Questão fiscal ameaça atividade e inflação

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Boletim Macro do FGV Ibre diz que gasto sem contrapartida de receita pode levar a mais aperto monetário Por Marsílea Gombata — De São Paulo A expectativa em relação ao que será o novo arcabouço fiscal do Brasil e a falta de clareza sobre quanto tempo pode durar a licença para furar o teto de gastos (waiver) têm tensionado mercados e economistas. Segundo o Boletim Macro, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), mais custos sem contrapartida de mais receita – como cortes de gastos ou aumento de impostos – pesará contra a atividade econômica e a inflação pelo canal da demanda, do risco-país e da depreciação cambial. Como consequência, o Banco Central pode lançar novo aperto monetário, retomando ciclo de alta de juros. Em sua edição de novembro, o Boletim Macro ressalta que o principal tema do debate doméstico é o arcabouço fiscal que vigorará nos próximos anos. “A única certeza que temos até aqui é que o setor público terá um déficit em 2023, mas de que tamanho é muito pouco claro”, diz o boletim. “Adicionalmente, dependendo de que medidas sejam adotadas, as contas públicas podem operar no negativo por vários anos. Ou seja, nos próximos anos podemos ficar longe do superávit primário necessário para estabilizar a dívida pública.” A proposta da PEC da Transição apresentada aos líderes do Congresso em 16 de novembro exclui do teto, de forma permanente, gastos de R$ 175 bilhões. Na conta estão R$ 600 do Auxílio Brasil, com R$ 150 adicionais para famílias com crianças de até 6 anos. O boletim observa que a prorrogação do auxílio em R$ 600 e o adicional exigiriam cerca de R$ 70 bilhões, valor que não cabe no teto de gastos, o que leva à necessidade de um “waiver” fiscal. Esse valor, contudo, é menos da metade do pleiteado. Outros R$ 105 bilhões não têm direcionamento definido. O FGV Ibre alerta que um “waiver” de R$ 200 bilhões por ano gerará uma expansão de gastos de R$ 1 trilhão em cinco anos. “Ou seja, cerca de 10% do PIB de gastos diretos, aos quais se somarão os juros que incidirão sobre a dívida pública que terá de ser emitida para financiar esse aumento de gastos”, acrescenta o texto. O problema não é aumentar os gastos sociais, afirma Silvia Matos, coordenadora do Boletim, mas como financiá-los. “As licenças para gastar excessivamente não estão garantidas. Até porque temos o Banco Central independente atuando e manifestações da classe política, manifestações contra o que é visto como exagero”, afirma. “É preciso fonte de financiamento. A licença para gastar tem que existir por um determinado período.” “Estamos em um ambiente global e uma situação fiscal distinta do contexto de outros momentos. O espaço para uma política fiscal expansionista, como foi a tônica do Brasil nos últimos 20 anos, podendo gastar, usando bancos públicos, sem muitas restrições, não é o momento atual”, continua. Para a economista, a necessidade de ampliação dos gastos traz a oportunidade de se debater como melhorar a arrecadação e avançar na reforma tributária. “Se avançássemos na reforma tributária seria bom. Isso daria um alento, e o mercado ficaria um pouco menos reticente e mais favorável [em relação a como esses gastos serão financiados]”, acrescenta. Silvia argumenta é possível que a PEC tenha feito negativo sobre a popularidade do próximo governo, uma vez que pode pesar contra a atividade econômica, a geração de emprego e, consequentemente, a arrecadação tributária, inflando a despesa com juros sobre a dívida pública. Além disso, pode haver maior pressão inflacionária pelo canal da demanda decorrente dos estímulos fiscais, aumento do risco-país e depreciação cambial. “Não haverá outra saída para a autoridade monetária que não reagir, iniciando um novo ciclo de aperto monetário ou pelo menos não indo em frente com a redução de juros que se projetava para o ano que vem”, observa o boletim. “A sustentabilidade fiscal seguirá sendo o principal desafio do próximo governo. (…) Enquanto este arcabouço não for definido, a incerteza na economia continuará muito elevada, contribuindo para acentuar a desaceleração da atividade que está em curso.” Na seção sobre política fiscal, o economista Manoel Pires, coordenador do núcleo de política econômica e do Observatório de Política Fiscal do FGV Ibre, afirma que a adoção de medidas permanentes durante a transição do governo reduz o incentivo para uma revisão mais geral do sistema fiscal. “A discussão do waiver é uma ponte para um período de reorganização das finanças públicas do país que irá se iniciar. É necessário que a nova regra seja acompanhada de um bom plano fiscal, senão as coisas não vão andar bem”, alerta no boletim. Nesse contexto, Pires ressalta, “uma avaliação mais criteriosa sobre o cenário de receitas tributárias é fundamental”. Na parte sobre política monetária do boletim, José Júlio Senna, que chefia o Centro de Estudos Monetários do FGV Ibre, lembra que o debate sobre aumento de gastos públicos, sem qualquer menção a uma nova regra fiscal, trouxe elevado nível de estresse aos mercados financeiros. Ele argumenta que contribuíram para isso o fato de não ter participado desse debate o futuro ministro da Fazenda – “que põe um certo freio a demandas irrealistas”, cujo nome ainda não foi divulgado. A turbulência dos mercados se deu com a elevação dos juros nominais, das taxas implícitas de inflação e dos juros reais dos papéis indexados à inflação (NTN-Bs), escreve Senna. “Acompanhamento rotineiro realizado pela MCM Consultores mostra que, entre 9 e 16 de novembro, por exemplo, as inflações implícitas em contratos de mercado previstas para 2023 e 2024 passaram de 5,9% para 6,4% e de 5,7% para 6,8%, respectivamente”, observa. “Nesse mesmo período, os juros reais das NTN-Bs subiram ao longo de toda a curva, como ilustra a alta de 5,92% para 6,14% dos títulos com vencimento em 2050.” Ele acrescenta que a curva de juros de mercado passou a contemplar a possibilidade de elevação da taxa básica de juros nas próximas reuniões do Copom, sendo empurrada para a frente a possibilidade de corte

