pressionado por movimentos sociais a reformular a contribuição, mas não apresenta alternativas. Questionado pelo R7 acerca do assunto, o Ministério do Trabalho respondeu que o governo não estuda a volta da taxa. “O ministro já deixou claro que não existe a mínima chance de essa cobrança voltar a ser feita”, afirmou a pasta, em nota. A reportagem também perguntou quais opções estariam no radar do presidente, mas não recebeu retorno.Para a advogada trabalhista Vanessa Dumont, a extinção está em harmonia com os princípios da liberdade sindical. “A volta da contribuição sindical compulsória seria um retrocesso, até porque a existência de sindicatos financeiramente saudáveis não foi suficiente para impedir a instalação da crise de representatividade, cuja perda abrupta da fonte de custeio é apenas um dos fatos geradores”, afirma a sócia do escritório Caputo, Bastos e Serra Advogados. “A abolição parece ter sido acertada, justamente porque representa o primeiro passo para a consolidação da transição democrática da organização sindical no Brasil”, argumenta Dumont. Segundo a especialista, a autonomia do empregado quanto à contribuição gera aperfeiçoamento na prestação dos serviços dos sindicatos. A obrigatoriedade da taxa reforçava, segundo a advogada, a manutenção de entidades artificiais. O trabalhador tem a liberdade de pagar ou não, caso não se sinta efetivamente representado ou se o sindicato não é atuante ou participativo. VANESSA DUMONT, ADVOGADA TRABALHISTA “O sindicato, para atrair o trabalhador e convencê-lo a contribuir, precisa ser atuante e participativo, sair de uma posição reativa para um lugar mais proativo, o que pode ser vantajoso, além de tornar a busca pela melhoria das condições de contratação e gestão dos trabalhadores mais efetiva”, afirma a advogada. O presidente da Comissão de Assuntos Tributários da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF) e professor do IDP, Alberto de Medeiros Filho, tem posição semelhante à da colega. “Eu não enxergo nenhuma vantagem [na contribuição compulsória], porque o trabalhador acaba sendo obrigado a pagar para financiar um sistema que, muitas vezes, discorda da atuação”, aponta. Para ele, a taxa opcional pode aumentar a confiança na entidade e a sensação de representatividade do empregado. Hoje, como o sindicato tem de atrair o trabalhador para receber a contribuição, precisa atuar de forma que agrade e traga benefícios efetivos. É como se fosse obrigado a prestar um bom serviço e melhorar a eficiência, para ter mais filiados. ALBERTO DE MEDEIROS FILHO, OAB-DF FontesApesar de a saúde financeira das instituições representativas ser um importante argumento, a contribuição compulsória não é a única possibilidade de custeio dos sindicatos. “É preciso pensar numa forma de arrecadação mais justa e razoável para combater a crise financeira e dar fôlego às entidades. Um exemplo é a contribuição assistencial, também chamada de cota de solidariedade ou de contribuição de fortalecimento sindical”, apresenta Vanessa. Alberto lista também a possibilidade de redirecionar despesas governamentais. “O governo tem outras alternativas para transferir recursos a entidades, dentro do orçamento da União e do remanejamento dos tributos já existentes. Não necessariamente precisa retroceder à Reforma Trabalhista, até porque não vejo clima para isso no Congresso”, avalia o professor. “Não sei qual é o custeio que o presidente Lula quer propor. Acredito que seria algo parecido com o Sistema S [como Sesi, Senac e Sesc, instituições prestadoras de serviços administradas de forma independente], com parte do FGTS, por exemplo. Nesse caso, o Estado repassaria para as entidades, mas não sabemos como seria, ainda está muito obscuro. Mas a volta ao que era antes [da reforma trabalhista] não tem mais espaço”, afirma Torres. https://noticias.r7.com/brasilia/volta-do-imposto-sindical-e-vista-como-retrocesso-por-especialistas-22012023