STF decide sobre data de início do FAP

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Índice impacta cálculo dos Riscos Ambientais do Trabalho (RAT), que incide sobre a folha de salários Rio O Supremo Tribunal Federal (STF) pode decidir, nesta semana, sobre a data de início das cobranças referentes ao Fator Acidentário de Prevenção (FAP). Os ministros vão dizer se estão permitidas desde janeiro de 2010 – como instituído – ou se seriam válidas somente a partir de 2013. Esse índice é calculado com base no registro de acidentes de cada empresa. Pode diminuir à metade ou dobrar as alíquotas do RAT, os Riscos Ambientais do Trabalho – nova denominação para o Seguro de Acidente de Trabalho (SAT) -, que incide sobre a folha de salários. A diferença de tempo, portanto, tem impacto econômico. Afeta, principalmente, empresas que têm discussão judicial sobre o tema e vêm depositando judicialmente os valores que deveriam repassar ao governo. Desdobramento Os ministros reconheceram a constitucionalidade do FAP em julgamento realizado no ano passado. Eles vão voltar ao tema, agora, por meio de embargos de declaração. As discussões ocorrerão no Plenário Virtual entre os dias 25 de novembro e 2 de dezembro. O debate em torno da data de início das cobranças foi levantado pelos contribuintes por conta da metodologia utilizada para calcular o índice (RE 677725). Metodologia Os contribuintes argumentam que nos dois primeiros anos foram usados, para a cobrança, dados anteriores à própria instituição do FAP, prática que seria vedada pela Constituição Federal. Citam o artigo 150. Consta, nesse dispositivo, que União, Estados e municípios não podem cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado. O FAP foi instituído em 2009 e as cobranças tiveram início em janeiro de 2010. Só que o cálculo teve como base as ocorrências registradas nas empresas nos anos de 2008 e 2007. Entenda O FAP tem como base sempre os registros dos dois anos anteriores. A Receita Federal divulga o índice de cada empresa no mês de setembro. O que será aplicado em 2023, por exemplo, foi disponibilizado em setembro deste ano e leva em conta as ocorrências de 2021 de 2020. Os contribuintes dizem que até 2013 utilizava-se ocorrências registradas antes da lei e, por esse motivo, as cobranças não seriam possíveis. Impacto Especialista na área, Alexandre Ponce de Almeida Insfran, do Velloza Advogados, diz que muitas empresas entraram com ação contra o FAP em 2010, contestando a constitucionalidade e a metodologia utilizada, e depositaram os valores discutidos em juízo. Se os ministros decidirem que nos dois primeiros anos de vigência da lei não se poderia cobrar, essas companhias poderão levantar parte do dinheiro. Existem empresas, além disso, ele diz, que mantiveram as discussões, mas recolheram os valores diretamente aos cofres públicos. Nesse caso, teriam o direito de receber de volta o que pagaram a mais. https://valor.globo.com/legislacao/valor-juridico/coluna/stf-decide-sobre-data-de-inicio-do-fap.ghtml

Fim da linha para o trabalho de pijama? Número de anúncios de vagas em home office para de crescer

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Números mostram que proporção fica em torno de 10% do total de vagas; setor de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg é o que mais utiliza modalidade. Por Marta Cavallini, g1 Antes restrito a poucas profissões, o trabalho em home office se popularizou na pandemia – e muita gente descobriu as alegrias de não gastar tempo no trânsito e passar o dia de pijama. Mas levantamentos realizados em anúncios de empregos no país mostram que o oferecimento de vagas na modalidade praticamente se estabilizou nos últimos meses. À medida que as restrições sanitárias foram sendo flexibilizadas, muitas empresas que haviam colocado os funcionários para trabalhar à distância voltaram para o trabalho presencial ou híbrido – revezamento entre as duas modalidades na mesma semana. O que os levantamentos confirmam é que o setor de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg tem a maior adesão ao home office. Isso porque a própria atividade possibilita que o profissional possa trabalhar de casa e também é uma forma de atrair profissionais em meio à dificuldade de contratação de mão de obra especializada. Estudo feito de 1º de outubro a 8 de novembro pela Cortex, empresa de inteligência de vendas B2B, mostrou que, das mais de 429 mil oportunidades abertas, mapeadas nos 15 principais portais de vagas do país, somente 39,3 mil citam o home office na descrição, o que corresponde a 9,16% do total. Home office: 40% dos brasileiros preferem trabalhar em casa Este é o terceiro levantamento realizado pela empresa neste ano. O primeiro, feito em julho, apontou que 8,4% das vagas eram para trabalho remoto. Já o segundo, realizado em setembro, mostrou que 8,6% das vagas citavam o home office na descrição. O levantamento mostrou ainda que os setores de Serviços (4.569) e Tecnologia da Informação (3.686) são os que tiveram maior número de vagas no modelo remoto, somando 8.255 oportunidades. Em seguida, estão os setores de Varejo, com 1.745; Financeiro, com 893; e Indústria, com 643. Cidades Já em relação às cidades com mais empresas abertas à possibilidade de oferecer vagas de trabalho à distância, São Paulo (2.411), Rio de Janeiro (533), Belo Horizonte (356), Curitiba (344), Porto Alegre (253), Florianópolis (240), Brasília (235), Barueri (177) e Campinas (145) são as que lideram a lista. Sobre o porte das empresas com vagas abertas para home office, o levantamento apontou que 55% são micro, 19% grande, 17% pequeno e 9% médio. Sobre o faturamento anual, os destaques são para as faixas de R$ 81 mil a R$ 360 mil, que concentram 32% das empresas com vagas remotas abertas; R$ 0 a R$ 81 mil, com 23%; e a faixa que vai de R$ 30 milhões a R$ 100 milhões, com 8%. “Diversas pesquisas apontam o home office como o modelo de trabalho preferido entre muitos colaboradores, e ele possibilita a busca por profissionais especializados por todo o país. Porém, algumas empresas podem não se sentir seguras em garantir esse modelo como formato definitivo de trabalho, por isso, muitas ainda optam por não colocar isso na descrição das vagas”, ressalta Carolina Ballerine, gerente de People na Cortex. Crescimento passou de 500% em 2020 Outro levantamento, feito pela Gupy, mostra que do total de vagas publicadas na plataforma de recrutamento e seleção atualmente, 10,36% são remotas. Em 2021, eram 10,45% no mesmo período. Segundo a empresa, em 2020, houve um crescimento nas vagas com trabalho remoto de 504,62%. O avanço continuou em 2021, com aumento de 366,39%. Já neste ano, a alta é de apenas 5,93%. Veja abaixo a proporção de vagas remotas abertas dentro do total ano a ano: 2022: 10,36%2021: 10,45%2020: 6,34%2019: 2,87% O estudo da Gupy foi feito em uma base de 70 mil vagas publicadas por mais de 3.000 empresas. Tecnologia da informação A pesquisa da Gupy mostra ainda que o setor de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg da informação está isolado na liderança de representatividade de vagas remotas dentro das vagas totais publicadas na plataforma de empregos. Além da alta representatividade, os dados indicam crescimento acelerado da cultura remota no setor. Em 2019, apenas 3% das vagas publicadas eram declaradas como remotas. O cenário mudou drasticamente com a pandemia e acelerou o aumento, marcando 24% em 2020. Em 2021, mais da metade das vagas publicadas no setor de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg foram remotas – 58% das oportunidades gerais. O crescimento segue acelerado, com potencial de chegar em até 3/4 das posições no segmento em 2022, informa a Gupy. O segundo setor com maior presença e crescimento da cultura remota é o financeiro – em 2019, ele estava empatado com https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg, com 3% de representatividade, mas, no ano seguinte, o ramo financeiro subiu apenas 5 pontos percentuais, atingindo 8% de representatividade. O pulo em crescimento para o segmento financeiro foi no ano de 2021, em que 23% das vagas publicadas na Gupy eram declaradas como remotas. Entretanto, a tendência de crescimento para 2022 segue moderada, rodando em torno de 30% de representatividade. Os setores de telecomunicações, indústria e saúde tiveram uma leve queda na representatividade de vagas operacionais, diminuindo alguns pontos percentuais entre os anos de 2020 e 2021. Pico foi em maio de 2021, mostra LinkedIn Já um balanço feito pelo LinkedIn mostra que o mês de pico de vagas com trabalho remoto no Brasil foi em maio de 2021, com 47,74% do total. Desde então, há uma tendência de queda e, em setembro deste ano, a proporção é de 29,55%. Além disso, o levantamento mostra que as funções remotas estão em declínio globalmente após análise de postagens de empregos no LinkedIn. Nos EUA, por exemplo, antes da pandemia, apenas 2% dos empregos no LinkedIn eram listados como remotos. Esse número atingiu quase 20% em abril de 2022 e agora voltou para 15%. “Isso reflete uma tendência que estamos vendo em países ao redor do mundo e é um provável sinal de que o trabalho remoto já atingiu o seu pico e agora os empregadores desejam ver os funcionários de volta ao escritório”, informa o LinkedIn. O estudo foi feito com mais de 2.900 executivos C-Level de grandes organizações em todo o mundo, sendo 250

Dois terços dos trabalhadores ganham até dois salários mínimos

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Baixa produtividade, influenciada por qualificação dos trabalhadores abaixo do necessário, é principal explicação Por Lucianne Carneiro — Do Rio A melhora do mercado de trabalho depois das consequências da pandemia não esconde um problema estrutural: a concentração dos trabalhadores em vagas com rendimentos baixos. O Brasil tinha dois terços (67,1%) de seus trabalhadores com renda de até dois salários mínimos (R$ 2.424) por mês no terceiro trimestre de 2022. São 65,5 milhões de pessoas nesta situação, de um total de 97,5 milhões de pessoas ocupadas no país. O cálculo é da LCA Consultores, feito a partir de microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua a pedido do Valor. Considerando apenas aqueles que ganham até um salário mínimo (R$ 1.212), a parcela é de 35,6% (34,7 milhões de pessoas). A baixa produtividade do trabalho no Brasil, influenciada por uma qualificação dos trabalhadores que avançou, mas está aquém do necessário em qualidade e intensidade, é apontada por economistas como a principal razão para esta composição da força de trabalho centralizada nos rendimentos até dois salários mínimos. Esses percentuais oscilaram na pandemia como resultado da crise. Houve aumento da parcela de quem ganhava menos e redução dos que estavam na faixa superior dos rendimentos. Para se inserir, trabalhadores aceitaram trabalho com remunerações menores. E isso ocorreu tanto no mercado formal de trabalho (setor privado com carteira de trabalho ou setor público) quanto no informal. Agora, com a recuperação do emprego e, mais recentemente, de uma reação também do rendimento médio, as parcelas dos que recebem até um salário mínimo e entre um e dois salários começaram a recuar. O que se observa, no entanto, é que a variação foi limitada não só na pandemia como ao longo dos últimos anos. Desde 2012, início da série histórica da pesquisa, a fatia de quem recebia até dois salários mínimos por mês variou entre o mínimo de 65,7% no segundo trimestre de 2014 e o máximo de 71% nos terceiro e quarto trimestres de 2021. “O Brasil é um país ainda muito desigual. Há uma pequena parcela de trabalhadores muito qualificada, mas tem um grupo muito maior com baixa qualificação, que não consegue passar dos dois salários mínimos de rendimento. É a Belíndia”, afirma Bruno Imaizumi, economista da LCA Consultores responsável pelo levantamento, fazendo referência ao termo cunhado por Edmar Bacha nos anos 1970 para descrever a desigualdade na sociedade brasileira. Para a coordenadora do Grupo de Pesquisas em Economia do Trabalho da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Diana Lúcia Gonzaga da Silva, a distribuição do pessoal ocupado, pelo perfil de renda, reflete as consequências de uma baixa produtividade do trabalho. “O comportamento estrutural do mercado de trabalho está associado à baixa produtividade. A economia brasileira tem se concentrado em setores que agregam pouco à produção e acabam formados por empregos pouco complexos”, diz ela. Vendedor de uma loja de produtos para cozinha no Centro do Rio, Oswaldo de Souza, de 45 anos, recebe R$ 1.700 por mês. Ele estudou apenas até o quinto ano do ensino fundamental e diz que nunca chegou à marca de dois salários mínimos por mês. Souza mora sozinho em uma casa alugada na comunidade de São Carlos, região central do Rio, por R$ 500, paga pensão de R$ 300 para o filho e precisa bancar seus demais gastos com o que sobra. “A gente vai se virando como dá. Se eu pudesse, a coisa mais importante para mim seria morar em um lugar mais seguro. A gente passa por gente armada quando chega em casa e está sempre alerta”, diz. A falta de estudo de Souza e de tantos outros trabalhadores brasileiros está por trás da baixa qualificação citada por Naercio Menezes Filho, professor do Insper e da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP), como uma das principais influências para a baixa produtividade do trabalho, que limita a evolução salarial ao longo da trajetória profissional da maioria dos brasileiros. “Sem crescimento da produtividade do trabalho, fica difícil aumentar de forma sustentada o salário das pessoas. E um dos principais fatores para isso é a baixa qualificação. A maioria da população acaba pingando de emprego em emprego com salários baixos ao longo da vida”, afirma. Mesmo com o avanço da parcela da população mais instruída, tanto com ensino médio completo tanto com curso superior, ainda são fundamentais melhorias na qualidade do aprendizado, segundo Menezes Filho. “Hoje 70% dos jovens têm ensino médio completo, mas o aprendizado não é o esperado. Falta conhecimento em conteúdo e em habilidades sociais, como perseverança, resiliência, garra e metas. É preciso continuidade de políticas públicas, ao longo de toda a vida educacional, para ajudar o jovem a se virar no mundo”, defende o professor. O garçom Edilson da Silva Sousa, de 29 anos, era um dos trabalhadores que ganhavam um salário mínimo até 2020. O aumento da escola do filho, no entanto, pressionou o orçamento da família e ele acabou arrumando um segundo emprego como garçom, aos sábados e domingos. Só descansa quando tem algum evento da família. A decisão de pagar uma escola particular foi para investir na educação do filho. “Antes eu ganhava um salário por mês e fazia uns bicos em eventos. Mas quando a escola do meu filho aumentou tive que tornar isso fixo. A gente decidiu se apertar por uma boa causa”, conta ele, que tem o ensino fundamental completo. https://valor.globo.com/brasil/noticia/2022/11/22/dois-tercos-dos-trabalhadores-ganham-ate-dois-salarios-minimos.ghtml

Membro do grupo de transição de Lula sugere pôr fogo em papéis sobre nova reforma trabalhista

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Ricardo Patah, da UGT, diz que ato simbolizaria o renascimento do movimento sindical, como ‘uma fênix’ Guilherme SetoSÃO PAULO Ricardo Patah, presidente da central sindical UGT e membro do grupo de discussão sobre trabalho e previdência do governo de transição de Lula (PT), sugeriu na primeira reunião que os relatórios do Grupo de Altos Estudos do Trabalho (Gaet), criado em 2019 pelo governo federal para discutir uma nova reforma trabalhista e sindical, sejam colocados em um tambor e incendiados. A ideia, segundo Patah, é simbolizar o renascimento das pautas trabalhistas e o surgimento de um neo-sindicalismo, “como uma fênix”. Ele afirma que a ideia foi bem recebida pelos colegas, sem contestação, mas que ainda voltará a conversar sobre o tema com eles. Patah diz que a volta de Lula à Presidência cria a expectativa de fortalecimento do Ministério do Trabalho, que foi extinto por Jair Bolsonaro (PL) no primeiro ato de seu governo, em 2019, e depois recriado para acomodar Onyx Lorenzoni (PL). As propostas do Gaet, grupo formado por ministros, desembargadores e juízes que foi instituído pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho (que integra o Ministério da Economia), foram criticadas por lideranças sindicais nos últimos anos, que dizem ver nelas tentativas de subtração de direitos trabalhistas e enfraquecimento da estrutura sindical. Algumas das propostas que saíram do Gaet, por exemplo, foram as de liberar trabalho aos domingos e proibir o reconhecimento de vínculo de emprego entre prestadores de serviço e aplicativos Outras alterações propostas em relatórios do Gaet foram a autorização para a criação de sindicatos por empresas e o fim da unicidade sindical, que hoje proíbe o estabelecimento de mais de um sindicato por categoria na mesma base territorial (por município, uma região, estado ou país).